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(1)UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE. PENHA DA GLÓRIA DOS SANTOS. OS REPTOS DE SANTA JOANA DE LESTONNAC NA PRÁXIS DA EDUCAÇÃO SOCIAL NA ORDEM DA COMPANHIA DE MARIA NOSSA SENHORA. São Paulo 2018.

(2) PENHA DA GLÓRIA DOS SANTOS. OS REPTOS DE SANTA JOANA DE LESTONNAC NA PRÁXIS DA EDUCAÇÃO SOCIAL NA ORDEM DA COMPANHIA DE MARIA NOSSA SENHORA. Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção de título de Mestre.. ORIENTADOR: Prof. Dr. João Clemente de Souza Neto. São Paulo 2018.

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(5) AGRADECIMENTOS. Agradeço a Deus pelo dom da vida. Aos meus pais por fazerem com que esta vida se concretizasse, não só pelo nascimento, mas por tudo o que me possibilitaram viver e aprender na companhia deles. Agradeço à minha irmã, Lourdes, pelo apoio, presença, compreensão e incentivo. Às religiosas da Ordem da Companhia de Maria Nossa Senhora, que proporcionaram a bagagem espiritual, intelectual que tenho hoje. Aos meus amigos, que me fizeram sentir seu apoio e incentivo mesmo nos momentos em que estivemos longe. Aos professores do Programa EAHC que, por meio das disciplinas ministradas, contribuíram para a aquisição de conteúdos tão necessários à pesquisa. Ao meu orientador, Professor João Clemente de Souza Neto, por toda a paciência e dedicação. À Professora Maria Stela Graciani e ao Professor Marcelo Martins Bueno por participarem da minha banca..

(6) “Servir de uma maneira sempre nova.” Santa Joana de Lestonnac.

(7) RESUMO A discussão sobre a Educação Social/Pedagogia Social na América Latina, diferentemente da Europa, ainda é um campo em construção (Graciani). Nesse sentido, teorizar sobre ela pode ser mais eficaz analisando-se práticas cotidianas de grupos sociais que apostam em uma educação libertadora (Freire) e a transformação social de indivíduos e comunidades em vias de um processo de humanização (Dussel, Baró). A presente pesquisa se constituiu em compreender a influência do pensamento e do testemunho de Santa Joana de Lestonnac (1556-1640) na práxis da Educação Popular/Social realizada pela Ordem da Companhia de Maria Nossa Senhora no Cone Sul buscando através da atuação das educadoras da Companhia de Maria, em sua práxis educativa entre as populações marginalizadas e excluídas, verificar elementos que se constituem como práticas de Educação Popular/Social. Seria impossível, não nos deparamos, no decorrer do trabalho, com as questões inerentes ao campo de atuação e regulamentação da profissão dos educadores sociais no Brasil. Nesse sentido, entendemos que à medida que esta discussão esteja mais avançada, o conceito de Educação Popular/Social, será apropriado pelos educadores sociais e organizações/instituições sociais.. Palavras-chave: Educação Popular/Educação Social. Humanização. Pedagogia da Libertação. Espiritualidade.. Exclusão. Transformação..

(8) ABSTRACT A discussion on Social Education / Social Pedagogy in Latin America, unlike Europe, is still a field under construction (Graciani). In this sense, theorizing about it can be more effective analyzing daily practices of social groups and a social transformation of people and communities in the process of humanization (Dussel, Baró). This research was an influence of the thought and testimony of St. Joan of Lestonnac (1556-1640) in the Praxis of Popular/Social Education held by the Order of the Company of Our Lady in the Southern Cone, seeking to update the educators of the Company of Maria, in her educational praxis among marginalized and excluded populations, to verify elements as they constitute as practices of Popular / Social Education. It would be impossible, we find, without results of work, as issues inherent in the field of action and regulation of the profession of social educators in Brazil. In this sense, we understand that as we discuss it now more advanced, the concept of Popular/Social Education will be appropriated by social educators and associations / social institutions. Keywords: Popular Education/Social Education. Humanization. Pedagogy of Liberation. Spirituality. Exclusion.. Transformation..

(9) SUMÁRIO. 1.. INTRODUÇÃO ...............................................................................................................8. 2.. HISTÓRIA DO SURGIMENTO E PRÁXIS DA ORDEM ....................................................... 22 2.1 A história de Santa Joana de Lestonnac ...................................................................... 23 2.1.1 2.2. Contexto em que nasceu Joana ........................................................................ 24. Influências na vida de Santa Joana de Lestonnac .................................................. 28. 2.2.1 Michel de Montaigne ................................................................................................. 28 2.2.2. Protestante ......................................................................................................... 29. 2.2.3. Inaciana .................................................................................................................... 30 2.3 O nascimento e desenvolvimento da Ordem ............................................................... 32 2.3.1. O nascimento da Ordem ................................................................................... 33. 2.3.2. A mulher e a Educação ..................................................................................... 34. 2.3.3. A Igreja aprova a Ordem ................................................................................. 44. 2.4 Expansão da Companhia na América........................................................................... 47 2.4.1. Regime Centralizado de Governo: Generalato ............................................... 49. 2.4.2. O Projeto Educativo .......................................................................................... 50. 2.4.3. O desenvolvimento do Projeto Educativo na América Latina ...................... 52. 2.5. As repercussões das ideias de Santa Joana de Lestonnac na Educação Social........ 58 2.5.1 A Prática da Educação Popular na Ordem............................................................ 61 2.5.2 A Província Cone Sul ............................................................................................... 67 2.5.3 ODN Brasil ................................................................................................................ 69 3 DA EDUCAÇÃO POPULAR À EDUCAÇÃO SOCIAL ............................................................... 75 3.1 A Educação Popular ..................................................................................................... 75 3.2 Educação: participativa, popular ................................................................................ 79 3.3 A Pedagogia Social ........................................................................................................ 83 3.4 4.. Educação Popular e Educação Social/Pedagogia Social ........................................ 97. CONSTRUÇÃO DA EDUCAÇÃO SOCIAL NO CONE SUL DESENVOLVIDA PELA ORDEM .... 118 4.1 Desenvolvimento da Pesquisa...................................................................................... 119 4.2 O passo a passo da práxis da ODN ............................................................................. 121 4.2.1 Inserção da vida religiosa: um jeito de ir ao encontro do Outro ....................... 121 4.3. Descrição dos Encontros de Educação Popular da Ordem no Cone Sul como. expressão do compromisso das irmãs com os pobres...................................................... 131.

(10) 4.3.1 A práxis e a formação do educador popular/social da Ordem extraída dos relatórios .......................................................................................................................... 133 4.4. Os Procedimentos da Pesquisa ............................................................................... 158. 4.4.1 5.. Análise das entrevistas .................................................................................... 160. CONCLUSÃO ............................................................................................................. 173. REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 183 ANEXOS........................................................................................................................... 188.

