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1 MODERNIDADE, CONTEMPORANEIDADE E CAMPOS SOCIAIS

1.3 SOCIEDADE DO ESPETÁCULO: INFORMAÇÃO, IMAGEM E MÍDIA

Marcada pela Revolução da Tecnologia da Informação e pela evolução do capitalismo (informacional), a década de 1970 adotou o uso de tecnologias e o aumento da produtividade como estratégias para reagir ao declínio da lucratividade e renovar o capitalismo. Assim, no final do século XX, surge uma nova economia, chamada por Castells (1999) de economia informacional.

Baseada na Revolução Tecnológica, essa nova economia apresenta características diferenciadas e interligadas, sendo informacional e global ao mesmo tempo. Fridman (1999) explica essa dualidade, dizendo que ela é informacional porque sua produtividade e competitividade dependem de informações baseadas em conhecimento e, ao mesmo tempo, é global porque suas atividades produtivas, consumo, circulação e componentes estão organizados mediante uma ampla rede e conexões entre agentes econômicos em escala global.

Desta forma, esse novo paradigma tecnológico organizado em torno das novas tecnologias da informação, mais flexíveis e poderosas, possibilita que a própria informação se torne o produto do processo produtivo - e essa nova realidade vem provocando profundas mudanças na sociedade. Na cultura dominada por imagens, o avanço tecnológico e a rápida disseminação da informação são fundamentais. A mídia passa a ter um papel fundamental na produção de discursos e na criação de ilusões, produzindo grandes ‘espetáculos midiáticos’ – caracterizando a sociedade da imagem.

As primeiras formulações do conceito de sociedade da imagem remontam à década de 1960 e foram apresentadas pelo filósofo, militante político e cineasta francês Guy Debord, que sempre se orgulhou de nunca ter sido desmentido em suas teses. Para ele, a imagem é a forma final da derradeira realização do capital, fundamento da sociedade da imagem ou do espetáculo. Debord (1997) dizia que o poder dos meios de comunicação de massa e dos profissionais do espetáculo invadiu todas as fronteiras e conquistaram todos os domínios – da arte à economia, da vida cotidiana à política.

No Congresso Nacional, por exemplo, esse espetáculo, diversas vezes, é reproduzido (e provocado) na tribuna, quando um parlamentar inflama o seu discurso apresentando a notícia que motivou o seu pronunciamento. É muito comum encontrar parlamentares mostrando recortes de jornal, revista ou mesmo matérias de televisão gravadas em DVD para reforçar os seus discursos e imprimir-lhes importância - conseguindo, com isso, mais adeptos na votação de suas proposições. É cena corriqueira, inclusive, esses atores anexarem os recortes junto aos requerimentos que protocolam nas suas devidas comissões, conforme se percebeu na análise desenvolvida nesta pesquisa e que se apresenta mais adiante.

Ainda sobre o conceito de sociedade da imagem, é interessante dizer que após Debord sistematizar a teoria do espetáculo com o lançamento do livro A Sociedade do Espetáculo em 1967, o também francês Baudrillard vem como o teórico da ideia de ‘simulacro’. Este filósofo e sociólogo defendia a tese de que a "produção da realidade", a partir de narrativas midiáticas, criava um mundo de "simulacro" que dispensava a experiência vivida.

Através de suas obras, especialmente “Simulacros e Simulação” e “A Sociedade de Consumo”, Baudrillard reduz o indivíduo à condição de consumidor como consequência da automatização do sistema de produção, sugerindo que a publicidade seria a arte oficial do capitalismo e a televisão o ponto de origem do que chamava de ‘mundo simulacional”. Para Baudrillard (1991), esse mundo de estetização é composto por uma produção exagerada de imagens, signos e mensagens, com sofisticadas técnicas para produzir ilusões, a exemplo do mundo virtual. Sua famosa frase “já não consumimos coisas, mas somente signos” reforça a sua visão de que a característica de nossa sociedade-cultura é, antes de tudo, a de ser uma sociedade-cultura de consumo. Assim, tudo torna-se simulacro.

