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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE ARTES E COMUNICAÇÃO SOCIAL CURSO DE LICENCIATURA EM CINEMA E AUDIOVISUAL LETÍCIA CATHERINE GALANTE MENDES

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Academic year: 2022

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CURSO DE LICENCIATURA EM CINEMA E AUDIOVISUAL

LETÍCIA CATHERINE GALANTE MENDES

O ESTILO MTV DE EDIÇÃO

E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA AS ABERTURAS DE SÉRIES:

Um estudo de caso sobre a abertura de True Blood

Niterói 2022

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O ESTILO MTV DE EDIÇÃO

E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA AS ABERTURAS DE SÉRIES:

Um estudo de caso sobre a abertura de True Blood

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de Licenciada em Cinema e Audiovisual.

Orientadora:

Profª Drª Elianne Ivo Barroso

Niterói 2022

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Bibliotecário responsável: Debora do Nascimento - CRB7/6368

Aberturas de Séries : Um estudo de caso sobre a abertura de True Blood / Letícia Catherine Galante Mendes ; Elianne Ivo Barroso, orientadora. Niterói, 2022.

151 f. : il.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Cinema e Audiovisual (Bacharelado/Licenciatura))-Universidade Federal Fluminense, Instituto de Arte e Comunicação Social,

Niterói, 2022.

1. Montagem do filme (Cinematografia). 2. Music Television.

3. Seriados de televisão. 4. Videoclipe. 5. Produção intelectual. I. Barroso, Elianne Ivo, orientadora. II.

Universidade Federal Fluminense. Instituto de Arte e Comunicação Social. III. Título.

CDD -

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Departamento de Cinema e Vídeo PARECER DA BANCA EXAMINADORA

Aluno(a):

Matrícula:

TÍTULO

NOME DOS MEMBROS DA BANCA EXAMINADORA Prof. Orientador

Examinador 1 Examinador 2

PARECER

DATA ___ /___ /___

APROVAÇÃO (___)

MENÇÃO DE LOUVOR (___)

REPROVAÇÃO (___)

ASSINATURAS DA BANCA Prof. Orientador

Examinador 1 Examinador 2

LETÍCIA CATHERINE GALANTE MENDES 117057030

O Estilo MTV de Edição e sua Contribuição para as Aberturas de Séries:

Um estudo de caso sobre a abertura de True Blood

Elianne Ivo Barroso João Luiz Leocadio Gabriel Cruz

04 02 22 X

A banca destaca a qualidade e a extensão do trabalho que revela um rigor da pesquisa. Recomenda-se a continuidade dos estudos com a contribuição importante na área de edição e montagem.

JOAO LUIZ LEOCADIO DA NOVA joaoleocadio@id.uff.br:48693723715

Assinado de forma digital por JOAO LUIZ LEOCADIO DA NOVA joaoleocadio@id.uff.br:48693723715 Dados: 2022.02.08 15:36:22 -03'00'

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O ESTILO MTV DE EDIÇÃO

E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA AS ABERTURAS DE SÉRIES:

Um estudo de caso sobre a abertura de True Blood

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de Licenciada em Cinema e Audiovisual.

BANCA EXAMINADORA

___________________________

Profª Drª Elianne Ivo Barroso

___________________________

Prof. Dr. Gabriel Cruz

___________________________

Prof. Dr. João Luiz Leocadio

Niterói 2022

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Aos meus pais, Carla Valéria Galante Mendes e Roberto Ermida Mendes, que tornaram possíveis todos os estudos e qualificações aos quais tive acesso até hoje.

À Elianne Ivo Barroso, pelo aceite à proposta de orientação, pela disponibilidade e paciência, por sanar dúvidas, pelas revisões, correções, excelentes sugestões e pelo processo de orientação como um todo.

A todos os professores da Universidade Federal Fluminense que passaram por meu caminho e, cada um à sua maneira, deixaram suas contribuições para minha formação.

Aos amigos que fiz na faculdade, que me permitiram não percorrer esse caminho sozinha e tornaram possível minha chegada até aqui.

Às minhas gatas, Mia Colucci e Lilo, que se constituíram nos meus pequenos momentos de alegria em meio às exaustivas horas dos dias e meses de realização deste trabalho.

A Pedro Henrique, que tornou esses anos de pandemia um pouco menos enlouquecedores, escutou meus desabafos, esteve do meu lado nos momentos mais difíceis e me apoiou incondicionalmente.

À minha família, amigos e todos aqueles me deram forças para seguir o caminho que escolhi.

A Deus, porque sem ele minha saúde mental estaria à míngua.

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Este trabalho visa investigar quais são os recursos, técnicas, ferramentas e escolhas estilísticas comumente associadas ao estilo MTV, sua influência nas sequências de abertura de séries e por meio de quais técnicas e ferramentas de edição ele manifesta-se visual e ritmicamente nessas sequências. Para isso, exploraram-se as características-chave do estilo, segundo Ken Dancyger; a construção da identidade da Music Television e a expressão de sua linguagem visual em videoclipes, em vinhetas e na programação do canal como um todo; as transformações sofridas pelas sequências de título e créditos cinematográficos ao longo da história; e teorias e técnicas de edição que refletem sobre corte e ritmo. Em seguida, utilizou- se a gama de ferramentas de análise colecionadas ao longo da monografia para fazer um estudo de caso sobre a abertura de True Blood, comprovando-se a correlação feita entre a sequência e o estilo MTV e trazendo como hipótese a influência desse estilo de edição no campo das aberturas de séries como um todo.

Palavras-chave: Edição. Montagem. Music Television. MTV. Videoclipe. Vinhetas.

Sequências de título. Créditos cinematográficos. Séries. Aberturas.

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This written work aims to investigate which are the resources, techniques, tools and stylistic choices commonly associated with the MTV style, its influence on series’ opening sequences and through which techniques and editing tools it manifests itself visually and rhythmically in these sequences. For this purpose, were explored: the key characteristics of the style, according to Ken Dancyger; the construction of Music Television's identity and the expression of its visual language in music videos, vignettes and the channel's schedule as a whole; the transformations undergone by title sequences and movie credits throughout history; and editing theories and techniques that reflect on cut and rhythm. Then, the range of analysis tools collected throughout the monograph was used to make a case study about the opening of True Blood, proving the correlation made between the sequence and the MTV style and bringing as a hypothesis the influence of this editing style in the field of series’

opening titles as a whole.

Keywords: Editing. Montage. Music Television. MTV. Music video. Vignettes. Title Sequences. Movie credits. Series. Openings.

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Figura 1 - Vinhetas da MTV: pastiche, referenciação a distintos estilos, referências à cultura

pop...24

Figura 2 - Vinhetas da MTV: cores vibrantes, mistura de cores, padronagens e texturas, estilo psicodélico...26

Figura 3 - Videoclipe de Thriller (1983)...29

Figura 4 - Vinhetas da MTV: flerte com o surreal e o grotesco...36

Figura 5 - Vinhetas da MTV: mutação da marca, pastiche, resgate do passado, inspiração em movimentos artísticos modernos...36

Figura 6 - Recorte e colagem; fragmentação; mistura de cores e texturas; e nonsense em vinhetas da MTV Plus...37

Figura 7 - Referências à cultura pop; releitura de diversos estilos musicais que fizeram sucesso no decorrer do tempo em vinhetas da MTV Classic...37

Figura 8 - sinuosidade das formas, mistura de cores e texturas em vinhetas da MTV Hits...37

Figura 9 - Frames retirados de A Colour Box...39

Figura 10 - Frames retirados de An Optical Poem...40

Figura 11 - O Homem do Braço de Ouro (figuras superiores), Um Corpo que Cai (figuras do centro), Intriga Internacional (esquerda inferior) e Psicose (direita inferior)...46

Figura 12 - Personagem interagindo com tipografia em A Pantera Cor-de-Rosa...47

Figura 13 - Créditos iniciais de Dr. Fantástico (à esquerda) e Crown, o Magnífico (à direita)...48

Figura 14 - Créditos iniciais de Se7en – Os Sete Crimes Capitais...49

Figura 15 - Frames inicial e final de planos da abertura de True Blood – Ambientação da cidade...79

