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TEMA: PROVA DOCUMENTAL

No documento Processo Civil - Casos Práticos (páginas 108-112)

c Celebrado o contrato definitivo, IP não paga o remanescente do preço, obrigando XC a instaurar a respectiva acção de condenação?

TEMA: PROVA DOCUMENTAL

Nos termos do art. 362º CC consagra-se que a ‘’Prova documental é a que resulta de

documento; diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto’’.

No presente caso estamos face a um documento particular simples, uma vez que não se enquadra no âmbito do art. 362º/2 e 3. Não existe qualquer intervenção notarial ou de qualquer outra pessoa com poderes de autenticação: este documento escrito é apenas assinado pelo Eduardo e pelo Francisco.

Note-se que poder-se-ia pensar em aplicar as normas constantes do art. 370º e 371º CC, mas uma vez que tais respeitam ao valor probatório dos documentos autênticos e estamos face a um documento particular simples é necessário atender ao disposto no art. 374º e 376º CC.

É de salientar que sempre que se está face a uma prova documental é necessário realizar duas fases: (1) identificar a força probatória processual do documento (autoria do documento); (2) identificar a força probatória material do documento (conteúdo do documento).

A fim de apurar se o documento em análise prova a celebração do contrato de mútuo e o (a falta de) pagamento é necessário atender à força probatória processual do documento que se encontra consagrada no art. 374º do CC. Tal terá força probatória plena quanto à autoria do documento, ou seja um documento que não tenha sido impugnado possui força probatória plena. Para se destruir a sua força probatória plena é necessário fazer-se prova em contrário. Imaginando-se que tal documento era anexado junto à petição inicial se o réu na contestação tomasse conhecimento com o mesmo mas não soubesse identificar se aquela assinatura era ou não dele, tal seria fundamento para impugnar? Não: dizer que não se sabe não é fundamento de impugnação pelo que não é suficiente para afastar a força probatória plena deste documento (típica pergunta de oral). Deste modo, uma vez que ambas as partes (Eduardo e Fernando) assinaram o documento e uma vez que tal documento não foi impugnado conclui-se que este, nos termos do art. 374º CC, tem força probatória plena.

Analisando agora o conteúdo do documento, ou seja a sua força probatória material, é necessário atender ao disposto no art. 376º CC. Nos termos do nº1 da norma em análise quando se diz ‘’faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu

autor’’ o que tal significa é que o documento prova as declarações (prova que

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declarou ter lhe pago já uma parte). Deste modo, não ficam provado os factos, ou seja não fica provado o pagamento e o empréstimo. Uma coisa é declarar-se que se emprestou e outra é emprestar-se de facto. Ou seja, fica provado com força probatória plena as declarações, salvo se se provar a falsidade de tais. Nos termos do nº2 faz-se referência à confissão que consta do art. 352º do CC. Segundo esta norma se se conseguir, analisando as declarações, retirar das mesmas, factos desfavoráveis a quem as emitiu, por aplicação do art. 353º CC poder-se-ão considerar tais factos como provados.

Exposto o anterior coloca-se então a questão de saber se o presente documento prova o empréstimo. Uma vez que Francisco reconhece que Eduardo lhe emprestou aquela quantia tal consubstancia uma declaração que lhe é desfavorável pelo que aplicando o art. 376º/2 e o art. 352º CC tal consubstancia uma declaração confessória. Tendo em consideração que é sempre necessário enquadrar a acção no âmbito da acção que está a ser proposta podemos concluir que o empréstimo é dado como facto provado.

Analisemos agora a questão da falta de pagamento (‘’Francisco reconhece que

Eduardo lhe emprestará a quantia de €5. 000, dos quais €1. 000 foram já pagos’’). Uma

vez que a declaração encontra-se tanto assinada por Francisco (devedor) como por Eduardo (credor), o facto de Francisco na declaração declarar que já havia pago mil euros a Eduardo tal consubstancia um facto que lhe é favorável, pelo que em princípio, aplicando a norma do art. 376º/2 CC, tal não ficara provado com força probatória plena. Contudo é necessário atender ao facto que a declaração, como foi mencionado anteriormente, encontra-se assinada por ambos e o facto de Francisco declarar que já tinha pago tal quantia a Eduardo tal consubstancia um facto desfavorável para Eduardo. Ou seja, aplicando o art. 376º/2 CC fica provado com força probatória plena o pagamento de mil euros uma vez que tal é desfavorável para Eduardo.

