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Para uma definição de maqueta

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Academic year: 2021

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Presidente Doutora Maria Madalena Aguiar da Cunha Matos, Professora Associada,

Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa. Vogais Doutor Carlos Manuel Silva Lameiro,

Professor Associado,

Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa; Doutor Pedro Jorge Monteiro Bandeira,

Professor Associado, Universidade do Minho; Doutor Rui Manuel Reis Alves, Professor Auxiliar,

Universidade Lusíada de Lisboa;

Doutor Pedro António Alexandre Janeiro, Professor Auxiliar,

Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa; Doutora Maria Dulce Costa de Campos Loução, Professora Auxiliar,

Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa.

PARA UMA DEFINIÇÃO DE MAQUETA

REPRESENTAÇÃO E PROJECTO DE OBJECTOS ARQUITECTÓNICOS

Doutorando: João Miguel Ferreira Couto Duarte

Orientador Científico: Doutor Carlos Manuel da Silva Lameiro, Professor Associado da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa

Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa

Doutoramento em Arquitetura – Especialidade de Teoria e Prática do Projecto

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Este trabalho teve o apoio financeiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) com a Bolsa de Investigação SFRH/BD/65017/2009, sendo desenvolvido no Centro de Investigação Arquitetura, Urbanismo e Design (CIAUD) da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa (FAUL).

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RESUMO

Apesar da importância que lhe é reconhecida como dispositivo de representação de arquitectura, sobretudo no âmbito do projecto, a compreensão da maqueta permanece difusa, justificando-se por isso a sua inquirição.

A maqueta será avaliada como instância onde a realidade adquire compreensibilidade, clarificando-se a sua natureza codificada e qual o seu alcance na constituição do pensamento projectual do arquitecto. Partindo do jogo de reenvios estabelecido entre pensamento e representação, e reconhecendo a distinção que sempre terá do seu objecto, será analisado não ‘aquilo’ que o arquitecto pensa ao adoptar a maqueta, mas ‘como’ pensa ao assim proceder. A maqueta será tomada como possibilidade de pensar e não como meio somente de expressar um pensamento autonomamente formulado. Reconhece-se à maqueta uma ‘condição generativa’. A avaliação da maqueta implicará uma avaliação síncrona do desenho, por ser há muito considerado o elemento definidor do trabalho do arquitecto, ainda que esse valor venha a ser revisto.

Partindo da sua compreensão como representação, pretende-se reflectir sobre o alcance da maqueta no projecto de objectos arquitectónicos. Procura-se uma definição de ‘maqueta’.

PALAVRAS-CHAVE

Maqueta; Representação; Projecto de arquitectura; Pensamento projectual; Condição generativa da maqueta.

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ABSTRACT

Despite the importance that it is recognized as a device of representation in architecture, mainly in the project field, the understanding of the scale model is still diffused. Therefore its questioning is justified.

The scale model will be evaluated as an instance where reality acquires comprehensibility, being its codified nature clarified and its range defined in the constitution of the architect’s design thinking. Accepting the resending game that it is established between thought and representation, and acknowledging the distinction it will always have from its object, it should be analyzed not “what” an architect thinks of while adopting a scale model, but “how” he thinks while he or she is going through it. The scale model will be taken as a possibility of thinking and not just a means of expressing an autonomously formulated thought. A “generative condition” will be granted to the scale model. The scale model evaluation will implicate a synchronous evaluation of drawing because it has long been considered as the defining element of the architect’s work even if this value should be revised.

Beginning from its understanding as representation, it is our aim to perceive the reach of the scale model in the design of architectonical objects, to look for a definition of ‘scale model’.

KEYWORDS

Architectural scale model; Representation; Architectural design; Architectural design thinking; Generative condition of the scale model.

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À minha mãe e ao meu pai. À Gabriela, ao Guilherme, à Carlota e à Filipa.

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Doutor Carlos Lameiro, agradeço a generosidade de ter aceitado ser Orientador Científico deste trabalho e a confiança e a serenidade com as quais sempre compreendeu, acompanhou e apoiou o seu desenvolvimento.

À minha família, agradeço o facto de estar incondicionalmente presente, apesar das minhas muitas ausências.

À Teresa Rodeia, agradeço a permanente capacidade para compreender e para me ajudar a clarificar tudo aquilo que ainda era turvo. Agradeço ainda a profunda amizade. Ao Miguel Seabra, agradeço o apoio e a disponibilidade permanentes; ao Rui Alves, a generosidade das críticas; à Cátia Santana, o optimismo; à Maria João Soares, o incentivo. Aos meus amigos, agradeço a confiança.

Ao arquitecto Manuel Mendes Tainha, ao arquitecto Álvaro Siza Vieira, ao arquitecto João Luís Carrilho da Graça e ao arquitecto Nuno Mateus, agradeço as entrevistas concedidas.

Agradeço ainda à Professora Gabriela Celani, à Professora Madalena Cunha Matos, à Professora Marieta Dá Mesquita, à Professora Marta Úbeda Blanco, ao Professor Duarte Cabral de Mello, ao Professor Horácio Bonifácio, ao Professor João Paulo Martins, ao Professor José Pinto Duarte, ao Professor Marcial Echenique, ao Professor Paulo Pereira, ao Professor Rafael Moreira e ao Professor Ricardo Zúquete; ao Dr. José Luís Doria, à Doutora Maria Manuel Torrão, à Doutora Paula Abrunhosa, à Professora Sílvia Anjos, à Engenheira Elsa Negas, ao Arquitecto Caetano de Bragança, ao Arquitecto Pedro Botelho, ao Arquitecto Tiago Matildes e ao Designer Miguel Rangel Pamplona; à Biblioteca da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, ao Palácio Nacional da Ajuda (PNA), ao Museu Arqueológico do Carmo (MAC), à Fundação Instituto Arquitecto José Marques da Silva (FIMS), ao Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), ao Museu da Engenharia Militar (MEM) e ao

Spatial Information Architecture Laboratory (SIAL).

Aos meus alunos, agradeço o facto de, sem o saberem, me terem desde há muito vindo a proporcionar a possibilidade de observar o uso de maquetas.

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NOTAS PRÉVIAS

Neste trabalho, foi seguida a Norma Portuguesa NP405 na elaboração de citações e na organização da bibliografia, sendo adoptado o sistema autor-data-localização aí preconizado. Todas as citações serão enquadradas por aspas duplas “…” seguidas da indicação da respectiva fonte. Qualquer citação será seguida sempre da indicação da respectiva fonte, mesmo que essa fonte tenha sido referida imediatamente antes, não sendo por isso adoptadas expressões como, por exemplo, idem ou op. cit.. As citações em língua estrangeira serão apresentadas no corpo principal do texto traduzidas, procurando garantir maior fluidez na leitura, surgindo na sua forma original em nota de rodapé precedidas pela indicação ‘Tradução do autor. No original: “…”’. Quando uma citação em língua estrangeira é reutilizada, a sua forma original já não será apresentada em nota de rodapé. Não serão traduzidos nomes de obras – livros, artigos, etc. –, ou de lugares, a não ser que tenham designação corrente em língua portuguesa. Na tradução das citações, serão preservados na forma original palavras e expressões que surjam em corpo itálico e as palavras em língua que não a da citação. No interior das citações, será utilizado parêntesis recto ‘[…]’ para indicar supressões e acréscimos de texto, bem como ajustes pontuais – de género, de tempo verbal, etc. – julgados úteis para garantir a compreensão da citação e a sua integração no corpo principal do texto. Será ainda utilizado parêntesis recto no interior das citações para indicar terminologia específica na língua da fonte considerada, como por exemplo ‘concepção física’ [physical design]. Todas as palavras em língua estrangeira, à excepção de nomes de pessoas e de obras – de arquitectura, etc. – mas incluindo títulos – de livros, de artigos, dos respectivos capítulos, etc. – serão apresentados em corpo itálico. Todas as palavras e expressões às quais se atribui um valor semântico particular e ainda noções e títulos – de livros, de artigos, dos respectivos capítulos, etc. – serão enquadradas por aspas simples ‘…’.

As referências bibliográficas serão apresentadas na sua forma completa apenas no final do texto, na Bibliografia, sendo indicada entre parêntesis recto […] a data da edição original da obra caso não tenha sido essa a edição consultada, por exemplo: ALBERTI, L. B. [1485] (2011) Da Arte Edificatória. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. ISBN: 978-972-31-1374-7. No corpo principal do texto, a fonte referida será sempre a edição consultada, por exemplo: Alberti (2011).

Este trabalho está escrito de acordo com as normas de ortografia anteriores ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990.