Figura 16 - Frames inicial e final de planos da abertura de True Blood – Imagens de aspecto envelhecido, tons quentes e vinhetas...80

Figura 17 - Frames inicial e final de planos da abertura de True Blood – Sequência das crianças...81

Figura 18 - Frames inicial e final de planos da abertura de True Blood – Transição e pôr-do- sol...82

Figura 19 - Frames inicial e final de planos da abertura de True Blood – A segunda parte...83

Figura 20 - Sequência da raposa em decomposição...84

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Figura 22 - Sequência do batismo no lago...86

Figura 23 - Frames inicial e final de planos da abertura de True Blood – Sequência final...87

Figura 24 - Fotograma do título True Blood...89

Figura 25 - Fotograma boca soltando fumaça em reverse speed...92

Figura 26 - As cores nas aberturas de The Walking Dead, à esquerda, e American Gods, à direita...106

Figura 27 - Iluminação e textura nas aberturas de Dexter, acima, e Penny Dreadful, abaixo...106

Figura 28 - Efeito caleidoscópio na abertura de Dark...107

Figura 29 - Cores vibrantes e movimentos vertiginosos na abertura de BoJack Horseman...107

Figura 30 - Frames das aberturas das animações adultas The Simpsons, à esquerda, e South Park, à direita...108

Figura 31 - Frames das aberturas de Mad Men, acima, e True Detective, abaixo...108

Figura 32 - De cima para baixo: Cidade Invisível, Se Eu Fechar Os Olhos Agora, Capitu, Carcereiros, Nada Será Como Antes e Ilha de Ferro...109

Figura 33 - Frames de apresentação dos títulos de todas as aberturas de American Horror Story feitas até hoje...110

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TABELA 1 – Síntese de elementos que compõem o estilo MTV...32 TABELA 2 – Predominância do gráfico ou do cinematográfico...51 TABELA 3 – Características gerais da sequência de abertura de True Blood...77 TABELA 4 – Verificação da presença de elementos do estilo MTV na abertura de True

Blood...93

(12)

INTRODUÇÃO...14

O ESTILO MTV DE EDIÇÃO SEGUNDO DANCYGER...16

METODOLOGIA...20

CAPÍTULO 1 – A LINGUAGEM VISUAL DA MTV...21

1.1 HISTÓRIA E IDENTIDADE...21

1.2 O VIDEOCLIPE...27

1.3 A UNIDADE VISUAL DA MTV...30

CAPÍTULO 2 – AS SEQUÊNCIAS DE TÍTULO...38

2.1 OS PRECURSORES DO MOTION GRAPHICS – OS CURTAS-METRAGENS EXPERIMENTAIS DE ANIMAÇÃO...38

2.2 AS SEQUÊNCIAS DE TÍTULO E CRÉDITOS CINEMATOGRÁFICOS – HISTÓRIA E DESENVOLVIMENTO...42

2.3 ALGUMAS PROPOSTAS DE CLASSIFICAÇÃO DE SEQUÊNCIAS DE ABERTURA...50

2.4 A TEIA DE INFLUÊNCIAS: ESTILO MTV, SEQUÊNCIAS DE TÍTULO CINEMATOGRÁFICAS, VINHETAS TELEVISIVAS E ABERTURAS DE SÉRIES....52

CAPÍTULO 3 – O SEGREDO DO CORTE: TEORIAS E TÉCNICAS DE EDIÇÃO...56

3.1 EDIÇÃO OU MONTAGEM? AFINAL, O QUE É ISSO?...56

3.2 A EDIÇÃO E O CORTE SEGUNDO WALTER MURCH...58

3.3 A REGRA DE SEIS DE MURCH...60

3.4 A MONTAGEM E O RITMO SEGUNDO SERGEI EISENSTEIN...61

3.5 OS MÉTODOS DE MONTAGEM DE EISENSTEIN...63

3.6 RECURSOS A SEREM UTILIZADOS COMO FERRAMENTAS DE ANÁLISE....66

CAPÍTULO 4 – ANÁLISE DA SEQUÊNCIA DE ABERTURA DE TRUE BLOOD...70

4.1 AS SÉRIES CONTEMPORÂNEAS E SUAS ABERTURAS...72

4.2 A ABERTURA DE TRUE BLOOD...75

4.2.1A SÉRIE...75

4.2.2A MÚSICA TEMA:BAD THINGS...76

4.2.3ANÁLISE DA SEQUÊNCIA DE ABERTURA...77

4.2.3.1 Quanto à tipografia...88

4.2.3.2 Quanto à semelhança com o estilo MTV de edição...90

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CONCLUSÃO...101

BIBLIOGRAFIA...111

SITES CONSULTADOS...113

SOBRE OS TIPOS DE CORTES...113

SOBRE TRUE BLOOD...114

REFERÊNCIAS AUDIOVISUAIS...116

FILMES...116

FICÇÃO SERIADA...117

APÊNDICES...119

VISUALIZAÇÃO PLANO A PLANO DA ABERTURA DE TRUE BLOOD...119

ANÁLISE PLANO A PLANO DA SEQUÊNCIA DE ABERTURA DE TRUE BLOOD...122

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INTRODUÇÃO

Quando se pensa em “audiovisual” e “contemporaneidade”, e caso se propusesse um jogo de associações com tais palavras, é possível que alguns dos primeiros termos a aparecerem fossem semelhantes a: séries, streaming, motion design, música, cortes rápidos, ritmo acelerado, conteúdos digitais, dentre outros.

Fenômenos contemporâneos, as séries e seriados fizeram sua primeira aparição na TV no início da década de 50. A partir dos anos 80, com o surgimento e a expansão dos canais pagos – e a consequente segmentação da audiência – iniciou-se um período de experimentações na ficção seriada, que trouxe à tona as discussões sobre qualidade na TV. Entre o final dos anos 90 e o começo dos anos 2000, inicia-se um período marcado pelo papel da internet, do video on demand (VOD) e do streaming1 no pilar da exibição; e pelo sucesso das chamadas “séries de qualidade”, conhecidas por sua complexidade narrativa, visual cinematográfico e personagens multifacetados. As mudanças técnicas e narrativas sofridas pelo formato e as novas formas de exibição e consumo transformaram em definitivo a relação entre essas obras e a audiência, agora muito mais fiel e engajada. É nesse contexto que a série contemporânea, tal qual a conhecemos atualmente, torna-se o grande fenômeno, sucesso de crítica e público, que é no presente.

Dividindo espaço com elas, tem-se hoje as animações ágeis, dinâmicas e repletas de cor que pululam em anúncios publicitários, feeds, stories e vinhetas, ou “intros”, como também são chamadas. Das redes sociais e plataformas de vídeo aos endereços eletrônicos das mais variadas naturezas, não há quase espaço no mundo digital que esteja livre da profusão de cores e movimentos do motion design, quase sempre acompanhada de trilhas musicais ou efeitos sonoros. São também as músicas que embalam os muitos cortes e transições entre os planos curtos da linguagem publicitária, cuja presença excessiva é marca registrada no digital.

Com as séries de um lado e essa edição estilizada, veloz, de visual marcante e som intenso de outro, a presente pesquisa, realizada no contexto da produção do trabalho monográfico para conclusão do curso de Licenciatura em Cinema e Audiovisual, pretende adentrar numa área que pode ser vista como um ponto de interseção entre esses fenômenos da contemporaneidade: as aberturas de séries. Sob o título de “O Estilo MTV de Edição e sua

1 O vídeo sob demanda é uma tecnologia que permite que o assinante assista aos conteúdos disponíveis na plataforma quando lhe for conveniente, em qualquer dia e horário, desde que haja conexão com a internet ou que seja feito o download prévio. Já o streaming é uma tecnologia de video sob demanda que utiliza o sistema de transferência por buffering, ou seja, pré-carregamento de dados, permitindo que o conteúdo possa ser assistido antes que um download completo seja realizado.

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Contribuição para as Aberturas de Séries: Um estudo de caso sobre a abertura de True Blood”, o trabalho se debruçará sobre esse estilo de edição, cujas características encontram-se elencadas e descritas por Ken Dancyger no livro The Technique of Film and Video Editing: History, Theory, and Practice, do qual a versão traduzida servirá de base para este trabalho2.