Analisemos agora a questão dos €4. 000 que Francisco ainda não pagou a Eduardo. Tendo em consideração o princípio da indivisibilidade da confissão – art. 360º CC - é importante contudo salientar que (1) existe um reconhecimento da dívida; e (2) existe uma declaração que corresponde ao pagamento de mil euros.

Imagine-se que o presente documento era assinado pelo devedor relativamente ao pagamento dos €1. 000. Tal seria uma declaração favorável para o referido, mas existe a regra da indivisibilidade da confissão – art. 360º CC – que no caso contrário importa que não se pode dissociar o reconhecimento do empréstimo e o pagamento dos €5. 000 – art. 361º CC.

Note-se que da leitura do art. 361º CC resultam dois tipos de confissões quanto à sua indivisibilidade:

 CONFISSÃO COMPLEXA: Admite-se um facto favorável e outro desfavorável em simultâneo. No caso prático, Francisco reconhece que Eduardo lhe emprestara € 5. 000, mas ao mesmo tempo declara que já pagou €1. 000

 CONFISSÃO QUALIFICADA: Admite-se um facto que em si mesmo é desfavorável mas dá-se lhe uma conotação favorável. Exemplo: o Bento reconhece que o Manuel lhe emprestou €10. 000 mas que tal foi a título de doação.

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Ou seja, se o documento em análise só tivesse sido assinado pelo devedor, como o reconhecimento da dívida no valor de €5. 000 consubstancia um facto que lhe é desfavorável tal fica provado. Devido à regra da indivisibilidade da confissão e uma vez que o devedor reconhece que já havia pago €1. 000 tal também fica provado.

NOTA1: Nos termos do art. 360º in fine quando se diz ‘’salvo se provar a sua inexactidão’’ tal regere-se ao facto de ser admitida prova em contrário. Do ponto de

vista do ónus da prova cabe ao devedor provar que já pagou, alegando o cumprimento da obrigação que consubstancia um facto extintivo. Contudo, com a regra da indivisibilidade da confissão quem tem de provar que nada foi pago, apesar de no documento constar o oposto, é o credor.

NOTA2: A confissão é a rainha das provas: se uma pessoa admite um facto que lhe é

desfavorável existe (quase) toda a probabilidade de esse facto ser verdadeiro.

NOTA3: Método de resolução de casos relativos à força probatória dos documentos:

1. Força Probatória Formal – Autoria

2. Analisar se as declarações se encontram provadas 3. Força Probatória Material – Conteúdo

NOTA4: Quando está em causa uma confissão é sempre necessário analisar e

consequentemente referir o art. 360º do CC.

NOTA5: Note-se que se tal documento consubstancia-se uma escritura pública iria-se

aplicar o regime do art. 370º e 371º do CC. Contudo, no art. 371º não se consagra nada semelhante ao que é consagrado no art. 376º/2 CC, ou seja em nenhuma parte daquela norma se refere a confissão. A resolução de tal problema passa primeiro pelo facto de o art. 370º referir-se à força probatória formal, ou seja o legislador presume que ‘’o documento provém da autoridade ou oficial público a quem é atribuído (…)’’. Por outro lado, o art. 371º/1 do CC refere-se à força probatória plena que corresponde à percepção de que o notário faz da declaração que alguém invoca ter feito. Este artigo possui uma certa similitude com o consagrado no art. 376º/1 CC: existe a livre apreciação do julgador uma vez que estamos face a uma situação de força probatória bastante (força probatória que se afasta por contra prova; é apenas necessário criar a dúvida).

NOTA6: Nos termos do art. 358º/3 CC consagra-se a situação da confissão quando

esta possui força probatória bastante; nos termos do nº2 da mesma norma consagra- se a mesma situação mas quando tal já possui força probatória plena.

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CASO XIX

Em Janeiro de 2012, Gustavo e Hélio celebraram um contrato de compra e venda de um prédio, situado em Lisboa, por escritura pública. A 2 de Junho de 2012, Gustavo instaurou contra Hélio uma acção, pedindo a declaração de nulidade desse contrato, por simulação. A fim de provar o acordo simulatório, Gustavo indicou, como único meio de prova, determinadas testemunhas; mas Hélio opôs-se a que sejam admitidas a depor, invocando o nº 2 do artigo 394º do Código Civil. Quem tem razão?

TEMA: PROVA TESTEMUNHAL (art. 392º a 396º CC)

As testemunhas são as pessoas que, não sendo partes, nem peritos, prestam

informações ao tribunal sobre a descoberta da verdade material, sobre factos relevantes para o exame e decisão da causa, ou seja sobre os factos controvertidos ou necessitados de prova.