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PLANO GERAL LISTA DE IMAGENS

I - CONSIDERAÇÕES INICIAIS

I - 1 PROPÓSITOS DA INVESTIGAÇÃO I - 2 PROCEDIMENTOS DA INVESTIGAÇÃO II -DA MAQUETA COMO REPRESENTAÇÃO

II - 1 DA MAQUETA AO MODELO

II - 1. 1 DA ‘MACCHIETTA’ À ‘MAQUETA’ II - 1. 2 A MAQUETA COMO MODELO II - 2 MODELOS

II - 2. 1 A INQUIRIÇÃO DE ‘MODELO’ II - 2. 2 MODELOS CONCEPTUAIS

NOÇÕES GERAIS

A INCAPACIDADE REPRESENTACIONAL DE UM MODELO ‘ESTRUTURALISTA’ A NOÇÃO DE ‘CONCEPÇÃO FÍSICA’, A PARTIR DE FRIGG

NOÇÃO REAJUSTADA DE MODELO CONCEPTUAL II - 2. 3 MODELOS FÍSICOS

NOÇÕES GERAIS

O ESTATUTO DA ‘REALIDADE’

DA ‘REALIDADE’ COMO ENTIDADE REPRESENTACIONAL... ... À ‘REALIDADE’ COMO ENTIDADE CODIFICADA

A ‘REALIDADE’ REVISTA

NOÇÃO REAJUSTADA DE MODELO FÍSICO A REPRESENTAÇÃO RECONSIDERADA II - 3 MAQUETAS

II - 3. 1 O PROBLEMA DA CONDIÇÃO ICÓNICA DA MAQUETA O PROBLEMA DA CONDIÇÃO ICÓNICA DA MAQUETA

A CONDIÇÃO ICÓNICA DA MAQUETA – ÚBEDA BLANCO E HUBERT O SIGNIFICADO DA ABSTRACÇÃO

A INUTILIDADE DA NOÇÃO DE ‘SIGNO ICÓNICO’, A PARTIR DE ECO A IMPREVISIBILIDADE DOS CÓDIGOS ICÓNICOS

O ALCANCE DAS PROPOSTAS DE ECO

O PROBLEMA DA NÃO ARBITRARIEDADE DOS SIGNOS ICÓNICOS A ARBITRARIEDADE DA REPRESENTAÇÃO, A PARTIR DE GOODMAN II - 3. 2 A CONDIÇÃO ICÓNICA DA MAQUETA RECONSIDERADA

DA CONDIÇÃO ICÓNICA DA REPRESENTAÇÃO... ... À CONDIÇÃO CODIFICADA DA MAQUETA O PROBLEMA DA TRIDIMENSIONALIDADE A TRIDIMENSIONALIDADE REVISTA CÓDIGOS GEOMÉTRICOS

OS CÓDIGOS GEOMÉTRICOS DA MAQUETA OUTROS CÓDIGOS GEOMÉTRICOS DA MAQUETA

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II - 4 DA MAQUETA COMO REPRESENTAÇÃO III -CONSIDERAÇÕES INTERMÉDIAS

III - 1 DO ALCANCE DA REPRESENTAÇÃO NO PENSAMENTO

OS ESTATUTOS DO PENSAMENTO E DA REPRESENTAÇÃO A IMPOSSIBILIDADE DO TRANSPARECIMENTO DO PENSAMENTO DO ALCANCE DA MAQUETA NO PENSAMENTO DO ARQUITECTO IV -O PROJECTO DE OBJECTOS ARQUITECTÓNICOS, A PARTIR DA MAQUETA

IV - 1 A OBSERVAÇÃO DO ALCANCE DA MAQUETA PLANOS DE OBSERVAÇÃO

A OPORTUNIDADE DO DESENHO PARA A OBSERVAÇÃO DA MAQUETA O SIGNIFICADO DE ‘PROJECTO’

IV - 2 A ‘INVENÇÃO’ DO ARQUITECTO

IV - 2. 1A ‘INVENÇÃO’ DO ARQUITECTO – PRIMEIRA OBSERVAÇÃO DO ‘ARQUITECTO CONSTRUTOR’…

… AO ‘ARQUITECTO INVENTOR’ ‘DE RE AEDIFICATORIA’

A POSSIBILIDADE DA CONCEPÇÃO PRÉVIA DA OBRA

A MAQUETA COMO SISTEMA DE REPRESENTAÇÃO PROJECTUAL AS PROPOSTAS DE ALBERTI – DA RECUSA DO DESENHO… … À FORMULAÇÃO DA MAQUETA COMO SÍNTESE DO PROJECTO DIFUSÃO DA MAQUETA COMO SÍNTESE DO PROJECTO

OCASO DA MAQUETA COMO SÍNTESE DO PROJECTO

O DESENHO COMO SISTEMA DE REPRESENTAÇÃO PROJECTUAL ‘LETTERA A LEONE X’

A ‘INVENÇÃO’ DO ARQUITECTO – PRIMEIRA OBSERVAÇÃO IV - 2. 2A ‘INVENÇÃO’ DO ARQUITECTO – SEGUNDA OBSERVAÇÃO

DA INVENÇÃO DO ARQUITECTO À INVENÇÃO DOS OBJECTOS ARQUITECTÓNICOS

AS TEORIZAÇÕES DA MAQUETA – DE ALBERTI A DE L’ORME… … E DE SCAMOZZI A ARNHEIM

O ALCANCE DA MAQUETA NA CONCEPÇÃO DOS OBJECTOS ARQUITECTÓNICOS

O ‘EFEITO GENERATIVO’ DA MAQUETA, A PARTIR DE EISENMAN O ‘PODER GENERATIVO’ DO DESENHO, A PARTIR DE EVANS MANIFESTAÇÕES DO ‘PODER GENERATIVO’ DO DESENHO

O ‘PODER GENERATIVO’ DO DESENHO NO PROJECTO DOS OBJECTOS ARQUITECTÓNICOS

O ‘PODER GENERATIVO’ DO DESENHO COMO INTERPRETAÇÃO A CONDIÇÃO GENERATIVA DA MAQUETA

A MAQUETA COMO ORDEM DO PENSAMENTO

OUTRAS MANIFESTAÇÕES DA CONDIÇÃO GENERATIVA DA MAQUETA O (DES)ACERTO DA MAQUETA

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IV - 3 O PROJECTO DE OBJECTOS ARQUITECTÓNICOS, A PARTIR DA MAQUETA V -CONSIDERAÇÕES FINAIS

V - 1 PARA UMA DEFINIÇÃO DE MAQUETA BIBLIOGRAFIA

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LISTA DE IMAGENS

IMAGEM 1 – MAQUETA DO PROJECTO DE PETER EISENMAN PARA A HOUSE X, BLOOMFIELD HILLS, MICHIGAN. ... 127 IMAGEM 2 – MAQUETA DO PROJECTO DE PETER EISENMAN PARA A HOUSE X, BLOOMFIELD

HILLS, MICHIGAN. ... 129 IMAGEM 3 – MAQUETA DO PROJECTO DE FILIPPO BRUNELLESCHI PARA O TAMBOR E CÚPULA E

PARA AS TRIBUNAS DA CATEDRAL DE SANTA MARIA DEL FIORE, FLORENÇA. ... 159 IMAGEM 4 – MAQUETA DO PROJECTO DE FILIPPO BRUNELLESCHI PARA O LANTERNIM DA

CÚPULA DA CATEDRAL DE SANTA MARIA DEL FIORE, FLORENÇA. ... 160 IMAGEM 5 – DESENHO DE FRANCESCO DI GIORGIO MARTINI DE FORTALEZAS. ... 179 IMAGEM 6 – PERSPECTIVAS / VISTAS DE MAQUETAS DE LEONARDO DA VINCI DE IGREJAS DE PLANTA CENTRALIZADA. ... 179 IMAGEM 7 – MAQUETA DO PROJECTO DE BACCIO D’AGNOLO PARA A IGREJA DE SAN

GIUSEPPE, FLORENÇA. ... 186 IMAGEM 8 – DETALHE DA MAQUETA DO PROJECTO DE BACCIO D’AGNOLO PARA A IGREJA DE

SAN GIUSEPPE, FLORENÇA. ... 186 IMAGEM 9 – MAQUETA DO PROJECTO DE BENEDETTO DA MAIANO PARA O PALÁCIO STROZZI,

FLORENÇA. ... 187 IMAGEM 10 – MAQUETAS PARCIAIS DO PROJECTO DE BENEDETTO DA MAIANO PARA O

PALÁCIO STROZZI, FLORENÇA. ... 187 IMAGEM 11 – DESENHO DE VILLARD DE HONNECOURT DO ALÇADO EXTERIOR E DO ALÇADO

INTERIOR DE TRAMO DA CATEDRAL DE REIMS. ... 192 IMAGEM 12 – DESENHO DE ANDREA PALLADIO DO ALÇADO DA FACHADA E DE CORTE PELO

