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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS CURSO DE DOUTORADO EM LETRAS MARIA TERESA RABELO RAFAEL

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

CURSO DE DOUTORADO EM LETRAS

MARIA TERESA RABELO RAFAEL

CAMPO EDITORIAL E CIRCULAÇÃO DA LITERATURA DE AUTORIA AFRICANA DE LÍNGUA FRANCESA NO BRASIL: UM ESTUDO DE CASO DAS ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO EM ALÁ E

AS CRIANÇAS-SOLDADOS, DE AHMADOU KOUROUMA

JOÃO PESSOA 2019

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MARIA TERESA RABELO RAFAEL

CAMPO EDITORIAL E CIRCULAÇÃO DA LITERATURA DE AUTORIA AFRICANA DE LÍNGUA FRANCESA NO BRASIL: UM ESTUDO DE CASO DAS ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO EM ALÁ E

AS CRIANÇAS-SOLDADOS, DE AHMADOU KOUROUMA

Tese de Doutoramento de Maria Teresa Rabelo Rafael, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba como requisito final para obtenção do título de Doutora em Letras.

Área de concentração: Literatura, Cultura e Tradução

Linha de pesquisa: Tradução e Cultura

Orientadora: Profª. Drª. Marta Pragana Dantas

JOÃO PESSOA 2019

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R136c Rafael, Maria Teresa Rabelo.

Campo editorial e circulação da literatura de autoria africana de língua francesa no Brasil: um estudo de caso das estratégias de tradução em Alá e as

crianças-soldados, de Ahmadou Kourouma / Maria Teresa Rabelo Rafael. - João Pessoa, 2019.

181 f. : il.

Orientação: Marta Pragana DANTAS.

Tese (Doutorado) - UFPB/CCHLA.

1. Campo Editorial Brasileiro. 2. Literatura de Autoria Africana de Língua Francesa. 3. Allah n'est pas obligé.

4. Ahmadou Kourouma. 5. Tradução. I. DANTAS, Marta Pragana. II. Título.

UFPB/CCHLA

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MARIA TERESA RABELO RAFAEL

CAMPO EDITORIAL E CIRCULAÇÃO DA LITERATURA DE AUTORIA AFRICANA DE LÍNGUA FRANCESA NO BRASIL: UM ESTUDO DE CASO DAS ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO EM ALÁ E

AS CRIANÇAS-SOLDADOS, DE AHMADOU KOUROUMA

AGRADECIMENTOS

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer imensamente à minha excelente orientadora, Profa. Dra. Marta Pragana Dantas, que, durante toda a elaboração desta tese, ocupou um papel de bússola, não apenas determinando direções, mas também me ajudando a construir significados críticos sobre o presente estudo.

À CAPES, pela bolsa concedida.

Aos funcionários do Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba, pela permanente atenção, disposição e presteza.

Aos professores do Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba, pelo aprendizado inconteste.

À professora Wiebke Roben de Alencar Xavier e ao professor Roberto Carlos de Assis, pelas relevantes contribuições dadas no exame de qualificação do presente trabalho.

Gostaria de continuar agradecendo aos professores Xavier Garnier, da Université Sorbonne Nouvelle Paris 3, e Gisèle Sapiro, da École des Hautes Études en Sciences Sociales, por terem permitido minha participação em alguns dos seus cursos na França.

Aos responsáveis das editoras Gryphus, Kapulana, Pallas e Estação Liberdade, as quais, quando solicitados, forneceram informações úteis para a pesquisa.

Gostaria ainda de agradecer aos ex-Presidentes da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, os quais facilitaram e estimularam o acesso de milhares de brasileiros ao Ensino Superior.

Por fim, agradeço a minha família, por compreender minhas ausências durante estes quatro anos de pesquisa.

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DEDICATÓRIA

Dedico o esforço e os resultados obtidos neste trabalho de pesquisa a todos aqueles que têm a teimosia e a coragem de acreditar na educação.

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RESUMO

No âmbito das trocas culturais internacionais, pensar o fluxo literário que ocorre hoje na relação África-Brasil é um aspecto importante, para compreender o quão desprotegido é o intercâmbio entre esses dois territórios. Diante desse contexto, a presente pesquisa tem por objetivo analisar as problemáticas que envolvem a circulação da literatura de escritores africanos de língua francesa no Brasil, desdobrando-se sobre o estudo de caso da tradução brasileira do romance Allah n’est pas obligé (2000), do escritor marfinense Ahmadou Kourouma. Os parâmetros metodológicos utilizados partiram dos catálogos de onze editoras, seis independentes (Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade) e cinco grupos editoriais (Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e Melhoramentos), as quais serviram de base para o estudo em torno da origem linguística das obras, do volume de traduções, da sub-representação da produção africana feminina e, por fim, do caminho percorrido por tais obras até a publicação no Brasil. No que diz respeito à tradução, foram dadas ênfases aos elementos paratextuais e às estratégias utilizadas para traduzir os vocabulários, as expressões culturalmente marcadas e os saberes populares da língua malinquê para o texto de chegada. A pesquisa mostrou que, dentro do total de cento e vinte e duas obras identificadas no presente estudo, nove são de língua francesa, o que equivale a 7%

das publicações. Esse resultado revelou o lugar marginal que ocupam essas textualidades no Brasil. Ademais, identificou-se que essa realidade é ainda mais problemática, quando sabido que, das nove obras, apenas uma é de autoria africana feminina. Quanto à análise tradutológica, chegou-se a conclusão de que, ao subverter o português à norma e à lógica da língua/cultura malinquê, a tradução brasileira se distanciou de uma perspectiva domesticadora, em que os traços culturais e linguísticos da língua de origem são adaptados à língua/cultura de chegada.

Palavras-Chave: Campo Editorial Brasileiro. Literatura de Autoria Africana de Língua Francesa. Allah n’est pas obligé. Ahmadou Kourouma. Tradução.

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RÉSUMÉ

Dans le contexte des échanges culturels internationaux, réfléchir au courant littéraire qui se produit aujourd'hui dans les relations entre l'Afrique et le Brésil est un aspect important pour comprendre à quel point les échanges entre ces deux territoires sont sans protection. Dans ce contexte, la présente recherche a pour objectif d’analyser les problèmes liés à la circulation de la littérature d’écrivains africains francophones au Brésil, en développant l’étude de la traduction brésilienne du roman Allah n’est pas obligé (2000), de l’écrivain ivoirien Ahmadou Kourouma. Les paramètres méthodologiques utilisés sont issus des catalogues de onze éditeurs, six indépendants (Pallas, Kapulana, Nandyala, General Language, Gryphus et Estação Liberdade) et cinq groupes éditoriaux (Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo et Melhoramentos) et ont servi d’appui à l'étude autour de l'origine linguistique des œuvres, du volume de traductions, de la sous-représentation de la production des femmes africaines et, enfin, du chemin parcouru par ces œuvres jusqu'à leur publication au Brésil. En ce qui concerne la traduction, l'accent a été mis sur les éléments et stratégies paratextuels utilisés pour traduire les vocabulaires, les expressions et les croyances populaires de la langue malinké dans le texte de l'arrivée. Les recherches ont montré que sur un total de cent vingt- deux œuvres recensés dans la présente étude, neuf sont francophones, ce qui équivaut à 7%

des publications. Ce résultat a révélé la place marginale que ces textualités occupent au Brésil.

