MESTRADO EM EDUCAÇÃO
LINHA DE PESQUISA: EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
ELMA NUNES DE MÉLO
ALFABETIZAR: O SEGREDO É A INTELIGÊNCIA DA PRÁTICA
ELMA NUNES MÉLO
ALFABETIZAR: O SEGREDO É A INTELIGÊNCIA DA PRÁTICA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação Popular (PPGE) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Campus I, em cumprimento às exigências para a obtenção do Título de Mestre.
Área de concentração: Educação de Jovens e Adultos
Orientador: Prof. Dr. Luiz Gonzaga Gonçalves
ELMA NUNES MÉLO
ALFABETIZAR: O SEGREDO É A INTELIGÊNCIA DA PRÁTICA
.
APROVADA EM: ____/____/ 2006
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________
DR. LUIZ GONZAGA GONÇALVES (Orientador) (Universidade Federal da Paraíba/ Centro de Educação)
____________________________________________
DRª. TÂNIA MARIA DE MELO MOURA
(Universidade Federal de Alagoas)
____________________________________________
DRª. MARIA DO SOCORRO XAVIER BATISTA
(Universidade Federal da Paraíba/ Centro de Educação)
____________________________________________ DR. SEVERINO BEZERRA DA SILVA
DEDICATÓRIA
Ao meu inesquecível pai, Edson Silva de Melo (In memoriam),
à minha amada mãe Zinaura Nunes Machado, à minha querida
irmã Edlane Nunes de Mélo, à minha dedicada tia Severina
Batista Pereira, aos meus queridos e amados sobrinhos Danilo
Batista Pereira, Laís Nunes de Mélo Gondim, Fernando Pereira
Menezes Filho, que sempre sonharam com os meus sonhos e se
AGRADECIMENTOS
MUITO OBRIGADA
A Deus, pela luz contínua que me conduz à realização de inúmeras conquistas em
minha vida, em especial ao ingresso no Mestrado em Educação Popular na Universidade
Federal da Paraíba.
À Universidade Federal da Paraíba, pela oportunidade do ingresso no Curso de
Mestrado, desejado por muitos e conquistado por poucos.
Ao Professor e Orientador Dr. Luiz Gonzaga Gonçalves, pela sua serenidade contínua,
pela crença em mim depositada e por todas as idéias semeadas, ajudando a conduzir
gradativamente as minhas pesquisas.
Aos Professores do Programa: Drª Emília Prestes, Drª Edneide Jesine, Drª Socorro
Xavier; Dr. Antonio Carlos, Dr. Iractan de Oliveira, Dr. Afonso Scocuglia, por ter cada um,
de sua forma contribuído no amadurecimento do meu pensar e, sobretudo, do meu fazer.
Às professoras Drª Emília Maria de Trindade Prestes e à Drª Maria do Socorro Xavier
Batista pelas contribuições e sugestões fundamentais no processo da qualificação.
Ao querido e eterno professor Osvaldo Matos pela sua atenciosa correção ortográfica.
À Elizete, funcionária do PPGE, pela sua atenção carinhosa durante todo o curso.
Às Secretárias do PPGE, em especial a Rose, Vitória, Graça e Mônica, por seus
contínuos atendimentos às minhas procuras.
À Secretaria de Educação de Itambé, às coordenadoras, supervisoras e de forma
especial às diretoras e demais funcionários das escolas da EJA, pelo espaço aberto e
democrático para a realização desta pesquisa.
Aos colegas do curso, os quais tive a honra de conhecer nessa jornada, pela partilha
dos momentos de aflições e descontrações, mas, sobretudo, do saber. E, de forma especial,
aos colegas de turma da linha de pesquisa em EJA: Carmen, Ceiça, Neves, Regina, Olavo e
Wmarley.
A Carmen e a Ceiça, por toda a dedicação, incentivo e carinho a mim dispensados
Às educadoras alfabetizadoras de Itambé, interlocutoras de minha pesquisa, pela
absoluta colaboração ao exporem suas concepções e práticas educativas na EJA.
Aos educandos alfabetizandos pela extrema colaboração e confiança em mim
À minha amiga de infância Roberta Cristina Alexandre Cézar, pela incansável
cooperação desde o momento inicial da formulação do projeto de pesquisa, até o momento
final do Mestrado.
Ao meu amado filho-sobrinho Danilo, por sua efetiva colaboração nas impressões
deste trabalho de pesquisa.
A Damiana, companheira de minha família, pela sua contínua colaboração na
formação de um ambiente tranqüilo para minhas investigações.
A Valéria, colaboradora nas horas imprevisíveis.
À minha querida Mãe, serena, quieta e exigente, pela sua profunda cooperação na
construção de um ambiente que favorecesse as realizações das minhas pesquisas durante todo
o curso.
Ao meu querido Pai (In memoriam) que mesmo nesses curtos 13 anos de sua ausência
física, me estimulou por meio de seus inesquecíveis exemplos de luta e perseverança que em
mim se encarnaram.
A todas e todos, que de forma direta e indireta, contribuíram para a realização deste
RESUMO:
Esta pesquisa está voltada para estudar os recursos da inteligência mobilizados na prática
educativa da alfabetização na EJA em Itambé – PE, envolvendo a relação educador/a e
educando/a. Pretende-se identificar com este trabalho compreensões manifestas e limites
presentes nas práticas educativas das educadoras alfabetizadoras, e, sobretudo, analisar as
possibilidades de um ensino que valorize o contexto do educando e seu saber que se apresenta
no espaço escolar. Para realizar tal propósito trouxemos alguns autores como Paulo Freire,
Victor Fonseca, Edgar Morin, Mágda Soares, entre outros. Estes autores abriram novas
perspectivas quanto à conquista de outros conceitos referentes aos saberes populares e sua
utilização no processo da aprendizagem da linguagem e da leitura de mundo, no universo da
Educação de Jovens e Adultos. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, com o uso do grupo
focal. Constata-se por meio dos depoimentos das educadoras da EJA, que elas valorizam a
realidade da vida dos educandos na sua prática pedagógica e dizem valorizar seus saberes
prévios. Numa situação contraditória, suas aulas estão concentradas na exposição de
conteúdos de saberes escolares. Constata-se ainda que os educandos almejam realizar suas
expectativas com a alfabetização, no entanto há muito o que fazer para atender as suas
necessidades nos processos educativos. Tais entendimentos revelam a importância do
fortalecimento de apoio pedagógico, de uma maior compreensão do educador sobre a
extensão de conceitos de alfabetização e sobre a prática das trocas de saberes entre o
educando e o educador, com a valorização dos recursos inteligentes dos(as) educadores(as) e
educandos.
PALAVRAS-CHAVE: INTELIGÊNCIA DA PRÁTICA. ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS
RESUMEN
Esta investigación tiene por objeto de estudio los recursos de la inteligencia movilizados em
la práctica educativa de la alfabetización en la Educación de Jóvenes y Adultos (EJA) en
Itambé – PE, envolviendo la relación educador/a y educando/a. Se pretiende identificar con
este trabajo comprensiones manifiestas y límites presentes en las prácticas educativas de las
educadoras alfabetizadoras, y, sobre todo, analizar las posibilidades de una ensenãnza que
valore el contexto del educando y su saber que se presenta en el espacio escolar. Para realizar
dicho propósito trajimos algunos autores como Paulo Freire, Victor Fonseca, Edgar Morin,
Mágda Soares, entre otros. Estos autores abrieron nuevas perspectivas en cuanto a la
conquista de otros conceptos referentes a los saberes populares y su utilización en el proceso
del aprendizaje del linguaje y de la lectura de mundo, en el universo de la Educación de
Jóvenes y Adultos. Se trata de una investigación calitativa, con el uso del grupo focal. Se
constata por medio de los depoimentos de las educadoras de la EJA, que ellas valoran la
realidad de la vida de los educandos en su práctica pedagógica y dicen valorar sus saberes
previos. En una situación contradictoria, sus aulas están concentradas en la exposición de
contenidos de saberes escolares. Se constata aún que os educandos anhelan realizar sus
expectativas con la alfabetización, sin embargo hay mucho el que hacer para atender las
dichas necesidades en los procesos educativos. Tales entendimientos revelan la importancia
del fortalecimiento de apoyo pedagógico, de una mayor comprensión del educador sobre la
extensión de conceptos de alfabetización y sobre la práctica de los cambios de saberes entre el
educando y el educador, con la valoración de los recursos inteligentes de los/as educadores/as
y educandos .