(11) 8. 1. INTRODUÇÃO. Em 2007, a Ordem da Companhia de Maria Nossa Senhora (ODN) celebrou 400 anos da fundação. Antes, durante e até mesmo depois do jubileu, foram realizadas ações como simpósios, congressos, publicação de livros, organização de festivais e outras iniciativas em comemoração ao êxito do projeto educativo plasmado por Santa Joana de Lestonnac (1556-1640), em Bordeaux, França. Ao mesmo tempo, muito se falou e escreveu sobre a atuação da Ordem na educação escolar e na educação de forma geral, já que na Ordem se entende que toda missão realizada pelas irmãs é educativa. Ainda assim, comparando com a atenção dada à educação escolar, pouco se refletiu especificamente sobre a prática da Educação Popular/Social da ODN. A realidade latino-americana clama por uma nova ordem democrática em que os diferentes grupos possam conviver respeitando a dignidade humana e produzindo conhecimento e práticas para construir um novo projeto civilizatório. Autores como Dussel, Freire e os pesquisadores do grupo de pedagogia da USP, Mackenzie e PUC, acreditam que a América Latina possui o gérmen de uma política de libertação (Cf. DUSSEL, 1996; FREIRE, 1970). A matriz de uma política e de uma pedagogia da libertação se encontra nas práticas e metodologias de educação popular. Hoje, na América Latina, há milhares de movimentos de educadores populares e de educadores sociais. Todos, de um jeito ou de outro, buscam influenciar o Estado e as instituições religiosas seculares para a construção de uma política de direitos humanos. Há certo consenso entre os pesquisadores de que a Pedagogia Social e a Educação Social podem ajudar nessa construção, uma vez que elas atuam como mediadoras de múltiplos saberes. Em 2011, quando se realizou o planejamento global da missão da Companhia de Maria, essas questões vieram à tona e foi ficando cada vez mais clara a necessidade de se voltar aos princípios da Ordem para se repensar a sua prática pedagógica. E, assim, de certa forma, alinhá-la com a tradição da educação popular incluindo a questão dos direitos humanos que, no decorrer deste trabalho, aqui se denomina como educação popular/social. Semelhante compromisso foi assumido pela Companhia durante o IX Encontro de Educação Popular do Cone Sul, em 2013, organizado conjuntamente pela Província da Ordem da Companhia de Maria do Cone Sul e por pesquisadores do.

(12) 9. Mackenzie, da USP e da PUC. Esse encontro foi fundamental para buscar os reptos e o testemunho de Santa Joana e da Ordem no processo de educação mediado pelos educadores vinculados à Congregação. Na ótica do fazer da educação popular e da educação social, percebe-se que um tema comum é a questão social, o sofrimento das pessoas, a biografia de cada sujeito com quem se relaciona nas Instituições onde se trabalha. Nelas, a educação social e a popular se articulam porque têm como foco uma construção social coletiva. Não é o bem-estar de uma única pessoa, mas o de um coletivo, como pode ser verificado nas entrevistas:. Ese proyecto pedagógico se complementa con los princípios de la educación popular, primero que es un proyecto que inclui, que hace con que el otro de lo mejor de sí, nadie debe quedar por fuera y justamente se situa con aquel que está en situación más vulnerable (Suj. 2).; para mim, partindo daquela realidade de ouvir o grito do outro, deixarse afetar, eu sinto que o projeto de educação popular se coloca na lama do povo para poder pisar na lama, estar na realidade do povo, escutar, olhar, como uma utopia em que a gente sonha com a transformação de um mundo novo [...] (Suj.6).. Na literatura, tanto na perspectiva de Dussel como de Paulo Freire, a educação popular e social têm uma interfase, apesar da singularidade de cada uma. Este trabalho não se direciona para a construção de uma epistemologia da pedagogia social nem da educação popular. O principal objetivo aqui está no fazer, nas narrativas cotidianas e nas biografias existenciais. Por isso, o capítulo 2 enfatiza as experiências de Santa Joana e da Ordem e, ao mesmo tempo, busca-se iluminar essas narrativas a partir das teorias e viceversa. Nas experiências existenciais e institucionais narradas neste trabalho, destacam-se os papéis, as lutas, os sofrimentos as contradições, as ambiguidades e as incertezas que se criam e recriam na busca contínua da existência humana. Portanto, sob o ponto de vista desta dissertação, a educação popular/social está voltada para questões práticas do viver humano, do ajudar o sujeito a lidar com sofrimento, a interagir com o Outro para gerar uma convivência ética, como diria Santa Joana, “estender a mão; servir de uma maneira sempre nova”. Acredita-se que em toda a América Latina exista a mesma quantidade de educadores sociais e de professores, apesar de que ainda não foi realizada uma pesquisa sobre isso. No Brasil, os especialistas afirmam que o chamado Terceiro Setor, as ONGs ou organizações sociais têm mais profissionais trabalhando na Educação Social do que.

(13) 10. nas escolas.1 A pesquisa do IBGE 2010, sobre as Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos, aponta o número de trabalhadores deste setor, a diversidade de atuação, o campo de atividades das organizações, a média salarial, a distribuição no território nacional, entre outros. Além das ONGs, há as Pastorais sociais e as atividades das congregações religiosas. Trata-se de um mundo desconhecido, pois o que se tem conhecimento são as práticas de solidariedade e as experiências de gratuidade de um lado e, do outro, a existência de algumas formas de exploração. O educador social, sobretudo no Brasil, atua nos mais diferentes campos da assistência à comunidade: saúde, educação, cultura, religião e arte, abrangendo os sistemas de privação de liberdade, os povos tradicionais, trabalhos comunitários, especialmente com crianças, adolescentes e jovens, entre outros. Esses profissionais atuam como educadores, cuidadores, agentes sociais de saúde, na cultura, liderança comunitária, nos conselhos, em movimentos militantes, no acompanhamento de comunidades, na pastoral da criança, em roupeiros comunitários, nas cooperativas agrícolas, nas hortas comunitárias, nas oficinas de artesanato etc. Diante dessa realidade, em torno da qual os educadores sociais desenvolvem seu fazer educativo, faz-se necessário aprofundar dados históricos da Ordem, retomar as teorias e ouvir os educadores para entender a influência do pensamento de Santa Joana na práxis educacional. Em minha experiência de mais trinta anos de atuação como educadora na Ordem, tive a oportunidade de conviver com diversas situações em múltiplos campos, o que, para mim, confirma os variados espaços de atuação do educador social onde a práxis e teoria se entrelaçam no fazer do educador social. Semelhante vivência me permite hoje acreditar que a formação do educador social se faz na prática, tendo em vista a perspectiva de Freire: ação, reflexão, reflexão e ação. Desta experiência prática chego à teoria, pois é a partir do sofrimento humano que emergem minhas questões direcionadas à teoria. Quando iniciei minha caminhada como religiosa na Ordem da Companhia de Maria Nossa Senhora, não entendia o que era Carisma, mas sabia que as irmãs se dedicavam à educação nos mais variados campos, não apenas na educação escolar. Assim, tive a. 1. https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/fasfil/2010/default.shtm Em 2010, as 290,7mil FasFIl (Fundação privadas sem fins lucrativos) representavam 5,2% do total de entidades públicas e privadas existentes em todo o País. São entidades com atuações diversificadas entre as quais se destacam as entidades voltadas à defesa de direitos e interesses dos cidadãos (30,1%) e as religiosas (28,5%). Atuando nas áreas tradicionais de políticas públicas de Saúde, Educação e pesquisa e Assistência social, encontram-se apenas 18,6% dessas entidades. (IBGE 2010)..

(14) 11. oportunidade de atuar em áreas distintas, o que me forjou como educadora popular/social. Fui descobrindo a importância do campo teórico para iluminar a prática e responder a algumas das indagações que emergem desta. Em minha trajetória na Ordem, atuei na pastoral paroquial nas periferias de São Paulo, Belo Horizonte e Argentina. Mas a atuação não ficava apenas no campo religioso, sempre se estendia à formação de grupos de trabalho, partilha e formação. Assim, em Parelheiros, extremo sul de São Paulo, além da formação humana e religiosa para as catequistas, também atuei na formação de grupo de mães nos quais, além de trabalhos manuais, havia um espaço de partilhas de vida, conversas sobre os filhos, enfim, coisas também do cotidiano. Em Belo Horizonte, fiz parte de uma equipe multiprofissional na formação e acompanhamento de grupos de geração de renda, padaria comunitária e projeto de geração de renda na produção de bordados em ponto cruz (através de uma rede solidária, chegamos a enviar bordados para serem comercializados nos colégios da Companhia na Espanha). Neste grupo específico, eu ensinava crochê, mas mais importante do que o ensino do ponto, era o espaço onde conversávamos, acolhíamos os sonhos das pessoas e víamos que a cada ponto de bordado ou de crochê o que crescia era a autoestima daquelas mulheres que, depois de algum tempo confiando em sua própria capacidade, muitas deixaram o grupo e se aventuraram a buscar um trabalho fora do bairro para completar a renda familiar e terminar de construir suas casas. Em São Paulo novamente, atuei como assistente social em um projeto de passagem para crianças e adolescentes, no centro de Santo Amaro, em uma casa de paredes de vidro. Tudo ali era muito frágil – a vida é frágil! Na Argentina, na grande Buenos Aires/Moreno (bairro de subúrbio), desenvolvi atividade voluntária na Caritas Diocesana,. em. uma equipe multiprofissional. responsável. pela. formação e. acompanhamento de líderes de Caritas paroquiais e acompanhamento de comedores populares2 e roupeiros. Desenvolvi neste período formação em violência doméstica e também ajudei em projeto de saúde comunitária. De volta ao Brasil, coordenei projeto de contraturno escolar em um bairro periférico da Zona Sul, depois atuei como assistente. 2. Os comedores foram resquícios de um momento de recessão na Argentina em que eram preparadas refeições para as pessoas carentes, as chamadas “ollas comunitárias”. No momento em que vivi na Argentina, anos 1988-200, os comedores serviam comida para as famílias carentes e doavam roupas usadas que eram lavadas e consertadas por voluntárias, além de abastecer as famílias que acorriam aos comedores..