En outre, il a été identifié que cette réalité est encore plus problématique quand on sait que sur les neuf œuvres, une seule est de l’auteur africain féminin. En ce qui concerne l’analyse de la traduction, il a été conclu qu’en soumettant le portugais à la norme et à la logique de la langue/culture malinké, la traduction brésilienne s’éloignait d’une perspective de domestication dans laquelle les traits culturels et linguistiques de la langue source sont adaptés à la langue/culture d'arrivée.

Mots-clés: Champ editorial brésilien. Littérature d’auteurs africains francofones. Allah n’est pas obligé. Ahmadou Kourouma. Traduction.

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ABSTRACT

Within the scope of international cultural exchanges, thinking about the current literary flow in the Africa-Brazil interface is an important aspect to understand how unprotected the exchange between these territories is. In light of this context, the purpose of this research is to analyse issues related to the movement of Francophone African literature in Brazil, with focus on the translation of the novel Allah n’est pas obligé, written by Ahmadou Kourouma, from Ivory Coast. The methodological parameters used were taken from eleven publishing houses, six of them independent publishing houses (Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus, and Estação Liberdade), and five publishing groups (Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo, and Melhoramentos), which provided the basis for this study on the linguistic origin of literary works, translation volume, underrepresentation of African woman’s literary production and, ultimately, their journey until they were published in Brazil. Regarding the translation, the emphasis has been placed on paratextual elements, as well as on strategies used for translating vocabulary, expressions, and popular beliefs of Malinke language to target text. The research showed that from a total of one hundred and twenty-two works identified in this study, only nine were in French, which accounts for 7% of publications. This result revealed the marginal position occupied by these textualities in Brazil. Moreover, it was identified that this reality is even more problematic when we consider that from these nine works, only one was written by a female African author. As for the translation analysis, the conclusion was that, by subverting Portuguese to the norm and logic of Malinke language/culture, the Brazilian translation distanced itself from a domesticating perspective in which the cultural and linguistic traits of source language are adapted to the target language/culture.

Keywords: Brazilian Publishing Field. Francophone African Literature. Allah n’est pas obligé. Ahmadou Kourouma. Translation.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Edição francesa de bolsoda obra Allah n’est pas obligé (Seuil) ...116 Figura 2 - Edição brasileira da obraAlá e as crianças-soldados (Estação Liberdade) ...116

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Origem linguística das obras de autoria africana publicadas pelas editoras independentes Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade (2000-2015) ... 42 Gráfico 2 - País da primeira edição das obras de autoria africana publicadas no Brasil pelas

editoras independentes Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade (2000-2015)... 48

Gráfico 3 - Proporção entre escritores e escritoras de autoria africana

pelas editoras independentes Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade (2000-2015) ... 53 Gráfico 4 - Repartição de gêneros literários nos catálogos das editoras independentes

Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade

(2000- 2015) ... 55 Gráfico 5 - Número de títulos de autoria africana publicadas pelas editoras

independentes Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade (2000-2015) ... 57 Gráfico 6 - Origem linguística das obras de autoria africana publicadas pelos grupos Editoriais ... 68 Gráfico 7 - País da primeira edição das obras de autoria africana publicadas no Brasil pelos grupos editoriais Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e

Melhoramentos (2000-2015) ... 76 Gráfico 8 - Proporção entre escritores e escritoras de autoria africana pelos grupos editoriais Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e Melhoramentos

(2000-2015) ... 78 Gráfico 9 - Repartição de gêneros literários nos catálogos dos grupos editoriais

Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e Melhoramentos

(2000-2015) ... 79 Gráfico 10 - Número de títulos de autoria africana publicadas pelos grupos editoriais

Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e Melhoramentos

(2000-2015) ... 80 Gráfico 11 - Origem linguística das obras de autoria africana publicadas pelas editoras (2000-2015) ... 84 Gráfico 12 - País da primeira edição das obras de autoria africana publicadas no

Brasil pelas editoras (2000-2015) ... 87 Gráfico 13 - Obras publicadas em coedição (2000-2015) ... 87 Gráfico 14 - Proporção entre escritores e escritoras de autoria africana presentes nos

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catálogos das editoras (2000-2015) ... 89 Gráfico 15 - Repartição de gêneros literários presentes nos catálogos das editoras

(2000-2015) ... 89 Gráfico 16 - Número de títulos de autoria africana publicados pelas editoras

(2000-2015) ... 90

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Obras publicadas na coleção Vozes da África da editora Kapulana ... 37

Quadro 2 - Obras publicadas na coleção Para ler África da editora Nandyala ... 37

Quadro 3 - Obras publicadas na coleção Mama África da editora Língua Geral ... 38

Quadro 4 - Obras publicadas na coleção Ponta de Lança da editora Língua Geral ... 38

Quadro 5 - Obras publicadas na coleção Série Geral da editora Língua Geral ... 39

Quadro 6 - Número de traduções e de obras de língua portuguesa pelas editoras independentes Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade (2000-2015)... 41

Quadro 7 - Obras de escritores africanos de língua portuguesa publicadas pelas editoras independentes Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral e Gryphus (2000-2015) ... 44

Quadro 8 - Obras de escritores africanos de língua francesa publicadas pelas editoras independentes Pallas e Estação Liberdade (2000-2015) ... 47

Quadro 9 - Características referentes às editoras independentes e aos grupos editoriais...65

Quadro 10 - Número de traduções e de obras de língua portuguesa pelos grupos editoriais Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e Melhoramentos (2000-2015) ... 67

Quadro 11 - Obras de escritores africanos de língua inglesa publicadas pelos grupos editoriais Companhia das Letras, Ediouro e Globo (2000-2015) ... 68

Quadro 12 - Obras de escritores africanos de língua francesa publicadas pelos grupos editoriais Companhia das Letras e Record (2000-2015) ... 71

Quadro 13 - Obras de escritores africanos de língua árabe publicadas pelos grupos editoriais Companhia das Letras e Record (2000-2015) ... 71

Quadro 14 - Obras de escritores africanos de língua portuguesa publicadas pelos grupos editoriais Companhia das Letras, Record, Ediouro e Melhoramentos (2000-2015) ... 72

Quadro 15 - Número de traduções e de obras de língua portuguesa por editoras (2000-2015) ... 82

Quadro 16 - Obras de escritores africanos de língua francesa publicadas pelas editoras (2000-2015)...85

Quadro 17 - Obras premiadas de Ahmadou Kourouma ... 95

(14)

Quadro 18 - Contracapa da versão francesa e da versão brasileira ... 118

Quadro 19 - Orelhas da edição brasileira ... 119

Quadro 20 - Dedicatória da versão francesa e da versão brasileira ... 121

Quadro 21 - Posfácio da edição francesa ... 122

Quadro 22 - Posfácio da edição brasileira ... 123

Quadro 23 - Palavras traduzidas que receberam notas da tradutora ... 126

Quadro 24 - Palavras que permaneceram com a mesma escrita do texto de partida e receberam notas da tradutora ... 128

Quadro 25 - Abreviações que permaneceram com a mesma escrita do texto de partida e receberam notas da tradutora ... 130

Quadro 26 - Tradução dos nomes próprios...136

Quadro 27 - Tradução dos vocabulários oriundos da cultura malinquê ... 137

Quadro 28 - Tradução das expressões culturalmente marcadas pertencentes à cultura malinquê ... 145

Quadro 29 - Tradução dos saberes populares pertencentes à cultura malinquê ... 147

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AEMO Associação dos Escritores Moçambicanos

APE CNPq

Associação Portuguesa de Escritores

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CPLP Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

FLIAFRO FMI FUVEST

Festa Literária de Expressões Indígenas, Africanas e Afro-brasileiras Fundo Monetário Internacional

