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Identidade rechaçada

3. Educação, formação e trajetórias formativas

3.1. Políticas Educativas: da segregação social à exigência social de inclusão

3.1.1. Transformação social e respostas educativas

Praticamente até ao final do século XVIII, a educação das pessoas com deficiência não consistia preocupação pública. Jiménez (1997) classifica mesmo esta etapa como a pré-história da educação especial, na medida em que, salvo algumas exceções91, a resposta passava pela clausura das pessoas com deficiências manifestas, sem qualquer preocupação de natureza educativa. Tratava-se, pois, de proteger “os normais” da ameaça para a sociedade que representava a pessoa “não normal”. Estas instituições, algumas sob a égide da igreja católica e outras controladas por médicos, psiquiatras e filantropos, valorizavam sobretudo a satisfação das necessidades básicas em detrimento de preocupações de natureza educativa (Armstrong, 2011; Ferreira, 2007). Como resultado, “separa-se, segrega-se e discrimina-se” (Bautista, 1997, p. 23). Por esta altura, não existindo uma distinção entre a cognição e a doença mental, as respostas oferecidas aos indivíduos com deficiência intelectual ou doença mental eram comuns.

É entre os finais do século XVIII e o século XIX que começam a surgir algumas experiências de intervenção pedagógica como as de Itard, Esquirol, Pinel ou Séguin, este último fundador de uma “escola para atrasados mentais” em Paris, no ano de 1837, e mais tarde na Pensilvânia (Ferreira, 2007). São as experiências pedagógicas por eles protagonizadas que estão na origem do aparecimento de

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instituições vocacionadas para um vasto número de crianças, jovens e adultos nas margens da sociedade. Estas instituições eram altamente protecionistas e apoiadas numa lógica darwinista92 subordinada à crença de que as predisposições hereditárias cunhavam o destino das pessoas na sociedade (Ferreira, 2007). Este período é assinalado por Jiménez (1997) como um marco na história da educação especial, pela novidade de atitude social e cultural para com a deficiência que se traduz, nomeadamente, na tomada de consciência da necessidade de se criarem estruturas diferenciadas de atendimento.

Todavia, é também com a expansão da educação formal à maioria das crianças que surge o problema relacionado com a dificuldade ou impossibilidade de todas cumprirem as mesmas aprendizagens num calendário comum, conduzindo à necessidade de classificação dos alunos com base na sua inteligência.

Para García Pastor (1987, p. 66), a difusão da escolaridade obrigatória, acarreta duas consequências: i) uma mudança na conceção do que é considerado uma criança “normal”; ii) a constatação de uma categoria de alunos que se define pela sua incapacidade escolar e que por isso, à época, se entendia que consistiam um obstáculo ao progresso dos restantes alunos. É neste contexto que, para além da categorização das crianças com deficiências manifestas, surge um novo grupo de crianças que, não sendo capaz de desempenhar o seu papel de aluno com sucesso, passa a ser alvo de avaliações e diagnósticos que conduzem ao estabelecimento de categorizações. É assim que desde o final do século XIX se começa a generalizar o termo “anormal” para classificar os alunos que não conseguiam acompanhar as aprendizagens expectáveis para a sua faixa etária.

A este propósito, García Pastor (2001, p. 32) lembra que a escola sempre selecionou os alunos com base nos critérios definidos pelos professores e que se tornou necessário estabelecer

um critério mais objetivo e científico, o que acontece com a nova ideia de inteligência como capacidade para se adaptar às aprendizagens escolares e, sobre a possibilidade de a medir e usar esta medida como prognóstico do rendimento académico futuro.

É para responder ao desafio de “selecionar os alunos das escolas públicas que não acompanhavam o ritmo de ensino” (Niza, 1996, p. 139) que o ministério francês de Educação Pública convida, em 1904, Theodore Simon e Alfred Binet para fazerem parte da Comissão para o Estudo das Infância Anormal que tinha como propósito estabelecer um meio de diagnóstico que permitisse “estabelecer a separação entre as crianças normais e as anormais” (Pastor, 2001, p. 32). A inteligência é definida por Binet como um conjunto de funções cognitivas e um conjunto de autores93 estabelece a Escala Métrica de Inteligência para dar resposta à demanda de detetar os alunos com limitações intelectuais impeditivas de uma trajetória escolar com sucesso.