A prova testemunhal não é admitida nas seguintes situações:

 Quando o facto estiver plenamente provado por documento ou outro meio com força probatória plena – art. 393º/2 CC

 Quando a declaração negocial houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito

 Quanto tiver por objecto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo do documento autêntico ou de documento particular – art. 394º/1 CC. Note-se que esta norma não veda o recurso à prova testemunhal com vista a convencer o tribunal acerca da divergência entre a vontade real e a vontade declarada ou da existência de vícios da vontade, salvo no que respeita ao acordo simulatório e ao negocio dissimulado, quando for invocado pelos dissimuladores – art. 394º/2 CC

No presente caso, Gustavo invoca a nulidade do contrato de compra e venda com fundamento em simulação indicando como único meio de prova testemunhas. Ora nos termos do art. 394º/2 CC consagra-se que ‘’É inadmissível a prova por testemunhas

(…) ao acordo simulatório (…) quando invocados por simuladores’’.

Nos termos do art. 242º do CC, os simuladores podem arguir a nulidade do negócio simulado, ou seja é possível usar a prova testemunhal, mas só se for de forma acessória. O legislador coloca reservas relativamente à prova testemunhal devido ao facto de esta ser falível. Cada testemunha, mesmo que seja integra e empenhada na descoberta da verdade e da justiça, tem a sua própria percepção da situação. Ninguém conta os mesmos factos da mesma maneira. Daqui resulta a justificação para o legislador não admitir prova testemunhal como sanção para os simuladores.

PROF. MOTA PINTO E PROF. CARVALHO FERNANDES: Não se trata de uma sanção, uma vez que se assim fosse o legislador impedia os próprios simuladores de arguirem a nulidade do negócio simulado.

DOUTRINA: Tem entendido que a razão da proibição em análise assenta na falibilidade da prova testemunhal, que por vezes pode entrar em confronto com outros meios de prova e consequentemente não deve permanecer. Deve-se evitar que as partes no negócio simulem uma simulação (tal justifica o art. 394º/2 CC). Os inconvenientes da prova testemunhal podem ser colmatados se esta surgir como meio complementar de outro meio de prova admitido. Ou seja, não se admite só e apenas a prova testemunhal.

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Não existindo outro meio de prova a não ser a prova testemunhal, a acção será julgada improcedente.

Em suma: se o único meio de prova for a prova testemunhal esta não será admitida por força do art. 354º/2 do CC; se for usada apenas como meio complementar então será admitida.

No caso é nos dito que Hélio ‘’opôs-se a que sejam admitidas a depor’’ levantando então a questão de saber como é que ele processualmente se opôs? Ora, podemos estar face a uma situação de incidentes da prova testemunhal constantes no art. 636º e 637º do CPC. No presente caso não estamos contudo face a uma impugnação mas sim apenas e só no âmbito do art. 354º/2 do CC que consagra uma proibição.

NOTA1: Apresentar o rol de testemunhas na petição inicial é facultativo. Embora se

possa pedir ao tribunal que estabeleça um prazo para indicar os meios de prova, a verdade é que o momento indicado para o fazer é na audiência preliminar na medida em que esta poe ser dispensada. O rol de testemunhas deverá ser identificado no momento da audiência preliminar nos termos do art. 508º-A/2 al. a) do CPC. Se não se indicasse o rol de testemunhas na petição inicial (facultativo) nem na audiência preliminar, nos termos do art. 512º do CPC, a partir desse momento (da audiência preliminar) estar-se-ia ‘’nas mãos do juíz’’ no sentido que cabe a este aceitar ou não a apresentar de outro meio de prova.

NOTA2: Havendo audiência preliminar nesse momento requer-se a identificação dos

meios dos prazos e requer-se o estabelecimento do prazo; se não existir audiência preliminar ser-se-á notificado da lista de provas, sendo o prazo de 15 dias para indicar os meios de prova.

CASO XX

Numa acção de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges (a mulher), fundado em violação do dever de respeito, o cônjuge réu (o marido) reconheceu expressamente na contestação todos os factos alegados pelo cônjuge autor para o demonstrar. Todavia, o juiz levou-os à base instrutória. E, a final, deu-os como provados com fundamento no depoimento de parte prestado na audiência pelo mesmo cônjuge réu. Diga se o juiz procedeu bem.

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