No capítulo 1, ampliaremos o conceito de estilo MTV desenvolvido por Dancyger a partir de estudos de outros autores a respeito da linguagem visual da emissora e de seus videoclipes. Nos capítulos seguintes, serão explorados também o universo das sequências de título; das teorias e técnicas de edição, relativas, sobretudo, a corte e ritmo; e das obras de ficção seriada. O objetivo é compreender de que forma os recursos, técnicas, ferramentas e escolhas estilísticas comumente associadas ao estilo MTV se manifestam visualmente nas aberturas de séries e quais as implicações rítmicas e atmosféricas desses elementos para a abertura da obra.

Vale ressaltar que a associação feita entre os objetos – estilo MTV de edição e abertura de séries – trata-se de uma hipótese a ser investigada pela referida pesquisa, levantada com base na observação de padrões que se repetem nas aberturas de inúmeras obras de gêneros e origens (plataformas, canais, redes, companhias de televisão...) variadas. Contudo, em função da extensão concernente a uma monografia, e para que as temáticas e obras aqui elegidas fossem investigadas com a devida atenção e profundidade, foi preferível realizar um estudo de caso da abertura da série True Blood (2008-2014), do canal de televisão por assinatura HBO.

Na série, que se passa em uma cidade fictícia no interior da Louisiana, humanos e vampiros tentam coexistir pacificamente após a criação de um substituto para o sangue humano, um sangue sintético cujo nome dá título à série. A obra, que mistura horror, romance e fantasia, condensa em sua narrativa inúmeras características geográficas e temáticas político-sociais típicas da região sul dos Estados Unidos: os extensos pântanos; a arquitetura sulista; o fanatismo religioso; a religião e a cultura afro-americanas; a Guerra Civil Americana; e o forte racismo remanescente.

Correspondendo à obra que introduz, a abertura de True Blood aglutina dentro de si uma série de imagens de pântanos, casas e bares típicos da região e sua vida noturna, referências à aspereza da vida selvagem, cultos, rituais e símbolos religiosos, imagens relacionadas à Guerra Civil e seus efeitos e imagens repletas de sensualidade. Claramente, um conjunto de informações visuais descontínuas e que não constituem narrativa.

Como veremos ao fim da monografia, existem outras aberturas que possuem estilo semelhante ao do objeto de análise em questão ou que, mesmo distinguindo-se deste, ainda

2 DANCYGER, Ken. Técnicas de Edição para Cinema e Vídeo: História, Teoria e Prática. 3ª edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. 490 p. Tradução de: Technique of Film and Video Editing: History, Theory, and Practice.

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carregam outros conjuntos de características pertencentes ao estilo MTV. Espera-se assim que este trabalho abra precedentes para novas pesquisas sobre esse campo ainda tão pouco explorado, visto que existem muitos outros autores e obras a serem estudados.

Antes de prosseguirmos com qualquer outro assunto, para compreendermos melhor o tipo de edição com o qual trabalharemos ao longo dessa monografia, será necessário entender o que Ken Dancyger descreveu como “estilo MTV” quando elencou os diversos elementos técnicos, visuais e narrativos que compõem esse estilo.

O ESTILO MTV DE EDIÇÃO SEGUNDO DANCYGER

“Parte narrativa, parte atmosfera, som intenso e imagem rica” (DANCYGER, 2003, p.

194), o estilo MTV influenciou obras audiovisuais de distintos formatos e gêneros. Seja nos cinemas, comerciais de televisão, ficções seriadas, vinhetas, videoclipes e videogames; seja em reality shows, no terror, romance, documentário e até mesmo no jornalismo, o estilo adotado pela emissora deixou sua marca. Algumas das técnicas popularizadas através da linguagem visual da MTV no período da pós-modernidade foram de tal modo assimiladas pelos meios de comunicação que atualmente parecem corriqueiras, tão cristalizadas quanto eram (e ainda são) as normas do cinema clássico narrativo. Se hoje o jump cut3 e a câmera na mão nos parecem comuns no contexto de matérias jornalísticas, vídeos de plataformas digitais e até nos blockbusters do cinema hollywoodiano, há algum tempo eles seriam interpretados como falhas técnicas ou reflexos do baixo orçamento da produção. Esses e outros elementos, como o excesso de cortes, a curta duração dos planos, as grandes elipses, o ritmo acelerado e a música que deixa de ser incidental e torna-se uma forte presença, foram tão amplamente utilizados que agora fazem-se presentes em obras totalmente díspares entre si e que não necessariamente nos remeterão à linguagem veiculada pela MTV, apesar de poder se dizer que se beneficiaram, direta ou indiretamente, da influência da emissora.

Por isso, nesta monografia, ao debruçarmo-nos sobre o “estilo MTV”, olharemos não para um elemento individual recorrente na linguagem do canal, e nem mesmo para dois ou três, mas sim para um conjunto deles. Serão utilizadas, para estudo e análise ao longo deste trabalho, sobretudo as características elencadas por Ken Dancyger em seu livro. Destas, priorizaremos

3 Corte seco entre planos com o mesmo enquadramento, diferindo-se um do outro apenas por uma movimentação nos elementos dentro de quadro. Passa a impressão de que houve um “pulo” (jump, em inglês) na imagem, por isso é assim denominado. Mudanças no enquadramento, quando pequenas, também causam essa sensação.

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como ferramentas analíticas aquelas que se referem a escolhas concernentes à edição. No entanto, também serão abordadas outras bibliografias que exploram o visual da emissora e, dessa forma, somaremos alguns itens por elas apontados à gama de ferramentas analíticas desta pesquisa.

“O que nós chamamos de a influência da MTV na montagem é principalmente associada ao fenômeno dos últimos 20 anos4: o videoclipe.” É dessa forma que Dancyger inicia o primeiro dos dois capítulos de seu livro dedicados ao conjunto de elementos que ele tratou por “estilo MTV”, mas que também costuma ser referido por outros autores como “estética do videoclipe”.

Adiante, Dancyger define então o videoclipe como um “estímulo visual rápido e evocativo apresentado como pano de fundo para a apresentação aural de uma música simples ou uma série de músicas”. (ibid., p. 191)

Essas peças audiovisuais distinguem-se por evitarem a narrativa linear e a concentração na trama e na personagem, bem como por romperem com as convenções que utilizam a realidade como referência para a construção do tempo e espaço fílmicos, através de grandes elipses, da quebra da continuidade, entre outros elementos. Esse desprendimento das regras clássicas permite que o foco recaia sobre sentimento e tom – elementos mais importantes do videoclipe e do estilo adotado pela emissora. Outro elemento que passa a ter destaque diante dessas configurações são as referências a outros meios de comunicação, gêneros e formatos.

Mas antes de destrincharmos o modo como tudo isso aparece dentro do estilo MTV, nos detenhamos por um momento nos precursores desta forma. Dancyger argumenta que, sob o ponto de vista visual, o estilo MTV tem muito em comum com o curta-metragem experimental e com a videoarte. O autor menciona a antinarratividade dos curtas de Luis Buñuel, Um Cão Andaluz (Un chien andalou, 1929) e A Idade do Ouro (L’Age d’Or, 1930); o fluxo de consciência das obras de Maya Daren; a reflexão sobre as ferramentas de manipulação presente no trabalho de Stan Brakhage e a prevalência do estilo sobre o conteúdo nos filmes de Andy Warhol, ambos realizadores ligados à videoarte.

No entanto, a maior diferença entre esses curtas, a videoarte e o estilo MTV é que, neste, a base do formato é a música. Desse modo, devemos reconhecer o papel dos primeiros filmes dos Beatles, Os Reis do Iê, Iê, Iê (A Hard Day's Night, Richard Lester, 1964) e Socorro! (Help!, Richard Lester, 1965), no desenvolvimento do formato que se entende hoje por videoclipe.

Enquanto os musicais tradicionais intercalam a narrativa clássica com números cantados ou

4 A edição do livro de Dancyger aqui utilizada foi lançada no ano de 2003. Isso que significa que a expressão “dos últimos 20 anos” se refere ao início da década de 1980, época do surgimento da MTV e da popularização do videoclipe.