(15) 12. social no Amparo Maternal3 onde trabalhei no atendimento, acolhida de gestantes, entrevistas com as famílias, encaminhamentos e organização dos cursos para as gestantes. Por mais de cinco anos coordenei a Comissão de Educação Popular do Brasil e depois da Província do Cone Sul da Ordem da Companhia de Maria, e foi em razão desta última atividade que cheguei ao mestrado. As experiências citadas ajudaram a forjar a educadora que sou hoje. Antes de entrar na Companhia, sabia apenas que queria ensinar, não me via como professora, mas entendia que os novos conhecimentos que adquiria deveriam ser transmitidos a Outros, por este motivo minha primeira experiência educativa foi na catequese. Durante a trajetória na Companhia de Maria, a minha concepção de ser educadora foi se refinando, aprendi a escutar as pessoas; aprendi que o meu saber se completava com o saber do Outro, que podia aprender com as pessoas que eram auxiliadas. Além disso, compreendi que as pessoas simples, do povo, tinham um saber sensível e refinado e que elas me ensinariam muito. Aprendi a não ter respostas para tudo, pois há momentos em que é importante apenas escutar, calar e acolher o que o Outro tem a dizer. Entendi que, por mais difícil que pudesse parecer, tinha que respeitar a decisão das pessoas e que elas eram livres. Muitas vezes celebrei a vida com essas pessoas, mas também me tocaram muitos momentos em que vivenciei a morte junto com o povo. Nesses caminhos, as máximas de Santa Joana sempre me ecoavam: “nem todas calçam o mesmo sapato, quem me dera ter mil vidas para colocar a serviço da missão, educar na vida e para a vida”... Sempre gostei muito da proposta da “conversação”, isto é, de dedicar um espaço para o diálogo com as pessoas que acompanhava, com os funcionários que estavam sob minha responsabilidade. Santa Joana foi uma mulher de diálogo, de escuta, que questionava e se deixava questionar pela realidade e por isso abria espaço de liberdade, já que “O diálogo é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação eu-tu. [...] Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e aos homens”. (FREIRE. 1970, p.78-79). Santa Joana foi uma mulher de diálogo, pois nutria um grande amor pelo Outro. A educação popular/social pressupõe um diálogo profundamente amoroso e respeitoso com o Outro, sobretudo com aqueles que estão em situação de sofrimento. Nas entrelinhas. 3. Instituição Filantrópica que se iniciou para abrigar gestantes desabrigadas, que eram abandonadas por suas famílias por estarem grávidas ou por seus companheiros. Atualmente, a maternidade abriga um alojamento social que segue abrigando as gestantes que não têm onde ficar durante a gestação..

(16) 13. da vida e das narrativas de Santa Joana, o sofrimento aparece não só como uma coisa para destruir o homem, pois ele também humaniza o ser humano. Mas isso tudo aprendi não apenas através dos livros, da história de Santa Joana, mas também muito me foi passado pelas educadoras mais experientes da Ordem; muitas vezes este aprendizado não se deu por palavras, mas pelas ações delas. Penso que uma das formas de aprender na Companhia, para mim, foi através dos bons exemplos de muitas irmãs: a maneira como acolhiam, como tinham paciência de escutar as pessoas, a maneira como se dedicavam incansavelmente ao trabalho, como descobriam novas formas de se aproximar das pessoas. Sempre me recordo da irmã Saada que abriu nossa casa, quando nos mudamos para o bairro Paraíso das Piabas (grande Belo Horizonte), a todas as pessoas do bairro que quisessem conhecer as irmãs que chegaram. As pessoas entravam, não diziam nenhuma palavra, e ela com toda paciência as levava a conhecer o que se podia da casa e, por último, as convidava para uma oração na capela. Foi um processo de meses, mas, ao final, conseguimos formar uma comunidade de vida com aquelas pessoas. Por isso, à medida que vou escrevendo, vou vendo cada rosto, cada sorriso, cada mão estendida de cada educadora da Companhia de Maria. Partindo, então, da minha atuação como educadora, surgiu o desejo de pesquisar as práticas de educação popular e social na Ordem, o que veio ao encontro da proposta do programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, que tem como uma das linhas de pesquisa a “Formação do educador para a Interdisciplinaridade”. O referido Programa ofereceu-me o conhecimento e acesso às bases teóricas que, de certa forma, embasam a proposta de Educação Popular/Social presente no Projeto Educativo Companhia de Maria. Todo o suporte proporcionado pelas disciplinas do Programa em questão possibilitou a construção da presente pesquisa, no sentido de rever a minha prática, de compreender melhor o contexto pedagógico da Ordem e a ação das irmãs como educadoras. A educação popular/social tem como característica um movimento intimamente ligado à vida e isto pode ser apreendido nas reflexões de Freire, Dussel, Martín-Baró e de outros especialistas da educação social, esta que busca ajudar o sujeito individual e o sujeito coletivo a encontrar sentido na existência humana. Dentro do objetivo de compreender a influência do pensamento e do testemunho de Santa Joana de Lestonnac na práxis da Educação Popular/Social, realizada pela Ordem da Companhia de Maria no Cone Sul, traça-se como metas contextualizar a história de.

(17) 14. Santa Joana e da Ordem; analisar o Projeto Educativo: práticas e concepções e verificar as práticas de Educação Popular e Social na Companhia de Maria, aprofundando as teorias que as respaldam. Este objetivo está circunscrito a um contexto histórico determinado numa práxis e no campo relacional. A práxis e o campo relacional de atuação da Ordem se encontram com vários rostos, como da mulher, das crianças, dos negros, dos indígenas, dos operários, dos jovens, dos doentes, dos desempregados, dos analfabetos.... Na história da Ordem, desde sua origem, esses rostos estão presentes, ora com mais, ora com menos vitalidade. No início, em função do contexto histórico, aparece o rosto das mulheres, depois das famílias e, na América Latina, esses rostos se ampliam e se refazem o tempo todo, assim como na África. As questões que norteiam este trabalho têm como pano de fundo as intuições e percepções de Santa Joana de Lestonnac e da Ordem alinhadas à visão de Igreja proposta nos Documentos de Medellín e de Puebla para se pensar o papel e o campo de atuação do educador social. A práxis dos educadores sociais vinculados à Ordem ajuda na formação do educador? Como? Os pressupostos da Ordem aparecem no fazer pedagógico cotidiano e no discurso dos educadores? Qual a fundamentação teórica que embasa as práticas de Educação Popular/Social da Ordem? Santa Joana de Lestonnac, fundadora da Ordem da Companhia de Maria, pode ser chamada de educadora social? As práticas em meio popular, realizadas pela Companhia de Maria, principalmente no Cone Sul, podem ser consideradas como Educação Popular/Educação Social? De que forma as experiências auxiliam no melhor entendimento do que é educação social? Os procedimentos de pesquisa para responder a essas questões foram a leitura de documentos, o levantamento bibliográfico, o método hagiográfico e a realização de entrevistas. Os documentos da Ordem que foram utilizados como base de leitura desta dissertação foram atas, cartas, relatórios de encontros, projetos e documentos capitulares e eclesiásticos. O levantamento bibliográfico se deu em torno das publicações, teses e filmes sobre Santa Joana, a Ordem e a vida das irmãs. Realizou-se um levantamento bibliográfico e documental dos aspectos históricos da vida de Santa Joana de Lestonnac e do Projeto Educativo da Ordem, que também atestaram a aprovação e desenvolvimento da Congregação. O método hagiográfico, que por se tratar da vida de um santo e da fundadora de uma ordem, ajudou a entender que,. Por um lado a ‘vida de santo’ articula dois movimentos aparentemente contrários. Assume uma distância com relação às origens [...]. Mas, por.