PALABRAS LLAVE: INTELIGENCIA DE PRÁCTICA. ALFABETIZACIÓN DE
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ... 11
1.1 ORIGEM DO PROBLEMA ... 13
1.2 PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA ... 15
1.3 CAMINHOS DA PESQUISA ... 17
1.4 LOCAL DA PESQUISA ... 19
1.5 PARTICIPANTES ... 20
1.6 PERFIL DAS EDUCADORAS ... 21
1.7 PERFIL DOS EDUCANDOS ... 23
1.8 ESTRUTURAÇÃO DO TRABALHO ... 23
2
ASPECTOS
DA
INTELIGÊNCIA
HUMANA
NA
PRÁTICA
EDUCATIVA DA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS...25
2.1 A INTELIGÊNCIA DA PRÁTICA ALFABETIZADORA NA MODALIDADE DA EJA...25
2.2 ASPECTOS DA INTELIGÊNCIA HUMANA NA PRÁTICA EDUCATIVA: ABERTURAA, INTUIÇÃO, CRIATIVIDADE E CURIOSIDADE ... 29
2.3 O SEGREDO DE UMA PRÁTICA EDUCATIVA INTELIGENTE ... 38
2.4 REFLEXÕES ACERCA DE SABERES E FAZERES NO ENSINO DA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS... 40
3 O EDUCANDO JOVEM E ADULTO CONSIDERADO A PARTIR DE
SUA EXPERIÊNCIA DE MUNDO ... 44
3.1 SABERES PRÉVIOS E LEITURA DE MUNDO ... 44
3.2 O VALOR DA ORALIDADE NA INTELIGÊNCIA DA PRÁTICA EDUCATIVA ..49
3.3 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS NA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ... 52
3.4 REFLETINDO TÉCNICAS, ESTRATÉGIAS E HABILIDADES EDUCATIVAS ... 56
3.5 LETRAMENTO: USO PRÁTICO DO CONHECIMENTO DE MUNDO ... 60
4.1 O SABER FAZER DO(A) EDUCADOR(A) E A REALIDADE DO EDUCANDO....63
4.2 PERSISTÊNCIA DO EDUCANDO, UM MEIO PARA O ÊXITO ... 66
4.3 A VISÃO DAS EDUCADORAS FRENTE ÀS EXPECTATIVAS DO EDUCANDO ... 67
4.4 O LIVRO DIDÁTICO NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ... 68
4.5 O CURRÍCULO DIANTE DA PERCEPÇÃO DAS EDUCADORAS ... 71
4.6 AS EDUCADORAS NO ESPAÇO ESCOLAR ... 73
4.7 OS EDUCANDOS E SEUS DIZERES ... 75
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 85
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 90
1 INTRODUÇÃO
Nos últimos anos do século XX e início do século XXI, tem-se intensificado as
discussões em busca de uma melhor prática pedagógica a ser trabalhada no ensino da
alfabetização de jovens e adultos. Exemplo disso é que essa abordagem foi amplamente
discutida no encontro da V Conferência Internacional de Educação de Adultos -V
CONFITEA1. As temáticas discutidas neste Encontro, são consideradas veios abertos que
precisam se somar às novas e contínuas experiências, com o propósito de ajudar no combate
ao analfabetismo, a fim de obter resultados eficazes no aprendizado dos educandos dessa
modalidade de ensino. Isto se torna um desafio juntamente com as exigências do mundo
contemporâneo em constante movimento que impõem ao educador e à educadora de jovens e
adultos o uso de suas múltiplas inteligências, com o intuito de preparar o educando para essa
sociedade que cobra conhecimentos que extrapolam o domínio da leitura e da escrita,
exigindo algo mais completo, o conhecimento de mundo.
Mas, para que o educando inserido na Educação de Jovens e Adultos (doravante EJA)
possa inteligir a importância desse conhecimento de mundo é preciso, além de outros fatores
que, o(a) educador(a) entenda sua prática educativa, como ações inteligentes, capazes de
colaborar no processo de construção desse saber. Esta compreensão levará o(a) educador(a)
da alfabetização de jovens e adultos, a procurar meios que lhe permitam, através do fazer
pedagógico, obter resultados de qualidade, que significa dentre outros aspectos, incluir de
forma mais intensa, o educando na sociedade na qual está inserido.
Nesse sentido, as pessoas envolvidas no processo educacional, especialmente os(as)
educadores(as) alfabetizadores(as) de jovens e adultos, que se apresentam nesse século XXI,
precisam compreender a importância de se construir um novo olhar e, principalmente, um
novo fazer educativo que possa atender aos interesses dos estudantes pertencentes a esse
complexo universo da alfabetização de jovens e adultos. É necessário considerar que os
educandos dessa modalidade de ensino têm sua própria história de vida, cabendo assim ao
educador ou à educadora, reconhecê-la em sua prática educacional, respeitando os
conhecimentos construídos e adquiridos por eles a partir de suas experiências de vida, de seu
contexto social, político, econômico e cultural.
O objetivo desta pesquisa é proporcionar uma análise das possibilidades e limites de
uma prática educativa inteligente dos(as) educadores(as) junto aos educandos jovens e
adultos, no âmbito da rede pública de ensino em Itambé. Objetivamos, especificamente,
identificar a utilização da inteligência humana na prática alfabetizadora, considerando a
abertura, a intuição, a criatividade e a curiosidade; compreender o educando jovem e adulto a
partir de sua experiência de mundo; e identificar as estratégias de inteligências utilizadas no
fazer pedagógico das alfabetizaoras de jovens e adultos em Itambé, bem como as
possibilidades e limites de sua prática junto às expectativas de seu educando.
Esta investigação fez uma reflexão sobre as condições de uma prática alfabetizadora
inteligente, na tentativa de contribuir para a qualidade do ensino de jovens e adultos da rede
pública em Itambé, almejando para o educando sua maior inclusão na sociedade em que vive.
Consideramos como problemática básica desta pesquisa, a utilização de uma prática
educativa inteligente na alfabetização de jovens e adultos. Mesmo consciente da existência de
outros fatores que provocam o insucesso do alfabetizando, como por exemplo, a evasão por
necessidade de trabalho, as condições miseráveis de vida, as questões social, política,
econômica e estrutural do país dentre outros, é na qualidade da prática educativa, na ação
concreta do(a) educador(a) junto ao educando, que encontramos maiores possibilidades de
obter sua aprendizagem. Como assinala Freire (2003, p. 96), “creio que a melhor afirmação
para definir o alcance da prática educativa em face dos limites a que se submete é a seguinte:
não podendo tudo, a prática educativa pode alguma coisa”.
A importância de uma análise sobre a qualidade da prática do(a) educador(a) na
alfabetização de jovens e adultos visa, de forma geral, diante da contextualização desse tema
no século XXI, despertar uma reflexão no sentido do quê e do como fazer um trabalho mais
consciente e significativo, considerando a formação da cidadania, numa perspectiva de
transformação social. Isso porque, “as possibilidades de mudanças dependem, dentre outros,
do compromisso dos profissionais com construção da cidadania” (FONSECA, 1995, p. 150).
1.1 Origem do problema
Quando nos propomos a investigar um objeto de estudo, importa explicitar as razões
que nos impulsionam a aprofundar conhecimentos relacionados às questões que tenham
relevância no contexto do tema abordado.