92 Conceção que suportava, ainda que de forma implícita, um estatuto de inferioridade e de não ensináveis aos indivíduos com alguma

deficiência.

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Antes destes já Francis Galton introduzira a noção de inteligência como objeto passível de ser medido e estudado cientificamente e Cattell utiliza em 1890 na literatura psicológica a designação de teste mental (cf. Ferreira, 2007, p.23).

Na tese defendida por Pastor (2001), esta escala, para além de medir o desempenho das crianças em idade escolar nas tarefas que a prova apresentava, também procurava situar o sujeito em relação à sua faixa etária. O diagnóstico revelou-se particularmente útil para determinar a necessidade de educação de cada criança, que seria especial, no caso em que o sujeito apresentasse uma diferença significativa em comparação com os pares da sua idade. Neste caso, a resposta seria a separação das outras crianças, nomeadamente com o encaminhamento para o ensino especial (Pastor, 2001), justificando o argumento de Niza (1996) que defende que a psicometria se revelou como um instrumento que legitimava a exclusão.

Apesar da acusação de rigidez do pressuposto de que é possível medir o potencial de inteligência com que cada indivíduo nasce, inferindo daí o potencial de educabilidade de cada criança como uma espécie de prognóstico, Pastor (2001, p. 34) defende que Binet, na sua obra Les idées modernes sur les enfants, “crítica com dureza a ideia de que a inteligência é fixa, imutável, apesar de as propostas dos testes se basearem justamente na defesa do argumento contrário”.

Este meio de diagnóstico científico teve um profundo impacto no pensamento e práticas educativas do início do século XX, dando origem a um fatalismo dicotómico que divide o normal do não normal e que legitimou as medidas que conduziram à segregação, partindo-se do pressuposto da pouca importância que a educação poderia ter na vida daqueles classificados como não normais. Esta herança perdurou até recentemente, já que a identificação das dificuldades nas funções intelectuais aferidas através da institucionalização dos testes de inteligência, e a consequente obtenção de um QI abaixo de um padrão estabelecido94, implicava o afastamento da escola regular e contribuía para a criação de escolas especiais (Correia, 1997; Jiménez, 1997). A este propósito Veltrone (2011, p. 55) considera que a escola sempre tratou de forma peculiar os “alunos que fugiam dos padrões esperados, principalmente no que diz respeito a padrões de inteligência e desempenho acadêmico”.

É, também, nesta linha que Pastor (2001) defende que o estabelecimento da escala métrica que separava crianças normais e anormais tem um impacto profundo na organização escolar pública e que, pelas mãos de Binet, a psicologia se estabelece como a área científica dominante no âmbito dos estudos da infância anormal.

Em 1910, Binet apresenta uma proposta onde diferencia três categorias diferentes da anormalidade e as suas potencialidades de aprendizagem: a idiocia, a imbecilidade e a debilidade mental. As classificações nas categorias idiocia e imbecilidade eram baseados em critérios médicos, sendo a intervenção levada a cabo pelos profissionais de medicina, enquanto a classificação na categoria debilidade mental era adstrita aos profissionais de psicologia.

Como sublinham Ryan e Thomas (1980), a definição do quociente de inteligência provocou uma visão unidimensional daqueles classificados como deficientes mentais, desvalorizados e tratados em

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termos da sua idade mental, que se acreditava ser a tradução daquela medida. Em resultado, alguns “deficientes mentais” eram considerados ineducáveis, e mais do que apoio na educação, passou a defender-se a necessidade de ficarem sob supervisão médica (Ryan e Thomas, 1980). As práticas de exclusão da escola regular das crianças e jovens consideradas inadaptadas passam a estar na dependência da orientação médica, assistindo-se à hegemonia de um modelo médico-pedagógico. É desta forma que o ónus do problema deixa, pois, de ser responsabilidade da escola para ser atribuído às crianças que passaram a ser vistas como problemáticas.

Para Ferreira (2007), a escola segregadora cumpria as expectativas económicas, ao contribuir para a legitimação das políticas que fizeram da instituição escolar um importante dispositivo de seleção social. A escola respondia à lógica das economias industriais, moldadas pelo modelo taylorista onde apenas se admitia um número reduzido de quadros médios, em contraste com a necessidade de contratação de um elevado número de trabalhadores não qualificados, submissos e que se adaptassem ao exercício prolongado de tarefas monótonas e repetitivas.