Fundação Universitária para o Vestibular FNLIJ

IES

Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil Instituições de Ensino Superior

LIBRE

LICAFRO OSESP UNICAMP UFC UFF UFPB UFRB SNEL USP

Aliança Internacional dos Editores Independentes e da Liga Brasileira de Editoras

Laboratório de Literaturas e Culturas Africanas e da Diáspora Negra Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo

Universidade Estadual de Campinas Universidade Federal do Ceará Universidade Federal Fluminense Universidade Federal da Paraíba

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia Sindicato Nacional dos Editores de Livros Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 16

2 A CIRCULAÇÃO DA LITERATURA DE AUTORIA AFRICANA NO BRASIL ... 24

2.1 CIRCULAÇÃO E AUTORIA AFRICANA: DISCUTINDO CONCEITOS...25

2.2 AS EDITORAS INDEPENDENTES ... 28

2.2.1 As editoras Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua Geral, Gryphus e Estação Liberdade ... 32

2.2.1.1 As linhas editoriais ... 33

2.2.1.2 As coleções voltadas à produção literária de autoria africana ... 36

2.2.1.3 O perfil dos editores ... 39

2.2.2 A visibilidade dos escritores africanos lusófonos ... 41

2.2.3 Portugal e Brasil como centros editoriais das obras de língua portuguesa ... 47

2.2.4 A Sub-representação da produção feminina africana ... 52

2.2.5 O Romance como gênero mais contemplado nos catálogos e a literatura infantil em alta ... 54

2.2.6 A implementação da Lei 10.639/2003 e o maior número de publicações de autoria africana ... 56

2.3 OS GRUPOS EDITORIAIS ... 58

2.3.1 Os grupos editoriais Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e Melhoramentos ... 60

2.3.1.1 As linhas editoriais ... 60

2.3.1.2 O perfil dos editores ... 64

2.3.2 O financiamento das traduções ... 66

2.3.3 Estados Unidos e França como centros editoriais das obras de língua inglesa e francesa, respectivamente ... 75

2.3.4 A sub-representação da produção feminina africana ... 77

2.3.5 O romance como gênero mais contemplado nos catálogos ... 79

2.3.6 O número de publicações de autoria africana ... 80

3 A INVISIBILIDADE DA FICÇÃO DE AUTORIA AFRICANA DE LÍNGUA FRANCESA NO BRASIL ...82

4 UM OLHAR SOBRE O ROMANCE ALLAH N’EST PAS OBLIGÉ ... 92

4.1 A TRAJETÓRIA LITERÁRIA DE AHMADOU KOUROUMA ... 92

4.2 AHMADOU KOUROUMA NO BRASIL...96

(17)

4.2.1 Notas sobre a tradutora Flávia Nascimento...97

4.3 A VIOLÊNCIA NA ESCRITA DE AHMADOU KOUROUMA ... 99

4.4 A INSERÇÃO DA LÍNGUA MALINQUÊ NA NARRATIVA...105

5 ESTRATÉGIAS TRADUTÓRIAS EM ALÁ E AS CRIANÇAS-SOLDADOS ...111

5.1 TRADUÇÃO DOMESTICADORA E ESTRANGEIRIZADORA: DISCUTINDO CONCEITOS...112

5.2 O TRATAMENTO DADO AOS ELEMENTOS PARATEXTUAIS ... 114

5.2.1 Paratextos editoriais (capa, folha de rosto, contracapa, orelha do livro, dedicatória e posfácio) ... 115

5.2.2 Notas de rodapé da tradutora ... 123

5.3 O TRATAMENTO DADO AOS ASPECTOS LINGUÍSTICOS E CULTURAIS DA LÍNGUA MALINQUÊ ... 134

5.3.1 Vocabulário ... 134

5.3.2 Expressões culturalmente marcadas ... 143

5.3.3 Saberes populares ... 146

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 149

REFERÊNCIAS ... 154

APÊNDICE A - Catálogo da editora Pallas ... 161

APÊNDICE B – Catálogo da editora Kapulana ... 162

APÊNDICE C – Catálogo da editora Nandyala ... 163

APÊNDICE D - Catálogo da editora Língua geral ... 164

APÊNDICE E – Catálogo da editora Gryphus ... 165

APÊNDICE F – Catálogo da editora Estação Liberdade ... 166

APÊNDICE G – Catálogo da editora Companhia das Letras ... 167

APÊNDICE H – Catálogo da editora Record ... 169

APÊNDICE I – Catálogo da editora Ediouro ... 170

APÊNDICE J – Catálogo da editora Globo ... 171

APÊNDICE L – Catálogo da editora Melhoramentos ... 172

APÊNDICE M – Obras premiadas dos catálogos das editoras independentes Pallas, Kapulana, Nandyala, Língua geral, Gryphus e Estação Liberdade ... 173

APÊNDICE N – Obras premiadas dos catálogos dos grupos editoriais Companhia das Letras e Ediouro ... 176

(18)

Toda a dificuldade para compreender o funcionamento desse universo literário é, de fato, admitir não serem suas fronteiras, suas capitais, suas vias e suas formas de comunicação completamente passíveis de serem sobrepostas às do universo político e econômico. (CASANOVA, 2002, p.

25).

(19)

1 INTRODUÇÃO

Não pode continuar o seu estudo [estudos africanistas] afastado de nossos currículos, como se fosse matéria exótica. Ainda que disto não tenhamos consciência, o obá do Benim ou o angola a quiluanje estão mais próximos de nós do que os antigos reis da França (SILVA, 2003, p. 240).

As relações históricas e culturais que unem o Brasil e vários países da África, derivadas notadamente do passado colonial e do período da escravidão, contrastam com um intercâmbio literário ainda bastante vulnerável. Diante desse contexto, a promoção de tratados internacionais e políticas afirmativas implantadas pelo governo brasileiro, entre 1990 e 2016, constituem uma ação sem precedente, para promover um equilíbrio nas relações socioculturais entre essas duas áreas geográficas.

Nesta direção, um tratado que pode ser citado como exemplo consiste no Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, firmado em 1990, que tem por objetivo facilitar as trocas entre os países lusófonos através de um modelo ortográfico único. Essa relação linguisticamente multilateral foi também fortalecida com a criação, em 1994, da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), que objetiva promover a cooperação entre Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

Outro elemento importante que passou a contribuir para o fortalecimento das relações entre o Brasil e alguns países africanos foi a implementação dos Parâmetros Curriculares Nacionais na educação básica. Esse referencial pedagógico, que também data da década de 90 do século XX, tem por objetivo normatizar alguns aspectos concernentes às diferentes disciplinas escolares. Um dos diversos temas transversais que o compõe é, justamente, o conteúdo sobre a pluralidade cultural brasileira e seus laços históricos com o continente africano.

É também de grande relevância a contribuição da Lei 10.639/2003, sancionada no Governo do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a qual determina a inclusão, no currículo do ensino fundamental e médio brasileiro, em especial nas áreas de Educação Artística, de

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Literatura e História Brasileira, de conteúdos de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana1.

Conforme afirmam as pesquisadoras Rita Chaves e Tânia Macêdo (2007), essas medidas, de alcance nacional e internacional, resultaram em um maior número de publicações de obras de autoria africana no Brasil. Isso significa dizer que os estudos africanos ganharam novos espaços, graças ao desempenho do país em resgatar uma memória que permaneceu esmaecida (CHAVES; MACÊDO, 2007).