Assim, nossa pesquisa nasceu a partir de reflexões e questionamentos sobre a ação
educativa dos(as) educadores(as) junto aos educandos da alfabetização de jovens e adultos no
município de Itambé – PE. É um estudo que surgiu no espaço da rede pública de ensino e
levanta, diante do alto índice de analfabetismo,2 uma interrogação acerca de um saber fazer
mais dinâmico e eficaz, que estimule o cidadão sem escolaridade a procurar o ambiente
escolar e nele prosperar.
Nosso ponto de partida, como motivação para iniciar essa pesquisa foi a possibilidade
de carência na utilização de recursos inteligentes na prática educativa do ensino da
alfabetização de jovens e adultos, a falta de orientação das educadoras alfabetizadoras quanto
ao uso de suas capacidades, habilidades, técnicas e/ou estratégias para uma prática educativa
eficaz, a falta de reconhecimento dos saberes prévios do educando no fazer docente, a
possibilidade da alfabetização contribuir como meio de realização pessoal, profissional, e
inclusão social dos educandos. Estas foram suposições iniciais desta pesquisa, as quais se
ampliam quando percebemos outras carências: de formação pedagógica para o docente, de
cursos de graduação na modalidade da EJA, enfim, de valorização profissional nessa
modalidade de ensino.
A escolha por essa abordagem encontrou força maior no curso do Programa de
Formação de Professores Alfabetizadores – PROFA3 - oferecido aos educadores(as) em
regência e aos educadores(as) de apoio das escolas estaduais de Pernambuco, bem como em
outros Estados do país.
2
São milhões de jovens e adultos não alfabetizados, no Brasil, “[...] 13% da população brasileira com 15 anos ou mais é analfabeta, 30% têm menos de quatro anos de estudo e 59% não concluíram o ensino fundamental”. (MOURA;VÓVIO, 2003, p. 7).
O PROFA nos incentivou a pesquisar procedimentos e práticas educativas do(a)
alfabetizador(a) junto ao alfabetizando, colaborando na ampliação de uma concepção e de um
fazer consciente na alfabetização de jovens e adultos.
Trabalhar com jovens e adultos exige uma prática diferente da utilizada com crianças,
pois, traz consigo uma maior responsabilidade, determinando uma prática adequada, a fim de
colaborar na inserção desse aprendiz jovem e adulto na sociedade, levando-o a uma percepção
de si mesmo como sujeito ativo e transformador de sua realidade. Nesse sentido, Freire (1996,
p. 60) assinala que:
O fato de me perceber no mundo, com o mundo e com os outros me impõe numa posição em face do mundo que não é a de quem nada tem a ver com ele. Afinal, minha presença no mundo não é a de quem a ele se adapta mas a de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas sujeito também da história.
Assim, existe a possibilidade de um fazer mais eficiente, que permite não só ler e
escrever, mas a apreensão do significado desse aprendizado, ligado à realidade de mundo no
qual os educandos estão integrados, atingindo sua comunicabilidade em diferentes contextos e
objetivos, tornando-os mais esclarecidos, agentes construtores do mundo em que vivem.
Desta forma, “é preciso ir além da simples aquisição do código escrito, é preciso fazer uso da
leitura e da escrita, apropriar-se da função social dessas duas práticas, é preciso letrar-se”
(BARDANACHVILI , 2000, p.1).
No entanto, só será possível obter uma prática que alcance esses requisitos quando
os(as) educadores(as) compreenderem que a prática educativa precisa ser sempre repensada,
num contínuo refazer, sendo este flexível e/ou aberto, intuitivo, criativo e curioso diante do
contexto atual, tendo como meta principal o crescimento e a transformação do educando.
Sobre essa questão, Freire (2003, p. 84) assinala: “percebo o quanto foi fundamental naquela
época e continua sendo hoje o exercício de que me entregava e me entrego de pensar a prática
para melhor praticar”.
Podemos, em meio a toda essa discussão, perguntar: Por que a preocupação com uma
prática educativa inteligente na alfabetização de jovens e adultos? É importante lembrar que o
propósito básico desta pesquisa é identificar a inteligência da prática educativa, como um
caminho para obter melhores resultados no aprendizado do educando dessa modalidade de
ensino e como possibilidade de sua maior inclusão social. Isso significa conseguir dos
educandos um grau de desenvolvimento cognitivo que lhes permita fazer a leitura de mundo
Nesse sentido, percebemos a importância de compreender a necessidade de qualidade
e de aperfeiçoamento na ação do(a) educador(a), de, sobretudo, inteligir que um segredo para
alfabetizar é cultivar recursos inteligentes inerentes à prática educativa na alfabetização de
jovens e adultos.
Dando seqüência ao percurso deste trabalho, apresentamos os procedimentos
metodológicos da pesquisa, no que tange ao tipo de investigação, método, sujeitos, categorias
de análises, técnicas de levantamento de dados e perspectivas de análises trabalhadas.
1.2 Percurso metodológico da pesquisa
O processo de investigação e/ou a metodologia de uma pesquisa deve definir os
procedimentos, a forma que o sujeito vai abordar o objeto a ser estudado, o horizonte que se
pretende alcançar. Como assinala Minayo (2000, p. 22), "a metodologia inclui concepções
teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a apreensão da realidade e
também o potencial criativo do pesquisador".
Pretendemos com esta reflexão apresentar a nossa preocupação metodológica com o
encaminhamento desta pesquisa, pois um trabalho acadêmico requer criação e recriação,
análise e re-análise, avanços e retrocessos, numa lógica coerente e responsável de
investigação. Como diz Prestes (2004, p. 02)
[...] um processo de construção, de qualquer coisa, exige sacrifícios e dedicações dos seus criadores [...] desafiando aos autores a decifrarem o enigma do conhecimento, da criação, do enigma, da ocultação. Desafia aos criadores encontrar estratégias que possibilitem abordar o objeto de investigação.
A trajetória desta pesquisa incluiu a procura dados que possibilitou identificar algumas
práticas educativas na alfabetização de jovens e adultos,oferecidas nas suas várias faces, com
o objetivo de conhecer os procedimentos trabalhados no fazer educativo dos sujeitos
investigados. Como afirma Ireland (2001, p. 09)
A pesquisa aqui desenvolvida é de base qualitativa. Foram utilizadas diferentes fontes
de informação: observação, entrevistas individuais e trabalho de grupos focais, com a
finalidade de coletar dados que possibilitassem compreender o objeto estudado. Acreditamos
ter encontrado com esse procedimento, um meio através do qual os sujeitos pudessem
expressar suas idéias e sentimentos com mais espontaneidade e maior clareza sobre o tema em
discussão. A escolha da abordagem qualitativa foi privilegiada porque permite entender a
história de vida dos participantes, questão relevante nesta investigação, podendo o
pesquisador interagir apreendendo a realidade social dos sujeitos envolvidos.
Vale ressaltar que a observação é um caminho que constata de forma mais precisa a
prática educativa procurada nesta pesquisa. Optamos assim pela observação realizada por
meio das análises das entrevistas e do trabalho de grupos focais realizadas no espaço da sala
de aula. Acreditamos dessa forma, encontrar nas falas e nas expressões das alfabetizadoras e
dos alfabetizandos as ações, as técnicas, as inteligências utilizadas no processo
ensinar-aprender na EJA. As falas não são simples falas, são expressões que representam anseios,
emoções, perspectivas, experiências e condições de vida, que emergem no movimento da
investigação, ajudando no esclarecimento gradativo das buscas almejadas.
