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TEMA: COMPETÊNCIA ABSOLUTA (INTERNACIONAL – PACTO DE JURISDIÇÃO)

No documento Processo Civil - Casos Práticos (páginas 61-65)

c Celebrado o contrato definitivo, IP não paga o remanescente do preço, obrigando XC a instaurar a respectiva acção de condenação?

TEMA: COMPETÊNCIA ABSOLUTA (INTERNACIONAL – PACTO DE JURISDIÇÃO)

O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.

Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à matéria civil e comercial.

O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou fora da União Europeia.

Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio, nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.

No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. Nos termos do art. 59º, sendo a acção proposta em Portugal o tribunal português irá aplicar a lei portuguesa para determinar se a parte tem domicilio em Portugal. Nélia reside em Lisboa pelo tem domicilio no território de um Estado Membro da União Europeia, neste caso Portugal. Deste modo, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para conhecer da questão.

Apesar de já se ter apurado que os tribunais portugueses são competentes internacionalmente para conhecer da questão em analise, podemos ainda abrir a hipótese da existência de um pacto de jurisdição.

Nos termos do art. 23º consagram-se os pactos de jurisdição. Os pactos de jurisdição atingem as regras de determinação da competência internacional dos tribunais portugueses, havendo que distinguir entre:

 Pactos Atributivos de Jurisdição: concede-se a competência internacional a um ou a vários tribunais portugueses, a qual pode ser exclusiva ou concorrente.

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 Pactos Privativos de Jurisdição: as partes retiram a competência a um ou a vários tribunais portugueses e atribuem-na, em exclusivo ou concorrentemente, a um ou a vários tribunais estrangeiros (art. 99º/2 CPC). Para que a competência seja atribuída em exclusivo ao foro estrangeiro é preciso que as partes retirem a competência legal aos tribunais portugueses; se o não fizerem o caso poderá ser apreciado e julgado concorrentemente pelos tribunais portugueses

No presente caso estaríamos face a um pacto privativo de jurisdição uma vez que as partes acordaram que na eventualidade da ocorrência de algum litigio quanto ao cumprimento ou validade do contrato o tribunal do Rio de Janeiro seria o componente.

Na medida em que se pretende anular o contrato com base na sua simulação tal insere-se no âmbito da cláusula (‘’algum litígio quanto à validade’’).

Os pactos de Jurisdição devem observar alguns requisitos, requisitos esses constantes do art. 99º CPC (e não do art. 23º do Regulamento):

Litígio tem de ter natureza internacional – art. 99º/1

NOTA1: O Regulamento nº 44/2001 visa que a União Europeia seja um

todo, não sendo necessária a exigência de uma relação controvertida com mais de uma ordem jurídica, isto porque no Regulamento entende-se a União Europeia como sendo um todo, um único Estado Membro. O caracter internacional é inerente à União Europeia. Por sua vez, o art. 99º do CPC visa evitar o ‘fórum shopping’, ou seja que se escolha a instância mais conveniente.

NOTA2: se as partes não tivessem dito que a competência era exclusiva (‘’o seu julgamento cabe em exclusivo, ao tribunal do Rio de Janeiro’’),

nos termos do art. 99º/2 CPC tal competência seria alternativa, mas pelo Regulamento nº 44/2001 essa mesma competência seria exclusiva. Caso: requisito verificado – ordem jurídica portuguesa e ordem jurídica brasileira.

Só podem incidir sobre situações jurídicas disponíveis – art. 99º/3 al. a) – o que não abrange apenas as acções sobre o estado das coisas (acções de divórcio por exemplo)

Caso: requisito verificado uma vez que consiste no direito de anulação de um contrato  Deve ser aceite pela lei do tribunal estrangeiro designado pelas partes – art.

99º/3 al. b)

Caso: nada no caso nos indica que sim ou que não, pelo que terá de se considerar que este pacto de jurisdição só seria válido na medida em que a lei brasileira assim o dissesse. O facto de as partes inserirem tal no Pacto de Jurisdição não tem qualquer influência se a lei brasileira não o aceitar.

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 Necessitam de ser justificados por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas e, nesse caso, não envolver inconveniente grave para a outra – art.

99º/3 al. c)

NOTA: o legislador não define interesse sério. Alguma doutrina entende

que o interesse sério deve ser interpretado com recurso ao art. 398º/2 CC, ou seja interesse sério enquanto interesse digno de protecção legal.

Caso: ter-se-ia de demonstrar que tal escolha corresponderia a um interesse sério e que não conduziria a nenhum inconveniente grave para a outra parte.

 Não podem ofender a competência exclusiva dos tribunais portugueses, nos casos previstos no art. 65º-A – art. 99º/3 al. d)

Caso: uma vez que no caso nada nos é dito iremos presumir que sim.