Porém, à medida que o ritmo das inovações tecnológicas produzia alterações no modelo produtivo e económico, despontava a necessidade crescente de aumentar os níveis de qualificação das populações, conduzindo a um aumento do investimento da despesa pública em educação pela necessidade de mão- de-obra mais qualificada. É neste contexto que a obrigatoriedade da escolaridade básica se estende a quase todos os países da Europa na primeira metade do século XX95.

Esta ideia de que o aumento da escolarização surge e se generaliza no contexto europeu para colmatar a exigência do tecido económico, tem eco na argumentação de autoras como Pallisera (1996) e Tomlison (2012) que defendem que a educação começa a aumentar e a difundir-se a novos públicos, em virtude da demanda do progresso económico que gera crescentes necessidades nos domínios da leitura, escrita e cálculo, uma vez que o capitalismo industrial tinha cada vez mais necessidade de uma mão-de-obra minimamente educada.

Como lembra Azevedo (2007, p. 62), apesar da prevalência dos fatores macroeconómicos na sustentação de reformas, também “o ‘trabalho ideológico’ desencadeado pelos grupos sociais em tensão, pelos decisores políticos e pelos actores sociais que transfiguram problemas e conflitos sociais, económicos e políticos em problemas do foro educativo” contribuem para influenciar as reformas educativas. A par das alterações económicas, assiste-se ao despoletar de uma maior consciência social sobre os direitos humanos que apela à defesa de uma sociedade mais liberal e igualitária e que acaba por minar o modelo segregador e pressionar o poder político a encontrar soluções alternativas. A valorização de uma sociedade cada vez mais igualitária, os argumentos relacionados com os resultados pouco satisfatórios do duplo sistema escolar e as consequências negativas nomeadamente ao nível do

95 A realidade europeia deve ser demarcada do atraso significativo nacional, como assinala Niza (1996), na medida em que em 1911 a escola

autoconceito, em virtude da exclusão, reforçam a necessidade de mudança (Correia, 1997). Estão, pois, reunidas as condições para se proceder a mudanças nas políticas educativas.

É desta forma que progressivamente ganha terreno o termo integração, que alguns autores reconhecem ter origem no conceito de “normalização” (Correia, 1997; Niza, 1996; Bautista, 1997) que defende condições de existência no meio menos restritivo possível (Correia, 1997). Este novo conceito surge na Dinamarca, em 1940, e deve-se a um conjunto de ações levadas a cabo por associações de pais contra a permanência dos seus filhos em escolas segregadas, com efeitos na produção legislativa (Niza, 1996). É assim que dezanove anos depois a legislação dinamarquesa incorpora o princípio da normalização, com a aposta na desinstitucionalização, princípio que acaba por se estender a toda a América e Europa do Norte (Jiménez, 1997). Wolfensberg é apontado por Mann e van Kraanyenoord (2011) como um dos autores relevantes na operacionalização deste conceito, descrito como o conjunto de meios disponibilizados de modo a estabelecer ou sustentar a participação em contextos tão normais quanto possível. Este conceito chama a atenção para as condições desumanas em que se vivia em muitas instituições, e estes autores reconhecem que o trabalho de Wolfensberg desafia à integração na comunidade, sendo um “sinónimo da desinstitucionalização” (Mann e van Kraanyenoord, 2011, p. 205). Também Niza (1996) defende que no trabalho de Wolfensberg a integração, enquanto antónimo de segregação, se apresenta como a estratégia para o fim último da normalização. Por seu turno, Bautista (1997) defende que o princípio da normalização está intimamente ligado ao conceito de individualização, que propõe um atendimento ajustado às características e particularidades de cada aluno.

Paulatinamente, sob esta influência é publicada nos EUA, em 1975, a Education for All Handicapped Children Act —Public Law 94-142, que viria a influenciar os sistemas educativos do mundo ocidental. Na prática, a integração estabelece como novo paradigma a frequência da escola regular por todas as crianças gozando de um ambiente educativo adequado às suas necessidades.