Conforme, Santos Filho (2002) uma investigação qualitativa, expõe uma visão
envolvente, em que investigador e investigado são partes fundamentais no processo da
pesquisa. Sobre essa mesma questão assinala MAZZOTTI (1991, p.55):
Para os ‘qualitativos’ a realidade é uma construção social, o investigado participa e, portanto os fenômenos só podem ser compreendidos dentro de uma perspectiva holística que leva em consideração os componentes de uma dada situação em suas interações e influências recíprocas [...] Para os ‘qualitativos’ não se pode no processo de investigação deixar de valorizar a imersão do pesquisador no contexto e interação com os participantes, procurando apreender os significados por eles atribuídos aos fenômenos estudados. É também compreensível, que o foco vá
sendo progressivamente ajustado durante a investigação em que dados dela resultantes sejam predominantemente descritivos através das palavras. (grifo nosso).
No método qualitativo não há como negar o lugar dos sujeitos no percurso de uma
investigação. Nessa direção, assinalam Brito e Leonardos (2000, p. 08) acerca do seu processo
de investigação:
Nem mesmo a distância assegurada por um método científico poderia controlar a influência da subjetividade própria ao ser humano, que se faz presente durante todo o processo da pesquisa, desde a escolha dos objetos, passado pelo estabelecimento das hipóteses, seleção e recorte do campo de estudo até a análise e interpretação.
focais, educadoras e educandos da alfabetização de jovens e adultos foram passo a passo
desvelando sua prática educativa.
1.3 Caminhos da pesquisa
A pesquisa é de base interpretativa e os dados aqui analisados foram coletados no
período de dois meses (de outubro de 2005 a dezembro do mesmo ano), por meio de
entrevista e do trabalho de grupos focais, com educadoras (todas mulheres) e educandos nas
Escolas Municipais de Itambé, que trabalham com a modalidade da EJA.
O andamento desta pesquisa teve como plano inicial um contato prévio com as
interlocutoras educadoras e os interlocutores educandos. Esse primeiro contato proporcionou
respaldo para a elaboração de uma entrevista que atendeu a critérios previamente elaborados.
Assim, as educadoras foram entrevistadas com roteiros de perguntas por escrito que
posteriormente foram respondidas e discutidas através da dinâmica de grupo focal. Quanto
aos educandos, também entrevistados com roteiros de perguntas escritas, mas respondidas
oralmente e depois discutidas no trabalho de grupo focal, permitindo assim, uma discussão na
qual todos participavam espontaneamente do círculo de debate. Vale ressaltar que “no âmbito
das abordagens em pesquisa social, a técnica do grupo focal vem sendo cada vez mais
utilizada” (GATTI, 2005, p. 7).
O trabalho de grupos focais estabelece uma integração com os sujeitos envolvidos na
pesquisa, dando-lhes oportunidades de esclarecer e discutir coletivamente as concepções
acerca do tema abordado. Sobre este aspecto, Kitzinger (Apud GATTI, 2005, p.7) afirma que
“o grupo é ‘focalizado’, no sentido de que envolve algum tipo de atividade coletiva – como
[...] debater um conjunto particular de questões”, em que os sujeitos investigados expressam,
numa dinâmica de grupo, o que pensam e o que sentem a respeito das questões em discussão.
Deste modo, usar o grupo focal numa pesquisa é dar condições de não haver má
interpretação das posições dos participantes frente às questões abordadas. Os sujeitos
envolvidos têm a oportunidade, nesse processo de interação, de elucidar, questionar, criticar,
possibilitando levantar novas hipóteses para a pesquisa. Trabalhar com grupo focal é uma
contribuição singular e relevante, visto que com outros métodos não seria possível captar toda
essa complexidade de sentimentos, ações, percepções dos sujeitos envolvidos. Segundo Gatti
selecionadas e reunidas por pesquisadores para discutir e comentar um tema, que é objeto de
pesquisa, a partir de sua experiência pessoal’. O(A) pesquisador(a), assim, em conjunto com
os sujeitos da pesquisa, através da vivência do grupo focal, integra-se num debate, de forma a
entender com mais profundidade o objeto de estudo.
Com a utilização das entrevistas e com o trabalho de grupos focais, o(a)
pesquisador(a) tem uma visão geral do objeto de estudo, criando um maior entrosamento entre
ele(a) e os(as) interlocutores(as) (educadores e educandos) fator importante, porque provoca
uma relação amistosa e de confiabilidade entre todos os personagens da pesquisa.
O procedimento das entrevistas e do trabalho de grupos focais foi realizado em dois
momentos:
O primeiro momento, direcionado pela pesquisadora no espaço da sala de aula
refere-se às entrevistas com as refere-sete educadoras da alfabetização de jovens e adultos, através de
questões previamente elaboradas, distribuídas individualmente, as quais foram discutidas
numa data determinada, através da dinâmica de grupo focal. Este percurso foi realizado em
três encontros. As educadoras demonstraram inicialmente certa inibição, porém foram aos
poucos se soltando e revelando de forma surpreendente grande entusiasmo pela pesquisa.
Nesse processo de entrosamento, vale ressaltar seus desabafos ao expressarem o desejo de
fazer melhor em sua prática educativa com um apoio pedagógico mais efetivo dos setores
ligados à alfabetização de jovens e adultos.
O segundo momento, também com a intervenção da pesquisadora no ambiente da sala
de aula, está relacionado aos dezenove educandos da alfabetização de Jovens e Adultos.
Iniciando com a entrevista oral, no dia escolhido por todos, as respostas foram trabalhadas
com a dinâmica de grupos focais, levando os envolvidos ao debate. Esta trajetória ocorreu em
seis encontros, em datas acordadas com os educandos.
Ambas as discussões com as educadoras e com os educandos no trabalho de grupos
focais, foram registradas por meio de escritos e gravações. Esse procedimento foi escolhido
porque acreditamos que, ao trabalhar com as fontes orais, o(a) pesquisador(a) tem a
oportunidade de dialogar com os testemunhos vivos do processo de pesquisa, captando a
compreensão de mundo, a experiência, a idéia da prática, a subjetividade, o silêncio, as
emoções e ações dos sujeitos em estudo.
Os conteúdos das questões destinadas as educadoras foram estruturados da seguinte
forma: 1) Como podemos pensar numa alfabetização que atenda as necessidades dos alunos
trabalhadores? 2) O que, afinal o educando trabalhador espera da escola noturna? 3) Que
Que requisitos você apontaria para um alfabetizando obter êxito no seu aprendizado? 4) Como
você analisa o livro didático, bem como o currículo da EJA? 5) Descreva seu cotidiano
escolar.
Os conteúdos das questões destinadas aos educandos foram assim sistematizados: 1) O
que uma pessoa faz para viver sem escola até a idade adulta? 2) O que você quer fazer com a
leitura e a escrita? 3) Que momento da aula você mais gosta? Qual o que menos gosta?
Quando tem que faltar à aula, o que você pensa? 4) Na sua profissão como você seria um
professor do que você sabe? 5) O que mudou na sua vida com a escola?
Ao analisar as referidas entrevistas e discussões dos grupos focais, que correspondem
ao universo da alfabetização de jovens e adultos, identificamos visões e posicionamentos
frente ao processo ensino-aprendizagem nos quais educadoras e educandos estão inseridos,
que revelam gradativamente os recursos utilizados na prática educativa da alfabetização de
jovens e adultos em Itambé.
1.4 Local da pesquisa
A pesquisa foi realizada em duas escolas da Rede Urbana Pública Municipal de
Itambé – PE, Escola Municipal Pascoal Carrazzonni e Escola André Vidal de Negreiros. O
Critério para a escolha das escolas foi determinado por nelas existirem o ensino da EJA. Para
tanto, foi feito um prévio levantamento do número das instituições municipais que tivessem
esta modalidade de ensino. Seguindo este percurso, foram identificadas as duas referidas
escolas da zona urbana, onde se efetuou a investigação.
A Escola Municipal Pascoal Carrazzonni se encontra na rua Tenente Fontoura, s/n.
