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SOBRE OS USOS DA INTERNET POR CRIANÇAS, ADOLESCENTES E JOVENS BRASILEIROS

No documento KIDS ONLINE BRASIL - (www.pgcl.uenf.br). (páginas 89-95)

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Dar publicidade e denegrir o bom nome de uma instituição pública ou privada só pode ser um direito se atender ao dever de haver realizado tentativas anteriores para resolver proble- mas apontados, sem obter a necessária consideração. E, mesmo assim, há que considerar os alcances e limites legais de uma ação como a da página do Facebook da estudante. Pode resul- tar demagógica uma ação que é fácil de ser disparada pela Internet e saudada, avidamente, por milhares de pessoas, sem respeitar os direitos básicos dos cidadãos e de suas instituições envolvidas no conflito.

Embora esse seja um caso um tanto atípico, abre um precedente sobre discussões necessárias no âmbito dos direitos e deveres de quem usa a Internet em nosso país.

Nessa direção, os resultados da pesquisa realizada pelo CGI.br por intermédio do NIC.br, a TIC Kids Online Brasil 2012, que revela hábitos de usos das tecnologias de informação e comuni- cação dos usuários da Internet de 9 a 16 anos no Brasil, contribui, decisivamente, para conhe- cer e atuar sobre a questão, gerando a possibilidade de constituição de políticas públicas para esse contexto.

Um dos dados da pesquisa revela que 86% dos indivíduos da amostra pesquisada possuem o próprio perfil em uma rede social e expõem fotos que mostram claramente seu rosto, sen- do que 69% fornecem seu sobrenome e 57% indicam uma idade que não é a sua idade ver- dadeira. Por outra parte, 37% dos pais ou responsáveis crêem que é nada provável que seus filhos passem por algum incômodo ou constrangimento na Internet nos próximos seis meses, enquanto 31% crêem que é pouco provável que isso aconteça.

Ou seja, a posição dos pais e responsáveis é ingênua ou desinformada sobre os riscos e danos a que seus filhos se expõem no Facebook ou outras redes sociais, sem um controle ou media- ção mais próximos, mesmo que maximizando os benefícios advindos do uso da Internet.

O que está em jogo, nas palavras da pesquisadora inglesa Sonia Livingstone (2009), são os ris- cos, mas, também, os direitos e as responsabilidades de todos: adultos, crianças, adolescentes e jovens. Ela acrescenta que, se houver uma superavaliação das habilidades e capacidades da população de 9 a 16 anos para lidar com a Internet, corremos o risco de subestimar o apoio de que ela necessita e não compreender suas práticas culturais.

Aqui, estamos diante de um dilema a ser enfrentado em vários contextos em que haja um tra- balho educacional, seja na família, na escola, ou pela participação de organizações sociais, dos meios de comunicação e de setores governamentais.

O pesquisador inglês David Buckingham (2007) discorre longamente sobre a questão dos direi- tos das crianças e dos adolescentes estabelecidos pela Convenção dos Direitos das Crianças pelas Nações Unidas. O texto da convenção qualifica curiosamente como crianças todas as pessoas com menos de 18 anos.

Nesse sentido, há que se considerar o próprio conceito de criança, que, como sabemos, não pode ser padronizado, pois as diferenças de características de idade entre 9 e 18 anos são mui- to acentuadas e distintas. Além disso, há que se tomar em conta as distinções étnicas, culturais, de gênero e de condição socioeconômica, bastante analisadas, recentemente, pela pesquisa- dora portuguesa Cristina Ponte (2012).

Essas diferenças são bem explícitas nos resultados da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2012 e indicam a necessidade de aprofundamentos de novas pesquisas qualitativas, desejavelmente,

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também, por parte das universidades brasileiras, para que se possam adensar melhor os dados que dizem respeito à inclusão e qualidade no uso da Internet.

Porém, retornando à questão dos direitos de uso da Internet levantada por Buckingham (2007), o autor faz uma distinção entre os direitos básicos de crianças, adolescentes e jovens à provi- são e à proteção (alimentação, saúde, cuidados familiares e segurança) e os direitos de partici- pação, que exigiriam competências e, acrescentaríamos, deveres. Estes últimos dependem da educação para seu pleno desenvolvimento e exercício.

Tanto Buckingham (2007) como Livingstone (2009) e Ponte (2012) são favoráveis a um aco- lhimento das capacidades de crianças, adolescentes e jovens como elementos indispensáveis para a própria compreensão do uso que farão da Internet, como prática cultural. Dessa forma, suas atitudes e interações no mundo virtual são parte de sua “vida real”, pois a Internet e suas múltiplas possibilidades de viabilizar conhecimentos, informações, trocas sociais, consumo e entretenimento estão intrinsicamente ligadas à sua concepção de existência no contexto da sociedade em que vivem.

Essa primeira geração de nativos digitais pode e quer ensinar muito à geração dos analógicos, e a de seus pais e professores, qualificadas como Gerações X e Y.

No entanto, como propõem Fantin e Girardello, o enfrentamento da barreira digital pode ser enriquecido pelas mediações culturais:

“Nesse sentido, discutem as possibilidades de uma abordagem culturalista de mídia/educação para promover uma inclusão digital que seja experiência de cidadania, pertencimento e participação crítica e criativa na cultura” (2009: 69).

Certamente nossa bem intencionada internauta adolescente, citada no início deste artigo, além de outros milhares de crianças, adolescentes e jovens brasileiros e seus educadores, pais, res- ponsáveis e professores, muito se beneficiarão com um tipo de ação coletiva como a proposta por Fantin e Girardello (2009).