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dançados, os filmes de Lester são compostos por uma narrativa mais simples, cuja função é articular os números musicais – estes sim são o elemento de maior força e importância, que assume o papel de representar a identidade artística dos Beatles, pautada, segundo Dancyger, em criatividade, anarquia e energia. (ibid., p. 193)

Aqui estão os primeiros elementos estilísticos do videoclipe. A base do formato é a música. A narrativa é o menos importante, o sentimento é o mais importante. Do ponto de vista da montagem, isso traduz-se em fazer o jump-cut mais importante do que o corte contínuo. Também implica na centralidade do ritmo. Dado o baixo quociente de envolvimento da narrativa, é no ritmo que está o papel da interpretação.

Consequentemente, o ritmo torna-se a fonte da energia e de novas justaposições que sugerem anarquia e criatividade. (ibid.)

O autor menciona ainda a contribuição dos filmes de Monty Python, trazendo o elemento da metáfora literária da autorreflexividade. Nesse caso, o termo é referente ao meio de comunicação que olha para si mesmo, ao referenciar a si e a outros meios, assumir e entregar suas ferramentas de manipulação. Vale citar ainda a influência dos comerciais de televisão sobre o estilo MTV, uma vez que muitos dos diretores que adotariam a forma em seus filmes começaram na publicidade, como Adrian Lyne, de Flashdance – Em ritmo de embalo (Flashdance, 1983), e Tony Scott, de Top Gun – Ases indomáveis (Top Gun, 1986).

Terminada a investigação sobre as origens da forma que marcaria não só a história da televisão, mas expandiria sua influência para outros veículos, Ken Dancyger define e aborda individualmente cada uma das características-chave do estilo, a saber: a importância do sentimento; o declínio da trama; a montagem descontínua, associada a obliteração de tempo e espaço; o estado autorreflexivo do sonho; e o meio de comunicação que olha para si mesmo. E são esses elementos que serão vistos e sobre os quais nos embasaremos a partir deste momento.

Elemento de importância máxima no estilo MTV – e talvez um dos mais característicos do formato – é a criação de um sentimento, que toma forma a partir da associação de um trecho da obra a uma trilha musical e, por essa canção, a forma é polida. “A música – particularmente a letra – sintetiza o sentimento humano. A mente processa o som. [...] Quando adicionamos a letra de uma música, que tende a ser poética, estamos dando direcionamento para o sentimento da música.” (ibid., p. 195)

Ainda segundo Dancyger, “devido à profundidade do sentimento de uma simples sequência associada a um simples trecho da música, é difícil criar uma continuidade narrativa.”

(ibid.) Isso porque a intensidade emocional surge junto à trilha e, em geral, com ela mingua.

Não há atenuação – seu início não é gradativo, é súbito, tal qual seu fim. Emoções e afetos aparecem como “fragmentos de sonhos” – uma experiência breve, súbita e não inteiramente

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real. São intensos, fragmentados, sobrecarregados com informações e estímulos, de ritmo acelerado e curta duração. Por isso, em longas-metragens caracterizados por esse estilo, é comum encontrarmos uma série de sequências descontínuas, ao que Dancyger denomina set piece. Isto é, “um fragmento que tem autonomia estética, narrativa ou de sentido dentro da obra.

Esse fragmento é, em si, uma sequência ou uma cena brilhantemente executada com autonomia de obra. (N. T.)” (ibid., p. 201)

Sendo assim, se a necessidade de gerar um sentimento sobrepõe-se à de garantir a continuidade e a contribuição de cada sequência para a progressão da narrativa, tem-se que a trama se torna incidental, isto é, de importância secundária. Nesse caso, “a fragmentação pode ser mais frequente. O tom, a intercalação de humores, a fantasia, as brincadeiras, o pesadelo, tudo pode ser justaposto mais prontamente porque sua contribuição para a progressão da trama é desnecessária.” (ibid., p. 196)

Como estratégia para dar enfoque ao sentimento criado em detrimento da linearidade e da progressão da narrativa, recorre-se à obliteração do tempo e do espaço fílmicos, que já não mais são construídos com base nas convenções apoiadas no realismo. Tal qual a trama, eles tornam-se de importância secundária, relativos, utilizados em função da experiência afetiva.

Constantemente, o lugar, a percepção da personagem, as fantasias, memórias, sonhos, devaneios e delírios sobrepõem-se à linearidade, à continuidade e às noções convencionais de tempo. Passado, presente, realidade e ilusão confundem-se e entrelaçam-se.

Contudo, para quebrar com estas convenções, é preciso atentar antes para algumas questões técnicas e escolhas de montagem. Do ponto de vista da fotografia, um bom recurso é o uso frequente de close-ups preferencialmente a planos abertos, ou ainda o enfoque no primeiro plano sobre o fundo de quadro. Essas configurações retiram o contexto visual, isto é, a referência ao “onde?” e “quando?” do plano. Do ponto de vista da direção de arte, fotografia e pós-produção, há escolhas relativas à iluminação e ao tratamento da imagem que promovem a estilização e o distanciamento do realismo, como – nos exemplos de Dancyger – o tom sépia, as imagens enevoadas e os vermelhos quentes alternando-se com os azuis frios. O autor menciona ainda os jump cuts e o excesso de ritmo como ferramentas fundamentais para a obliteração de tempo e espaço. (ibid., p. 198)

Seguindo adiante, o autor faz uma comparação entre o estilo MTV e o estado autorreflexivo do sonho. Durante o sonho, ora o indivíduo encontra-se imerso, perdido dentro desse estado, ora percebe que está sonhando, refletindo sobre o sonho dentro do próprio sonho.

É como o ator que ora imerge na ilusão, enquanto personagem, ora sai de seu papel para falar diretamente com o público, reconhecendo que está apenas interpretando. Assim é o estilo MTV,

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Como a autorreflexividade reconhece que isso é um filme sendo assistido (como oposto à realidade), isso cria uma tolerância [...]. Essa liberdade permite alterações de sentimentos, narrativas, fantasia etc., sem a necessidade de fazer alterações plausíveis.

É, além de tudo, apenas um filme que você está vendo [...] e, sabendo que é um acontecimento midiático (diferente de um sonho), o público é tolerante com essas alterações de tom, tempo, lugar etc., que são realizadas. (ibid.)

E, assim como o sonho que se reconhece enquanto sonho, “assim como o personagem afasta-se e comenta sobre si mesmo no filme, também o faz o meio de comunicação.” (ibid.) Na autorreflexividade do estilo MTV, a obra reconhece não apenas a si mesmo, suas técnicas e ferramentas de manipulação, mas olha também para os outros meios de comunicação, citando- os, criticando-os e utilizando-os como referência. São filmes referenciando comerciais de televisão, videoclipes e outros filmes; comerciais de televisão e videoclipes que referenciam filmes de terror, documentários, musicais e o estilo de pintores famosos; entre outras combinações.

Em síntese, nesse estilo, um meio de comunicação pode citar o outro, criticar, pegar emprestado suas técnicas e até autocriticar-se. Afinal, não há a intenção de desviar a atenção do espectador do fato de que se trata de uma obra midiática, sequer há a intenção de esconder a técnica manipuladora. No estilo MTV, ritmo, dinamismo, movimentos de câmera, cortes, close- ups, primeiros planos, cores, efeitos, música e subjetividade “não são usados para construir a identificação com o personagem principal. [...] não são usados com frequência para nos lançar no arco dramático. Em vez disso, eles são usados para intensificar o efeito de set piece que pode ou não contribuir para o arco dramático.” (ibid., p. 204)

METODOLOGIA

Como dito anteriormente, apesar do por Dancyger intitulado “estilo MTV” – e por ele caracterizado, descrito e exemplificado – a identidade criada pela emissora não se restringe aos elementos destrinchados previamente. Isso porque o foco do autor ao escrever esses capítulos de seu livro era estudar a manifestação desse estilo no cinema; e a influência da estética usada pela MTV se estende para muito além das “telonas”.