Como afirma Correia (1997, p. 19), as “medidas mais integradoras são as que separam o menos possível do contexto natural de que faz parte integrante” não bastando que a integração se dê no plano físico, num ambiente não restritivo. Para um conjunto de autores como Correia (1997), Bautista (1997) e Jiménez (1997) é fundamental que a integração contemple o plano académico, o que significa uma participação efetiva de modo a que todos os alunos, sem exceção, possam beneficiar dos apoios e adaptações ajustados às suas necessidades.

Soder (1981) vai mais longe do que estes autores, que se centram na defesa da integração escolar ou educativa, para defender que a integração pode assumir quatro formas gradativas: física, funcional, social e societal ou comunitária. A integração física é apresentada como a coexistência no mesmo espaço físico, mas com separação das atividades educativas. A integração funcional refere-se à utilização em simultâneo dos mesmos espaços, nomeadamente os académicos. A integração social

assume um papel relevante de integração educativa efetiva de crianças com NEE em turmas regulares. Por último, a integração societal ou comunitária é apresentada como a mais desejável, na medida em que garante a plena integração dos indivíduos na sociedade e, dessa forma, o acesso, o envolvimento e a participação em todas as etapas de vida (Soder, 1981).

O novo modelo de integração conduz a alterações filosóficas que passam pela descategorização das crianças que apresentam dificuldades ou problemas, para a adoção de uma perspetiva de reconhecimento, aceitação e valorização das diferenças abandonando a dicotomia deficiente versus normal. Para esta nova perspetiva em muito contribuiu o relatório do Department of Education and Science (DES) britânico, que ficou conhecido como Relatório Warnock (DES, 1978) e que introduz o conceito de necessidades educativas especiais (NEE). De acordo com Armstrong (2008), este relatório desafia dois pressupostos dominantes à época: o primeiro sustentava a existência de dois grupos de crianças, as com e as sem deficiência; o segundo assumia que a categorização de deficiência, por si só, justificava a introdução de disposições específicas. Por detrás do conceito alternativo NEE estava a tentativa de abandono da ideia generalizada que a deficiência estava na criança, para enfatizar o desencontro entre a oferta escolar e as características de cada criança. A avaliação e categorização das crianças devia deixar de ser realizada com base nas deficiências e dificuldades, abandonando a hegemonia do modelo médico, passando a valorizar-se a intervenção apoiada nas necessidades evidenciadas pelos alunos em contexto educativo, ganhando cada vez maior importância os critérios pedagógicos.

Esta filosofia é, mais tarde, valorizada no documento Normas sobre a Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiência que resultaram da Resolução 46/96, de 20 de dezembro de 199396 adotada pela Assembleia Geral da ONU. Este documento enfatiza um novo conceito de deficiência, em que os fatores ambientais e atitudinais assumem particular relevância e, ao nível da educação, preconiza a importância das respostas educativas para as pessoas com deficiência no âmbito das estruturas regulares, para a população em geral, e a necessidade de se estabelecerem programas curriculares flexíveis (SNRIPD, 1996).

As críticas à ineficácia do modelo de integração para estabelecer roturas fundamentais com o passado vão surgindo à medida que este modelo se vai sedimentando. Correia (2008) refere que apesar dos esforços no sentido da integração, a educação especial permanece associada a um espaço e não a um serviço. Também a almejada diluição dos estigmas sociais e a sua capacidade para integrar os indivíduos com NEE plenamente na comunidade educativa fica muito aquém das expetativas. Como constata Armstrong (2008), estamos perante um paradoxo: embora o objetivo do termo NEE fosse permitir um enfoque maior nas necessidades educativas e menos nas necessidades individuais, acabou

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Tal como expresso no próprio documento, não sendo esta Resolução vinculativa, tem implícito um compromisso moral e político, da parte dos Estados, de adoção destas medidas que devem constituir um instrumento de orientação política no estabelecimento de estratégias que garantam que as pessoas com deficiência possam exercer os mesmos direitos e estar sujeitos às mesmas obrigações que os restantes cidadãos.

por se transformar numa categoria globalizante, aproximando-se de categorias já existentes, que persistem na demarcação da diferença como deficiência. Podemos encontrar uma avaliação semelhante em Capucha e Pereira (2007, p. 90) quando afirmam que, ao contrário do esperado, “o conceito de necessidades educativas especiais tendeu para a homogeneização de alunos diferentes que continuaram a ser percepcionados pela escola e pelos professores como deficitários em algum aspecto do desenvolvimento ou da aprendizagem”. Na ótica dos movimentos da deficiência, o termo NEE é desadequado por considerarem que “estes alunos não têm ‘necessidades especiais’, mas antes as mesmas que qualquer outro: a diferença é que, ao contrário do que acontece aos outros, as suas necessidades mais básicas não são satisfeitas” (Shakespeare e Watson, 1998, p. 17).