(18) 15 outro lado, um retorno às origens permite reconstituir uma unidade no momento em que, desenvolvendo-se, o grupo arrisca se dispersar. Assim como a lembrança [...] se combina com a ‘edificação’ produtora de uma imagem destinada a proteger o grupo contra a dispersão. (CERTEAU, 1982, p. 244).. Foram realizadas entrevistas com educadoras vinculadas há mais de dez anos à Companhia, com a finalidade de incorporar elementos à práxis educativa da Ordem nos dias atuais. Em síntese, os procedimentos da pesquisa auxiliam a ter certo distanciamento de um lado, mas, de outro, para mergulhar nesta temática, é necessário ter aproximação com os sujeitos envolvidos na pesquisa, mesmo com os que já morreram porque, como diz Certeau, as vozes deles sempre aparecem, mesmo que tenha que morrer novamente. Mas de uma forma ou de outra ela influencia a prática. Tudo isso para dizer que nesta investigação apresento-me, ao mesmo tempo, como pesquisadora e sujeito da pesquisa. Talvez aqui possa, sem aprofundamento, usar as ideias de Morin, de Alvara Pinto, de ciência com consciência, ou ainda, pesquisa com consciência. Trata-se de um dilema enfrentado em todo o trabalho. Logo, o apoio em dados históricos, análise de documentos e entrevistas busca garantir um certo distanciamento, mas sem perder a proximidade. O acesso aos dados só foi possível por eu fazer parte da Ordem. Os suportes teóricos para responder aos objetivos e problemas estão centrados na visão de Santa Joana e na Pedagogia Social, esta que tem seus fundamentos teóricos na América Latina embasados nas reflexões de Freire, Dussel, Martín-Baró. Além disso, são considerados os estudos de pesquisadores vinculados aos grupos de pesquisa de Pedagogia Social do Mackenzie, da USP e da PUC (Cf. Coleção de Pedagogia Social). Outro elemento teórico-jurídico auxiliar é o marco legal que define a profissão de educador social que está em trâmite no Congresso Nacional. Acredita-se que, uma vez regulamentada a profissão de educador social no território brasileiro, além de haver uma socialização maior desse conceito, possibilitará de uma forma mais rápida o reconhecimento de práticas de Educação Social/Pedagogia Social nas atividades que hoje se denominam como de educação popular na América Latina, apesar de a AIEJI – Associação Internacional dos Educadores de Jovens Inadaptados – referência mundial em Educação Popular/Pedagogia Social, ter a sua sede no Uruguai. Para sistematizar esta dissertação, o trabalho foi divido em cinco capítulos. O primeiro, a Introdução; o segundo intitula-se Contexto Histórico da Ordem; o terceiro.

(19) 16. denomina-se Da Educação Popular à Educação Social; o quarto intitula-se Construção da Educação Social; e o quinto capítulo refere-se à Conclusão. No segundo capítulo, faz-se uma trajetória da vida de Joana de Lestonnac (1556) desde o seu nascimento, em Bordeaux, na França, considerando o momento histórico e os contextos social e eclesial, assim como as influências que Santa Joana teve ao longo de sua vida que a fizeram, mais tarde, decidir pela fundação de uma Ordem religiosa (1640) dedicada à Educação da mulher. Desde este primeiro momento já se inicia a análise do pensamento de Santa Joana e a sua práxis. Busca-se proximidade com a Fundadora para se perceber como Joana de Lestonnac concebe a educação: é através do encontro com o Outro, do diálogo de abertura às diferenças, da ternura, que se concebe sua concepção de educação. Santa Joana de Lestonnac inicia sua experiência de educadora no encontro com Outro, que primeiramente foram os pobres, doentes, mas o seu ser de educadora foi forjado quando retoma sua experiência de vida no Cister e sente que a dor das “jovens que estão a ponto de cair nos infernos se não tiver quem lhes estenda a mão”, se assemelha à dor que ela sentiu em sua adolescência e juventude, mas teve quem a socorresse. Ela sentiu uma empatia com o sofrimento daquelas mulheres, e por isso estendeu a mão! O educador social tem que ter, sentir empatia com o educando, entender o seu problema e o seu sofrimento para, então, possibilitar a libertação. “El que oye el lamento o la protesta del outro es conmovido en la misma centralidade de su mundo: es descentrado. El grito de dolor del que no podemos ver significa a alguien más que a algo... el grito, nos exorta, nos exige hacermos cargo de su dolor, de su causa, de su grito” (DUSSEL. 1996, p.78). Esse clamor foi captado pelas religiosas da Ordem de sua Fundadora e sendo reproduzido em sua prática educativa cotidiana. Para que possa desabrochar o ser humano completo, em todas as suas capacidades, é necessário a proximidade e o acompanhamento constante, para que, uma vez que a pessoa encontre seu lugar no mundo, possa ajudar a outros a fazê-lo. Não é a educação do um sozinho, mas com o Outro. A partir dos ensinamentos de Joana, pode-se entender que todas as obras da Companhia de Maria constituem um espaço educativo, onde se deve respirar educação. No terceiro capítulo, focaliza-se o conceito de Educação Popular/Educação Social/Pedagogia Social, iniciando pelo entendimento da Educação Popular na América Latina a partir da reflexão teórica de autores como Freire, Dussel e Martín-Baró. Estes que, partindo de todas as contradições existentes no Continente Latino Americano,.

(20) 17. acreditam que pode haver um processo de libertação das vítimas no reconhecimento do Outro como ser de direito que propicie uma sociedade justa e igualitária, como consequência do processo de humanização de todos os oprimidos. Na esteira de se pensar um processo conjunto de mudança, entra em discussão a Construção da Educação Social, momento em que se destaca o surgimento da Educação Social/Pedagogia Social na Europa desde os primórdios, quando começaram a aparecer os primeiros indícios de ações educativas consideradas como atividades de educação social, pois é a partir do fazer, das práticas solidárias, da preocupação com o bem-estar do Outro e de sua integração na sociedade, que se considera que uma das propostas da educação social é formar para a convivência humana e a inclusão. No contexto latino-americano, a Educação Social vem na esteira da educação popular. Cada uma tem a sua especificidade, pois enquanto a educação popular atua no processo de conscientização e luta por direitos, buscando a implementação de políticas sociais que respondam às necessidades da sociedade, a educação social é a prática das políticas implementadas, embasada teoricamente pela pedagogia social. É nesse contexto de América Latina/Cone Sul que se busca encontrar os reptos do pensamento de Santa Joana de Lestonnac na práxis da Educação Social. Em sua prática educativa, localiza-se um consenso, pois parte de uma educação humanista que busca que o indivíduo desenvolva as suas potencialidades, o melhor de si para colocar a serviço da sociedade. Não é uma imposição, mas uma relação de igualdade em que o educador trata de entender o que o Outro traz, a bagagem que ele carrega para, depois, iniciar o processo pedagógico. Esta prática pedagógica está presente nas CEBs, onde cada pessoa tem a sua palavra. É no encontro de saberes que se dá a educação, parafraseando Freire, no encontro do educador x educando. Entende-se que a máxima nem todos calçam o mesmo sapato, responde o que pode ser esta educação. As pessoas são diferentes em suas necessidades físicas, pessoais e intelectuais, mas para saber, descobrir isso, faz-se necessário o acompanhamento, o diálogo, a paciência para se descobrir o que o Outro tem de genuíno. Assim sendo, o educador tem que se colocar ao lado do educando e, muitas vezes, deixar suas certezas e aceitar que também aprende com o educando, que este igualmente tem algo a dizer. A vida se constrói a partir de consensos e os teóricos nos quais se baseia esta pesquisa mostram justamente isso. O Outro, explorado, sofrido, vítima do sistema, tem a sua palavra e é ele quem faz o educador sair do comodismo quando se deixa interpelar pelo grito, gemido que ouve, e se dispõe a escutá-lo, porque escutar o grito do Outro é escutar o seu próprio grito, escutar o anseio por uma sociedade justa e fraterna..