Devem constar de documento escrito ou confirmado por escrito – art. 99º/3 al.

e) e nº4

NOTA: O Regulamento tem uma preocupação com a forma (escrita ou

verbal com confirmação escrita), como consta do art. 23º/1 al. a) b) e c) e nº2, mas abre o âmbito de validade formal do pacto de jurisdição em muito, uma vez que permite que os usos da relação entre as partes possam ditar a forma daquele. Por sua vez, o art. 99º CPC quanto à forma escrita tem também uma certa abertura (art. 99º/3 al. e) e nº4)), mas não tanta como a amplitude conferida pelo Regulamento.

Caso: requisito verificado nos termos do art. 99º/4 CPC (‘’considera-se reduzido a

escrito o acordo constante de documento assinado pelas partes’’)

 Deve mencionar expressamente (directa ou indirectamente) a jurisidição competente – art. 99º/3 al. e), in fine

Caso: requisito verificado (‘’o seu julgamento cabe em exclusivo, ao tribunal do Rio de Janeiro, competente segundo a lei brasileira’’)

Embora não se consiga provar com a maior clareza a verificação dos requisitos da al. b) e d), presume-se que se encontram verificados. Sendo a acção efectivamente proposta em Portugal, Manuel procedeu mal.

Nos termos do art. 100º CPC as partes podem convencionar as regras de competência em razão do território, desde que tais não consubstanciem nenhum dos casos previstos no art. 110º (o que neste caso efectivamente não sucede).

Sabendo que Manuel agiu mal, uma vez analisados e verificados os requisitos dos pactos de jurisdição, cabe saber quais as consequências que daí derivem. Para tal é necessário saber se a violação de um pacto de jurisdição conduz a um caso de incompetência absoluta ou incompetência relativa.

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Nos termos do art. 101º CPC consagra-se que a infracção de regras quando haja mera violação de um pacto privativo de jurisdição não determina a incompetência absoluta do tribunal.

Nos termos do art. 108º CPC consagra-se que a infracção das regras decorrentes do estipulado nas convenções previstas no art. 99º e 100º (pactos de jurisdição) determinam a incompetência relativa do tribunal.

Deste modo estamos face a uma excepção dilatória nos termos do art. 493º/1 e 2 e do art. 494º al. a), gerando a absolvição da instância nos termos do art. 288º CPC. Esta excepção dilatória, nos termos do art. 495º CPC, não será de conhecimento oficioso

(‘’O tribunal deve conhecer oficiosamente e todas as excepções dilatórias, salvo da incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo disposto no art. 110º’’), pelo

que nos termos do art. 109º a incompetência relativa terá de ser arguida pelo réu (Nélia) para poder ser conhecida pelo tribunal, sendo tal conhecida deste nos termos do art. 110º/3.

Nos termos do art. 111º/3 CPC consagra-se como consequência ‘geral’ da incompetência relativa a remessa do processo para o tribunal competente. Contudo, na parte final desse artigo, consagra-se que tal consequência não se aplica aos casos de violação de pactos privativos de jurisdição, sendo que nestas situações ocorre a absolvição da instância do réu. Tal deve-se ao facto de não se dever interferir na jurisdição de outros Estados. Deste modo, Manuel deveria propor a acção no Brasil.

NOTA1: Quando se realiza um pacto de jurisdição é necessário ter atenção ao seu

âmbito de incidência.

NOTA2: É sempre necessário analisar se o pacto de jurisdição não interfere com

nenhumas das competências exclusivas constantes do art. 22º, uma vez que um pacto de jurisdição nunca pode violar uma daquelas regras.

NOTA3: O art. 24º do Regulamento nº44/2001 consagra aquilo que costuma ser

designado como pactos tácitos. A norma consagra que ‘’é competente o tribunal de

um Estado Membro perante o qual o requerido compareça’’, ou seja o tribunal torna-

se competente pois o comportamento de comparecer perante aquele tribunal é como a celebração tácita de um pacto. Mas esta norma têm limites, constantes na sua segunda parte:

Limite1: a comparência tiver por único objectivo arguir a incompetência

E se o requerido se se defender por impugnação mas invocar a incompetência do tribunal?

 Deve-se ter cuidado na força como se interpreta a palavra ‘’único’’, uma vez que tal é enganoso.

 A interpretação correcta deste limite vai no sentido de que a comparência vise suscitar a incompetência sem prejuízo das restantes defesas que possam ser suscitadas.

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 Limite2: existir outro tribunal com competência exclusiva por força do art. 22º do Regulamento

c. “Se vier a surgir algum litígio quanto à validade, à interpretação ou à execução deste contrato, as partes comprometem-se a submetê-lo à apreciação de um tribunal arbitral, constituído de acordo com as seguintes regras…”. Manuel, porém, propõe a acção no tribunal judicial que, na falta desta convenção, seria competente. Procedeu bem?

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