PÁTIO DO PALÁCIO PORTO, VICENZA. ... 192 IMAGEM 13 – MAQUETA DO PROJECTO DE ANTONIO DA SANGALLO, IL GIOVANE, PARA A

BASÍLICA DE SAN PIETRO, ROMA. ... 195 IMAGEM 14 – MAQUETA DO PROJECTO DE MICHELANGELO BUONARROTI PARA A CÚPULA DA

BASÍLICA DE SAN PIETRO, ROMA. ... 196 IMAGEM 15 – MAQUETA DO PROJECTO DE MICHELANGELO BUONARROTI PARA A CÚPULA DA

BASÍLICA DE SAN PIETRO, ROMA. ... 196 IMAGEM 16 – GRAVURA COM CORTE LONGITUDINAL DO PROJECTO DE ANTONIO DA SANGALLO,

IL GIOVANE, PARA A BASÍLICA DE SAN PIETRO, ROMA. ... 198

IMAGEM 17 – GRAVURA COM ALÇADO NORTE DO PROJECTO DE ANTONIO DA SANGALLO, IL

GIOVANE, PARA A BASÍLICA DE SAN PIETRO, ROMA. ... 198

IMAGEM 18 – DESENHO DE BALDASSARE PERUZZI COM PERSPECTIVA DO PROJECTO PARA A BASÍLICA DE SAN PIETRO, ROMA. ... 205

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IMAGEM 19 – THE ORIGIN OF PAINTING ('THE MAID OF CORINTH'), DE DAVID ALLAN. ... 248 IMAGEM 20 – DIE ERFINDUNG DER MALEREI, DE KARL FRIEDRICH SCHINKEL. ... 248 IMAGEM 21 – PROJECTO ATRIBUÍDO A GIOTTO DO ALÇADO DO CAMPANÁRIO DE SANTA MARIA DEL FIORE, FLORENÇA. ... 261 IMAGEM 22 – DESENHO DE ANDREA PALLADIO PARA O PÓRTICO DA BASÍLICA DE SAN

PETRONIO, BOLONHA. ... 263 IMAGEM 23 – IGREJA DE SAN GIORGIO MAGGIORE, VENEZA, DE ANDREA PALLADIO. ... 263 IMAGEM 24 – CÚPULA DA CAPELA DO CASTELO DE ANET, EURE-ET-LOIR, DE PHILIBERT DE L’ORME. ... 267 IMAGEM 25 – PAVIMENTO DA CAPELA DO CASTELO DE ANET, EURE-ET-LOIR, DE PHILIBERT DE

L’ORME. ... 267 IMAGEM 26 – ARKHITEKTONY, DE KAZIMIR MALEVICH. ... 290 IMAGEM 27 – MAQUETA DO PROJECTO DE JOHN HEJDUK PARA A HOUSE II, EM RIDGEFIELD,

CONNECTICUT... 294 IMAGEM 28 – BYE HOUSE, GRONINGEN, DE JOHN HEJDUK. ... 294

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“Por isso, gostaria que se proporcionassem maquetas despojadas e simples, não concluídas com esmero excessivo, polidas e luzidias, nas quais se possa admirar o engenho de um inventor e não a habilidade manual de um artesão” (Alberti, 2011: 189).

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I - 1 PROPÓSITOS DA INVESTIGAÇÃO

Para poder pensar o mundo, o arquitecto representa-o. A representação revela uma compreensão do mundo, viabilizando assim o controlo que sobre o mundo o arquitecto se esforça por exercer. A representação confere ao arquitecto uma possibilidade de pensar o mundo.

No quotidiano, a representação poderá adquirir formulações diversas. A opção por uma dessas formulações será determinada quer pela aparente capacidade de revelar as compreensões do mundo, quer pelas idiossincrasias de cada autor, estabelecidas ambas no quadro das práticas e dos padrões de representação vigentes no contexto cultural onde este opera. A proficiência dessas formulações será aferida em função da informação que proporcionam e da clareza com que o fazem. A representação deverá transparecer as compreensões do mundo.

Mas a representação terá porventura implicações mais profundas. É isso que parece resultar da origem latina de ‘representar’ (Machado, 1990, vol. V: 80) – ‘repraesentare’ significa tornar presente (Ferreira, 1983: 594). Se representar significa tornar presente, então talvez a representação deva ser tomada já não como modo apenas de fazer transparecê-las, mas, sobretudo – suspeita-se –, de constituir as compreensões do mundo. Tornar presente significa conferir uma presença e a presença assim conferida não parece poder escapar às contingências das representações que em cada caso forem adoptadas para o fazer. De algum modo, representadas, as compreensões do mundo serão substituídas por aquelas que a representação permitirá formular. Mas nem sempre essa substituição será perceptível, como nem sempre será também perceptível aquilo que nela está implicado. Num processo de projecto, no qual o objecto em observação não tem ainda uma existência autónoma da representação que o torna presente, a oportunidade dessa substituição será talvez mais evidente – será no sucessivo confronto com as suas representações que se viabiliza a compreensão e, portanto, a invenção do objecto alvo do projecto. Mas há também que considerar a sua oportunidade quando os objectos são enfrentados na sua concretude. Mesmo que essa concretude pareça sobrepor-se sempre a qualquer representação, que assim surgirá sempre relativizada, parece afinal ser na representação que a compreensão dos objectos consegue ser resgatada da impossibilidade de os tomar em toda a sua complexidade e em toda a sua completude. Independentemente das suas diversas formulações e independentemente também da concretude do seu objecto, parece afinal ser na representação que o mundo adquire compreensibilidade. E se assim é, a

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representação terá de ser tomada já não como modo apenas de fazer transparecer as compreensões do mundo, mas como condição da possibilidade de as constituir. A possibilidade de compreender o mundo, a possibilidade de o pensar, parece pois imbricada com a necessidade de o representar. Talvez até a própria compreensão do mundo tenha afinal de ser tomada como representação, independentemente de poder vir depois a ser traduzida numa das suas diversas formulações. Por isso se suspeitou – e se suspeita agora de um modo até mais reforçado – que a representação será mais do que mero transparecimento das compreensões do mundo. Mas não só. As implicações da representação parecem afinal revelar-se radicais. Se o mundo adquire compreensibilidade não aquém mas na representação, isto é, se o mundo parece ter compreensibilidade apenas como representação, e se cada sujeito constituirá a sua existência ao confrontar-se com o mundo no qual se inscreve, então a existência do sujeito parece não poder ser constituída e, portanto, ponderada à margem das representações que sucessivamente elabora do mundo. “A representação é a nossa possibilidade de relação com o mundo – e, portanto, com o outro –, mas raramente nos lembramos de que representar está para além da cópia à vista. Representar é a possibilidade de significar. Representar é a possibilidade d’alguém estabelecer um sentido com aquilo que o rodeia, e estabelecendo-o, encontra uma possibilidade de existir” (Janeiro, 2010: 17).

Não está em causa neste trabalho a constituição da existência do sujeito. A referência à relação que essa existência estabelecerá com a representação denota apenas o reconhecimento da complexidade daquilo que uma reflexão acerca da representação poderá enfrentar. Neste trabalho, estão em causa antes, como pano de fundo, as relações estabelecidas entre o pensamento projectual do arquitecto e a representação. E essas serão, conforme as reflexões até agora feitas parecem apontar, relações que em muito ultrapassam uma estrita dimensão instrumental. Ponderar essas relações implicará pois ponderar já não como é que a representação revela uma compreensão do mundo, porventura nisso se esgotando, mas como é que as compreensões do mundo se revelam e, portanto, se constituem na representação. Ponderar essas relações, em particular no âmbito de um processo de projecto, implicará ponderar um jogo de reenvio constante entre pensamento e representação, que será talvez até um jogo apenas entre representações, no qual as aparentes relações de prevalência do pensamento sobre a representação deverão ter de ser reajustadas como relações de equidade. Mas estas são ainda suspeitas iniciais, intuições apenas, perscrutadas ao se considerar a representação de modo lato. É contudo uma representação particular que agora se pretende inquirir: a maqueta.

