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CAPÍTULO II O lugar do desastre e da incidência das políticas públicas

2.3. Os diagnósticos sobre o lugar da tragédia

2.3.2. Vulnerabilidades socioambientais reconhecendo Petrópolis a partir do

A Fiocruz, a pedido da Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Rio de Janeiro, em Fevereiro de 2011, lançou um estudo que apontava a falta de acesso aos direitos da população da região serrana, o que chamamos de vulnerabilidades, como causa das vulnerabilidades aos eventos extremos. Pela primeira vez, um grupo de pesquisadores utilizou os indicadores de falta de acesso a direitos para dizer que a redução dessas fragilidades socioambientais se dá com políticas públicas inclusivas e participativas.

O documento “Mapa de Vulnerabilidade da população do Estado do Rio de Janeiro as mudanças climáticas nas áreas social, saúde e meio ambiente” foi realizado sob a coordenação dos professores Martha Macedo de Lima Barata e Ulisses Confalonieri, embora tenha sido

lançado em um seminário na Secretaria de Meio Ambiente, não foi incorporado pelas políticas públicas do Estado.82

Nesta pesquisa, tentou-se identificar os aspectos ambientais, sociais e de saúde humana sensíveis a variações climáticas (anomalias de precipitação e temperatura), associados a cenários futuros de mudança global do clima, considerando o período 2010- 2040, numa abordagem quantitativa. Com isso criaram um Índice de Vulnerabilidade Municipal (IVM), no intuito de subsidiar a incorporação dos riscos climáticos na formulação de políticas públicas no Estado do Rio de Janeiro (ERJ). Buscando dados de diversas fontes, construíram diversos indicadores que, ao final, deduzem o índice de vulnerabilidade ambiental.

Utilizando-se dos conceitos sobre vulnerabilidade apresentados tanto na Lei 12.187/2009 (Política Nacional sobre a Mudança do Clima) e diversos autores da área, consideram como diretriz norteadora da pesquisa o que há de base comum nestas diferentes definições: “que as variáveis e indicadores incluídos nas métricas devem capturar três características básicas da vulnerabilidade, a saber: exposição, sensibilidade e capacidade adaptativa (ou de resposta).” (FIOCRUZ, 2011, p. 16) 83

Para esta análise, agregaram as informações considerando um fator de risco e projetaram os cenários criados pelo INPE para as próximas décadas, representando as anomalias de parâmetros climáticos. Com isso, “o fator exposição” está refletido nos componentes da vulnerabilidade ambiental. A sensibilidade está basicamente associada ao componente epidemiológico, ou seja, ao conjunto de agravos à saúde sensíveis à variação do clima. A capacidade adaptativa vincula-se, por sua vez, ao indicador de vulnerabilidade da família.” (FIOCRUZ, 2011, p. 16)

Dentro da pesquisa, os autores apresentaram alguns índices de vulnerabilidade, obtidos pela amostra quantitativa, com coleta dos dados para preenchimento do cálculo matemático e algumas projeções de cenário.

Nossa intenção ao trazer os resultados desta pesquisa baseia-se em dois motivos: o primeiro, mostrar que Petrópolis, no que diz respeito ao Índice de Variação Ambiental, é 100% vulnerável aos eventos extremos, sendo bastante vulnerável também socialmente; e, ainda, utilizar algumas ferramentas de análise como sugestões para nossa coleta de dados.

82 Disponível na página: http://pt.scribd.com/doc/52645505/Relatorio-4-Fiocruz-240211. 83 Idem.

O primeiro índice a ser apresentado foi o Índice de Vulnerabilidade Social da Família. O objetivo foi a construção de um indicador que sintetizasse as dimensões relevantes da pobreza, com a possibilidade de agregação para qualquer grupo demográfico identificado como mais vulnerável, no nível de cada família. Para tanto, foram consideradas: a) estrutura familiar: atenção e cuidado com as crianças, adolescentes e jovens, presença de cônjuge, ausência de desvantagem física ou social; b) acesso ao conhecimento: analfabetismo, escolaridade; c) acesso ao trabalho: disponibilidade de trabalho, qualidade do posto de trabalho, remuneração; d) disponibilidade de recursos: índices de pobreza; e) desenvolvimento infanto-juvenil: proteção contra o trabalho precoce, acesso à escola, progressão escolar, mortalidade dos filhos; f) condições habitacionais: propriedade/ densidade, abrigabilidade, acesso a serviço de abastecimento d’água, acesso ao esgotamento sanitário, coleta de lixo, serviço de energia elétrica, acesso a bens duráveis.