Esta escola absorve uma comunidade de classe pobre. A Escola Municipal André Vidal de
Negreiros, localizada na rua, Vidal de Negreiros, s/n, tem um público de educandos ainda
1.5 Participantes
Constituíram-se participantes deste estudo: a pesquisadora, as educadoras e os
educandos. O critério para a seleção das educadoras e dos educandos foi por eles estarem
envolvidos na alfabetização de jovens e adultos e por adesão à pesquisa, isto é, por melhor
expressarem a vontade de contribuir com o trabalho.
Há de se considerar ainda, que foi conjeturado a participação da coordenação e
supervisão da EJA do Município de Itambé nesta pesquisa, as quais, colaboraram
amistosamente no atendimento quanto ao acesso aos livros didáticos da EJA e permitiram,
junto à Secretaria de Educação, a realização da pesquisa de forma democrática nas referidas
escolas.
A participação da equipe da EJA iniciaria no segundo semestre do ano de 2005, quando
estava prevista a pesquisa de campo. Seria realizado a entrevista e o trabalho de grupo focal,
com o objetivo de ampliar as informações sobre o apoio à prática de ensino às educadoras, no
que se refere, especialmente, às capacitações e à formação continuada oferecidas pelo
Município. Contudo, não foi possível a realização desse procedimento, pois a referida equipe
alegou perda do material recebido (questões previamente elaboradas para a entrevista). Enfim,
sendo a pesquisa de caráter adesiva e não obrigatória, o encontro se tornou impossibilitado.
No entanto, vale ressaltar que os sujeitos alvos desta pesquisa são as educadoras
alfabetizadoras e os educandos da alfabetização de jovens e adultos, os quais serão
apresentados seus perfis para uma melhor compreensão de suas concepções de mundo.
Para apresentar o perfil das participantes educadoras, preservando suas identidades,
foram utilizados nomes historicamente conhecidos como, Anita Garibaldi, Margarida Alves,
Pagu, Irmã Dulce. Este foi um meio criado para não ser revelado suas verdadeiras identidades.
Todas as educadoras pertencem ao sexo feminino.
Quanto aos educandos, para manter suas identidades em sigilo foram utilizados nomes
Bíblicos como, Rute, Rafael, Moisés, Maria, dentre outros.
Estes critérios foram estabelecidos acreditando ser uma boa forma de proteger a
QUADRO 1 - PERFIL DAS EDUCADORAS
TOTAL DE EDUCADORAS 07 Escolas
02 ESCOLA MUNICIPAL PASCOAL
CARRAZZONI
ESCOLA ANDRÉ VIDAL DE NEGREIROS TOTAL
03 EDUCADORAS 04 EDUCADORAS 07
EDUCADORAS ENTREVISTADAS 07
RESPONDERAM AS QUESTÕES 07
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora na secretaria das escolas.
1.6 Perfil das educadoras
As educadoras alfabetizadoras desta investigação formam um grupo de sete mulheres,
com faixa etária não muito variada, de 27 a 36 anos. Das sete educadoras, duas estão cursando
a graduação e cinco possuem apenas o magistério. Três professoras são mães e todas são de
origem urbana, residentes próximos às escolas em que lecionam.
Das sete educadoras entrevistadas, apenas uma possui três anos de experiência com a
EJA, as demais possuem tempo máximo de atuação nessa modalidade de ensino de apenas um
Nº ESCOLA
Nº PROFESSORES ENTREVISTADOS
1 ESCOLA MUNICIPAL PASCOAL CARRAZZONNI 3
2 ESCOLA MUNICIPAL ANDRÉ V. DE NEGREIRO 4
TOTAL 7
PROFª ESCOLA FORMAÇÃO
TEMPO MAG.
TEMPO
EJA MÃE IDADE
Anita
Garibaldi E.A.V.N. MAGISTÉRIO 1ANO SIM 36
Maria
Quitéria E.A.V.N. MAGISTÉRIO 2 ANOS 1ANO SIM 27
Pagu E.A.V.N. GRAD. LETRAS (EM CURSO) - 1ANO NÃO 30
Chiquinha
Gonzaga E.M.P.C. GRAD. PEDAG. (EM CURSO) 10 ANOS 1ANO SIM 27
Irmã
Dulce E.A.V.N. MAGISTÉRIO - 1ANO NÃO 32
Raquel de
Queiroz E.M.P.C. MAGISTÉRIO - 1ANO NÃO 33
Margarida
Alves E.M.P.C. MAGISTÉRIO 5 ANOS 3 ANOS NÃO 35
ano. Duas possuem experiência no ensino fundamental da rede pública, quatro declararam não
terem experiência nesta rede de ensino e uma declarou experiência na rede particular.
As educadoras demonstraram uma grande receptividade com a pesquisa, expressando
espontaneidade e desejo de colaboração. Elas participaram do momento da entrevista e da
discussão com grupo focal com muito entusiasmo, evidenciando a importância deste trabalho
acadêmico.
Vale ressaltar que os depoimentos recolhidos por meio das entrevistas e do grupo focal
nesta pesquisa, foram apresentadas sem correções ortográficas, a fim de identificar o universo
vocabular e a escrita das interlocutoras.
É relevante identificar o perfil das educadoras porque, através dele, podemos
compreender melhor alguns aspectos de seu contexto de vida.
QUADRO 2 - PERFIL DOS EDUCANDOS
Nº ESCOLA
Nº ALUNOS ENTREVISTADOS
1 ESCOLA MUNICIPAL PASCOAL CARRAZZONNI 7
2 ESCOLA MUNICIPAL ANDRÉ V. DE NEGREIRO 12
TOTAL 19
ª ESCOLA NOME ZONA PROFISSÃO PAI/MÃE ESTUDOU IDADE
1 E.A.V.N. MARIA URBANA DOMÉSTICA SIM SIM 25
2 E.M.P.C. RUTE URBANA EMP. DOMÉSTICA SIM SIM 23
3 E.M.P.C. RAQUEL URBANA DOMÉSTICA SIM SIM 48
4 E.M.P.C. MOISÉS URBANA PRESTAMISTA SIM SIM 50
5 E.M.P.C. SARA RURAL CAMPONESA SIM SIM 46
6 E.M.P.C. ABRAÃO URBANA FAZ BICO NÃO SIM 16
7 E.M.P.C. TALITA URBANA EMP. DOMÉSTICA SIM SIM 25
8 E.A.V.N. JUDITE URBANA DOMESTICA SIM NÃO 50
9 E.A.V.N. JACÓ URBANA CHEFE JARDINEIRO SIM NÃO 27
10 E.A.V.N. MIRIAN URBANA EMP. DOMÉSTICA SIM NÃO 31
11 E.A.V.N. SALAMÉ URBANA DOMÉSTICA SIM NÃO 37
12 E.A.V.N. DÉBORA URBANA DOMÉSTICA SIM NÃO 28
13 E.A.V.N. SÉFORA URBANA DOMÉSTICA SIM NÃO 50
14 E.A.V.N. DAVI URBANA FOTÓGRAFO SIM SIM 30
15 E.A.V.N. FUA URBANA DOMÉSTICA SIM SIM 58
16 E.A.V.N. LÍDIA URBANA DOMÉSTICA SIM SIM 45
17 E.A.V.N. SIMÃO URBANA SERVENTE SIM NÃO 47
18 E.A.V.N. ISABEL URBANA FEIRANTE SIM SIM 41
19 E.A.V.N. EDITE URBANA DOMÉSTICA SIM NÃO 40
1.7 Perfil dos educandos
Os educandos entrevistados correspondem ao universo de dezenove, numa faixa etária
variada: um com 16 anos, cinco de 23 a 28 anos, e treze de 30 a 58 anos. São, na verdade,
mais adultos que jovens. Oito deles nunca estudaram e onze já tiveram alguma experiência
escolar. São todos, com exceção de um, pai e mãe de família.