Dito isso, no capítulo seguinte, veremos autores com enfoques diferentes, centrados na identidade visual da emissora, com uma ótica mais aproximada da perspectiva do design gráfico, e na estética do videoclipe, estudando as propriedades particulares desse formato.

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Adentraremos um universo dominado por uma linguagem gráfica, vibrante, onírica, irônica, pop, que mistura referências, estilos, épocas e estéticas, que preza pela liberdade em experimentar e pela constante transformação. Ademais, observaremos com atenção os principais responsáveis pela popularização dessa linguagem: sobretudo o videoclipe, mas também as vinhetas, que, a partir de um certo ponto, dividiam um bom espaço da programação com os videoclipes, carregando consigo a função de reforçar a identidade visual do canal.

Percorreremos também a história e o desenvolvimento das sequências de título e crédito cinematográficas, conhecendo seus precursores, suas origens, o legado de Saul Bass, as transformações ocorridas com o advento da computação gráfica, entre outros fatores que marcaram a trajetória dessas peças audiovisuais. Além disso, será estudada a proximidade entre sequências de título, aberturas de série e vinhetas, mediante análise de suas funções dentro da totalidade da obra e revisão de suas características em comum, vistas ao longo do trabalho.

Após investigar a influência do estilo MTV em sequências de abertura, mergulharemos, no capítulo posterior, nas teorias da montagem, especialmente as seis regras de corte de Walter Murch e as definições de Sergei Eisenstein sobre o campo. Conheceremos alguns tipos de cortes, como o corte seco, o jump cut, o match cut, o fade, a dissolução cruzada, entre outros; e será discutido o conceito de ritmo. Desse modo, tais elementos poderão ser utilizados como ferramentas de análise no próximo capítulo. Neste, será analisada a sequência de abertura da série True Blood (2008-2014), da HBO, com o objetivo de identificar por meio de quais recursos, técnicas, ferramentas, escolhas e efeitos relativos à edição esse estilo se manifesta nessas aberturas; além de avaliar os resultados que tal escolha estilística gera tanto para essas sequências enquanto peças independentes, quanto para a identidade visual da série como um todo.

CAPÍTULO 1 – A LINGUAGEM VISUAL DA MTV

1.1 HISTÓRIA E IDENTIDADE

Em 1º de agosto de 1981, surge, nos Estados Unidos, a primeira emissora a exibir quase exclusivamente videoclipes durante a totalidade das 24 horas de sua programação. Na Music Television, os clipes dividiam espaço apenas com as vinhetas, que delineavam e reiteravam a identidade do canal, e com os VJs – outra proposta inusitada lançada pela emissora, que nada

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mais era do que a transposição do conceito de DJ (disco-jóquei)5 para a televisão, a partir da criação da figura do vídeo jóquei, responsável por conduzir a apresentação dos videoclipes ao longo da programação. Além disso, o canal inovou ao estabelecer como público-alvo os adolescentes e jovens, público até então deixado de lado pelo mercado televisual e cuja fidelidade era difícil de conquistar. Beneficiando-se dessa segmentação, a MTV estrutura sua linguagem visual com base nas características e necessidades de seu público, através da adoção de visual irreverente, comunicação despojada e campanhas de marketing muito bem planejadas, que se valiam de slogans, vinhetas e peças publicitárias construídas em cima da autopromoção e da exploração da imagem de astros da música pop. Diante disso, a MTV torna-se um dos negócios mais rentáveis do conglomerado multinacional de comunicação Viacom, proporcionando não só o surgimento de novos canais especializados, mas também sua expansão internacional, com a criação de filiais em diversos países – inclusive no Brasil, a partir de 1990, quando nasce a MTV Brasil, tornando-se a primeira televisão segmentada do país.

Em função do sucesso comercial, e visando a manutenção deste, a emissora passou por diversas transformações. Durante seus primeiros anos no ar, a Music Television exibia videoclipes praticamente em fluxo contínuo; aos poucos, a presença das vinhetas que reforçavam a identidade do canal se tornou cada vez mais maciça, com essas peças adquirindo diversos tipos, formatos e funções, além de extensões cada vez maiores. O espaço dedicado a publicidade também cresceu, com os comerciais aproximando-se cada vez mais da linguagem visual veiculada pela MTV. Finalmente, em meados da década de 90, por conta do crescimento de sua popularidade, a emissora investe em uma programação mais diversificada, visando atender a demandas de consumo das massas. Inicia-se então a fase em que clipes musicais, vinhetas e o bloco comercial dividem espaço com programas de humor, entretenimento, esportes, turismo, variedades e notícias. Foi nessa fase também que a MTV lançou e popularizou o gênero reality show no formato como o conhecemos hoje.

Vale ressaltar, contudo, que o grande sucesso comercial não ocorreu ao acaso. Em primeiro lugar, foi identificado um segmento de público ainda não capturado pelas outras emissoras. Tratou-se então de construir uma marca cuja identidade e valores correspondessem aos desse grupo. A partir disso, a Music Television fundamentou-se sobre um conjunto de técnicas, estéticas, ferramentas, discursos, personalidades e comportamentos que, juntos, compunham o pacote do que viria a se tornar a tão distinta linguagem visual MTV. Soma-se a isso o fato de que a marca se beneficiou ainda do contexto histórico no qual se encontrava

5 Do inglês, disc jockey. Também conhecido em português como disco-jóquei ou discotecário.

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inserida, apropriando-se das características da cultura pós-moderna – que se mostraram muito convenientes para a construção da identidade desejada – e aproveitando as ferramentas e possibilidades que o desenvolvimento da computação gráfica, dos softwares, da edição não linear, dentre outros adventos tecnológicos, proporcionavam. Desse modo, o que buscaremos elucidar a seguir é que elementos são esses que compõem o pacote da referida linguagem e como todos os fatores aqui mencionados – público-alvo, pós-modernidade e avanços tecnológicos – relacionam-se a esses elementos.

Em sua dissertação de mestrado, Carla Cristina da Costa Teixeira, agora doutora em design pela PUC-Rio, estuda a linguagem visual das vinhetas da MTV a partir da concepção do videodesign – que seria o design gráfico para o vídeo – como “uma das áreas de atuação do design mais privilegiada em expressar essa influência advinda da cultura pós-moderna”

(TEIXEIRA, 2006, p. 12). A autora aborda a temática da pós-modernidade e faz pontuações a esse respeito diversas vezes em sua pesquisa, além de dedicar um capítulo inteiro ao assunto.

Visando fazer uma brevíssima síntese, apenas para esclarecer o que é isto que estamos tratando por “características da cultura pós-moderna” no presente trabalho, foram selecionados alguns dos termos que apareceram com maior recorrência e/ou tiveram maior destaque ao longo de sua dissertação.

Segundo Terry Eagleton, a pós-modernidade seria um período histórico que questiona noções clássicas da modernidade como a verdade, a razão, a identidade e a objetividade, a ideia de progresso, a emancipação universal, os sistemas únicos e as grandes narrativas que impregnaram a sociedade ocidental (EAGLETON, 1998 apud TEIXEIRA, 2006, p. 41).

No lugar desses ideais, passaram a vigorar, nos âmbitos cultural, econômico e social, elementos como: multiplicidade, efemeridade, descartabilidade, superficialidade, consumismo, fragmentação, descontinuidade, resgate do passado, pastiche6, experimentalismo, inovação estética, multiplicidade de narrativas, referenciação a distintos estilos, perda de continuidade histórica, fixação nas aparências, fragmentação dos discursos, instabilidade da linguagem, constante anseio por novidades, sensacionalismo, espetáculo e aproximação entre a alta cultura e a cultura popular. Ou seja, a cultura pós-moderna vai priorizar a multiplicidade de narrativas

6 O pastiche é um recurso visual análogo à paródia. Mas, diferentemente dessa, não tem a intenção de criticar o objeto ao qual faz referência, “é considerado uma espécie de ‘paródia vazia’, sem conteúdo crítico” (TEIXEIRA, 2006, p. 87).

“Imitar um estilo único, peculiar, tomar emprestado um tipo de linguagem, jogar aleatoriamente com alusões estilísticas, é uma prática utilizada quase que universalmente em nossos dias. A esta técnica chamamos de pastiche” (TREVISAN, 2011, p. 59-60).