No presente estudo, entendeu-se vulnerabilidade como uma unidade de agregação, no intuito de estimar a capacidade de resposta à variação dos eventos climáticos. Um determinado município que contenha percentual expressivo de famílias em pior situação, frente ao conjunto das seis dimensões aqui avaliadas, deve possuir famílias que tenham menor resiliência às projetadas variações do clima. (FIOCRUZ, 2011, p.48)

Para os autores, a “vulnerabilidade não se distribui de forma homogênea e uniforme no espaço intra-urbano, da mesma forma que não se concentra em alguma área contígua definida, ou seja, a segregação social no espaço não é “perfeita”. Nem todos os assentamentos identificados como de baixa renda são ocupados apenas por pobres e nem todos os pobres ocupam áreas tidas como carentes. Essa constatação imediata para qualquer observador atento reflete, ao mesmo tempo, algumas das dificuldades clássicas para se definir, caracterizar e localizar as diversas situações de vulnerabilidade social.” (FIOCRUZ, 2011, p. 49)

No caso de Petrópolis, os índices calculados pela pesquisa de vulnerabilidade da família, foram de 0,60, numa projeção que vai de 0 a 1. Os elementos de análise, apresentados pelos pesquisadores da Fiocruz, além de apontar a fragilidade social do município, fornecem pistas de elementos que devem ser observados para identificação da suscetibilidade de algumas regiões onde a presença do Estado, como executor de políticas públicas sociais garantidoras da dignidade humana, mostrou-se ineficaz. Ademais, apontam ausências/fragilidades de políticas públicas sociais, que uma vez realizadas poderiam contribuir na redução das vulnerabilidades.

É neste momento que o conceito de Justiça Climática se aproxima dos Direitos Humanos. Quando visualizamos a negação dos direitos fundamentais, da ausência de produção da dignidade da pessoa humana. Mostrar a conexão entre os conceitos fortalece o argumento que sem efetivação de direitos não há política de redução de riscos.

A pesquisa é importante porque sistematiza informações socioeconômicas para expressar em números a vulnerabilidade, demonstrando que é diretamente proporcional à ausência de direitos. Por outro lado, reforça a nossa posição de que o enfrentamento das consequências dos desastres socioambientais se dá também na construção de políticas de acesso a direitos fundamentais, aumentando as capacidades da população afetada, para usar um conceito de SEN (2005).

Outro índice que nos parece importante é do Vulnerabilidade Ambiental (IVAm), pois inclui características de sistemas biofísicos vulneráveis, eventos relacionados aos clima, bem como uma série histórica de eventos meteorológicos extremos, conforme registro da Defesa Civil. O IVAm é composto por: Indicador de Cobertura Vegetal; Indicador de Conservação da Biodiversidade; Indicador de Linha de Costeira; e Indicador de Eventos Hidrometeorológicos Extremos.

No caso de Petrópolis, num referencial de 0 a 1, foram identificadas as fragilidades de Indicadores de Cobertura Vegetal: 0,75; Indicação de Conservação da Biodiversidade 0,75 e Indicador de Eventos Extremos 1,00. A soma desses índices apresenta uma fragilidade ambiental de 0,67. As cartografias estão sobrepostas e o estudo demonstra uma série de mapas do Estado do Rio de Janeiro em que é possível alimentar com dados o programa desenvolvido com a pesquisa e verificar as alterações desses índices. Esses dados demonstram o quanto a questão ambiental está presente, mesmo que dissociada da questão social.

Pensar a relação com a natureza de uma forma ampla e não só como obediência às leis de proteção às áreas de preservação é urgente e necessário. A forma como a preservação da natureza se harmoniza com a efetivação dos direitos fundamentais.

A região serrana e no caso específico, Petrópolis, requer outra percepção dos moradores e autoridades públicas da relação entre ser humano e natureza. É preciso aprender a morar na Serra, a conviver com a sua natureza. Esta, sendo reconhecida como sujeita84 de direitos, como ser vivente com direito de existência e plenitude. O ser humano que habita esse

84 Aqui, mais uma vez, estamos no apropriando do debate dos direitos da natureza produzido em toda a América Latina.

ser integral deve buscar harmonizar-se com ele a partir de práticas culturais locais em que ambos se potencializem em dignidade e bem viver.

A função socioambiental das cidades deve ser pensada em prol da construção de um Plano Diretor que pense as fragilidades locais em harmonia com o direito de morar em segurança, que respeite o direito da população de ter acesso aos direitos básicos para uma vida digna, e que considere o elemento das mudanças do clima como um indicador a mais de vulnerabilidade, que exige políticas públicas voltadas para a adaptação e mitigação, considerando a maior ocorrência de eventos extremos.

Por fim, vale a pena destacar o Índice de Vulnerabilidade Geral (IVG), pois se trata do produto final da pesquisa, agregando diferentes variáveis e associando a cada município do ERJ uma medida comparativa (valor numérico) com respeito a sua vulnerabilidade frente às mudanças climáticas esperadas nas próximas décadas. Como conclusão, os municípios que apresentarem maiores valores de IVG em relação aos demais demonstrarão maior necessidade de atenção sob os aspectos do estudo.

O IVG, o primeiro componente do IVM, é formado por: Índice de Vulnerabilidade da Saúde padronizado – IVSp; Índice de Vulnerabilidade Social da Família padronizado – IVSFp; e Índice de Vulnerabilidade Ambiental padronizado – IVAmp.

Para Petrópolis o índice encontrado foi de 0,54. A pesquisa demonstra como Petrópolis está fragilizada com as mudanças climáticas e que é necessário pensar em políticas públicas ambientais e sociais que possam reduzir as vulnerabilidades da população.

É interessante perceber que tanto o Atlas de Desastres do Ministério da Integração Nacional, antes apresentado, quanto o estudo realizado pela Fiocruz a pedido da Secretaria Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro, apontam para a necessidade de investimentos em longo prazo em políticas sociais, notadamente de moradia, para a redução de vulnerabilidades.

2.3.3 Diagnóstico realizado pelo Grupo de Trabalho de Segurança Ambiental da Região