Corroborando com essa constatação, pode-se destacar o uso de obras de escritores africanos2 no currículo escolar, em cursos de especialização e aperfeiçoamento de professores, além da inclusão de romances de escritores africanos em processos seletivos nacionais para acesso ao ensino superior, como o vestibular da Fundação Universitária para o Vestibular (Fuvest) e o da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), as quais trabalharam, em 2016 e 2017, com análise literária dos romances Mayombé, do angolano Pepetela, e Terra sonâmbula, do moçambicano Mia Couto, respectivamente.

No campo acadêmico, não é diferente, haja vista a oferta de disciplinas da grade curricular de Licenciatura em Letras Vernácula de algumas Instituições de Ensino Superior (IES) que são voltadas ao estudo dessas produções literárias. Apenas a título de exemplo, pode-se citar a Universidade Federal da Paraíba (UFPB), com a disciplina obrigatória Literaturas Africanas em Língua Portuguesa, e a Universidade Federal do Ceará (UFC), com a disciplina obrigatória de mesmo nome, além da optativa intitulada Tópicos de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa. Ademais, os estudos críticos voltados às obras de autoria africana, sobretudo às de língua portuguesa, vêm também se consolidando no Brasil, através da criação de programas de pós-graduação, como o Programa de Pós-graduação em Letras da UFPB, o qual foi responsável pelo primeiro programa da região Nordeste a ter um projeto pioneiro de pesquisa dedicado aos diálogos poéticos entre as literaturas de autoria africana e

1 Essa lei foi modificada em 2008 pela Lei n°11.645, com a proposta de acrescentar conteúdos sobre a participação dos povos indígenas na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política do Brasil. É necessário destacar ainda que em setembro de 2016, com a edição da Medida Provisória 746/2016 que foi convertida no Projeto de Lei n. 34/2016, implantada no governo ilegítimo de Michel Temer, a legislação anterior (a Lei nº 10.639/2003) foi revogada. Isso significa dizer que os conteúdos de educação que fazem referências às relações etnico-raciais não são mais obrigatórios nos estabelecimentos escolares. Consequentemente, a proposta de uma educação baseada na diversidade foi, novamente, colocada como algo secundário no Brasil.

2 No presente trabalho entende-se por escritor africano aquele que nasceu em algum país da África. Como será discutido mais adiante, muitos dos escritores africanos com obras publicadas no Brasil nasceram em um país africano mas emigraram para europa ou para os Estados Unidos, ora para fazer estudos superiores ora para morar definitivamente. Sendo assim, embora sejam escritores que na grande maioria não vivam mais no continente africano, suas escritas dialogam de alguma forma com o seu contexto de origem.

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brasileira, o Centro de Estudos Africanos da Universidade de São Paulo (USP), o Grupo de Estudos de Literaturas e Culturas Africanas da Unicamp e o Grupo de Pesquisa em Literaturas Africanas, História e Pós-Colonialismo da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), entre outros.

Essa abertura, no Brasil, ao estudo sobre as obras literárias de escritores africanos é ainda mais relevante, quando se considera que:

[...] a população brasileira de origem africana representa provavelmente a metade da população nacional. Ela, assim e sem dúvida, constitui a mais vasta comunidade da diáspora africana, exercendo uma profunda influência cultural sobre a população de origem não africana. (MAZRUI, 2010, p. 867).

Mesmo considerando que tais avanços favorecem a circulação da literatura de autoria africana, estas obras ainda encontram fortes obstáculos, para se consolidarem nas livrarias brasileiras, por não estarem inseridas em uma rota prioritária de publicação. Essa dificuldade pode ser melhor compreendida, quando sabido que a maioria dos livros publicados no Brasil são escritos por pessoas não negras, sejam elas brasileiras ou estrangeiras (CARRASCOSA, 2017).

Diante desse contexto, parte-se da hipótese de que a circulação da literatura de autoria africana de língua francesa sofre mais obstáculos, para ser publicada no Brasil, quando se compara com as outras obras de escritores africanos de línguas centrais. Por essa razão, o presente estudo tem como objeto de pesquisa analisar as problemáticas que envolvem a circulação da literatura de escritores africanos de língua francesa no Brasil, desdobrando-se sobre o estudo de caso da tradução brasileira do romance Allah n’est pas obligé (2000), do escritor marfinense Ahmadou Kourouma.

Para isso, foi realizado um levantamento sobre as editoras que publicam obras de escritores africanos. Inicialmente, buscou-se selecionar editoras das mais variadas regiões, para obter um panorama geral do que vem sendo publicado no Brasil, em termos de literatura de autoria africana. Infelizmente, a região Sudeste exerce uma supremacia inconteste, realidade constatada inclusive em relação às editoras independentes. Em seguida, foram eliminadas tanto editoras que tinham em seus catálogos obras que não compreendiam o recorte temporal proposto, como foi o caso da editora Ática, que publicou autores africanos durante a década de setenta do século XX, como também as que tinham editado um número

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inferior a duas obras, entrando aqui as editoras Matrix3, Vieira & Lent4 Geração editorial5, Foz6, Editora FTD7, L&PM Editores8 e Berlendis & Vertecchia9.

Sendo assim, no âmbito desta pesquisa, de um total de dezoito editoras identificadas no levantamento, foram selecionadas para tratar mais de perto as onze com maior número de publicações: seis independentes (Pallas, Língua Geral, Gryphus, Kapulana, Nandyala e Estação Liberdade) e cinco grupos editoriais (Companhia das Letras, Record, Ediouro, Globo e Melhoramentos). Esse recorte foi escolhido, por possibilitar estabelecer comparações entre catálogos de editoras que são regidos por políticas editoriais diferentes, constituindo, portanto, uma contribuição para o mercado editorial brasileiro e para os estudos sobre literatura de autoria africana, uma vez que analisa o papel das referidas editoras na divulgação dessa produção literária.

Essa análise terá como amparo metodológico o estudo dos catálogos, por eles serem o resultado das políticas editoriais das editoras, o que permitirá problematizar as características, tendências e assimetrias referentes à circulação da literatura de autoria africana de língua francesa no Brasil. Diante disso, serão norteadores, para a presente pesquisa, algumas pistas de reflexão sobre:

 O lugar que as editoras ocupam no mercado editorial brasileiro e o perfil de suas linhas editoriais;

 A existência ou não de coleções voltadas à produção literária de autoria africana;

 A origem linguística das obras e o volume reservado às traduções;

 Os escritores e os gêneros literários contemplados;

 O caminho percorrido por essas obras até a publicação no Brasil;

 A (in)visibilidade da produção africana feminina;

 O volume de obras publicadas entre 2000 e 2015.

O recorte temporal da presente pesquisa compreenderá obras publicadas (traduzidas ou não) entre 2000 e 2015. Tal delimitação busca contemplar três anos que antecederam a entrada em vigor da Lei 10.639/2003 até o ano em que iniciamos o levantamento deste estudo,

3 Com publicação da obra A caçada real (2011), de Zetho Cunha Gonçalves.

4 Com publicação da obra O primeiro amor é sempre o último (2002), de Tahar Ben Jelloun, tradução de Joana Angélica d’Avila Melo. Vale destacar que em dezembro de 2017 a Vieira & Lent encerrou suas atividades editoriais e comerciais. Mas o saldo do catálogo continua a ser comercializado pela editora Mauad.