O difícil conceito de simulacro tendo por base o “quarto estágio (o terminal) do

signo”, nunca esteve relacionado com uma oposição entre simulação e realidade, entre o real e o signo, em outras palavras, nunca quis dizer irrealidade. Os simulacros são experiências, formas, códigos, digitalidades e objetos sem referência que se apresentam mais reais do que a própria realidade, ou seja, são “hiper-reais”. (SIQUEIRA, 2004)

Na teoria de Baudrillard, os meios de comunicação seriam a força constitutiva por excelência do jogo de simulacros. A sociedade da imagem e a indispensável onipresença da mídia é o ambiente em que se processa uma nova expansão do capitalismo. Portanto, para Jameson (1996, apud FRIDMAN, 1999), capitalismo seria sinônimo de pós-modernismo e "capitalismo da mídia" seria a transformação de objetos de todo tipo em mercadorias (sejam

estrelas de cinema, automóveis, sentimentos ou experiência política) e enseja vidas dedicadas ao consumo e desejos suscitados e inculcados pelos meios de comunicação de massa.

A estetização da realidade promove a colonização do inconsciente e da natureza pelo mercado, processo indissociado do pós-modernismo. As linguagens midiáticas alteraram decisivamente o atual modo de vida. Através de meios como a televisão, os computadores, a publicidade e outros, a cultura baseada na imagem suplantou a cultura literária anteriormente predominante. O que se vê é a "estetização da realidade" (expressão de Walter Benjamin) em que a arte se mistura indissoluvelmente à compra e venda de produtos através da criação de narrativas que favorecem investimentos imaginários e libidinais dos consumidores em torno das mercadorias. (FRIDMAN, 1999).

O espetáculo é o capital em tal grau de acumulação que se torna imagem [...] Quando o mundo real se transforma em simples imagens, as simples imagens tornam-se seres reais e motivações eficientes de um comportamento hipnótico. O espetáculo, como tendência a fazer ver (por diferentes mediações especializadas) o mundo que já não se pode tocar diretamente, serve-se da visão como o sentido privilegiado da pessoa humana [...] É o contrário do diálogo. Sempre que haja representação independente, o espetáculo se reconstitui. (DEBORD, 1997, p. 25,18).

Segundo Siqueira (2004), no simulacro da política o que se pratica é política eleitoral de curto prazo, estratégica e que “dessa forma a política não passa de intrigas, conspirações, tráfico de influência, lutas surdas ou abertas para se apropriar do poder, perdendo o seu forte sentido de questionamento do instituído, de prática reflexiva”. Assim, Siqueira conclui que o simulacro de política é política sem qualidade, que deixa o que é importante sem resposta.

Na luta pelo poder, ouvimos os discursos esvaziados de sentido, mas que no processo da simulação, continuam cada vez mais encenando uma produção de sentido. Discursos que, baseando-se em uma suposta ignorância dos indivíduos, prometem resoluções rápidas para problemas complexos. (SIQUEIRA, 2004)

Devido ao excesso de simulacro existente na política que se faz no Congresso Nacional brasileiro, é possível que dezenas de projetos e outras proposições sejam consideradas incoerentes, inadequados e/ou inviáveis, culminando em arquivamento após passarem anos tramitando nas mais diversas comissões parlamentares. Muitas proposições são movidas por determinado espetáculo midiático, que depois de substituído por um novo, acaba sendo esquecido pelo público em geral e, consequentemente, levando muitas proposições ao esquecimento também (daí ficarem anos e anos sem nenhuma ação durante o trâmite). Quando o assunto volta à tona através da mídia, muitas proposições são reapresentadas, seja pelo autor ou por seus pares que têm conhecimento das mesmas, seja com o antigo registro ou

com um novo. Esse ‘retorno’ da proposição pode acontecer, inclusive, em outra legislatura, quando seu autor já não pertence mais à bancada.

Desta forma, em meio às fragmentações do mundo pós-moderno, não se pode mais compreender a política apenas por sua velha dualidade direita-esquerda. A globalização, as novas tecnologias da comunicação e da informação imprimem um novo cenário político, com novas questões a serem problematizadas. É preciso considerar o predomínio do hiperpluralismo na política e a chamada ‘estetização da realidade’ produzida através da mídia – mais uma manifestação de poder que pode ser percebida nas relações em diversos campos sociais, mas que no campo político ocorre de forma bastante explícita. Por isso, pode-se afirmar que a política está intrinsecamente ligada à Comunicação Política e a interação de ambas com a comunidade dar-se-á de forma direta e imediata, consciente ou inconscientemente. “Em outras palavras, em situações que envolvem a sociedade como um todo, como em um processo eleitoral, ambas as ciências aproximam-se, interagindo-se para alcançar os seus objetivos”. (CUNHA, 1998, p. 10)