(21) 18. No quarto capítulo, ao realizar a análise dos Encontros de Educação Popular do Cone Sul e das entrevistas feitas com as educadoras, foi sendo delineada a proposta educativa da Companhia que busca dar respostas válidas a cada momento histórico, a cada situação de desumanização. Na época da Fundadora, eram as mulheres que necessitavam de alguém que lhes estendesse a mão, que lhes ajudassem a sair da situação de marginalização, impotência, falta de espaço na sociedade, ignorância intelectual. No decorrer dos séculos, esse modo de estar no mundo de forma educativa, seguiu-se realizando ações diante de realidade de exclusão, pobreza, abandono e discriminação enfrentada por muitas pessoas, principalmente na América Latina. Nesse contexto é que acontece o testemunho das educadoras da Ordem na Província do Cone Sul, na forma como acolhem as pessoas, no diálogo; caminhando junto; fazendo processo de educação partilhada: educando x educador; reconhecendo o saber popular, respeitando a cultura do povo e tirando dela elementos que possam ajudar o próprio povo no reconhecimento do seu saber, partilhando a missão educativa; construindo conjuntamente no reconhecimento da alteridade do Outro; possibilitando o crescimento das pessoas, fomentando seu empoderamento; muitas vezes vivendo em comunidades campesinas, periferias dos grandes centros, aldeias indígenas, enfim, em espaços de exclusão. Esta proximidade com a dor, o sofrimento do Outro, do pobre, das vítimas, vai forjando o educador social. Ele se forma através da experiência, mas também deve buscar uma teoria que o ajude a atuar de maneira mais eficaz. Não é o atuar por atuar, ajudar por ajudar. O educador tem que saber de onde parte e para onde vai, isto é, não conta só a boa ação, pois até a maneira, a forma de conversar, escutar e acompanhar o educando tem que ser aprendida, tem que ter uma teoria que a embase. Sua ação pedagógica deve ter uma intencionalidade. Neste sentido, retomando os Encontros de Educação Popular do Cone Sul, percebe-se que as educadoras da Ordem, ao longo de trinta anos, buscaram, através desses eventos, analisar suas práticas no meio popular e buscar teorias que pudessem auxiliá-las e, ao mesmo tempo, partindo da teoria, desenvolver o trabalho pedagógico de forma que se tornasse mais eficaz e possibilitasse uma ação educativa mais efetiva no sentido de formar melhor os destinatários de sua missão para que os mesmos pudessem se tornar multiplicadores..

(22) 19. Nas entrevistas, pode-se perceber efetivamente que o encontro com o Outro é uma das marcas notórias do educador popular da Ordem. A expressão estender a mão aparece em quase todas as entrevistas e marca justamente o fato de que o processo educativo nos meios populares passa pela sensibilidade à realidade do Outro e o comover-se com a sua dor, levando a estender a mão, o que possibilita a saída da situação de exclusão e desumanização para que a pessoa encontre o seu lugar no mundo. A prática do encontro com o Outro fica evidenciada através das teorias de Freire, Martín-Baró e Dussel. E neste mesmo sentido as entrevistas foram surpreendentes, pois à medida que foram levantadas as palavras que mais se aproximavam da Educação Social, percebeu-se que há um consenso na maneira de entender a educação. Algumas entrevistadas, ao falarem de sua atuação como educadora da Ordem, primeiramente relataram o seu processo pessoal de formação, o acompanhamento que receberam, a forma como, aos poucos e através da prática acompanhada, se tornaram educadoras, a partir da realidade pessoal do respeito. Percebe-se que este é um processo de mão dupla, pois a formação na Ordem vai se dando também no encontro com o Outro, e lembrando-se de que de um encontro ninguém sai da mesma maneira, sai-se diferente, um toca e é tocado: é o estender a mão para as educadoras da Ordem. O educando, o destinatário, pode sentir-se ajudado, acompanhado, mas para a educadora este encontro também é transformador, pois suas certezas também são questionadas, e ela é convidada a pensar e repensar a sua prática, pois se cada pessoa é diferente, se realmente acontece o diálogo educando x educador, a sua atuação será distinta com cada pessoa. Portanto, volta-se ao consenso de que é na relação que a educação acontece. Quando a pessoa partilha algo, ou questiona uma ação, o educador volta à teoria para buscar uma explicação, entender a situação ou até mesmo para confirmar se o que o educando está falando tem sentido. Nunca me esqueço de uma experiência no alojamento de gestantes quando, seguindo as regras da casa, ordenei a uma gestante que trocasse de quarto. Ela me olhou e disse que tudo que ela tinha era aquela cama, aquele cantinho, e eu ia tirá-la dali? No mesmo momento me recordei de algo que havia estudado em psicologia e não lhe respondi, pedindo-lhe um tempo para pensar. Lembrei-me de que as pessoas constroem seus ninhos, seus espaços de pertença, principalmente em ambientes estranhos a elas, para que possam ter uma contenção, organização interna no processo de adaptação ao novo ambiente. Eu não a mudei de quarto, é claro, mas me ficou a lição: escutar, dialogar, para entender a real necessidade do Outro..

(23) 20. Ao realizar-se esta pesquisa, percebeu-se que o entendimento sobre consenso não é algo tão simples. Muitas vezes existem outros interesses, outras questões. Por exemplo, quando se tem que optar por manter uma estrutura, uma organização, no caso da Ordem, toda a readequação estará em curso a partir do Planejamento Global para possibilitar a readequação de forças com vistas a um serviço mais eficaz. Isso é bom por um lado, pois se trata de manter ou assegurar que a mesma siga oferecendo seu serviço à Igreja e à sociedade por mais, quem sabe, quatrocentos anos. Estas novas estruturas mexem com o consenso. Como continuar mantendo um trabalho em meios populares ao mesmo tempo que se necessita de pessoas para dar continuidade à estrutura? Voltando à partilha da experiência acima sobre o alojamento social, como saber até que ponto a estrutura pode ser questionada e abrir espaço para uma ação que chegue ao consenso? O mesmo se observa em organizações como a Igreja que, por um lado, faz apelo a uma opção pelos pobres, por outro, enfrenta barreiras para ser aceita em todos os seus espaços de atuação. Com possibilitar uma formação para os educadores para que não tenham apenas respostas prontas, mas que em sua atuação cotidiana possam acessar teorias que respaldem a sua prática? Ao mesmo tempo, descobriu-se que ainda que não se expresse, não se fale de forma mais geral sobre a educação social, e mais da educação popular no Brasil, ela já vem acontecendo mesmo em espaços considerados de educação popular. Foi muito bom perceber que as conquistas feitas por pessoas e grupos sociais no tocante a direitos, ou consciência deles, à experiência de cidadania vivida por muitos, não podem ser tiradas por ninguém. Isso dá esperança e ao mesmo tempo exige uma responsabilidade na forma de educar. Agora, é possível entender algumas falas, leituras, pois voltando ao já enunciado, não se trata de ensinar as letras, e sim ensinar a fazer uma leitura do mundo, pois é melhor cabeças bem feitas que cabeças cheias. As pessoas têm que experimentar, acreditar em si mesmas. Daí a necessidade de um conteúdo consistente, que levante a pessoa para que ela possa encontrar o seu lugar no mundo. Foi interessante poder olhar a Ordem sob outra ótica. Ainda que em muitos momentos tudo se mesclava, a distância exigida pela pesquisa ajudou no encontro de outros valores e também limites que estavam ofuscados pela proximidade. Sabe-se que de muitas coisas escritas, algumas ficam no desejo, pois não é possível realizar todas as propostas geradas por capítulos gerais e assembleias, mas ainda que muito não se realize, permanecem o sonho, o projeto e a intenção, o que significa que não se está parado no tempo. Por este motivo, tudo o que se vivencia na Ordem atualmente, no tocante aos pobres e oprimidos na América Latina,.