5 Com publicação da obra O Leão e a Joia (2012), de Wole Soyinka, tradução de William Lagos.

6 Com publicação da obra Teoria Geral do Esquecimento (2012), de José Eduardo Agualusa.

7 Com publicação da obra A Montanha da Agua Lilas - Fabula para Todas as Idades (2013), de Pepetela.

8 Com publicação da obra O Ladrão e os Cães (2008), de Naguib Mahfuz, tradução de Ana Ban.

9 Com publicação da obra Miramar (2003), de Naguib Mahfuz, tradução de Safa Abou Chahla Jubran.

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cobrindo, assim, doze anos de vigência da nova legislação. Isso permitiu, entre outras coisas, perceber os efeitos da mudança no dispositivo legal sobre a circulação dessa produção literária no Brasil. O período escolhido se justifica, à medida que a lei citada resulta de uma política afirmativa que promoveu a diversidade cultural, ao dar luz à produção literária e historiográfica de autoria africana e afro-brasileira.

Em relação à análise tradutológica, buscou-se selecionar uma obra dotada de aspectos linguísticos e culturais do contexto africano que se distancie dos padrões canônicos e dominantes e, consequentemente, levante problemáticas em torno do discurso heterogêneo inerente à tradução minorizante (VENUTI, 2002). Das nove obras10 de autoria africana de língua francesa identificadas na pesquisa, apenas o romance Allah n’est pas obligé (2000), de Ahmadou Kourouma, faz uso de um hibridismo linguístico e cultural, fruto da mistura de um francês coloquial com vocabulários, expressões culturalmente marcadas e saberes populares oriundos da língua/cultura malinquê.

Sendo a língua o recurso específico com ou contra o qual se inventarão soluções à dominação literária (CASANOVA, 2002), este embate linguístico presente na escrita de Ahmadou Kourouma demonstrará, através da análise tradutológica, como o escritor modificou a língua francesa, para lidar com o contexto africano, transformando sua escrita em uma crítica do modelo literário europeu.

Esse estudo de caso se justifica por três razões: primeiro, por propor uma análise de uma obra de língua francesa que faz parte do nosso corpus. Segundo, porque, através dessa análise, foi possível apreender tanto os mecanimos editoriais utilizados para promover essa obra no Brasil, como verificar as escolhas tradutológicas adotadas na tradução de aspectos da língua e da cultura malinquê para o texto de chegada. Terceiro, pela escassez de estudos referentes à literatura da região subsaariana de expressão francesa, mais precisamente a respeito de Ahmadou Kourouma. Apesar de ser um escritor amplamente estudado na Europa, no Canadá e em países africanos, no Brasil, poucos trabalhos acadêmicos foram voltados a sua produção literária. Nesse sentido, uma abordagem sobre a tradução da obra Allah n’est pas obligé se torna importante para a própria constituição do campo de estudo das literaturas de autoria africana.

10 As outras oito obras de autoria africana de língua francesa identificadas na presente pesquisa foram: L’enfant noir (1953), de Camara Laye, Esclaves (2009), de Kangni Alem, Contours du jour qui vient (2006), de Léonora Miano, Topographie idéale pour une agression caractérisée (1975), de Rachid Boudjedra, Partir (2006), Les raisins de la galère (1996), Le Bonheur conjugale (2012) e Le dernier ami (2004), todos esses últimos quatro de Tahar Ben Jelloun.

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Quanto à análise propriamente dita, será verificado, inicialmente, o tratamento dado aos elementos paratextuais, para que, dessa forma, seja possível identificar o processo de autenticação e legitimação da obra no contexto de chegada. Em seguida, será analisado se determinados itens lexicais e culturais do contexto africano foram mantidos no texto em português, ou se foram traduzidos, seguindo a estratégia da domesticação do texto literário, em que as marcas "estranhas" do texto são apagadas e o mesmo passa a apresentar uma sintaxe linear, um sentido unívoco, uma linguagem contemporânea e uma consistência lexical (VENUTI, 2002).

No que diz respeito ao embasamento teórico da pesquisa, para compreender os agentes de intermediação e os tipos de exigências políticas, econômicas e culturais que regem as trocas literárias entre o Brasil e alguns países africanos, será utilizado o aporte teórico da sociologia dos campos de Pierre Bourdieu (2002), por ele explorar a mediação entre as obras e as condições sociais de sua produção. A pertinência de adotar a noção de campo para o presente estudo se justifica, à medida que o campo não reduz a literatura ao texto, ao contrário, ele permite compreender as relações entre os atores literários como fenômeno social, o que significa analisar e problematizar as relações invisíveis que estão por trás das relações com os atores, dando visibilidade às lutas de poder (JURT, 2015). Logo, por meio dessa perspectiva analítica, será permitido compreender as relações hierárquicas e de força que regem as relações entre o campo editorial brasileiro e os campos internacionais, sejam eles europeus, americano e/ou africanos.

Além do conceito de campo literário desenvolvido por Pierre Bourdieu, serão também utilizadas as inflexões que lhe vêm sendo dadas da área da Sociologia da Literatura. As contribuições partirão dos estudos de Pascale Casanova (2002), que analisa as desigualdades existentes na distribuição do capital literário, considerando o universo literário intermediado pelo universo político, econômico e ideológico, e de Gisèle Sapiro (2014), que problematiza as condições externas relacionadas à produção e circulação das obras literárias. O uso desse referencial teórico nos ajudará a compreender, por exemplo, o interesse das editoras em publicar obras de escritores africanos premiados internacionalmente, o maior volume de obras de língua portuguesa, as dificuldades das independentes em financiar obras traduzidas, entre outras problemáticas que surgiram ao longo da pesquisa.

Para embasar a análise da tradução de Allah n’est pas obligé para o português brasileiro, será utilizado o aporte teórico de Gérard Genette (1987), de forma a fundamentar o

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estudo sobre o lugar pragmático e estratégico ocupado pelos paratextos. Já para refletir sobre as escolhas tradutológicas referentes à tradução dos aspectos culturais em língua malinquê, serão norteadores os conceitos de tradução estrangeirizadora e domesticadora, de Lawrence Venuti (2002), e o conceito de ética positiva, de Antoine Berman (2007).

Vale destacar que a presente pesquisa é tributária dos trabalhos de diversos pesquisadores que têm se debruçado nas relações literárias de autoria africana, como o moçambicano Francisco Noa, a portuguesa Ana Mafalda Leite e os franceses Claire Ducournau e Raphaël Thierry. Sobre as transferências literárias entre o continente africano e o Brasil, pelo fato de a literatura de autoria africana de língua portuguesa, principalmente de Angola e Moçambique, estar mais consolidada no Brasil, os estudos de especialistas brasileiras, como Rita Chaves, Tania Macêdo, Carmen Tindó Secco, entre outros, ocupam um lugar importante na nossa referência bibliográfica.

Mais precisamente no que diz respeito à análise tradutológica do romance de Ahmadou Kourouma, o presente trabalho é devedor dos esforços de diversos outros pesquisadores brasileiros que se voltaram a sua produção literária. Apenas para destacar alguns exemplos, a tese Les soleils des indépendances: da sociedade sólida ao prelúdio dos laços efêmeros (2007), de Maria Suzana Moreira do Carmo, que propôs uma análise sobre os aspectos estéticos e temáticos do referido romance, a fim de mostrar como a passagem da tradição à modernidade leva o indivíduo à reorganização de sua identidade.