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De entre as diversas formulações da representação, o arquitecto conta com a maqueta para poder pensar o mundo. A maqueta será uma representação singular. Singular, desde logo, porque de todas as representações de que o arquitecto dispõe a maqueta parece ser aquela que, por causa da sua natureza tridimensional e da sua dimensão construtiva, mais próxima se encontrará dos objectos arquitectónicos. Entre ambos, parece estabelecer-se uma natural semelhança, que nalguns casos será reforçada até pelo facto de uma maqueta poder constituir-se – porventura até construir-se – como um objecto quasi-arquitectónico. As maquetas de grandes dimensões cujo interior poderá até ser experimentado assim parecem indicá-lo. Mas a maqueta será uma representação singular, também, porque, ao contrário daquilo que sucede com outras representações de arquitectura – com o desenho, por exemplo – parece tender a ser negligenciado o seu impacto nas compreensões que o arquitecto faz do mundo. Isto é: reconhece-se esse impacto ao reconhecer-se as aparentes fidedignidade e evidência com que uma maqueta permite transparecer o pensamento do arquitecto, mas não se reconhece o quanto a maqueta poderá determinar a constituição desse pensamento ao representá-lo, mais ainda se adoptada no âmbito de um processo projectual. De algum modo, ao parecer reproduzir os objectos arquitectónicos, mesmo que essa reprodução tenda a estar sujeita a uma escala, a maqueta surgirá tão naturalmente concordante com o pensamento do arquitecto – tão naturalmente sua cúmplice, talvez até – que não merecerá sequer ser inquirida. Entre o acolhimento que proporciona às compreensões do mundo por aparentemente lhes ser próxima e o artifício que a permeia por ser uma representação, é difuso aquilo que está implicado na adopção de uma maqueta. Há no modo como é enfrentada a sua condição de representação uma ambiguidade que justifica a inquirição da maqueta.

Este trabalho radica-se pois numa dúvida, a partir de agora tomada como questão desencadeante da investigação. Assim: qual o alcance da maqueta na constituição do pensamento projectual do arquitecto?

Inquirir assim a maqueta implicará inquirir o modo como participa no já referido jogo de reenvios entre pensamento e representação. A importância da maqueta na prática de alguns autores, confirmada desde logo pelos próprios, e as possibilidades das tecnologias de modelação e de fabricação assistidas por computador – Computer

aided design / Computer aided manufacturing (CAD/CAM) – verificam a oportunidade

dessa inquirição. No caso, o alcance da maqueta poderá ser perspectivado num horizonte de ‘profundidade’, observando o modo como as suas múltiplas formulações viabilizam a definição de informação ao longo de um processo de projecto, desde a

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afirmação de intenções iniciais até à fixação definitiva da configuração dos objectos arquitectónicos. Mas é mais do que apenas a participação da maqueta nesse jogo de reenvios que está em causa. Inquirida em ‘profundidade’, mesmo que se reconheça que deverá modelar a respectiva clarificação, a maqueta parece continuar a ser abordada sobretudo em função do pensamento que a convocou, sendo por isso de algum modo reduzida, mais uma vez, a uma dimensão apenas instrumental. É contudo o modo como a maqueta determina a própria definição desse jogo de reenvios que está em causa, pois é o seu alcance na constituição do pensamento projectual do arquitecto que se pretende discernir. A inquirição deverá assim ser perspectivada num horizonte de ‘anterioridade’. Mais do que equacionar ‘aquilo’ que um arquitecto pensa quando transcreve o seu pensamento numa maqueta, há que equacionar ‘como’ é que o arquitecto pensa ao assim proceder, radicando a inquirição também no território da conceptualização do projecto de arquitectura e não somente no território da concepção dos objectos arquitectónicos. É, pois, como possibilidade de ordenar o pensamento projectual que a maqueta deverá ser inquirida.

A oportunidade de assim inquirir a maqueta é reforçada pelo contexto onde ocorreu a sua generalização enquanto meio de representação de âmbito projectual. Apesar de a sua adopção ser anterior, essa generalização é síncrona com as transformações culturais operadas a partir do início do Renascimento Italiano. A partir de então, a par de meio de apresentação, a maqueta passaria a estar associada também ao processo de projecto, acompanhando um progressivo reconhecimento da dimensão intelectual do trabalho do arquitecto e uma concomitante redefinição do modo de esse trabalho ser efectivado. “Imbuídos de uma renovada confiança na sua capacidade intelectual, [os arquitectos] ansiavam desenvolver uma nova arquitectura baseada já não nas tradições da Igreja, mas que expressasse a clareza matemática e a racionalidade que percebiam na ordem divina do universo” 1 (Roth, 2000: 341). Da condição de ‘construtor’ radicado no estaleiro da obra e focado sobretudo na prática construtiva, o arquitecto passaria à condição de ‘inventor’, desobrigado da presença em obra e disponível para a ideação de objectos que poderiam nem sequer ter já de ser construídos. De modo gradual, os objectos arquitectónicos deixariam de assentar em esquemas predefinidos cujas variações eram resolvidas aquando da sua construção, para passarem a resultar de um processo criativo, faseado na definição de uma ideia,

1

Tradução do autor. No original: “Imbuidos de una renovada confianza en su capacidad intelectual, ansiaban desarrollar una nueva arquitectura, basada no ya en las tradiciones de la iglesia, sino que expresase la claridad matemática y la racionalidad que percibían en el orden divino del universo” (Roth, 2000: 341).

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no seu desenvolvimento e na fixação dos respectivos resultados. Era necessário pois assegurar a controlabilidade, a mensurabilidade e a comunicabilidade do trabalho do arquitecto, o que seria garantido pela representação. A representação conferiria ao arquitecto a possibilidade de assim entender e projectar os objectos arquitectónicos. Na representação, isto é, no projecto, e já não apenas na obra, ficariam plasmadas as suas intenções. Permaneceria assim – e ainda permanecerá – a relação entre a representação e o pensamento projectual. Talvez a representação tenha capacitado sempre o arquitecto como ‘inventor’, sempre que este a tenha usado. E talvez a tenha usado sempre, ainda que de modos diversificados. Aquilo que confere singularidade à relação a partir de então generalizada entre o trabalho do arquitecto e a representação será o facto de ter sido também então pela primeira vez teorizada. São de Leon Battista Alberti (1404-1472) as reflexões inaugurais acerca da dimensão intelectual do trabalho do arquitecto, desenvolvidas em ‘De Re Aedificatoria’, concluído em 1452, que sintomaticamente são propostas a par das reflexões também inaugurais acerca dos instrumentos que se lhe adequavam: o desenho e, sobretudo, a maqueta. Acerca da maqueta, Alberti afirmará: “gostaria que se proporcionassem maquetes despojadas e simples, não concluídas com esmero excessivo, polidas e luzidias, nas quais se possa admirar o engenho de um inventor e não a habilidade manual de um artesão” (Alberti, 2011: 189). Ainda hoje este desejo será prevalecente.

Este trabalho tem então como propósito primeiro compreender o alcance da maqueta na constituição do pensamento projectual do arquitecto. Mas o cumprimento desse propósito, ao implicar a observação da maqueta na definição do jogo de reenvios que se estabelece entre pensamento e representação, não parece poder ser dissociado da compreensão da relação que a maqueta estabelece com os objectos arquitectónicos. Aparentemente, e independentemente agora de integrar um processo projectual – suspeita-se, aliás, que o alcance da representação na compreensão dos objectos será independente da concretude destes –, essa relação será assegurada na medida em que a maqueta reproduzirá algumas das propriedades desses objectos, isto por causa das suas já referidas tridimensionalidade e dimensão construtiva. Por isso a natural semelhança que parece estabelecer-se entre ambos e por isso também a comum classificação da maqueta como um modelo icónico (Echenique, 1975: 172). Mas essa capacidade de reprodução de propriedades, cuja oportunidade terá de ser averiguada, não conseguirá colmatar a manifesta distinção – desde logo dimensional, mas também geométrica, material, de comportamento estático, etc. – que sempre existirá entre uma maqueta e o seu objecto. Aliás, pese embora todo o esforço – ou talvez toda a ilusão – de aproximação, essa distinção será até necessária para estabelecer a representação.

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Só sendo distintos, a representação deverá conseguir substituir e portanto representar os seus objectos. Assim, a par de uma semelhança aparentemente natural – ou talvez ao seu invés –, haverá que ponderar a eventualidade de a relação que a maqueta estabelece com os objectos arquitectónicos assentar, pelo menos em parte, se não mesmo na totalidade, num conjunto de vínculos artificiais, talvez mesmo arbitrários, num sistema de convenções, portanto, que permita que um objecto – uma maqueta –, sendo distinto de outro objecto – um objecto arquitectónico –, possa torná-lo presente, constituindo uma sua representação. Esses vínculos deverão por isso ser inquiridos. A sua compreensão constituirá o outro propósito deste trabalho.