(24) 21. configura-se como um processo de muitos anos em que foram sendo colocadas pedrinhas sobre pedrinhas, mas que hoje já se pode vislumbrar parte de um alicerce, pois ao se considerar que a Ordem tem 400 anos e 200 das primeiras fundações na América Latina, a experiência de aproximadamente 40 anos em meio aos pobres já fez muita história e proporcionou muitas mudanças a esse continente. Tendo feito esse percurso, foi possível responder às questões que nortearam esta pesquisa, alinhadas às percepções e ao pensamento de Santa Joana, contribuindo para o papel e o campo de atuação do educador social à medida que nas atividades de Educação Popular/Social da Ordem está clara a opção pelos pobres, pelos mais humildes. Estes são os principais destinatários dos projetos sociais da Ordem: nos projetos de contraturno escolar, na escola bilíngue, na cooperativa agrícola e em outras ações, delimita-se o campo de atuação do educador e a formação ocorre tanto através dos encontros educando/educador, na relação dialógica, quanto no respeito às diferenças. No processo de humanização, do qual tanto o educando como o educador fazem parte, na medida em que se reconhece a alteridade do Outro e se percebe que um é revelado no Outro, o crescimento se dá em duas vias: educando/educador. Em todo o discurso das educadoras aparecem os princípios/pressupostos pedagógicos da Ordem como algo natural, que faz parte do fazer cotidiano e embasa todo o processo educativo. A fundamentação teórica que propicia as práticas de Educação Popular/Social da Ordem está contida nos próprios princípios pedagógicos que embasam toda a sua ação educativa, tanto a escolar como a social, já que carrega o princípio de humanização da pessoa buscando alcançar o objetivo de que ela possa dar o que tem de melhor e se comprometer com a sociedade. Neste sentido, as práticas educativas em meio popular, realizadas pela Ordem no Cone Sul, podem ser consideradas como práticas de Educação Popular/Educação Social a partir dos espaços de atuação, do seu fazer social, que viabiliza a educação da pessoa em todos os aspectos da vida. Finalmente, as experiências apresentadas na pesquisa são muito ricas e demonstram atenção à realidade enfrentada pelas educadoras, levando-as a se posicionarem educativamente a cada situação em que exista alguém que necessite de uma mão estendida. No decorrer deste trabalho, pôde-se concluir que a ação das educadoras da Companhia de Maria parte de um processo de Educação Popular/Social, processo esse que despontou no nascimento da Ordem e que segue fazendo eco até os dias atuais, na ação educativa de cada educadora/or da Companhia de Maria. Apesar das práticas.

(25) 22. educativas da Ordem na América Latina/Cone Sul se configurarem como ações de Educação Social, as educadoras denominam seu trabalho como atividades de Educação Popular. O conceito de Educação Social/Pedagogia Social ainda não é usado por este grupo específico. Entendeu-se, a partir da pesquisa, que isso se deve ao fato de se tratar de um conceito ainda em construção no continente latino-americano, o que não impede de reconhecer essa ação pedagógica nas práticas das educadoras da Ordem. Acredita-se que reconhecer em Santa Joana de Lestonnac uma educadora social ajuda a rever a prática educativa da Ordem no campo social, pois apesar da necessidade deste campo de atuação, ele não é muito valorizado em comparação aos professores da educação básica. Entendese que isso se dá pelo fato de a profissão não estar totalmente regulamentada, o que impede a normatização da formação desse educador. De qualquer forma, para a Companhia de Maria, o presente estudo poderá ajudar para que a educação social no Cone Sul não fique limitada apenas aos espaços populares, mas possa fazer uma intersecção com as práticas educativas desenvolvidas em outros espaços de atuação da Ordem. Finalmente, tem-se a sensação de que, apesar de todos os levantamentos e análises, ainda há necessidade de novas pesquisas, especialmente sobre a biografia de Santa Joana como educadora social, a sistematização de seus pressupostos pedagógicos, além de estudar as trajetórias das irmãs no campo da educação social, principalmente daquelas que chegaram ao martírio. Em termos de conclusão, pôde-se constatar que a educação popular/social é um campo prático de formação individual e coletiva para a convivência humana, que tem como pressuposto o fato de que a produção do conhecimento se dá também pela prática, pelos acontecimentos da existência humana, e na relação com o Outro. Este campo de atuação, denominada educação popular e social, pressupõe a opção pelos oprimidos e por aqueles que sofrem. A pedagogia social, como teoria da educação popular e da educação social e comunitária, tem o papel de sistematizar de forma orgânica essas múltiplas práticas e vivências. No decorrer do trabalho, fica nas entrelinhas a mensagem de que a humanidade, de tempos em tempos, tem necessidade de fazer uma nova síntese para a construção de um projeto civilizatório. 2. HISTÓRIA DO SURGIMENTO E PRÁXIS DA ORDEM. A educação e a religião estão presentes em todas as sociedades e cada transformação social requer um novo jeito de educar. Ora se educa por meio de símbolos na convivência, ora por meio das instituições. O foco da educação está sempre voltado.

(26) 23. para a formação do sujeito da maneira que uma determinada sociedade espera. Grandes acontecimentos históricos, como o Renascimento, a Invenção da Imprensa, a Reforma Protestante, a Revolução Industrial, o Iluminismo, modificaram o jeito de ser, de pensar, de crer e de agir das pessoas, e isso exigiu novas metodologias e novos procedimentos no processo educacional. Modificações radicais inauguraram a concepção antropocêntrica do mundo, estimularam o Naturalismo e o Humanismo, desenvolveram o pensamento científico, a cultura clássica, a arte e a anatomia, o mercantilismo e a ascensão da burguesia. Tudo isso alterou as dinâmicas de convivência, a relação do homem com a natureza, do homem com Deus, do homem com outro homem, a forma de organização das sociedades e instituições. Nessa esteira, as máquinas cada vez mais inteligentes transformam a sociedade e, consequentemente, os meios de produção material e simbólico, e por este caminho segue a divisão do trabalho, segundo Marx.. 2.1 A história de Santa Joana de Lestonnac. Preocupada com as mudanças sociais e a maneira como isso repercutia na formação da mulher no século XVII, Santa Joana de Lestonnac (1556-1640) sentiu-se inspirada a fundar uma ordem religiosa com foco na educação feminina e na formação religiosa. Nasceu, assim, em 1607, a Ordem da Companhia de Maria Nossa Senhora, Ordinis Dominae Nostrae (ODN). O intuito da fundadora foi responder às necessidades daquele momento histórico, em Bordeaux, na França, ou seja, sua preocupação era oferecer formação integral à mulher, numa época em que a educação era voltada para os homens. Naquele momento, as jovens, de certa forma, representavam um grupo socialmente excluído, impossibilitado de aproximar-se da instrução. Essa nova configuração do ser e do mundo exige outra configuração de convivência, e esse itinerário pede um novo posicionamento das mulheres. E como Santa Joana de Lestonnac não queria fazer rupturas, ela optou pela via do consenso, que é a educação com uma proposta inovadora a partir dos muros do convento. O ato de educar não é algo que se faz por acaso. Toda educação tem uma intencionalidade que pode servir para que a pessoa cresça, liberte-se, para que se abra um leque de conhecimentos que vai ajudá-la a ler o mundo a partir de determinada perspectiva, ou para perpetuar a submissão de um determinado grupo ou sociedade..