Pode-se citar ainda a contribuição de três dissertações de mestrado, a primeira de Maria Sertã Padilha, Identidade e minoridade em Allah n’est pas obligé, de Ahmadou Kourouma (2016), que utilizou o conceito de "literatura menor", concebido por Gilles Deleuze e Félix Guattari, para o estudo do romance. A segunda é de Taiane Santi Martins, Vozes de Soba: História e memória, tradições e oralidade, releituras do período colonial na obra de Ahmadou Kourouma (2016), que verificou, a partir da obra Monnè, outrages et défis, qual o posicionamento do escritor em relação ao diálogo entre os campos da História e da Literatura e como isso influencia na composição de sua narrativa ficcional. Por último, a terceira dissertação, de autoria de Amarílis Macedo Lima Lopes de Anchieta, intitulada Tongue-tied: traduzindo os contos em guerra de Chinua Achebe (2014), propôs fazer uma tradução de alguns contos do escritor nigeriano, dando ênfase à sua escrita multicultural, fruto da mistura da língua africana igbo e da língua inglesa.

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Por fim, o texto se divide em seis capítulos. O primeiro compreende a presente introdução em que se destaca o contexto em que a pesquisa está inserida, os objetivos que foram trilhados, o caminho percorrido até chegar neles e o aporte teórico adotado nas análises.

No segundo capítulo, serão expostos, inicialmente, tanto a razão que nos levou a utilizar, no presente trabalho, o termo circulação e literatura de autoria africana, como o que se entende por editora independente e por grupo editorial. Em seguida, serão analisadas as características das onze linhas editoriais e o lugar que as editoras ocupam no mercado editorial brasileiro. Só depois, então, será lançada uma reflexão sobre a origem linguística das obras e o volume de traduções, o caminho percorrido pelas obras até a publicação no Brasil, a sub-representação da produção feminina africana, os gêneros literários contemplados nos catálogos e o volume de obras editadas entre 2000 e 2015.

O terceiro capítulo consistirá em problematizar a invisibilidade constatada nos catálogos das editoras independentes e nos catálogos dos grupos editoriais referentes às obras de autoria africana de língua francesa. Para isso, a análise partirá das pistas de reflexão utilizadas no capíitulo anterior.

Já no quarto capítulo, a atenção se voltará aos aspectos relacionados à trajetória literária de Ahmadou Kourouma, o caminho percorrido pelo escritor até ser publicado por prestigiosas editoras francesas e as premiações que lhes foram atribuídas pela sua vasta produção literária. Posteriormente, alguns aspectos serão destacados sobre suas obras traduzidas no Brasil e sobre a formação e as experiências proficionais da tradutora Flávia Nascimento. Por fim, serão tecidos alguns comentários a respeito da violência abordada no romance Allah n’est pas obligé e sobre o hibridismo linguístico e cultural presente nessa narrativa, fruto do uso da língua malinquê e da língua francesa coloquial.

O quinto capítulo consistirá no estudo de caso da tradução brasileira do romance Allah n’est pas obligé. De início, far-se-á a análise das notas do editor (capa, folha de rosto, contracapa, orelha do livro, dedicatória e posfácio) e da tradutora (inseridas em forma de rodapé). Por fim, será examinada a tradução para o português brasileiro de aspectos linguísticos e culturais da língua malinquê, tais como os vocabulários, as expressões culturalmente marcadas e os saberes populares.

O sexto e último capítulo compreenderá as considerações finais, em que se encontrará o balanço final sobre os dados obtidos e seus respectivos significados para a pesquisa.

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2 A CIRCULAÇÃO DA LITERATURA DE AUTORIA AFRICANA NO BRASIL De um lado o livro constitui um médium maior da difusão cultural. De outro, a edição é um espaço onde questões econômicas, políticas e culturais estão estreitamente imbricadas (SAPIRO, 2008, p. 228).

A proposta deste capítulo consistirá em apreender o lugar e os obstáculos à tradução de obras de autoria africana de língua francesa no Brasil. Para isso, foi realizado um levantamento de editoras que publicaram obras de autoria africana, entre 2000 e 2015. Desse levantamento, chegou-se a um corpus de onze editoras que serão analisadas mais de perto.

Através do estudo dos seus catálogos, será possível observar em que contexto as produções de língua francesa estão inseridas e que problemáticas elas levantam, quando se pensa, de uma forma global, nas obras de escritores africanos publicadas no mercado editorial brasileiro.

Inicialmente, serão discutidas as principais noções que balizam os conceitos de circulação e literatura de autoria africana utilizadas neste trabalho. Em seguida, será esclarecido o sentido atribuído às editoras independentes e aos grupos editoriais. Por fim, haverá um espaço de reflexão sobre o lugar que as onze editoras ocupam no mercado nacional e as características de suas linhas editoriais, de forma a compreender a demanda, o interesse e os obstáculos vinculados à circulação dessas literaturas no Brasil.

Do ponto de vista metodológico, foram elencados, inicialmente, os critérios para a seleção das editoras que entrariam no corpus de análise. Como dito na introdução, foram eliminadas editoras que publicaram menos de duas obras de autoria africana e também as que publicaram obras que não entravam no recorte temporal estabelecido para o presente estudo.

Uma vez selecionadas as editoras, foram construídas onze tabelas que armazenaram diversas informações relacionadas as cento e vinte e duas obras contempladas nos catálogos. Essas tabelas contêm informações referentes aos seguintes dados: nome do escritor(a), país de origem, título original, título traduzido, ano da primeira publicação na editora brasileira, nome do tradutor(a), local e ano da primeira edição da obra. Os dados que alimentaram essas tabelas foram colhidos, sobretudo, na Internet e através dos sites oficiais das editoras. Do contrário, as informações foram solicitadas diretamente aos responsáveis das editoras.

Reunidos esses dados, algumas assimetrias foram constatadas, quais sejam: o número de obras de língua portuguesa e o número de obras traduzidas, a origem linguística das obras de autoria africana publicadas, o país da primeira edição das obras de autoria africana

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publicadas no Brasil, as obras editadas através do processo de co-edições, a proporção entre escritores e escritoras de autoria africana presentes nos catálogos, a repartição de gêneros literários presentes nos catálogos e o número de títulos de autoria africana publicados. Sendo assim, a análise dessas informações permitiram evidenciar as assimetrias existentes nos catálogos das editoras, independentes e grupos editoriais.

2.1 CIRCULAÇÃO E AUTORIA AFRICANA: DISCUTINDO CONCEITOS

Para o presente estudo, foi necessário compreender o lugar que ocupam as textualidades de escritores africanos de língua francesa no Brasil, a partir de uma ideia de circulação, visto que as obras desses escritores, até chegarem a ser publicadas no Brasil, transitaram entre diferentes espaços editoriais, sejam eles africanos, europeus e/ou americanos.

Através de um breve levantamento realizado durante a pesquisa, constatou-se que a maioria dos escritores presentes nos onze catálogos já viveu, ou ainda vive, na Europa, nos Estados Unidos ou, até mesmo, no Brasil. Esse fato nos permite afirmar que esses escritores estão inseridos em um contexto de multiculturalidade, à medida que nasceram em um país africano, mas pertencem a uma geração que emigrou para estudar e/ou trabalhar, ao menos temporariamente.

Essas vivências em espaços dotados de diferentes culturas favoreceram a construção de uma identidade descontínua, instável e fluida que caminha em direção com o estudo de Stuart Hall (2006) sobre o colapso das identidades culturais do sujeito pós-moderno. Ao contrário do sujeito do Iluminismo, descrito por Hall como tendo uma identidade fixa e estável, o sujeito pós-moderno é descrito a partir de um perfil contraditório, incompleto, instável e incerto (HALL, 2006):

[...] as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito unificado. A assim chamada "crise de identidade" é vista como parte de um processo mais amplo de mudança, que está deslocando as estruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social (HALL, 2006, p. 7).