As ocupações dos educandos da alfabetização de jovens e adultos são variadas, porém
todos pertencem a uma mesma classe social. Eles e elas são: domésticas, prestamistas4,
camponeses, jardineiros, pedreiros, serventes, fotógrafos, feirantes. Dos dezenove
entrevistados, quatorze são mulheres e apenas cinco são homens.
É mister salientar que todos os educandos entrevistados são oriundos de uma mesma
realidade social e econômica, de classe baixa que acreditam numa melhoria de vida através da
alfabetização.
A maioria dos educandos entrevistados já passou pela escola, poucos aprenderam a ler,
a escrever e a interpretar o mundo que o cerca.
É importante frisar também que, em nosso primeiro encontro, os alfabetizandos
ficaram surpresos, receosos e atentos ao que falávamos a respeito da pesquisa, demonstraram
entusiasmo e desejo de colaboração. Nos encontros seguintes, os educandos se tornaram mais
espontâneos e mais encorajados a responderem às questões abordadas, aquecendo o debate e
possibilitando, assim, maiores informações sobre os temas em questão.
Há de se considerar ainda que a fala desses interlocutores foram colocadas exatamente
como se expressavam, com o objetivo de detectar e preservar seu universo vocabular.
É relevante identificar o perfil dos educandos, porque através dele podemos entender,
com maior clareza, a realidade na qual estão inseridos.
1.8 Estruturação do trabalho
Para discutir esta pesquisa intitulada Alfabetizar Jovens e Adultos: O Segredo é a
Inteligência da Prática, foram estruturados quatro capítulos. O primeiro inicia com a
introdução que encaminha o percurso metodológico da pesquisa, expondo desde os primeiros
passos da pesquisa, até o momento último, da utilização das técnicas empregadas na avaliação
4
dos dados. Este caminhar nos permite compreender a trajetória e a seriedade de uma produção
científica.
O segundo capítulo: Aspectos da inteligência humana na prática educativa da
alfabetização de jovens e adultos têm como finalidade esclarecer o tema abordado, que, por
sua vez compreende: a inteligência da prática alfabetizadora na modalidade da EJA; aspectos
da inteligência humana na prática educativa: abertura, intuição, criatividade e curiosidade; o
segredo de uma prática educativa inteligente; e, reflexões acerca de saberes e fazeres no
ensino da alfabetização de jovens e adultos, mantendo um diálogo com os pressupostos
teóricos que fundamentam este estudo.
O terceiro capítulo trata especialmente do educando jovem e adulto considerado a
partir de sua experiência de mundo. Nosso objetivo nesse capítulo é mostrar que os saberes
trazidos por educandos jovens e adultos, diante de sua experiência de vida, de suas práticas
sociais podem ser trabalhados no fazer pedagógico, a fim de provocar uma maior
compreensão do seu próprio mundo e do universo letrado.
Por fim, o quarto capítulo traz reflexões dos dados pesquisados, refere-se aos
resultados da pesquisa com as educadoras e os educandos de Itambé. Nossa pretensão com
esta abordagem é poder contribuir para que, as reflexões em torno das representações das
educadoras e dos educandos da alfabetização, desvelem novas temáticas que sirvam como
impulso para provocar maiores interesses por uma prática educativa inteligente, e, portanto,
mais eficiente no ensino de jovens e adultos.
A pesquisa, cujos resultados aqui se apresentam, trabalha dentre outros, com um
aporte teórico e prático num diálogo com as obras de: Ferreiro (2003), Fonseca (1995), Freire
(1987 e suas várias obras), Moura e Vóvio (2003), Soares (2003), que defendem uma visão de
que os educandos, especialmente o jovem e o adulto, necessitam de uma prática educativa que
vá além da leitura e da escrita, que os incluam neste mundo a partir de sua prática social.
Também são representadas as posições de Morin (2003), Gonçalves (2003) e Assmann (2004)
que, consideram como essencial à utilização de estratégias da inteligência humana no fazer
pedagógico. Inteligências essas não apresentadas a partir de um modelo acabado, mas
construídas num aprendizado cotidiano, que se forma no movimento das experiências do
processo ensino-aprendizagem, na prática educativa.
Compreendido o percurso e a proposta desta pesquisa, analisaremos o II capítulo, com
o objetivo principal de identificar alguns aspectos da inteligência humana na prática
2
ASPECTOS
DA
INTELIGÊNCIA
HUMANA
NA
PRÁTICA
EDUCATIVA DA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Este capítulo apresenta alguns recursos da inteligência humana que podem ser
utilizados na prática educativa da alfabetização de jovens e adultos. Encontra-se estruturado
em quatro momentos, o primeiro, enfoca a inteligência da prática alfabetizadora na
modalidade da EJA; o segundo aborda aspectos da inteligência humana na prática educativa:
Abertura, intuição, criatividade e curiosidade; o terceiro tenta explicitar o segredo de uma
prática educativa inteligente e, o quarto trata da reflexão acerca de saberes e fazeres no ensino
da alfabetização de jovens e adultos.
2.1 A inteligência da prática alfabetizadora na modalidade da EJA
A alfabetização de jovens e adultos é um movimento histórico muito intenso,
complexo, recheado de conflitos de difíceis soluções, que se prolonga por muito tempo no
Brasil. Mas, não pretendemos aqui realizar uma análise histórica, queremos apenas lembrar
que este movimento nos faz perceber a necessidade de buscar práticas educativas inteligentes
que possibilitem atender os interesses dos alfabetizandos, contribuindo na obtenção de uma
aprendizagem mais ampla que ultrapasse o domínio do contar, do ler e do escrever,
permitindo-o fazer a leitura de si mesmo e a leitura de mundo, proporcionando, assim,
condições de sua maior inclusão na sociedade.
A inteligência da prática educativa na alfabetização de jovens e adultos é uma
abordagem que privilegia um saber fazer docente que utilize e desenvolva suas várias
capacidades no processo ensinar-aprender, respeitando e reconhecendo a importância de se
trabalhar com as experiências de vida do educando jovem e adulto. Dessa forma as
inteligências do(a) educador(a) usadas em sua prática educativa, é um fator fundamental para
atender os interesses vitais do educando.
A inteligência deve ser, aqui nesta investigação, melhor esclarecida, pois são variadas
formas de entendê-la, já que ela está sempre em evolução, a qual sofre os desígnios de um
filósofos e cientistas, educadores e pais, mas só muito recentemente ela é concebida como um
fenômeno fluido, plástico e modificável” (FONSECA VITOR, 1995, p. 35).
Entende-se por inteligência, a “faculdade ou capacidade de aprender, apreender,
compreender ou adaptar-se facilmente, intelecto [...], destreza mental, agudeza, perspicácia”
(ARÉLIO, 2001, p. 425). Nesse sentido, a inteligência é, uma disposição de aprender o que se
ensina, estuda ou pesquisa, é também, uma forma de adaptar-se as circunstâncias de uma dada
realidade e, sobretudo, transformá-la.
Contudo, quando se refere ao processo de ensinar-aprender a jovens e adultos é
necessário estimular essa inteligência, motivá-la, tanto no educando, quanto no (a)
educador(a). A prática alfabetizadora exige habilidades que ultrapassam os conhecimentos
pré-estabelecidos dos livros e dos currículos, impondo ao educador e a educadora usar e
desenvolver suas agilidades e capacidades, possibilitando efeitos dinâmicos no processo de
ensino-aprendizagem. Tais efeitos caracterizam-se na obtenção do aprender do educando por
meio da utilização de várias inteligências, que podem ser usadas na prática educativa.