(27) 24. Dentro da mentalidade religiosa de seu tempo, Santa Joana de Lestonnac, como todo católico, também buscava a salvação, mas ela percebeu que a salvação pessoal passava pela salvação do Outro.4 O Outro era a mulher: criança, adolescente, jovem, esposa, mãe. Era a mulher deixada em sua ignorância religiosa, intelectual e pessoal.. Quantas pessoas se perdem por não serem instruídas desde a infância nos deveres essenciais e nos princípios da Religião Cristã! Quantas jovens vivem na ignorância, de que se lamentarão por toda a vida; ou bebem o erro nessas fontes envenenadas, de que depois dificilmente se libertarão, e que talvez passarão a outras! [...] sob o pretexto de uma boa educação no conhecimento das letras e vida social, ensina-se a mentira, e através das meninas inocentes começam a infeccionar e corromper famílias inteiras (D. F., 1975, p. 142).. Lestonnac entendeu que responder ao chamado que Deus fazia para ela, naquele momento, se daria através da educação, que serviria para que as pessoas, as mulheres, pudessem se colocar na sociedade de forma ativa; que a partir da formação recebida, pudessem não apenas educarem-se a si mesmas, mas sim a toda a sociedade. Sua proposta educativa, mais do que ser algo intimista, visava a uma educação que desse à mulher um lugar de respeito e de dignidade humana. Algo para além dos muros do mosteiro, que se espalharia por toda a comunidade, por todo o entorno. Dessa maneira, influenciaria na forma de pensar e de agir da comunidade e da sociedade. A visão de Educação de Santa Joana, e da própria Ordem, é que a educação é uma forma de ajudar a mulher a se colocar no mundo como sujeito do processo e não na lógica da subserviência. Educar, nesse momento, é ajudar a mulher a buscar sua libertação e a dos homens, o que requer mudança das estruturas sociais e da forma como cada pessoa compreende, interpela e busca a transformação do mundo. Educar a mulher é também educar a criança.. 2.1.1 Contexto em que nasceu Joana Refletindo sobre a época em que viveu Santa Joana (1556 – 1640),5 transportamonos para o momento histórico da França em que se podia sentir a convulsão do surgimento 4. “... quem é liberto do jugo de ter que realizar a própria salvação está menos focado em si e mais atento para o mundo”. (BENKE, 2011, p. 9-10). 5. Joana de Lestonnac foi canonizada pelo Papa Pio XII em 1949, 309 anos depois de sua morte. Não poderia afirmar, mas talvez por causa de sua canonização tardia, não é muito comum referir-.

(28) 25. do novo homem, do pensamento moderno, o Renascimento, a ascensão da burguesia, a Reforma protestante. A Reforma foi um movimento liderado pelo monge alemão, Martinho Lutero (1483 – 1546). No afã de conseguir dinheiro para terminar a cúpula da basílica do Vaticano, o Papa Leão X (1513-1521) decide continuar a pregação sobre as indulgências, estipulando valores pecuniários a pecados cometidos. Isso fez com que Lutero enxergasse que a Igreja estava corrompendo as verdades do Evangelho. Então publica, em 1520, três obras nas quais ataca o múnus eclesiástico: [...] o de ensinar, o de governar e o de santificar. O primeiro é substituído pelo estudo direto da Bíblia, que traduz para o alemão e coloca nas mãos do povo; o segundo confia aos príncipes temporais e o terceiro o recusa, pois, para Lutero, bastava o Batismo para participar do sacerdócio de Cristo. O que salva o homem, afirma, não são as boas obras, mas sua confiança em Cristo e em sua misericórdia. [...] Tudo isso produziu a divisão no campo da Teologia, dando margem ao surgimento de novos movimentos reformadores. (AZCÁRATE, 2009, p. 23-24). As ideias de Lutero encontraram a simpatia de muitas pessoas, inclusive de padres e freiras, estendendo-se rapidamente por toda a França e ameaçando a autoridade do Papa. Na França, a Reforma teve como uma das principais forças do movimento o teólogo, professor e escritor João Calvino (1509 – 1564), que [...] exerceu uma influência mais profunda que Lutero, tornando universal a reforma luterana: inova muito pouco, mas deduz, sistematiza, organiza e corrige a obra de Lutero tornando-a universal. É a reforma luterana pensada por um francês. Formará um corpo de doutrina flexível o bastante para torná-la capaz de adaptar-se a todos os espíritos. [...]. Destacamos duas inovações: sua doutrina sobre a predestinação e a criação, em Genebra, de uma Academia de Teologia aberta a homens e a mulheres. (AZCÁRATE, 2009, p. 24). Essa doutrina atraiu inúmeras pessoas importantes, como banqueiros e burgueses, propagando-se principalmente nos ambientes femininos, pois concedia às mulheres um protagonismo até então inexistente. A criação da Academia de Teologia (1559) merece destaque, pois ali estarão [...] pela primeira vez na história do Cristianismo, as mulheres. São elas as famosas “mestras calvinistas”, as quais não somente catequizam, mas se a ela, principalmente nos textos de Ordem como Santa Joana, mas usualmente a chamamos de Joana, Joana de Lestonnac. Chamá-la assim, evoca a força de sua personalidade e ao mesmo tempo a proximidade da Madre Fundadora. No presente trabalho me referirei a ela como Santa Joana..

(29) 26 incorporam, à educação, o estudo de Humanidades. [...]. As “mestras calvinistas” ofereciam à infância feminina uma educação que respondia às exigências do florescente Humanismo. (AZCÁRATE, 2009, p. 25). Essas academias ajudaram a impulsionar a proliferação das igrejas reformadas, convertendo o Calvinismo em um partido político, preparado para enfrentar os católicos, o que acabou por ocasionar as guerras de religião no território francês. Dentro desses conflitos entre católicos e calvinistas, podemos ressaltar o episódio da Noite de São Bartolomeu (1572), em que, tentando abortar um complô calvinista, a rainha Catarina de Médici mandou matar todos os protestantes que se encontravam em Paris para assistir ao casamento de Henrique de Bourbon, aproximadamente 3 mil pessoas. Em Bordeaux houve uma réplica do massacre, em que morreram também muitas pessoas. Foi uma época de profunda convulsão religiosa, em que se presenciou muita violência e vingança entre os dois lados: católicos e protestantes. Esse problema se acirrou quando o Papa Paulo IV (1555 – 1569) reorganiza a inquisição, o que favoreceu a intolerância entre ambos os grupos. Os reis franceses seguiram tomando o partido de Roma, mas mesmo sem o apoio real, o Calvinismo seguia desenvolvendo-se vigorosamente, fundando escolas e entrando em mosteiros e conventos. O catolicismo resistia em reformar-se, o que provocou uma saída em massa da burguesia para as ceias e as pregações dos ministros da Reforma. O catolicismo em Bordeaux se manifestava em forma de culto às relíquias e procissões à Virgem Maria, de devoção formalista, e alguns parlamentares que se mantinham pela vontade real. Três atitudes resumiam a conduta da alta sociedade bordalesa, formada por parlamentares, homens de leis e médicos: Os que permaneciam fieis à religião tradicional; os que, simpatizando-se com o movimento reformador, permaneciam extremamente fiéis às exigências e ao credo da fé católica, valorizando sua longa tradição de séculos; os que valorizavam o Catolicismo, não por sua doutrina ética, mas por razões políticas, vendo nesta fé um apoio à monarquia e à ordem social. (AZCÁRATE, 2009, p. 30). Esses conflitos levaram muitas pessoas a mudar de religião, fazendo com que surgissem divisões nas famílias por divergência religiosa. Nesse contexto nasceu em Bordeaux, em 1556, Joana de Lestonnac, filha do conselheiro do parlamento da cidade, Ricardo de Lestonnac, casado com Jeanne Eyquem,.