Surge pois uma nova dúvida na qual este trabalho também se radica, e cujo esclarecimento deverá anteceder até o esclarecimento da dúvida tomada já como questão desencadeante da investigação, como se de um seu considerando prévio se tratasse. Assim: como é que uma maqueta representa um objecto arquitectónico? Inquirir assim a maqueta implicará então inquirir os eventuais sistemas de convenções que permitem reconhecê-la como substituto de um objecto arquitectónico. É possível discernir a necessidade dessas convenções desde logo nas propostas de Alberti (2011: 189) – o despojamento e a simplicidade recomendados para as maquetas requerem um código que permita aí interpretar a complexidade dos seus objectos. Porém, não é claro o quanto a compreensão da maqueta depende dessas convenções – revelam-se necessárias, por exemplo, em relação aos materiais, por se distinguirem dos materiais do seu objecto, mas parecem já dispensáveis em relação às formas geométricas, por causa da condição tridimensional que a maqueta partilha com os objectos arquitectónicos. Apenas a abstracção inerente à representação fará sustentar a possibilidade de a relação que a maqueta estabelece com o seu objecto ser uma relação convencionada. De algum modo, a eventual natureza codificada da maqueta colide com a evidência da sua capacidade representacional, sublinhada sempre pela facilidade com a qual é compreendida. Mas a suspeita fica: a maqueta não deverá distinguir-se, na sua eventual natureza codificada, de qualquer outra representação, mesmo onde essa natureza é mais evidente, como o é, por exemplo, no desenho. E, confirmando-se, o reconhecimento da natureza codificada da maqueta parece ter uma implicação radical: se é a interpretação proporcionada por uma convenção e não uma qualidade intrínseca que vincula uma maqueta a um objecto arquitectónico, torna-se necessário ponderar sob que condições um objecto poderá constituir-se como uma maqueta de um outro objecto. É a própria noção de ‘maqueta’, se entendida como identidade a priori de alguns objectos, que parece estar em causa.

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Em síntese, a partir de uma questão inicial, articulada com uma outra espoletada na sua sequência e cujo esclarecimento acabará até por anteceder o esclarecimento dessa primeira questão, este trabalho desdobra-se na definição e no cumprimento de dois propósitos distintos ainda que necessariamente complementares: por um lado, de início, o propósito de compreender a constituição da maqueta como dispositivo de representação de arquitectura, discernindo o modo como cumpre o significado fundador de ‘representar’ – está em causa a identificação da natureza codificada da relação que a maqueta mantém com os seus objectos, precisando em particular os códigos em que assenta, as razões da sua compreensibilidade e o impacto que têm na possibilidade de apreender como uma maqueta um determinado objecto; por outro lado, considerando os contributos decorrentes do cumprimento desse propósito inicial, o propósito de compreender o alcance da maqueta na constituição do pensamento projectual do arquitecto – está agora em causa quer o modo como a maqueta tornará sucessivamente presente o seu objecto, nos jogos de reenvios que deverá estabelecer com o pensamento, quer, sobretudo, o modo como intervém na constituição desses jogos, discernindo-se assim não tanto ‘aquilo’ que o arquitecto pensa ao longo desse processo mas antes ‘como’ é que o arquitecto pensa ao convocar a maqueta para definir e se confrontar com o objecto do seu pensamento.

Partindo da sua compreensão enquanto representação, pretende-se compreender o alcance da maqueta no projecto de objectos arquitectónicos. Procura-se uma definição de ‘maqueta’.

Não se pretende atingir uma formulação definitiva capaz de circunscrever um conjunto preciso de objectos. Fazê-lo permitiria porventura determinar ‘o que é’ uma maqueta, isolando as condições inerentes à sua constituição e, desse modo, promover uma possível optimização do seu uso. Mas procurar essa formulação, mais ainda se se confirmar a sua dependência de um sistema de convenções, parece ignorar o carácter circunstancial do qual deverá revestir-se o reconhecimento de qualquer maqueta. A procura de ‘o que é’ uma maqueta deverá assim imbricar-se com a procura de ‘por que razão é’ uma maqueta, aceitando-se para isso inquirir não um objecto, mas o processo da sua interpretação, e portanto os vínculos que permitem aceitar, de acordo com uma dada convenção e para um dado efeito, que esse objecto possa substituir um objecto arquitectónico, determinando assim a sua compreensão. Ao se procurar uma definição de ‘maqueta’, pretende-se compreender quais as circunstâncias em que é viabilizado esse processo de interpretação, para se compreender depois as suas consequências na conceptualização da arquitectura e na concepção de objectos arquitectónicos.

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I - 2 PROCEDIMENTOS DA INVESTIGAÇÃO

Face à natureza epistemológica do problema que está na origem deste trabalho – ao se pôr em causa a natureza da relação que a maqueta estabelece com o pensamento projectual do arquitecto põe-se em causa não tanto o objecto desse pensamento mas, sobretudo, as condições em que se dá o conhecimento desse objecto e, desse modo, aquilo que desse objecto se conhece e o modo como se o conhece –, a investigação deverá permitir contrapor a um certo quadro teórico de compreensão da relação que a maqueta estabelece com o pensamento projectual do arquitecto, porventura marcado por uma relativização da representação face ao pensamento que a convoca, um outro quadro que admita o reconhecimento e o ordenamento do jogo de reenvios em que empiricamente se suspeita consistir essa relação. É pois como teorização sobre essa relação – sobre a sua natureza, a sua constituição, as suas implicações – que esta investigação é perspectivada.

É possível considerar que o novo quadro teórico que se pretende constituir deverá ser formulado no âmbito de um território disciplinar particular, assumindo desde logo a eventualidade de os seus limites possuírem uma configuração de contorno variável. Esse território estará imbricado quer com o território da ‘Teoria da Representação’, que terá genericamente como objecto o acto de ‘tornar presente’, quer com o território talvez mais lato da ‘Teoria do Pensamento Projectual’, que terá como objecto, também genericamente, o pensamento de índole criativa. Ao ter como objecto o ‘acto de o pensamento projectual se tornar presente’ – a designação é apenas circunstancial –, crê-se que esse território permitirá sediar uma discussão da maqueta nos termos em que esta tem vindo a ser ponderada. Eventualmente – e essa é uma suspeita que deverá ser esclarecida no decurso da investigação –, a comum separação dos dois territórios com os quais este novo se liga poderá até revelar-se desajustada, se se confirmar, como aliás se observou já, que a possibilidade de pensar o mundo está imbricada com a necessidade de o representar. Mas a investigação não poderá ficar circunscrita a esse território, já que aquilo que se pretende discutir não parece poder ser equacionado no âmbito apenas dos seus limites. A assunção da eventualidade de esses limites terem uma configuração de contorno variável confirma esta verificação. Serão por isso convocadas reflexões desenvolvidas noutros territórios, mesmo que a maqueta não seja aí visada: nos territórios da Filosofia, da Filosofia das Ciências e da Teoria e da Psicologia da Arte, nos territórios da Semiótica e da Semiologia e ainda no território da Geometria, isto naquilo que concerne mais à compreensão da dimensão representacional da maqueta; e nos territórios da Teoria e da História da Arquitectura,

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nos territórios da Teoria e da História da Arte e no território da Representação de Arquitectura, considerando aí em particular o desenho, isto agora naquilo que concerne à compreensão do alcance da maqueta no projecto dos objectos arquitectónicos. A investigação terá pois um carácter multidisciplinar, ainda que as reflexões assim elaboradas devam ter a sua síntese feita sempre no território cujos limites foram agora identificados. Serão assim equacionadas, por exemplo, as noções de ‘representação’, de ‘realidade’, de ‘abstracção’, de ‘signo icónico’, de ‘código’, de ‘semelhança’ e de ‘arbitrariedade’, numa asserção lata, num primeiro momento, para, num segundo momento, serem equacionadas em relação à maqueta, o que implicará por sua vez equacionar as noções de ‘escala’ e de ‘código geométrico’, e as noções de ‘poder generativo’ do desenho e da ‘condição generativa’ da maqueta.