Por serem escritores dotados de um perfil bastante cosmopolita, visto que transitam entre diferentes espaços e têm suas obras escritas em línguas europeias, com primeira edição

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ora na Europa, ora nos Estados Unidos, ora em países africanos ou, até mesmo, no Brasil, vê- se a relevância de articular suas produções com o estudo sobre transárea, de Ottmar Ette (2016).

A proposta do alemão e professor de literatura comparada Ottmar Ette é compreender a literatura a partir de uma perspectiva de mobilidade e movimento. Segundo Ette (2016), a produção literária que extrapola a sua origem geográfica deriva do fato de ela ser produzida em dois contextos, o que significa dizer que ela transita entre dois mundos, duas realidades sociopolíticas distintas ou duas línguas, tornando-se uma literatura sem identidade definida, por não ter morada ou residência fixa (ETTE, 2016). Através dessa concepção de trânsito literário fundamentada na pluralidade de percurso, pontes e não de raízes, deve-se entender as transferências entre espaços culturais (ETTE, 2016).

Esse modo de apreender a literatura para além dos seus limites nacionais nos parece caminhar igualmente em direção ao conceito móvel de "literatura mundo", desenvolvido por Michel Le Bris (2007). Esse conceito foi empregado pela primeira vez, no ano de 2007, em um manifesto intitulado Para uma literatura mundo em francês (Pour une littérature monde en français). Editado por Michel Le Bris, Jean Rouaud e Eva Almassy e reagrupando as contribuições de quarenta e quatro autores de expressão francesa, através desse manifesto literário, os escritores propuseram trabalhar com uma concepção de literatura sem centro, isto é, uma espécie de abertura ao mundo de modo transnacional (LE BRIS, 2007).

O conceito de "literatura mundo" visou a questionar algumas ambiguidades relacionadas à noção de literatura francófona. Segundo os defensores do manifesto, a ideia que busca abarcar as produções tidas como francófonas tende a criar uma posição artificial e hierárquica entre os escritores "franceses" e os escritores considerados "francófonos". Ao buscar esclarecer o que compreenderia essa "literatura mundo", Michel Le Bris (2007) afirma:

Literatura-mundo de forma bem simples, para voltar a uma ideia mais ampla, mais forte da literatura, reencontrando sua ambição de dizer o mundo, de dar um sentido à existência, de interrogar a humana condição, de levar cada um de volta ao mais secreto de si mesmo. Literatura-mundo para retratar cruzamento, no caldeirão das megalópoles modernas, de culturas múltiplas e o nascimento de um mundo novo. Literatura-mundo, enfim, no momento em que, sobre um tronco desde já comum, multiplicam-se as hibridações, desenhando o mapa de um mundo polifônico, sem centro, tornado redondo...11 (LE BRIS, 2007, p.41-42, tradução nossa)

11 Littérature-monde, très simplement, pour revenir à une idée plus large, plus forte de la littérature, retrouvant son ambition de dire le monde, de donner un sens à l’existence, d’interroger l’humaine condition, de reconduire chacun au plus secret de lui-même. Littérature-monde, pour dire le télescopage, dans le creuset des mégapoles

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A partir dessas concepções não estanques, tanto de Ottmar Ette como de Michel Le Bris, a circulação da literatura de autoria africana vai ser compreendida no presente estudo.

Diante desse contexto, fez-se pertinente articular, igualmente, a ideia de circulação com o conceito de transferência cultural, tal qual forjado por Michel Espagne (1999), que propõe retraçar a trajetória dos bens simbólicos através dos suportes de transferência, dos mediadores e, sobretudo, analisando as lógicas de recepção e de apropriação desses bens no novo contexto de chegada. Essa ideia de transferência cultural analisa o processo de seleção, transformação e assimilação de objetos e práticas culturais através da conjuntura do contexto de partida e dos interesses e necessidades do contexto de chegada, não se limitando a uma compreensão meramente ligada à exportação de bens culturais (ESPAGNE, 1999).

Tal conceito nos estimulou a interrogar sobre a demanda do contexto de recepção, já que ele define em grande parte o que pode ser importado e a influência dos principais agentes (atores e instituições) na escolha das obras. Mais especificamente, o uso desse conceito nos permitiu observar: "[...] a transformação que uma importação cultural produz no contexto de recepção e, inversamente, o efeito positivo desse contexto de recepção sobre o sentido do objeto" (ESPAGNE, 2012, p. 23).

Para mais, é necessário destacar a razão pela qual se optou fazer uso do termo

"literatura de autoria africana". Quando se fala em literatura brasileira, japonesa ou argentina, por exemplo, refere-se à produção de autores nascidos nesses países. Partindo dessa lógica, a alusão a uma suposta literatura africana faria referência à produção literária de escritores oriundos de qual país?

Por ser a África um vasto continente, diferentemente dos casos acima mencionados, acredita-se que o uso do termo "literatura africana" não leva em conta a pluralidade das produções literárias, como também das origens geográficas dos escritores. Dá-se a entender que se está falando de obras produzidas em um único país, quando, na verdade, essas literaturas podem ser de autores originários de cinquenta e quatro países que possuem línguas, culturas e realidades diversas.

modernes, de cultures multiples, et l’enfantement d’un monde nouveau. Littérature-monde, enfin, à l’heure où sur un tronc désormais commun se multiplient les hybridations, dessinant la carte d’un monde polyphonique, sans plus de centre, devenu rond…11 (LE BRIS, 2007, p.41-42).

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Até mesmo alguns escritores africanos não validam o termo "literatura africana”, por ele provocar uma leitura reducionista, esquematizada e homogênea de suas escritas, à medida que alimenta uma concepção patrimonial. Lambert (2011) destaca que a expressão "literatura africana" é eurocêntrica, pois valoriza (apenas) as narrativas que adotaram os princípios ocidentais e, por essa razão, são situadas em zonas literárias institucionalizadas, não considerando as várias outras tradições literárias de autoria africana.

Vale a pena convocar ainda o estudo do filósofo, professor e escritor congolês Valentin Mundimbe (1994), que traz o conceito de "biblioteca colonial”, para se referir a um conjunto de enunciados propagados por diferentes grupos de observadores externos ao contexto africano. Segundo Mundimbe (1994), esses grupos findam por forjar uma "verdade”, para interpretar a realidade africana, a partir de categorias eminentemente etnocêntricas.

Diante disso, o referido escritor propõe uma reflexão sobre os elementos constitutivos e os condicionamentos externos que interferiram no campo dos estudos africanos, para que, dessa forma, sejam reavaliados esses postulados etnocêntricos.

Seguindo nesta reflexão de descolonização epistemológica, proposto por Mudimbe, pelo fato de que a denominação "literatura africana" não dá conta da multiplicidade de vozes, optou-se adotar a expressão "literatura de autoria africana", por acreditar que ela não veicula uma ideia de que as obras literárias pertencem a um único espaço geográfico.

2.2 AS EDITORAS INDEPENDENTES

É sensível a definição de editoras independentes. Uma das complexidades de construir esse conceito deriva do fato de elas poderem ser dotadas de diferentes dimensões: pequena, média ou grande porte. No presente corpus, por exemplo, cinco editoras se enquadrariam entre pequena e médio porte (Pallas, Kapulana, Língua Geral, Gryphus e Nandyala), enquanto que a editora Estação Liberdade estaria mais inscrita como de grande porte, porque suas vendas de Best-sellers japoneses mudam vertiginosamente sua margem de lucro.