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em detrimento das verdades únicas e universais provenientes do saber científico que prevalecia na modernidade, “vai valorizar o sensível, a comunicação, a emoção coletiva e será então mais relativa, completamente dependente dos grupos ou tribos enquanto tais” (MAFFESOLI, 1989 apud TEIXEIRA, 2006, p. 45).

Figura 1 - Vinhetas da MTV: pastiche, referenciação a distintos estilos, referências à cultura pop.

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Não se pode esquecer também que a cultura pós-moderna é a expressão de um período ligado ao consumo e ao capitalismo avançado, em que “a própria ‘cultura’ se tornou um produto” (JAMESON, 2002 apud TEIXEIRA, 2006, p. 42). Dessa forma, a pós-modernidade e a fase do capitalismo sobre a qual ela se desenvolveu contribuíram para a promoção do

“consumo de diversas mercadorias que sustentam a indústria cultural, da qual a MTV faz parte, estando baseadas na efemeridade estética e na contínua promessa de satisfação inerente à publicidade.” (TEIXEIRA, 2006, p. 48)

De acordo com a autora, “o design em parceria com a publicidade suscita no consumidor o desejo irrefreável de obter determinada mercadoria” (ibid., p. 67). Logo, se o design possui o poder de influenciar aquele com quem se comunica a consumir e é este consumo que sustenta a indústria cultural pós-moderna, pautada na obsolescência e na constante renovação, temos que também o design pós-moderno tem de ser pautado na contínua transformação e na não existência de um padrão estético típico. Para que isso seja possível, faz-se necessário que o contexto de trabalho do designer tanto permita a liberdade criativa e a experimentação quanto ofereça uma extensa gama de possibilidades de manipulação digital das imagens.

Por volta da década de 1960, a vigência do austero e funcionalista design moderno como padrão de qualidade começa a entrar em declínio. O pragmatismo, a precisão, a tipografia uniforme, a rigidez do grid system7, a neutralidade e a universalidade cedem espaço para a ornamentação, coexistência de distintos estilos e “para a possibilidade de haver uma maior personalização e diferenciação entre as identidades visuais corporativas projetadas” (ibid., p.

65). Isso ocorre por conta do processo de segmentação do público-alvo, gerando uma maior preocupação em atingir nichos específicos, e do crescimento da influência das ações de marketing sobre o sucesso ou fracasso de um produto. Com isso, de acordo com Carla Cristina Teixeira (2006, p. 69), o design pós-moderno passa a valer-se do uso de diversas referências;

da busca por inspiração em estilos do passado, como o Art Nouveau e o Art Déco; da mistura de cores, da sinuosidade das formas, do estilo psicodélico que surgiu no design americano; do mix entre cultura pop e elementos do período clássico; da introdução de interferências na imagem – como rabiscos, riscos, respingos, rasgos e ruídos; e do jogo com padrões, texturas e formas geométricas, dentre outros elementos. O resultado dessas transformações foi o fim do

“cerceamento da criatividade dos designers através de ‘fórmulas prontas’” (ibid., p. 65), com o aumento de sua autonomia. Somado a isso, o desenvolvimento da computação gráfica transforma a figura do designer em “consistente ‘co-autor’ [sic] de suas obras” (ibid., p. 125).

7 Ferramenta do design gráfico que permite alinhar os elementos textuais, gráficos e imagéticos de uma composição visual com base em uma estrutura geométrica formada por linhas e colunas em sequência.

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Figura 2 - Vinhetas da MTV: cores vibrantes, mistura de cores, padronagens e texturas, estilo psicodélico.

A introdução do computador no design também facilitou a tradução gráfica dessas várias idéias [sic] e tendências, através de softwares que promovem o uso de diferentes imagens, novas ou reproduzidas, que são colocadas em várias camadas [...]. Essas imagens podem ser fragmentadas, recompostas, adulteradas ou se misturar com texturas ou pedaços de outras imagens. O computador facilitou a introdução de interferências e ruídos em uma imagem [...]. Os trabalhos não mais necessariamente precisam transmitir um sentido bem delimitado e fechado, mas podem suscitar no público diversos tipos de interpretação (ibid., p. 69-70).

As mudanças tecnológicas ocorridas entre o final da década de 50 e início da década de 60 foram essenciais para o desenvolvimento do design gráfico para vídeo. Dentre elas, estão o videotape8 e o advento da computação gráfica, com a invenção de um sistema de edição eletrônica que possibilitou o surgimento dos primeiros efeitos de animação em vídeo. No entanto, seria somente a partir da década de 70 que os recursos da informática passariam a ser amplamente utilizados na televisão. Segundo Arlindo Machado, o que caracteriza essa fase é

“a imensa manipulabilidade da imagem, não apenas a nível da articulação dos planos, através do corte e da montagem, mas sobretudo no nível interno, na articulação dos elementos visuais dentro do quadro.” Além disso, segundo ele, “são produtos típicos dessa televisão cada vez

8 Fita de vídeo.

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mais digitalizada os videoclipes, os spots de abertura de programas (como os de Hans Donner) e os comerciais de última geração” (MACHADO, 1995, p. 158).

1.2 O VIDEOCLIPE

Naquela época [década de 80], com a popularização de novos dispositivos como walkman, controles remotos, videocassete, TV a cabo, a experiência de recepção das mensagens midiáticas começa a se modificar, ocorre uma intensificação acentuada dos “casamentos e misturas entre linguagem e meios” (SANTAELLA, 2003, p.15).

Assim, o videoclipe desenvolveu-se como um formato audiovisual impulsionado pelo avanço tecnológico das mídias e das consequências observadas nas linguagens e conteúdos produzidos. Ao unir a experimentação visual ao reino da música pop [...]

mostra-se como um amalgama de possibilidades audiovisuais, que mescla elementos das linguagens do cinema, TV e propaganda, além da música, é claro, aliados as possibilidades técnicas do vídeo e computação gráfica em plena expansão no momento. (TREVISAN, 2011, p. 9-10)

Não é possível formular uma definição única de videoclipe e nem ao menos precisar com certeza suas origens, visto que os pesquisadores que o estudam pertencem a áreas diferentes e, muitas vezes, divergem entre si. Além disso, os tipos e estilos de videoclipes são múltiplos, o que torna essa tarefa ainda mais difícil. No entanto, podemos eleger, para fins de uma compreensão melhor sobre esse elemento ao longo da presente pesquisa, as mesmas delineações traçadas por Michele Trevisan em sua tese sobre a estética do videoclipe.

Caracterizado por ser uma peça de formato híbrido, com origens na publicidade, no curta- metragem experimental e na generalidade da TV, “podemos adotar a ideia mais comum de que o videoclipe é sinônimo de videomusica, ou seja, uma peça promocional para uma música ou seu intérprete” (ibid., p. 13). Isto é,

podemos dizer que é, antes de tudo, uma ferramenta publicitária, onde se divulga um produto – a banda, o cantor (a), a música, através de uma estética de imagens. [...] As mensagens transmitidas ultrapassam as letras das canções, divulgando tendências, comportamentos e produtos (ibid., p. 14).

A Music Television pode até não ter sido a inventora do formato videoclipe, mas ela definitivamente contribuiu para o delineamento e a perpetuação das características que qualificam a grande maioria das obras pertencentes a esse formato.

A maior parte dos clipes produzidos antes da inauguração da emissora eram repletos de amadorismo ou soluções muito simples, pontilhadas de clichês [...]. No caso do Brasil, [...] A fórmula adotada por esses clipes seguia chavões como a gravação de um suposto show ao vivo [...] ou então imagens um tanto monótonas e estáticas, que em

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nada lembravam os clipes dinâmicos e fragmentados que seriam exibidos mais tarde pela MTV (TEIXEIRA, 2006, p. 74).