Considerando, por um lado, a natureza dos propósitos já definidos e, por outro, o carácter teórico da informação que terá de ser ponderada, carácter esse confirmado pelos âmbitos dos territórios disciplinares aos quais se recorrerá, e sobretudo porque se reconhece a “constatação da inexistência de um ponto mítico – equidistante à obra e à crítica, à coisa e ao seu pensamento –, i.e., de um local privilegiado de observação da realidade que se observa, consequentemente exterior a ela” (Lameiro, 1994: 11), crê-se ser adequado optar metodologicamente por desenvolver a investigação como um processo sucessivo de argumentação e de contra-argumentação. A imagem de uma linha sinusoidal que terá como linha de referência o objecto a inquirir será aqui porventura oportuna. Será um processo sustentado na revisão quer, desde logo, da produção teórica que tem de um modo mais directo a maqueta como objecto, quer, naturalmente, da produção teórica procedente dos territórios disciplinares já referidos, que muitas vezes não estão sequer relacionados com a arquitectura e o seu projecto. Mas esse processo será sustentado também na observação de maquetas, quer de um modo mais dirigido, já que determinado pelos propósitos deste trabalho, quer de um modo menos evidente, mas não menos importante, resultante de umas há muito contínuas adopção e ponderação de maquetas, decorrentes da prática do projecto de arquitectura desenvolvida em simultâneo com a prática docente nas áreas de ‘projecto’ da licenciatura em arquitectura na Universidade Lusíada de Lisboa. À formulação prévia de um ‘Estado da Arte’, crê-se pois ser oportuno contrapor uma investigação compreendida como uma contínua e cumulativa, mas não à partida e em definitivo encadeada, revisão de referências teóricas, tomando cada nível dessa revisão, que se aproximará de um estado da arte mais circunscrito, como base do nível seguinte, num processo que deverá ter a sua conclusão no esclarecimento cabal das dúvidas que se encontram na origem da investigação, isto é, um esclarecimento equilibrado entre os

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propósitos já formulados e a precariedade que um quadro teórico da natureza daquele que se procura teorizar sempre terá. A lógica argumentativa constituirá porventura o instrumento de validação fundamental desse processo (Groat e Wang, 2002: 302), já que o discurso, tomado também num jogo de reenvios com o pensamento, será, no caso, a instância a partir do qual se estruturará a observação do objecto em inquirição. É pois na teoria e na prática do projecto – o ramo de especialidade no qual se inscreve este trabalho – que se procura fundamentar a investigação.

A investigação será desdobrada em duas partes, que constituirão o corpo principal deste trabalho, determinadas a partir dos dois propósitos já considerados. Estas duas partes do trabalho serão articuladas por uma terceira – ‘Considerações intermédias’. Na primeira dessas partes – ‘Da maqueta como representação’ –, será equacionada a dimensão representacional da maqueta, procurando contrapor aos limites da sua classificação como ‘modelo icónico’, que decorrem dos limites da própria noção de ‘signo icónico’, a possibilidade de a compreender como resultado de uma relação convencionada, discernindo, em consequência, quais os códigos aí implicados. Em particular, serão confrontadas propostas de Eco (1997; 2005) com propostas de Goodman (1976), o que deverá permitir verificar a arbitrariedade que subjaz à relação que a maqueta estabelece com os objectos arquitectónicos. Esse confronto recorta-se de um fundo em muito definido a partir de argumentos da linguística. Na segunda dessas partes – ‘O projecto de objectos arquitectónicos, a partir da maqueta’ –, e dando continuidade ao equacionamento da sua dimensão representacional, será questionado o alcance da maqueta na constituição do pensamento projectual do arquitecto, identificando, de início, o impacto da maqueta nas redefinições da figura do arquitecto e da sua prática, num processo que não poderá ser dissociado de uma revisão do impacto que aí teve o desenho, para depois ser questionado o impacto da maqueta quer no modo como ordena o pensamento projectual do arquitecto, quer no modo como permite a sua evolução. Pelo seu carácter inaugural, e porque muito daquilo que aí é manifestado marca ainda hoje o uso da maqueta, serão ponderadas as propostas de Alberti (2001). Serão ainda ponderadas a proposta de Evans (1997) acerca do ‘poder generativo’ do desenho e a proposta de Eisenman (in Frampton e Kolbowski, 1981) acerca, agora, do ‘efeito generativo’ da maqueta. Pelos distintos equilíbrios que as respectivas práticas projectuais comportam entre o uso do desenho e o uso da maqueta, foram realizadas entrevistas ao arquitecto Manuel Tainha, ao arquitecto Álvaro Siza Vieira, ao arquitecto João Luís Carrilho da Graça e ao arquitecto Nuno Mateus. As transcrições dessas entrevistas são apresentadas em apêndices. Complementam a bibliografia consultada.

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“[O] modelo físico tem um ligeiro estatuto de outsider. Num modelo físico parece existir menos código, menos representação, menos conversão de dados para meios convencionais e, por isso, o objecto – o modelo – parece mais real” 2 (Selenitsch in Burry, Ostwald, Downton e Mina, 2007: 4).

2

Tradução do autor. No original: “the physical model has a slightly outsider status. In a physical model there appears to be less code, less representation, less conversion of data into conventional means, and hence the object – the model – appears to be more real” (Selenitsch in Burry, Ostwald, Downton e Mina, 2007: 4).

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II - 1 DA MAQUETA AO MODELO

II - 1. 1 DA ‘MACCHIETTA’ À ‘MAQUETA’

Segundo o ‘Grande Dicionário da Língua Portuguesa’, uma maqueta é um “[e]sboço, em tamanho reduzido, de escultura, de pintura, de obra de arquitectura, etc., moldado em barro ou em cera; [p]rojecto reduzido, em relevo, de um monumento, de uma construção, etc.” (Machado, 1991, vol. IV: 29). ‘Maqueta’ provém do francês maquette, que provém, por sua vez, do italiano macchietta – pequena mancha –, um diminutivo de macchia, e macchia – mancha – tem origem latina em macŭla (Machado, 1990, vol. IV: 39), que significa mancha e nódoa, mas também infâmia, vergonha e desonra (Ferreira, 1983: 696).

A efectiva vulgarização da palavra é recente, datando já do século XX. Na revista ‘A Arquitectura Portuguesa e Cerâmica e Edificação, reunidas’, por exemplo, ‘maquete’ – ainda um galicismo, muitas vezes coexistente com ‘maquette’ – apareceria pela primeira vez em Abril de 1935 (Coelho, 1937: 2), reportando-se à maqueta do projecto do novo Palais des Expositions pour l’OTUA, em Paris, apresentado em concurso, em 1934, em conjunto pelo arquitecto Eugène-Elie Beaudouin (1898-1983) e pelo arquitecto Marcel Lods (1891-1978) (Raveloarisoa e Filhon, s.d.). Contudo, fora das publicações da especialidade, a palavra era já usada, como se confirma, por exemplo, com a referência à ‘maquette’ – ainda em francês – da Igreja e Escola de Artes e Ofícios da Beira, em Moçambique, inaugurada em 1925 (Sopa e Fernandes, s.d.), que foi apresentada na ‘1.ª Exposição Colonial Portuguesa’, que teve lugar no Porto, em 1934 (Agência Geral das Colónias, 1934: 121). Ao contrário daquilo que aconteceu na norma do português europeu, onde a sua grafia viria a fixar-se na forma ‘maqueta’, no Brasil a grafia da palavra permaneceria mais próxima da sua origem francesa, vindo a fixar-se na forma ‘maquete’ (Academia Brasileira de Letras, s.d.).

As primeiras definições de ‘maqueta’ em português datam do final do século XIX. Contudo, a palavra seria já usada, conforme fica claro na sua primeira dicionarização. ‘Maquetta’ terá sido registada pela primeira vez no ‘Diccionario technico e historico de pintura, esculptura, architectura e gravura’, editado em 1875, sendo aí definida como o “primeiro e pequeno esboço que os esculptores modelam em barro ou cera, de alguma estátua ou outra obra de esculptura, que intentam executar; do mesmo termo ha muito usado pelos nossos artistas, se servem os pintores para designar os seus primeiros esboços feitos sobre papel, cartão ou panno” (Rodrigues, 1875: 251). Nesta definição,

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a maqueta é tomada como registo de ensaio, mediando, no processo de criação, entre as formulações iniciais ideadas pelo artista – escultor ou pintor – e a sua subsequente estabilização. Por se tratar de um esboço, comportando por isso maior definição do que aquela exigida a um esquisso (Rodrigues, 1875: 163), permitiria já observar a configuração da obra, mesmo que essa configuração não fosse ainda definitiva. Este sentido é de algum modo consentâneo com a noção de imprecisão que parece resultar de macchia, a origem italiana de ‘maqueta’. Quer pelos materiais que refere, quer pelo modo como define o seu carácter de ensaio, é possível discernir na definição de ‘maquette’ apresentada por Boutard no ‘Dictionnaire des Arts du Dessin : la peinture, la

sculpture, la gravure et l’architecture’, de 1826, a origem da definição de ‘maquetta’

proposta por Rodrigues (1875: 251). Rodrigues assume, aliás, o trabalho de Boutard como uma das obras tomadas como referência para o seu Diccionario. Para Boutard, uma maqueta “[é], para o escultor, um pequeno modelo onde nada está terminado, que não apresenta se não o primeiro pensamento acerca da formação do grupo e da pose das figuras. As maquetas fazem-se por vezes em cera e mais frequentemente em barro; são para o escultor aquilo que são para o pintor os esquissos feitos por impulso” 3 (Boutard, 1826: 414).