Ao tratar da inteligência, Fonseca Vitor (op. cit, p. 31) lembra Gardner, quando sugere
“não há uma única inteligência, mas sim inteligências múltiplas e independentes”. Gardner
classifica a inteligência em sete modos diferentes de conhecer o mundo:
1) Inteligência corporal, (dança e desporto);
2) Inteligência espacial, (arte, engenharia e ciências); 3) Inteligência lingüística, (escrita, poesia, teatro);
4) Inteligência lógico-matemática, (física, química, biologia, filosofia);
5) Inteligência musical, como capacidade para combinar e compor sons não-verbais (música);
6) Inteligência intrapessoal, (psicanálise, psiquiatria e pedagogia); E,
7) Inteligência social, (sociologia e antropologia). Estas inteligências, bem como outras, são capacidades humanas, utilizadas singularmente ou em conjunto para atender determinados fins.
Há na verdade variadas formas de definir ou entender o significado da inteligência. Assim, a inteligência pode ser compreendida como estratégias usadas para a sobrevivência, adaptação, realização de atividades humana, vegetal ou animal. Morin (1999, p.195) descreve a inteligência como
Além disso, Morin (Ibid. p. 196) assinala que, a inteligência precede a humanidade, o
pensamento, a consciência, a linguagem. Ele afirma que
É entre os vertebrados, especialmente pássaros e mamíferos, que se desenvolve uma arte estratégica individual, comportando astúcia, utilização oportunista do risco, capacidade de reconhecer os próprios erros, aptidão para aprender; qualidades propriamente inteligentes que, reunidos em feixe, permite reconhecer um ser inteligente.
Diante do exposto, nota-se que o uso da inteligência como técnica, habilidades, meios
de sobrevivência, trabalho ou adaptação no mundo não se restringe apenas ao ser humano.
Outros seres vegetais e animais, também desenvolvem capacidades, astúcias, qualidades
inteligentes que garantem sua permanência no mundo através dos tempos.
A capacidade de utilizar a inteligência, se encontra presente em todos os seres, sejam
eles animal, vegetal ou humano. No humano, observamos que a inteligência vem se
constituindo por meio dos tempos, podendo ser aberta, intuitiva, criativa e curiosa.
Não pretendendo aprofundar de forma determinante as definições de inteligência
definidas por Gradner e Morin (nem oferecer uma explicação advinda da psicologia referente
à inteligência), preocupamo-nos em tê-los como referência para refletirmos acerca da
inteligência, possibilitando identificar disponibilidades inteligentes (abertura, intuição,
criatividade e curiosidade) para melhor utilizá-las na prática educativa. O que definimos nesta
pesquisa é como a inteligência humana pode ser capaz de desenvolver estratégias,
habilidades, técnicas e operações no fazer docente da alfabetização de jovens e adultos com
um ensino de qualidade na modalidade da EJA.
É nessa direção, que defendemos uma prática educativa inteligente, capaz de utilizar
variadas aptidões e técnicas para obter um resultado mais eficaz, que leve o educando jovem e
adulto, à condição de cidadão crítico, capaz de intervir em sua sociedade, apoderando-se não
apenas do mundo letrado, mas, sobretudo, de sua compreensão.
Sem a compreensão de mundo letrado nos dia atuais, a pessoa busca
inconscientemente possibilidades e alternativas nem tanto explícita, mas implícitas que
surgem de acordo com as necessidades individuais, exigindo a construção de habilidades,
nunca antes pensada, impondo usar uma inteligência natural, espontânea do próprio ser
humano, como a intuição, a criatividade e uma condição aberta ao novo e ao imprevisível.
Exemplo disso, é o depoimento da aluna entrevistada Mirian, que fala sobre uma de suas
A vida era colocada com as dificuldades da leitura, peguei ônibus errado, fui para um lugar bem diferente, fiquei acompanhado a torre da Telemar, desci do ônibus sem dinheiro, eu vi a torre, segui ela a pé, até chegar lá. A vida se torna mais difícil sem a escola [...] (grifo nosso)
Queremos mostrar com o exemplo de Mirian que ela foi obrigada a criar, de acordo
com as circunstâncias, uma estratégia, que a conduzisse ao seu destino. Esta situação impôs a
utilização de sua capacidade inteligente, de se sobressair por meio de sua intuição e
criatividade. A torre da Telemar acendeu assim, a luz de sua inteligência inventiva,
conduzindo-a de forma correta ao ponto almejado.
Constatamos diante do exposto que o(a) educador(a) pode agir e interagir com o seu
educando, procurando conhecer a realidade concreta de seu cotidiano, a fim de colaborar no
reconhecimento de seu mundo e num olhar mais crítico sobre si mesmo e sobre a realidade
que o cerca, desenvolvendo assim, sua inteligência educativa. Sobre esta questão Freire
(2003, p. 49), inspirado em Karel Kosik, expressa claramente o saber gerado na cotidianidade,
É o espaço-tempo em que a mente não opera epistemologicamente em face dos objetos, dos dados, dos fatos. Se dá conta deles mas não apreende a razão de ser mais profundas dos mesmos. Isto não significa, porém, que eu não possa e não deva tomar a cotidianidade e a forma como nela me movo no mundo como objeto de minha reflexão; que não procure superar o puro dar-me conta dos fatos a partir da compreensão crítica que dele vou ganhando.
Assim, o(a) educador(a) pode esforçar-se em alargar as habilidades de sua
inteligência, encontrando não um modelo, mas diversos caminhos que o possibilitem aprender
melhor, para fazer melhor. A inteligência não é singular, pronta e acabada, “a inteligência
humana é efetivamente algo de transcendente e de muito complexo que não se reduz a uma
definição perfeccionista, inflexível, imutável ou exclusivista”. (FONSECA VICTOR, 1995, p.
38)
Diante do exposto, importa que o(a) educador(a) da alfabetização de jovens e adultos
procure entender e sentir a necessidade de aprender continuamente, de se renovar, tentando
através dos seus e dos saberes de outros se aperfeiçoar, encontrando variadas e novas formas
de usar a inteligência em seu fazer pedagógico, revelando suas distintas aptidões. Como
assinala Vasconcelos (2004, p. 8)
De acordo com o exemplo acima exposto, queremos defender que, os desafios da vida humana impõem condições de adaptação, e, sobretudo, de transformação, desafiando a
utilização de nossas múltiplas inteligências.
Morin (1999, p. 197-198), pensa em 15 qualidades inteligentes que podem ser
utilizadas como capacidade humana, dentre elas destacamos apenas sete por melhor
descreverem explicitamente a concepção de inteligência abordada nesta pesquisa, como
aptidões de uma prática alfabetizadora eficaz na modalidade da EJA:
1) [...] A aptidão para utilizar o acaso para fazer descobertas e a aptidão para demonstrar perspicácia em situações inesperadas;
2) A aptidão sherlock-holmesiana para reconstituir [...] um acontecimento ou um fenômeno a partir de rastros ou de índices fragmentários;
3) Aptidão para conjecturar sobre o futuro, considerando as diferentes possibilidades, [...] considerando incertezas e o surgimento do imprevisível;
4) Aptidão para enriquecer, desenvolver, modificar a estratégia em função das informações recebidas e da experiência adquirida;
5) Aptidão para reconhecer o novo sem o reduzir aos esquemas do conhecido e a capacidade de situar o novo em relação ao conhecido;
6) Aptidão para enfrentar/superar situações novas e a aptidão para inovar dentro do apropriado;
7) Aptidão para reconhecer o impossível, discernir o possível e elaborar roteiros associando o inevitável e o desejável.
A capacidade da inteligência humana não se restringe aos conceitos já elaborados, ao
contrário, ela existe através das experiências peculiares de cada um, em condições surgidas
num determinado momento histórico. A inteligência nesse sentido é, não apenas científica,
mas oriunda da experiência de vida, sendo ela também aberta, intuitiva, criativa e curiosa. É
nesta direção que pode permear uma prática inteligente na alfabetização de jovens e adultos,
cabendo ao educador e a educadora identificar suas inteligências, exercitá-las e
desenvolvê-las no processo ensino aprendizagem, reconhecendo-as como aspectos inteligentes da prática
educativa.