Com o crescimento da popularidade da emissora, os videoclipes tornaram-se uma verdadeira vitrine para cantores e bandas. Eles detinham o poder de promover não apenas as músicas e álbuns, mas estilos, roupas, visuais e personalidades. Vendo a incrível ferramenta publicitária que estas peças poderiam ser, as gravadoras tornaram-se as principais financiadoras dessas produções e, a partir dos anos 80, a imagem dos ídolos musicais passou a ser ostensivamente explorada nos videoclipes. Fez-se uso de uma série de símbolos visuais e características comportamentais facilmente identificadas na aparência, na atitude e nas performances dos artistas e seus videoclipes. Expostos ao fluxo contínuo de clipes, os espectadores rapidamente identificaram-se com seus ídolos e passaram a reproduzir suas aparências, trejeitos e comportamentos, o que impulsionava o consumo de uma série de produtos e serviços relacionados aos artistas.

Não que esse processo de exploração e reprodução das imagens não ocorresse antes.

Como Dancyger aponta em seu livro, nos filmes dos Beatles de Richard Lester – precursores do estilo MTV – a narrativa não é o mais importante, mas sim os trechos musicais que representam a identidade da banda. O que aconteceu é que, a partir da exibição massiva de videoclipes, também esse processo se massificou.

Nessa mesma época, a canção Thriller, de Michael Jackson, tem seu clipe lançado e transforma-se em febre mundial, mesmo com uma duração demasiadamente longa para um videoclipe (14 minutos). Tal sucesso deu início a uma nova fase na produção de clipes musicais – a das “‘superproduções’, dignas de filmes de Hollywood” (ibid., p. 29). Portanto, se um dia os clipes haviam sido tratados como um elemento de importância secundária à música, repletos de amadorismos, soluções simples e clichês, o sucesso e a popularidade da MTV, seus videoclipes e artistas mudou de vez a relação da indústria fonográfica com essas peças audiovisuais. Em muitos casos, tais peças passaram a ser idealizadas concomitantemente à própria canção, tamanha era a importância comercial nelas identificada.

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Figura 3 - Videoclipe de Thriller (1983).

Posto isso, é possível afirmar que “o clipe é um legítimo produto da indústria cultural, estimulando o consumo de produtos através da criação de imagens que são associadas aos músicos contratados pelas grandes gravadoras.” (ibid., p. 80)

Dessa forma, é lógico pensar que a estrutura dessas peças possa se assemelhar em algum ponto à de um spot publicitário, em função de sua curta duração, “estrutura compacta”

(TREVISAN, 2011, p. 17), da profusão de imagens instantâneas, da velocidade, dos curtos planos, da grande quantidade de cortes, do constante movimento e do privilégio da emoção e da sensação imediata em detrimento da narrativa.

Além destas, é possível identificar no videoclipe outras características, comuns não só aos spots publicitários, mas também às vinhetas da MTV e de abertura e encerramento dos programas das demais emissoras. A saber: forte presença de técnicas como a fusão e a sobreposição de imagens – muitas vezes pertencentes a distintas fontes e naturezas; numerosos movimentos de câmera; manipulação digital de cores e formas geométricas; e grande quantidade de elementos gráficos. A articulação destes vários itens descontínuos faz com que os quadros pareçam “uma série de recortes (de imagens estáticas ou em movimento) colados, seguindo um certo ritmo” (ibid., p. 56).

Ritmo esse pautado na junção entre música, imagem e movimento a partir da fragmentação, de cortes orientados pela música, do “abandono revolucionário da dimensão de tempo” e da possibilidade de dissolver a unidade dos planos em um fluxo contínuo. Com isso, temos a consequente ausência ou quebra da narrativa, o rompimento com as padronizadas convenções de continuidade e com as noções clássicas de personagem, a não-linearidade e a falta de significados explícitos. Podemos apontar ainda como características: a união do artístico com o comercial e da alta cultura com a cultura de massa; mudança constante;

repetição; a presença de referências, de metáforas sutis, da paródia e do pastiche; a ironia e a autoironia; a autorreflexão; a quebra de regras e o questionamento de dogmas.

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Sistematizando, podemos dizer que o videoclipe é uma linguagem híbrida, que coletou o que havia de mais recente e instigante nas diferentes mídias. Do cinema, o videoclipe tomou emprestado as “ousadias técnicas”, bebeu da influência dos movimentos de vanguarda e da narrativa compacta dos curtas-metragens. Da publicidade, o videoclipe herdou os “maneirismos estéticos” o (SOARES, 2004 p. 59 apud TREVISAN, 2011, p. 62), que possuem como finalidade criar uma peça visualmente aprazível, capaz de mexer com o imaginário e provocar desejos no espectador. Finalmente, articulou tudo isso a partir do

conceito de sinestesia, em que as imagens dos videoclipes são, frequentemente, conectadas à música privilegiando uma série de conotações sensoriais, impressões e significações extra musicais [sic], transmitindo um tipo de visualização do som musical” (TREVISAN, 2001, p. 55).

1.3 A UNIDADE VISUAL DA MTV

O videoclipe pode até ter sido o principal produto da Music Television ao longo de sua história e pode inclusive ter emprestado seu nome para intitular aquilo que ficou conhecido como sinônimo de “estilo MTV” – a “estética do videoclipe”. No entanto, é preciso lembrar que o sucesso e a expansão da emissora foram construídos a partir de uma inteligente identificação de público-alvo e criação de demanda, que resultou na construção de uma forte identidade para a marca, reforçada a todo tempo pela linguagem visual da emissora. Afirmar isso significa dizer que as características inerentes ao videoclipe e a imagem comercial projetada pela MTV se faziam visíveis por toda parte.

Dos clipes e vinhetas aos programas de entretenimento e matérias jornalísticas, do departamento técnico à atitude dos VJs, para onde quer se voltasse a atenção, era possível identificar a identidade jovem, irreverente e pós-moderna da MTV. Nos programas, os cenários criavam um ambiente descontraído, acompanhando a fala e a postura dos apresentadores, que normalmente conduziam o programa em pé. Estes, os VJs, não costumavam ser atores ou modelos, mas sim jovens comuns – de modo a facilitar a identificação da audiência com a emissora. No jornalismo, a MTV promoveu uma verdadeira revolução em termos de linguagem.

Adotou a narrativa não linear em suas matérias, renunciou à câmera estabilizada pelo tripé e assumiu a tremulação da imagem da câmera na mão; utilizou-se de ângulos inusitados nas filmagens, de ruídos nas imagens e planos de curta duração; e, principalmente, assumiu o corte

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na montagem, ao fazer uso do jump cut. Técnica hoje muito comum – e desejável – em entrevistas; na época, constituía-se em um verdadeiro “susto na linguagem”9.

Aliás, com o surgimento da linguagem visual proposta pela MTV, outras emissoras americanas também sofreram uma espécie de “rejuvenescimento” nos projetos gráficos adotados. As vinhetas de abertura dos programas e a própria forma de apresentação dos famosos “âncoras” dos jornais televisivos americanos absorveram muitas características presentes no universo da Music Television Começou a ser priorizada uma maior dinâmica na forma como os jornais eram conduzidos e também na própria linguagem de edição das reportagens. Muitos apresentadores passaram a comandar seus programas “em pé”, seguindo a forma como os VJs anunciavam os clipes da emissora, o que garante maior mobilidade e interação com o público (TEIXEIRA, 2006, p. 24).

Mas a influência da Music Television não foi absorvida apenas pelas demais emissoras de televisão. Com o passar do tempo, os anunciantes que almejavam um espaço para suas propagandas na grade da MTV começaram a produzi-las emulando a “fórmula visual”

empregada pelo canal no restante de sua programação. Para a emissora, também era interessante manter seu bloco comercial inserido de forma sutil na programação, uma vez que assim ela pareceria “mais atraente para seus anunciantes, que geralmente apreciam este tipo de artifício usado pela publicidade.” (ibid., p. 91)

Já em suas vinhetas, a MTV foi na contramão do que havia de mais “sofisticado” no mercado até o início da década de 80, esquivando-se do estilo futurista das animações 3D repletas de prata e dourado feitas por Hans Donner para a Rede Globo. Resgatou imagens bidimensionais; fez uso de recursos visuais como ruídos, sujeiras, colagens, imagens distorcidas, mal reveladas, fragmentadas e sobrepostas umas às outras; e experimentou com a tipografia, com a utilização de palavras apagadas e desconstruídas e textos superpostos que rompiam com as regras de legibilidade. Gerou assim um aspecto grunge em suas vinhetas, despojado, rebelde, desleixado, irônico e anárquico – que predominou, por exemplo, na linguagem visual das vinhetas veiculadas pela MTV Brasil durante a década de 90.