Mas esta definição inicial ainda não considerava a ‘maquetta’ como representação de arquitectura. Para a arquitectura, continuava a ser definido o termo ‘modelo’, embora dotado de valências distintas. “Em architectura chamam-se modelos á representação exacta de edifícios ou monumentos, feitos de madeira em pequena escala, que servem para guiar os que são encarregados de os executar em ponto grande” (Rodrigues, 1875: 261). Ao contrário daquilo que acontecia em relação à ‘maquetta’, Rodrigues diverge de Boutard em relação ao ‘modelo’, ao entender este “não passa[r] de um objecto de agrado, menos apropriado para dar às pessoas da arte uma ideia do edifício, do que o fariam as plantas e os alçados meticulosamente desenhados e cotados com exactidão” 4 (Boutard, 1826: 431, 432). Na definição dada por Rodrigues

(1875: 261), permanece antes o lastro da primeira definição de ‘modelo’ em português. A primeira dicionarização da palavra ‘modelo’ com o significado de representação de arquitectura é anterior à de ‘maqueta’, tendo ocorrido no ‘Vocabulario Portuguez e

3

Tradução do autor. No original: “Est, pour le sculpteur, un petit modèle où rien n’est arrêté, qui n’offre que la première pensée de la formation du groupe et de la pose des figures. Les maquettes se font quelquefois en cire, et plus souvent en terre; elles sont, pour le sculpteur, ce que sont pour le peintre les esquisses heurtées” (Boutard, 1826: 414).

4 Tradução do autor. No original: “n’est guère qu’un objet d’agrément, moins propre à donner aux gens de

l’art une idée de l’édifice, que ne feroient des plans et des élévations soigneusement dessinés et cotés exactement” (Boutard, 1826: 431, 432).

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Latino’ de Bluteau, concluído em 1728. “Modêlo ou modello. Na arte da pintura, he hua figura pequena em barro, ou cera, para por ella se fazer em grande. Os Architectos, que empreendem grandes edificios, fazem modelos de relevo, para melhor acertarem na execução de sua ideia, cada official faz modelos com differentes proporções, & com differentes materiais conforme a obra que intenta fazer” (Bluteau, 1716, tom. V: 527). Ao invés da maqueta, o modelo parece não se coadunar com a execução de ensaios, sendo antes associado à síntese do processo projectual, aferida já na sua proporção e nas suas dimensões, e à sua necessária comunicação à obra. Para o arquitecto, os ensaios, pelo menos no início do trabalho, seriam garantidos pelo esquisso, definido comummente à pintura, à escultura e à arquitectura, numa clara afirmação da primazia do desenho sobre a concepção dessas artes, como um “pequeno desenho ou modelo imperfeito, que exprime a idéa ou projecto de uma obra d’arte, concebida e já borrateada ou rascunhada pelo auctor” (Rodrigues, 1875: 261). ‘Modelo’, aqui por certo associado mais à escultura, permite confirmar a definição dada à ‘maqueta’. Apesar da informação de Machado (1990, vol. IV: 39), que a atribui à 8.ª edição do ‘Diccionário da Língua Portugueza’, de 1890, a primeira dicionarização comum de ‘maqueta’ é anterior, surgindo no ‘Diccionario Contemporaneo da Lingua Portugueza’, editado em 1881. ‘Maqueta’ é aí definida como “pequeno esboço modelado em barro ou em cera de alguma estátua ou obra de escultura” (Aulete e Valente, 1881: 1118). A omissão da possibilidade de se constituir como representação de arquitectura marca igualmente a definição que este dicionário apresenta para ‘modelo’ (Aulete e Valente, 1881: 1171), o termo então corrente para esse efeito. No ‘Diccionário da Língua Portugueza’, na sua 8.ª edição – a primeira deste dicionário a incluir a palavra, o que poderá explicar a informação dada por Machado (1990) –, a definição de ‘maquèta’ pouco se distingue da do dicionário anterior, continuando a não ser considerada como representação de arquitectura. Pelo contrário, ‘modélo’, ou ‘modello’, é definido como a “[i]magem que se ha de copiar, e imitar na pintura, esculptura, ou architectura, ou em fundição: de ordinário é para ponto maior” (Silva, 1890, vol. II: 362). A importância destes dicionários para a compreensão dos sentidos atribuídos a ‘maqueta’ resulta não tanto das definições que propõem, até porque estas têm significados mais estritos do que aqueles contidos na definição contida no ‘Diccionario technico e histórico’ (Rodrigues, 1875: 251), mas do facto de as proporem, que poderá ser interpretado como um reflexo do uso crescente do termo, quer nos círculos associados à produção artística, quer fora deles. Esta possibilidade tem acolhimento no ‘Plano’ que presidiu à elaboração da obra onde ocorre a sua primeira dicionarização comum: além dos “vocábulos abonados pelos mestres da língua [...] [havia também que incluir] os

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neologismos sanccionados pelo uso e pela necessidade, e os termos technicos, que, com o desenvolvimento da instrucção publica, tem passado para a litteratura e para a linguagem da conversação” (Aulete in Aulete e Valente, 1881: I).

A primeira dicionarização de ‘maqueta’ enquanto representação de arquitectura terá ocorrido no ‘Diccionario dos termos d’Architectura’, editado em 1895. ‘Maquieta’ é aí definida como o “esboço em vulto e proporcionado da obra que se pretende construir” (d’Assumpção, 1895: 100-101). A maqueta – se não o seu uso corrente, pelo menos o seu conhecimento – estaria já vulgarizada, servindo, por isso, até de exemplo de termos exógenos à prática portuguesa que justificavam uma dicionarização – “[q]uem não diz hoje: esquisso, longarina, locomotiva, maquietta, mochêtta, e tantas outras?” (d’Assumpção, 1895: XII). Esta vulgarização é confirmada pelos já referidos primeiros registos da palavra em dicionários comuns. A definição agora preconizada, próxima, aliás, da da sua primeira dicionarização (Rodrigues, 1875: 251), parece contemplar a possibilidade de a maqueta se constituir como um registo de ensaio, à imagem daquilo que acontecia nos âmbitos da escultura e da pintura. ‘Esboço’, que significa ‘debuxo’ (d’Assumpção, 1895: 64), é considerado um “esquisse – desenho d’um projecto” (d’Assumpção, 1895: 53) –, isto é, um “desenho ou modelo imperfeito da obra que se projecta construir” (d’Assumpção, 1895: 66). Enquanto representação tridimensional, a maqueta passa assim a coexistir com o modelo, que continuaria a ser considerado como a “[r]epresentação exacta, em ponto pequeno e certa e determinada escala, da construção que se intenta levar a effeito” (d’Assumpção, 1895: 104). Esta definição pouco parece distinguir-se daquelas que identificavam a maqueta apenas na escultura e na pintura. A diferença entre uma e outras advirá de facto de, para a arquitectura, a maqueta ser especificamente qualificada como ‘proporcionada’, embora esse fosse um atributo também expectável em relação às maquetas feitas no contexto dessas outras artes. A importância desta definição resulta, por isso, não de um ajustamento que particularize o seu conteúdo ao âmbito da arquitectura, mas do facto de a sua dicionarização significar um reconhecimento da maqueta, na sua condição original – isto é: como registo ‘imperfeito’, já que ainda não totalmente estabilizado –, como possível instrumento de trabalho do arquitecto.