2.2 Aspectos da inteligência humana na prática educativa: abertura, intuição,
criatividade e curiosidade
A inteligência humana tem sido analisada em seus múltiplos significados e é ainda um
universo plástico, num processo de contínua renovação, que caminha de acordo com as
da prática educativa navega, tendo em vista que ela deve ser capaz de compreender as
exigências do mundo atual, que reclama novas habilidades no fazer pedagógico.
É nessa direção acima exposta, que a prática alfabetizadora pode trilhar. Cabe assim,
ao educador e a educadora da alfabetização de jovens e adultos, através do amadurecimento
de seus saberes constituídos por meio de suas experiências, tornar-se apto para ser mais
aberto, intuitivo, criativo e curioso em sua ação educacional. Todavia, esta só terá sentido
nessa dimensão, se valorizar os saberes prévios do educando, constituídos através de sua
prática social, reconhecendo suas verdadeiras necessidades.
Assim, o segredo de uma prática educativa inteligente está no saber fazer uma prática
pedagógica, capaz de atender aos interesses básicos dos educandos, valorizando suas
experiências de vida, pois tanto o educando, quanto o próprio educador, são frutos (corpos) de
sua prática social, de sua vida cotidiana, que envolve seus anseios pessoais, seus sabores e
dissabores, sua relação com o mundo. Essa prática de vida é inseparável da prática
profissional e assim, da prática educativa.
Nesse sentido, inspirados em dentre outros, Morin, Gonçalves, Assmann, Freire e
Alencar, consideramos nesta pesquisa, quatro aspectos da inteligência humana que
destacamos como fundamentais à prática educativa do(a) educador(a) da alfabetização de
jovens e adultos.
O primeiro aspecto refere-se a uma prática educativa Aberta, frisamos nesse sentido, a
necessidade do(a) educador(a) da alfabetização de jovens e adultos ter uma postura flexível e
atenta às transformações do mundo contemporâneo, sendo capaz de modificar e modificar-se,
de aceitar o novo. Isso não quer dizer que, esta condição de flexibilidade é de vulnerabilidade
aos fatos, significa, sobretudo, está atento ao novo. Pois, é necessário ter clareza do contexto
histórico que envolve aspectos político, econômico, social, educacional e cultural de um
determinado tempo e espaço, repleto de acontecimentos surpresas, que abalam as estruturas
vigentes, desencadeando incertezas e mudanças. É necessário assim, está pronto para inteligir
e captar essas transformações. Como assinala Morin (2003, p.16)
Seria preciso ensinar princípios de estratégias que permitiriam enfrentar os imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar seu desenvolvimento, em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certezas.
É importante que o(a) educador(a), esteja também alerta nesta prática aberta, num
estado de busca, à espera e à procura do novo, do inesperado, do imprevisível. “Aprender a
viver em alerta traz uma grande vantagem: pode-se partilhar uma das maiores invenções da
vida, a possibilidade de reter preciosidades do que se vê e do que se sente a partir dos lugares
mais improváveis” (GONÇALVES, 2003, p.10). Esta posição de prontidão permite ao
educador e à educadora obter pistas que indiquem o caminho a ser trilhado em seu fazer
pedagógico, superando suas limitações práticas, teóricas e ideológicas, desafiando-se e
refazendo-se num exercício cotidiano e renovador de seu tempo. Sobre essa questão Morin
(2003, p. 30) ressalta que
O inesperado surpreende-nos. É que nos instalamos de maneira segura em nossas teorias e idéias, e estas não têm estrutura para acolher o novo. Entretanto, o novo brota sem parar. Não podemos jamais prever como se apresentará, mas deve-se esperar sua chegada, ou seja, esperar o inesperado [...]. E quando o inesperado se manifesta, é preciso ser capaz de rever nossa teoria e idéias, em vez de deixar o fato novo entrar à força na teoria incapaz de recebê-lo.
Quando falamos do novo, lembramos de um termo que está sendo usado
fundamentalmente na atualidade: NEOFILIA, que quer dizer literalmente “amor ao novo. No
sentido positivo significa a disposição de adaptar-se à situações e circunstâncias novas. O
gosto pelo novo, pela mudança, é palavra de ordem na seleção profissional” (ASSMANN,
2004, p. 28).
Esse entendimento acima exposto revela que, o ser humano precisa viver neste estado
de busca do novo, especialmente quando nos referimos à educação e especificamente à
alfabetização de jovens e adultos que requer, diante de sua peculiaridade, um trabalho
competente que possa não apenas atrair jovens e adultos para a escola, mas, sobretudo, que os
faça permanecer nela. Assim, o prazer pelo novo, a curiosidade, ou ainda a neofilia
impulsionam, estimulam, colaboram para o desenvolvimento individual e coletivo,
proporcionando o desejo insaciável de querer saber mais, como diz Archanjo (Apud
ASSMANN, op. cit. p. 37) “desejando algo mais: a cor dentro da cor”.
Assim, como ressalta Assmann (2004, p. 30), o gosto pelo novo “é muito mais que um
fator individual que potencializa o crescimento pessoal. É também um fator social
imprescindível às culturas vivas e aos sistemas dinâmicos” é situar-se melhor no mundo. A
sociedade contemporânea, em constante estado de mudanças e inovações, exige do sujeito
atitudes e comportamentos de busca, em qualquer área de conhecimento, para que ele se torne
O segundo aspecto de uma prática educativa inteligente é a Intuição. A inteligência
intuitiva permite ao educador e a educadora da alfabetização de jovens e adultos, perceber
rapidamente, no movimento de sua prática educativa, algo que está por vir. Essa intuição
desperta uma condição de abdução que, torna o sujeito capaz de absorver, de raptar o
conhecimento em sua mente, antes mesmo dele emergir claramente. Como assinala
Gonçalves, trata-se de uma “disponibilidade abdutiva da mente humana capaz de permitir que
sua imaginação e investigação adiantem um cenário e com certa coerência para dar conta dos
aspectos obscuros da prática” (2003, p. 21).
No entanto, é preciso compreender que para intuir sobre algo ou alguma coisa é
preciso antes ter uma idéia ou conhecimento sobre o que se pretende fazer. Mas, essa
capacidade de “prever” o que poderá acontecer no exercício do processo
ensino-aprendizagem, em meio a esse movimento do fazer pedagógico, só será possível se antes
existir um saber, um planejamento desse saber preparando-se para a prática com uma
finalidade. Como diz Freire (1992, p. 84)
Planejar a prática significa ter uma idéia clara dos objetivos que queremos alcançar com ela. Significa ter um conhecimento das condições que vamos atuar, dos instrumentos e dos meios de que dispomos [...] Planejar significa prever os prazos,
os diferentes momentos de ação que deve estar sempre sendo avaliada. (grifos nossos)
É imprescindível que o(a) educador(a) da alfabetização de jovens e adultos perceba
que estudando, preparando-se para atuar no processo ensinar-aprender, ele(a) obtém uma
maturidade, que o(a) conduz para o desenvolvimento de suas idéias e convicções, podendo
produzir uma inteligência intuitiva, que permitirá fluir sua maneira, sua forma particular de
exercer sua prática educativa. Nesse sentido, o educador(a) utiliza sua percepção de mundo,
sua astúcia, argúcia no processo ensino-aprendizagem.
Essa inteligência intuitiva na prática educativa nos faz pensar “a educação a partir da
necessidade humana intrínseca (que não pode esperar) de estar aprendendo” (GONÇALVES,
op. cit. p.13), nos fazendo reportar naturalmente aos primeiros passos da humanidade na terra,
quando homens e mulheres pré-históricos sobreviviam através da necessidade de adaptação
(flexibilidade), da intuição e da criatividade inventiva, para garantir suas vidas.
Portanto, esta inteligência se encontra presente em diversos e distantes contextos
históricos, desde as primeiras aparições da espécie humana na terra, até o momento atual,
através de invenções e habilidades criadas para garantir a sua sobrevivência. É o caso dos