Ainda nessa direção foi realizado em 2012, em Estocolmo, na Suécia, o Fórum da Juventude Nórdica na Euro DIG (european dialogue on Internet governance), com a finalidade de criar no âmbito dos cinco países nórdicos (Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia) uma plataforma jovem para discutir o tema da governança da Internet. O Fórum de Governança da Internet (IGF, 2012) da Juventude Nórdica visava:

1. Propiciar a discussão da governança da Internet pelos jovens, em seus próprios termos;

2. Permitir sua participação nos debates da Conferência EuroDig;

3. Deixar que suas ideias fluíssem por meio de um relatório (NORDICOM, 2012), para que fossem conhecidas no Internet Governance Forum (IGF) em Baku, no Azerbaijão, em 2012, e, posteriormente, em outras regiões do planeta.

Algumas das ideias propostas trataram dos seguintes tópicos:

• Segurança na Internet se obtém com o conhecimento;

• A Internet é um lugar para exercer a liberdade;

• A informação é ridiculamente fácil de ser manipulada;

• é preciso aproximar as distintas gerações para mais perto;

• Se alguém está fora do mundo on-line, está fora da vida social também;

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• Na Internet é mais fácil roubar do que comprar;

• é preciso facilitar o uso da Internet;

• é preciso colocar atenção nos temas relativos à privacidade.

Concluindo, os jovens nórdicos pediram mais educação para o uso da mídia e propuseram os seguintes objetivos (NORDICOM, 2012):

1. Os pais e responsáveis devem ser educados e “empoderados” para dialogar com seus filhos, em vez de confiar que isso seja feito por programas de computadores, empresas ou ações regulatórias;

2. As escolas devem ensinar às crianças, adolescentes e jovens como pensar criticamente, como acessar informação e determinar que fontes são confiáveis;

3. Os políticos devem agir. “Eles precisam entender que a Internet tornou-se uma enor- me parte de nossas vidas. Eles têm a oportunidade de ensinar-nos como surfar com segurança”;

4. Por último, mas não menos importante: os jovens querem que seu conhecimento seja reconhecido e usado.

Entre o que crianças, adolescentes e jovens brasileiros também revelaram em suas respostas à pesquisa TIC Kids Online Brasil 2012 está o fato de que 75% dos entrevistados percebem saber mais sobre a Internet que seus pais e responsáveis, e que suas habilidades em seu uso são altas.

A variedade de atividades que realizam é significativa, porém aquelas que lidam com jogos, entretenimento e redes sociais são as preferidas.

Mesmo percebendo saber mais que seus pais ou responsáveis sobre a Internet, são eles (64%) as principais fontes de aconselhamento (explicando por que alguns sites são bons e outros ruins), seguidos pelos professores (51%), o que coincide com a primeira e a segunda conclusão dos jovens nórdicos, levando-nos a reiterar a importância da educação em todo o processo que leva aos hábitos de uso da Internet.

Essas reflexões nos encaminham a concluir que os resultados da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2012 consolidam um momento importante para a tomada de decisões por parte de vários setores da sociedade brasileira, como os meios de comunicação, as organizações sociais, as universidades – em especial os cursos de graduação e pós-graduação em Pedagogia, Comunicação, Informática, Letras e Artes, entre outros –, na definição de medidas e iniciati- vas que facilitem o diálogo e as consequentes ações entre adultos responsáveis junto à popu- lação de 9 a 16 anos.

Esses resultados das pesquisas sugerem a realização de séries regulares de seminários, fóruns e encontros regionais, nacionais e internacionais, para discutir a aplicação dos resultados apre- sentados à elaboração de políticas públicas. Sugerem ainda:

• Campanhas pontuais de esclarecimentos para pais, responsáveis e professores pela mídia impressa, audiovisual e digital;

• Uma vigorosa reavaliação do papel das universidades brasileiras, alavancando novas pesquisas e o desenvolvimento de estratégias de enriquecimento de seus currículos para professores, visando à integração do uso de mídia aos projetos político-pedagógicos das escolas, especialmente as públicas;

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• Atividades nas escolas de Ensino Fundamental e Médio conectadas pela Internet e inclu- são das crianças, adolescentes e jovens em fóruns específicos em preparação a sua par- ticipação nos encontros regionais e seminários regionais, nacionais e internacionais.

A empreitada é de bom tamanho, mas os resultados justificarão os esforços. Mãos à obra, pois.

REFERÊNCIAS

BUCKINGHAM, D. crescer na era das mídias eletrônicas. São Paulo: Loyola, 2007.

NORDICOM. University of Gothenburg. BUTCH, C.; EDSTRÖM, M. (Org.). Youth have their say on Internet governance. Nordic Youth Forum at EuroDIG. Estocolmo (Suécia): Nordicom, 2012.

FANTIN, M.; GIRARDELLO , G. Diante do abismo digital: mídia/educação e mediações culturais. revista Perspectiva, Florianópolis, v. 27, n. 1, p. 69-96, jan./jun. 2009. Disponível em: <http://www.perspectiva.

ufsc.br>.

JENKINS, H. risks, rights and responsibilities in the digital Age: An Interview with Sonia livingstone (Part one and two). Disponível em: <http://www.henryjenkins.org/2009/06/an_interview_with_sonia_living.

html>. Acesso em: 15 jan. 2013.

LIVINGSTONE, S. Sonia livingstone on children and the Internet. Social Science Bites. Disponível em:

<http://www.socialsciencebites.com>. Londres (Reino Unidos), 2012.

PONTE, C. crianças & media: Pesquisa Internacional e contexto português do Século XIX à actualidade.

Lisboa (Portugal): ICS, Imprensa de Ciências Sociais, 2012.

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No documento KIDS ONLINE BRASIL - (www.pgcl.uenf.br). (páginas 89-95)