O significado de ‘maqueta’ nas dicionarizações portuguesas iniciais são análogos aos das dicionarizações estrangeiras coevas. Essa actualidade poderá ser explicada quer pela assimilação de vocabulário e de práticas decorrente de contactos entre artistas e arquitectos portugueses e os seus homólogos estrangeiros, quer pelo recurso a textos – desde logo, dicionários, mas também compêndios de história e manuais técnicos –

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onde o significado da palavra estivesse já fixo. A adopção do dicionário de Boutard (1826) por Rodrigues (1875) confirma-o. Em francês, ‘maquette’, inicialmente com um uso restrito ao trabalho de um pintor ou de um escultor – “o seu primeiro pensamento, onde nada está ainda digerido, e [que] não se parece senão com uma obra informe” 5 (Dictionnaire de Trévaux, 1771, tome V: 813) –,foi registada pela primeira vez como representação de arquitectura no ‘Grand Larousse de la langue française’, em 1873 (Larousse, 1975: 3150). Em castelhano, onde se fixou com grafia igual à portuguesa, “[a] palavra maqueta é de uso muito recente, [...] não aparece[ndo] até ao século XVIII onde se encontra a formar parte do vocabulário de belas-artes. Na prática, não é utilizada até entrar o século XX” 6 (Úbeda Blanco, 2002: 31). Contudo, em italiano, e apesar de ter aí tido origem em ’macchietta’, ‘maquette’ foi preterida em função de ‘plastico’ (Maldonado in Gregotti, 1987: 61). De qualquer modo, ‘plastico’ “reclama a ideia de uma construção física moldável, no sentido que lhe dá o escultor quando trabalha com um material como o barro, o que faz pensar que [...], como sinónimo de maquette, não é um objecto encerrado, feito de uma vez por todas, mas mais um processo aberto que se executa em sucessivas intervenções mediante retoques e reconsiderações” 7 (Maldonado, in Gregotti: 61). Nas línguas anglo-saxónicas, em inglês e em alemão, por exemplo, ‘maqueta’ não teria correspondência num termo com a mesma raiz etimológica, surgindo antes como uma particularização da noção de ‘modelo’. Assim, seriam adoptados, respectivamente, num caso, ‘architectural model’ ou ‘architectural scale model’ e, no outro, ‘architekturmodell’ ou ‘baumodell’.

Nestas primeiras dicionarizações, parecem equilibrar-se dois sentidos distintos de ‘maqueta’: por um lado, um, original, radicado no vocabulário de belas-artes, em particular no de escultura, que afirma a maqueta como registo de ensaio, como se de um esquisso tridimensional se tratasse, ainda impreciso e, por isso, transitório; por outro lado, um outro, que estabelece uma aproximação ao projecto de arquitectura desse sentido original, que, sem o negar, antes o ajusta às exigências de proporção e de controlo dimensional à escala sobre as quais tenderá a assentar a representação de objectos arquitectónicos.

5 Tradução do autor. No original: “sa première pensée, ou rien n’est encore digéré, & qui ne paroît que

comme un ouvrage informe” (Dictionnaire de Trévaux, 1771, tome V:813). 6

Tradução do autor. No original: “La palabra maqueta es de uso muy reciente, […] no aparece hasta el siglo XVIII donde se encuentra formando parte del vocabulario de bellas ares. En la práctica no es utilizada

hasta entrado el siglo XX”(Úbeda Blanco, 2002: 31). 7

Tradução do autor. No original: “richiama l’idea di un costrutto fisico modellabile, nel senso che gli dà lo scultore quando lavora con un materiale come l’argilla. Il che fa pensare che [...], come sinonimo de maquette, non è un oggetto chiuso, fatto una volta per tutte, ma piuttosto un processo aperto che si espleta per interventi successivi, mediante ritocchi e ripensamenti” (Maldonado in Gregotti, 1987: 61).

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II - 1. 2 A MAQUETA COMO MODELO

Importa averiguar as implicações dos dois sentidos agora observados. Desde logo, suscitam a reavaliação do espectro de possibilidades da representação tridimensional. Se, enquanto modelo, essa representação estaria sobretudo associada a uma maior estabilidade formal e geométrica do seu objecto, enquanto maqueta, passará a poder ser também adoptada no processo da sua definição. Há, porém, uma outra implicação, porventura de consequências mais profundas, para a própria definição de ‘maqueta’ e, por arrasto, para a definição de ‘modelo’. Ao coexistirem e, desse modo, ao ampliarem esse espectro de possibilidades da representação tridimensional, as diferenças entre maquetas e modelos tenderão a ser diluídas, já que o controlo da relação escalar exigida a um modelo estará também subjacente à proporção que uma maqueta deverá assegurar. ‘Maqueta’ e ‘modelo’ tornam-se assim designações latas, em larga medida sobrepostas, cuja diferenciação parece afinal estar radicada em condições externas à sua concretização: por um lado, o intuito com que são adoptadas – enquanto ensaio, a maqueta; enquanto síntese, o modelo –, por outro lado, o apuro dessa concretização – ‘imperfeita’, a da maqueta; ‘exacta’, a do modelo. Como representação, isto é: como modo de tornar presente o seu objecto, uma maqueta e um modelo parecem deter uma constituição similar.

A definição de ‘maqueta’ poderá ser prosseguida a partir de uma definição recente, proposta no ‘Vocabulário técnico e crítico de Arquitectura’. Uma ‘maqueta’ é aí definida como um “[m]odelo, em tamanho reduzido e numa escala conveniente, de uma forma ou objecto que se pretende construir ou fabricar” (Rodrigues, Sousa e Bonifácio, 2002: 180). Confirmando as implicações agora referidas, que decorrem das suas definições iniciais, esta nova definição concilia a noção de ‘maqueta’ com a noção de ‘modelo’. A sujeição a uma escala conveniente não invalida a possibilidade de uma maqueta continuar a ser considerada como um registo de ensaio, sendo, pelo contrário, até determinante para o desenvolvimento do processo projectual onde estiver integrada. Mas essa era uma possibilidade já presente, pelo menos de modo implícito, nas anteriores definições, que contribuiu, aliás, para a já referida dificuldade em distinguir maquetas de modelos. A importância desta nova definição deve ser discernida num outro plano de observação. Ao investi-la na condição de modelo, esta definição desvela a complexidade subjacente aos vínculos estabelecidos entre uma maqueta e o seu objecto. E fá-lo independentemente das circunstâncias do seu uso. De qualquer modo, cotejado com ‘maqueta’, ‘modelo’ aparece como um termo de maior amplitude. ‘Modelo’ provém do italiano modello (Machado, 1990, vol. IV: 149), cuja origem latina

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popular modellus resultará do erudito mŏdŭlu, diminutivo de modus, que significa medida, quer enquanto instrumento de medição, quer enquanto dimensão de algo, mas também método, moderação, modo, módulo, regra ou ritmo musical, entre outras acepções (Ferreira, 1983: 734). Embora imbuído “[d]o sentido platónico de “forma ideal”, de “paradigma” sobre o qual se regulam as existências materiais” 8 (Croset in

Gregotti, 1987: 47), podendo, por isso, ser tomado como “[m]atriz de qualquer coisa pensada ou fabricada” (Rodrigues, Sousa e Bonifácio, 2002: 184), importa, por agora, sublinhar “o sentido de modelo como “representação”, como cristalização de uma ideia, como momento do trabalho de projecto” 9 (Croset in Gregotti, 1987: 47). Como

modelo, e sublinhados então estes significados, a maqueta deverá ser tomada como modo de o arquitecto mensurar o objecto do seu pensamento.

Retome-se a compreensão dos vínculos que se estabelecerão entre uma maqueta e o seu objecto por esta ser um modelo. Por ser um modelo, uma maqueta poderá ser provisoriamente considerada como “uma representação de uma realidade, na qual a representação se faz por meio da expressão de certas características relevantes da realidade observada e onde a realidade consiste nos objectos ou sistemas que existem, existiram ou podem existir” 10 (Echenique, 1975: 164). As acepções comuns de ‘réplica’ e de ‘reprodução’ que poderiam decorrer de uma aproximação mais imediata à noção de ‘maqueta’ dão lugar à afirmação de uma diferenciação – aquela que resulta do facto de uma maqueta apenas expressar algumas das características do objecto que representa. Uma réplica e uma reprodução, mesmo nessas acepções comuns, serão também diferentes do seu objecto. Contudo, essa diferença, ao invés daquela que agora resulta da definição de ‘modelo’, parece sobretudo assentar no facto de a maqueta comportar uma ordem de grandeza inferior à do seu objecto. Uma maqueta será diferente de um objecto arquitectónico porque é menor do que esse objecto. E mesmo que assim não aconteça, isto é: se a representação e o seu objecto têm a mesma ordem de grandeza, como ocorre nas representações à escala natural e nos protótipos, essa diferença continuará ainda assim a existir. Sem essa diferença, a representação não teria, sequer, existência. Existiria apenas, sem mais, o objecto sobre o qual a representação pretenderia debruçar-se. Importa assim discernir o

8 Tradução do autor. No original: “il senso platonico di “forma ideale”, di “paradigma” sul quale si regolano

le esistenze materiali” (Croset in Gregotti, 1987: 47).

9

Tradução do autor. No original: “il senso di modello come “rappresentazione”, come cristallizzazione di un’idea, come momento del lavoro di progettazione” (Croset in Gregotti, 1987: 47).

10 Tradução do autor. No original: “a representation of reality, in which the representation is made by the

expression of certain relevant characteristics of the observed reality and where reality consists of the objects or systems that exist, have existed, or may exist” (Echenique, 1975: 164).

Referências

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