Ainda a este respeito, Rodrigues (2006) sustenta que o modelo de integração criou uma escola paralela dentro da escola onde os alunos classificados como deficientes partilhavam o espaço, mas com condições especiais de frequência, aspeto que contribuiu para a diferenciação entre as categorias “deficientes” ou “diferentes” e os “normais”. Neste sentido, a tentativa de criação de um conceito abrangente que servisse o ideal de inclusão e o respeito pela diversidade com alívio de carga estigmatizante parece não ter passado de uma ilusão.

Para a insatisfação com este modelo também contribuíram os resultados de investigações que revelam que os alunos com NEE colocados sem qualquer apoio exterior na sala de aula regular poderiam obter melhores resultados académicos e sócio emocionais (Ferreira, 2007), a par da constatação de que os percursos apoiados em currículos alternativos empobrecem o currículo comum e são menos desafiadores (Fischer, Roach e Frey, 2002). É deste cômputo de críticas que se geram aproximações a um novo modelo.

Autores como Mann e van Kraanyenoord (2011) defendem que a integração foi o predecessor histórico, nos países desenvolvidos, de uma nova forma de pensar que se transformou no modelo de inclusão. Por seu turno, Culham e Nind (2003) consideram que a inclusão emergiu das críticas à integração e normalização tendo como semente a nova ordem, difundida pelos pensadores do modelo social que colocam a tónica na natureza deficientizadora da sociedade, em substituição da visão tradicional do modelo individual.

É, de acordo com Slee (2008), o trabalho coletivo de um conjunto de autores como Finkelstein (1980), Tomlinson (1982), Oliver (1990), Barnes (1996) e Shakespeare (1993), entre outros, que desafia a base conceptual do modelo médico da deficiência, sobre a qual a educação especial foi edificada e operacionalizada, para valorizar o modelo social da deficiência. De acordo com este modelo, a deficiência resulta da forma como as sociedades se organizam, obstaculizando a participação e, em consequência, geram exclusão (Armstrong, 2011). Na perspetiva destes autores, a inclusão pressupõe a eliminação de todas as barreiras e um sistema desenhado para satisfazer as necessidades de todos. Para

os autores que defendem o modelo social, esta é a razão que sustenta a reivindicação de que as mudanças devem ser feitas na e pela sociedade e não nos e pelos indivíduos.

As críticas ao modelo de integração resultantes da produção científica parecem ter resultado em exigências que conduziram a mudanças mais radicais em muitos países (Booth e Ainscow, 1998). É desta forma que surge o modelo de inclusão, internacionalmente associado à Declaração de Salamanca que resultou da Conferência Mundial sobre Educação de Necessidades Especiais (UNESCO, 94). Este modelo ganha progressiva legitimação legislativa, na comunidade ocidental e Riddell (2013, p. 98) sustenta que “após a publicação da Declaração de Salamanca, a inclusão foi aceite como a ortodoxia política da União Europeia (UE) e estados membros” e que os estados candidatos à adesão à UE são pressionados para adotarem práticas mais inclusivas.

Outro contributo relevante, como o Relatório Delors (1996), reafirma que a educação não se resume à aquisição de competências básicas (Capucha e Pereira, 2007), uma vez que constitui um fator essencial para o desenvolvimento pessoal e social e chama a atenção para o facto de esta poder contribuir para a “coesão, se procurar ter em conta a diversidade dos indivíduos, e dos grupos humanos evitando transformar-se num fator de exclusão social” (Delors, 1996, p. 47). Ainda de acordo com este relatório, uma perspetiva de exclusiva valorização intelectual pode conduzir a situações de exclusão escolar apoiadas nos resultados escolares. Nesta linha, podemos colocar a hipótese de a escola poder constituir uma barreira se não forem tomadas em linha de conta as características individuais e se não