Mas a emissora não possuía um único estilo de vinheta, uma vez que, como mencionamos anteriormente, “são vários os elementos utilizados na sua construção, e talvez o estilo do design pós-moderno seja exatamente não ter estilo algum, ou pelo menos nenhum estilo muito definido” (ibid., p. 114). Aliás, essas peças da MTV sequer possuíam um único formato ou finalidade. Havia as vinhetas IDs, que apresentavam, através de uma animação de curta duração, o logo do canal em diversos contextos e com diferentes designs. O canal também

9 Termo utilizado por Soninha, ex-VJ da MTV, ao falar sobre a linguagem visual da emissora e mencionar o jump cut, em entrevista concedida para o livro Admirável Mundo MTV Brasil, 2006, p.54-55.

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possuía vinhetas mais longas, ligadas a campanhas publicitárias de autopromoção, e as vinhetas de Serviço de Utilidade Pública (SUP), que abordavam assuntos de cunho social ou relacionados à saúde de forma descontraída. O formato desse último tipo influenciou o estilo de muitas das campanhas governamentais produzidas posteriormente. E não se pode esquecer, é claro, das vinhetas de abertura e encerramento, que costumavam possuir elementos simbólicos associados a seus programas ou elementos visuais que remetessem ao estilo deles. Geralmente contavam também com “uma trilha sonora compatível com a atração” (PEDROSO in Pedroso

& Martins, 2006, p.114 apud TEIXEIRA, 2006, p. 134).

Dessa forma, dentro de seus variados programas, matérias, comerciais, videoclipes e vinhetas, caracterizados pelos mais diversos formatos e gêneros, a MTV utilizou-se de algumas técnicas, ferramentas e soluções estéticas recorrentes, formando um estilo geral mais amplo que englobava uma série de outros estilos – o estilo MTV. Para elucidar de forma mais clara e sintética tudo que vimos até aqui e incluir algumas informações adicionais, veremos a seguir uma seleção de alguns dos elementos mais relevantes que apareceram ao longo dos trabalhos das autoras consultadas para a escrita desse capítulo, Carla Cristina da Costa Teixeira e Michele Kapp Trevisan, organizados por meio de uma tabela.

Desse modo, podemos entender as vinhetas da MTV – e principalmente as vinhetas ID – como peças que condensam em seus conteúdos a essência da emissora; que realizam uma síntese das características conceituais e estéticas que compõem a identidade da marca MTV.

Por isso, tanto no pacote que expressa a linguagem visual da emissora (programas, cenários, matérias jornalísticas, VJs, videoclipes etc.) quanto nas vinhetas – e principalmente nelas, podemos encontrar a presença dos seguintes elementos:

Tabela 1 – Síntese de elementos que compõem o estilo MTV QUANTO À FORMA E CONTEÚDO

Edição veloz e fragmentada

 Mudança frenética de planos e quadros;

 Cortes rápidos e numerosos;

 Descontinuidade;

 Compressão do tempo-espaço.

Movimento e dinamismo  Movimentos de câmera – Pans, tilts, zoom, travelling, câmera na mão, em steadycam;

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 Movimentos dentro de quadro – Personagens e objetos movimentando-se dentro de quadro, entradas e saídas, animações.

Fotografia e Iluminação estilizadas

 Variação de luzes;

 Uso de teleobjetiva ou grande angular;

 Ângulos inusitados.

Fragmentação da narrativa

 Quebra ou ausência de narrativa;

 Não-linearidade;

 Descentralização e rompimento com as noções clássicas de personagem;

 Possibilidade de diversos tipos de interpretação;

 Ausência de interesse em produzir sentido específico ou ser autoexplicativa;

Nonsense10 (ausência de sentido).

Referência/reciclagem/releitura de memórias, textos e obras já

existentes

 Descontextualização e recontextualização;

 Pastiche;

 Referências à cultura pop, cultura de massas;

 Iconografia desvairada;

 Mistura cultura pop com objetos do período clássico;

 Mistura de diferentes elementos históricos;

 Falta de continuidade histórica;

 Estética kitsch11.

Resgate e releitura de elementos e estilos do passado

 Tratamento de “envelhecimento”, uso de determinadas fontes, elementos estéticos que remetem ao passado;

 Passado estereotípico, agradável;

 Clima de nostalgia.

10 1. Desprovido de significação ou coerência; absurdo, disparate. 2. Conduta contrária ao bom senso. 3. No contexto do cinema e da literatura: filme ou escrito que recorre a elementos surreais, a situações ilógicas, absurdas etc. (Definições retiradas do dicionário de português da Google, fornecido pela Oxford Languages).

11 “Acompanhando a pesquisa de Rüdiger (1990), o termo generalizou-se [...] como a combinação contraditória de cores ou estilos, e as manifestações artísticas “falsificadas” [...], o tipo de cultura para o consumo em massa, produzida por grandes empresas. É neste sentido que o kitsch foi resumido à arte do mau-gosto.” (TREVISAN, 2011, p. 31)

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Atenuação das fronteiras entre:

 Alta cultura e cultura popular;

 Artístico e comercial;

Mainstream12 e movimentos de vanguarda.

Interferências visuais (com grafismos)

 Ruídos, sujeiras, rabiscos, rasgos, respingos de tinta;

 Palavras soltas, destruídas, fragmentadas.

Experimentação com imagens

 Imagens fragmentadas, justapostas, mal reveladas e com efeitos de distorção;

 Sobreposição de camadas durante a edição do vídeo, criando um visual com imagens e palavras superpostas umas às outras.

Recorte e colagem

 Experimentações com padronagens, texturas, formas geométricas e pedaços de imagens;

 Combinação entre informações gráficas díspares.

Cores e formas ousadas

 Cores exuberantes;

 Misturas de cores e texturas;

 Estilo psicodélico.

Experimentações tipográficas

 Mistura de diferentes fontes tipográficas;

 Escrita em cima de um escrito anterior, que é apagado ou raspado;

 Tipografia desconstruída;

 Falta de legibilidade.

Inspiração em movimentos artísticos modernos, como o

surrealismo, a pop art e o cubismo

 Surrealismo – paisagens oníricas, imagens que parecem geradas a partir do processo artístico do fluxo de consciência;

Pop art – repetição de imagens, serialização;

 Cubismo – recortes, colagens, justaposições de imagens, palavras soltas, grafismos, figuradas mal reveladas e outros ruídos visuais.

Humor e irreverência  Ironia;

12 Termo do inglês cuja tradução literal significa corrente (ou fluxo) principal. É comumente usado para designar as tendências, modas e correntes de pensamento mais populares no âmbito da cultura de massa.

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 Autoironia;

 Ridicularização;

Nonsense;

 “Império do grotesco” (TEIXEIRA, 2006, p. 98).

QUANTO À IDENTIDADE DA MARCA

Relativos ao ideal de juventude:

 Despojamento;

 Rebeldia;

 Anarquia;

 Questionamento de valores;

 Rompimento com regras e convenções;

 Visual propositalmente “amador”;

 Experimentalismo;

 Inovação estética.

Relativos à pós-modernidade:

 Mutação constante da marca (principalmente no logo MTV);

 Constante anseio por novidades;

 Instabilidade;

 Espetáculo;

 Efemeridade;

 Descartabilidade;

 Superficialidade;

 Banalidades;

 Multiplicidade;

 Pluralidade;

 Heterogeneidade.

Fonte: produção própria da autora desta monografia, feita a partir da síntese dos apontamentos presentes nos textos de Carla Cristina da Costa Teixeira (2006) e Michele Kapp Trevisan (2011).

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Figura 4 - Vinhetas da MTV: flerte com o surreal e o grotesco.

Figura 5 - Vinhetas da MTV: mutação da marca, pastiche, resgate do passado, inspiração em movimentos artísticos modernos.

Referências

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