Por essa razão, ao procurar defini-las, é preciso levar em consideração vários fatores, como a extensão do seu catálogo geral, o volume de tiragens, a periodicidade de publicações por mês, o número de funcionários, a formação e as experiências profissionais dos editores, dentre outros aspectos. Além desses indicadores que podem revelar o porte da empresa, outros

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elementos devem ser levados em conta, para compreender quais segmentos e perfis de livros as diferentes editoras procuram trabalhar.

Ao contrário dos grupos editoriais que dificilmente irão investir em um escritor desconhecido, porque o risco de perder dinheiro é maior, as editoras independentes tendem a voltar-se para escritores iniciantes ou em vias de consagração. Nesse segundo caso, essa tendência se explica pela dificuldade em financiar, ao menos regularmente, publicações de autores com muita notoriedade no campo literário internacional devido à demanda que isso implicaria com promoção, difusão, viagens e cobertura de imprensa.

Se, na maioria das vezes, não duvidamos que determinadas editoras são grandes conglomerados editoriais, existem, contudo, situações de difícil classificação, quando se trata de editoras menores. Há linhas editoriais que tendem a publicar Best-sellers internacionais e autores nacionais consagrados, enquanto que outras publicam livros em parceria com o próprio autor ou com instituições estatais ou privadas e fazem pouquíssimas apostas de bancar o custo integral de um livro. Vale lembrar ainda das editoras que publicam livros financiados pelo escritor.

Apesar da relevância de dar luz a essas tendências, os resultados obtidos no presente estudo mostraram que tais características não devem ser tomadas como únicas para diferenciar os diversos perfis editoriais. No caso das editoras independentes aqui estudadas, mesmo quando averiguado que elas foram responsáveis por um maior número de publicações de obras de autoria africana e pela difusão de uma maior diversidade de gêneros literários, foram, sobretudo, os grupos editoriais que traduziram as obras de escritores africanos de língua francesa, inglesa e árabe. Isso evidencia, entre outros aspectos, que esses grupos também tiveram um papel primordial na promoção da bibliodiversidade, à medida que suas traduções deram visibilidade a importantes obras de escritores africanos não lusófonos. Por outro lado, embora os grandes grupos tenham financiado mais obras traduzidas, não houve, por parte deles, uma preocupação em diversificar os escritores e os gêneros literários, o que nos mostra a necessidade de relativizar as limitações e contribuições de cada tipo de editora em relação à promoção da literatura de autoria africana no Brasil.

Em suma, as editoras independentes, de todos os tamanhos confundidos, distanciam-se de empresas detentoras de grande capital econômico, no qual os livros tendem a ser produzidos e consumidos segundo a lógica de mercado, circulando segundo as leis do

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comércio, nacional e internacional, com grandes tiragens de obras de escritores consagrados (SAPIRO, 2007).

Ademais, o estudo que nos ajudou a construir o sentido de editora independente para o presente trabalho foi a tese Girafas e bonsais: editores "independentes" na Argentina e no Brasil (1991-2015), do sociólogo José de Souza Muniz, o qual analisa o modo de apropriação e o conjunto de práticas e representações ligadas ao termo independente. Através desse trabalho, compreende-se que, no campo editorial, as independentes estão constantemente associadas à bibliodiversidade, porque seus projetos editoriais são contrapostos a um mercado tendencioso que ameaça a circulação de ideias, a publicação de bons livros e a diversidade das expressões ideológicas e culturais (MUNIZ, 2016).

De modo geral, a produção cultural independente é compreendida por Muniz (2016) como aquela que está fora - ora por escolha, ora por condição - dos circuitos e mercados massivos que controlam a produção, a circulação e a consagração dos bens simbólicos (MUNIZ, 2016). Em contraponto à lógica das empresas privadas, dos grandes conglomerados e das instâncias públicas, a produção cultural independente se identifica com métodos artesanais de produção, com o experimentalismo estético e com discursividades contra- hegemônicas (MUNIZ, 2016).

É válido também articular a concepção de editora independente aqui presente com os traços da perspectiva sociológica de Bourdieu (1999), que distingue pequena editora versus grande editora. Embora sejam termos diferentes, percebe-se que alguns dos elementos pelos quais Bourdieu definiu como sendo de pequena editora pode compreender igualmente o sentido de editora independente aqui estabelecido, posto que tomamos como equivalente os aspectos relacionados ao capital financeiro e simbólico que regem essas editoras.

No tocante à perspectiva sociológica de Bourdieu (1999), embora as pequenas editoras sejam empresas com fins lucrativos, elas não chegam a ter o volume de vendas como os grandes grupos editoriais. Esse reduzido capital financeiro já significa maiores dificuldades, para publicar obras estrangeiras devido aos elevados custos de tradução.

Outro elemento importante que as caracteriza diz respeito às exigências de rentabilidade econômica dos livros que não são determinadas por um sistema organizativo, administrativo e de gestão tipicamente empresarial, como no caso das editoras com forte vocação comercial que trabalham com elevadas margens de lucro. Normalmente, no caso das

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pequenas editoras, fica a critério do editor e de sua equipe analisar os ganhos financeiros que eles podem alcançar com a publicação e comercialização dos seus livros. Isso significa dizer que boa parte das pequenas editoras são estruturas editoriais de porte médio, em que as práticas, o ritmo de produção e os modelos econômicos adotados são incompatíveis com as lógicas industriais (BOURDIEU, 1999).

Por não terem como concorrer com o capital financeiro das grandes editoras e terem dificuldade de se inserir nas redes nacionais de divulgação e distribuição, as editoras de pequeno porte tendem a se consolidar no mercado através do capital simbólico (BOURDIEU, 1999). Nesse sentido, invariavelmente, quando se define esse tipo de editora, acaba-se por reconhecer a sua escolha editorial baseada no valor estético das obras e o seu papel de resistência, dada a sua relação com o polo autônomo do campo da arte (BOURDIEU, 1999).

Seguindo nesta direção, Bourdieu (1999) destaca que são os pequenos editores que conseguem resistir à força do mercado através das suas tendências de vanguardismo literário e político, defendendo os escritores oriundos de países literariamente periféricos. Os pequenos editores independentes procuram exercer seus talentos e suas audácias de descobridores em pequenos autores de pequenas línguas especialmente, porque são mais acessíveis à compra dos direitos autorais. Sua estratégia de sobrevivência no meio editorial consiste, assim, em tentar revelar autores condizentes com os valores estéticos do circuito de produção restrita (BOURDIEU, 1994).

Por seu turno, Marta Pragana Dantas (2011), em seu estudo sobre os obstáculos existentes à tradução de obras francesas contemporâneas no Brasil, confirma esse importante papel desempenhado pelas editoras de pequeno porte, dado que elas procuram garantir a diversidade e a pluralidade em suas linhas editoriais fundamentadas na qualidade e na revelação de novos valores (DANTAS, 2011).

Evidentemente, em um mercado editorial regido por grandes grupos de financiadores que dominam a potente indústria de produção cultural, a existência de editoras independentes está constantemente ameaçada de extinção, porque elas têm dificuldade de se consolidarem no mercado editorial, cada vez mais, regido pela lógica dos conglomerados editoriais. Mesmo quando se considera que a globalização contribuiu para o aumento de traduções no Brasil, sabe-se que elas se concentram, sobretudo, em livros de autoajuda, romances na linha dos Best-sellers e traduções de textos religiosos (BARBOSA, 2005). A partir desse contexto, fica

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