(30) 27. proveniente de uma família da classe mercantil dos fins do século XV, assim como os Lestonnac. Ambas as famílias faziam parte da nobreza, tendo desempenhado importantes cargos públicos na cidade de Bordeaux. Tinham também em comum o apreço pela filosofia humanista. Sobrinha de Michel de Montaigne, Santa Joana vivenciou toda a reflexão e discussões sobre o humanismo, pois sua mãe, Jeanne Eyquem, desde a infância respirara a cultura humanista. Ela era considerada uma mulher culta, que falava grego e latim, logo, era normal que sua casa estivesse aberta a reuniões em torno das influências filosóficas da época. “La casa de los Lestonnac se convirtió en importante centro literario, donde se daban cita personas de letras de la zona de Burdeos. Allí se comentaban las obras de Vinet, Pierre de Bach, P. Chaison y Boëtie, y se leían ensayos enviados por Miguel de Montaigne desde su retiro en Perigord. La tertulia femenina centró su interés en discusiones religiosas, derivando lentamente hacia el calvinismo”. (SOURYLAVERGNE, 1984, p. 58). O ambiente onde cresceu Santa Joana era culto, mas também marcado pela divisão religiosa: “Sua mãe, segundo o testemunho unânime dos biógrafos de Santa Joana de Lestonnac, professou pela fé de Calvino um zelo áspero e tenaz até a morte” (AZCÁRATE, 2009, p. 30). Esta encomendou a educação de sua filha à cunhada, Jacoba d’Arsac, enteada do poeta La Boétie, esposa de Thomas de Montaigne, também calvinista, acreditando, como mãe, que era o melhor que poderia fazer para sua filha.6 Um dado histórico ao qual, em nossa opinião, se deve prestar mais atenção é a unanimidade entre os primeiros biógrafos de Santa Joana de Lestonnac em reconhecer a retidão moral de sua mãe, a quem apresentam não somente enriquecida pela cultura humanista, mas também como mãe dotada de todas as qualidades que a tornavam capaz de dar a sua filha uma educação privilegiada. (AZCÁRATE, 2009, p. 31). Segundo historiadores, foi Michel de Montaigne, tido por alguns como católico ortodoxo, que influenciou o pai de Joana, Ricardo de Lestonnac, a tirar sua filha da casa de Thomas para ficar longe da influência calvinista. Nesse caso, grande parte da formação “La personalidad de Juana se perfila marcada por la situación de conflicto que la conduce a dar cuenta de su fe. Su primera educación en casa de Thomas de Beauregard recuerda las actividades de los pedagogos y regentes que trabajaban en nombre de la religión Reformada”. Un camino de Educación, Soury-Lavergne, 1984. 6.

(31) 28. católica de Santa Joana, deve-se a seu pai e a seu tio Michel. Segundo a História da Ordem - H. O.: Francisco de Lestonnac tuvo una influencia decisiva sobre su hermana. [...] Debía su formación espiritual e intelectual a las lecciones de su padre e a los religiosos de la Compañía de Jesús que por entonces se habían establecido en Bordeaos para ejercer su apostolado. (H. O., 1964, p. 41). Apesar de parecer muito controversas, as experiências vividas por Santa Joana em sua infância e adolescência, as influências de Michel de Montaigne, a protestante e a inaciana acabaram por sedimentar-se e, mais tarde, ajudaram-na a plasmar seu projeto educativo.. 2.2. Influências na vida de Santa Joana de Lestonnac. 2.2.1 Michel de Montaigne Miguel de Montaigne admiraba la belleza de su sobrina y más todavía su clara inteligencia y su grandeza de alma, que como buen discriminador de espíritus supo calibrar mejor que nadie. Fue por lo tanto un placer para él instruir a su sobrina y enriquecerla con sus conocimientos intelectuales. (H. O. 1964, p. 39). Segundo SOURY-LAVERGNE (1984), Joana assimila de seu tio Michel de Montaigne três características do humanismo renascentista: visão otimista do mundo;7 sentido da pessoa humana;8 e disposição à “Honradez”.9. “El mundo contemplado es un mundo para gobernar, y su visión positiva se orienta hacia la comunicación entre los hombres. [...] Apoyándose en esa concepción del mundo, el autor de Ensaios saca una consecuencia pedagógica importante: la de la alegría” SOURY-LAVERGNE, 1984, p. 50. 8 “Lo que Montaigne quiere encontrar en la amistad, como en toda comunicación es, precisamente lo que la persona tiene de único y incomparable.... lo interesante aquí es el carácter humano de la comunicación, que lleva a penetrar en el conocimiento del hombre y, a partir de su singularidad, alcanzar la universalidad. SOURY-LAVERGNE, 1984, 53. 9 Segundo SOURY-LAVERGNE, os termos honrados e honradez foram tão usados no século XVII que existe uma dificuldade em especificar o seu sentido exato para Montaigne, pois ele se repete muitas vezes. “De la formación del juicio, que es una actitud, al aprendizaje de la virtud, basado en las conductas, el paso imperceptible. El punto de partida y el punto de llegada se sitúan igualmente en el plano moral. Ahí se perfila para Montaigne una jerarquía de valores, entre los que el amor a la verdad aparece en un lugar destacado”. 7.

(32) 29 [...] referente a tres puntos comunes de Juana de Lestonnac con Miguel de Montaigne permite concluir que la Fundadora de la Orden de Nuestra Señora, es deudora de una herencia humanista, claramente definida. Su visión optimista del mundo le hace sintonizar con las fuerzas vivas, que animan la primavera de la existencia; su sentido de la persona humana le abre a los problemas de sus semejantes, mientras que sus disposiciones reales a la “honradez” la empujan en favor de la humanidad que hay que poner de pie. (SOURY-LAVERGNE, 1984, p. 62). 2.2.2. Protestante. O fato de Joana de Lestonnac ter tido sua primeira educação na casa de seu tio Thomas já possibilita a reflexão sobre algum tipo de influência calvinista. Ela vai viver com os tios aproximadamente aos sete anos e retorna a casa de seus pais mais ou menos aos 12 anos. Segundo Soury-Lavergne (1984), Lutero defendia a escola, o que supunha uma valorização da instrução. Argumentava que a mesma deveria ser tanto para os meninos como para as meninas, e ainda, que a instrução deveria estar combinada com as exigências da vida concreta. Argumentava também sobre a educação como “bem público”, assim, pode-se perceber a influência da reforma protestante na educação naquela época. Quando Santa Joana plasma sua obra educativa, algumas ideias do Calvinismo lhe chamam a atenção: El puesto otorgado a la mujer atrae su atención. Ha conocido a las “Damas reformadas”, discípulas de Calvino, que se afanan con ardor por extender su doctrina... De ahí surge la necesidad que experimenta de crear una obra que las mujeres no teman tomar palabra y mostrar los tesoros del conocimiento a las futuras madres de familia. (SOURYLAVERGNE, 1984, p. 75). As experiências vividas por Joana através do contato com as mestras calvinistas possibilitam que ela elabore sua proposta educativa, pegando o que tem de valor para seu projeto. El sentido en el que “la Instrucción” será el fin de la Compañía de María Nuestra Señora, se parece mucho al que anima a los educadores de la Reforma.... Al leer la Fórmula de las Clases, elaborada por Juana de Lestonnac, el lector queda impresionado por ciertas coincidencias de términos, con los de la introducción a la reseña del Colegio de Rive. (SOURY-LAVERGNE, 1984, p. 67). Outros exemplos serão:.

Referências

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