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Práticas orais sobre o boi surubim: consciência e preservação da memória através da oralidade e da escrita

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM

PEDRO PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE PINHO

LETRAMENTOS, CONSCIÊNCIA E PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA: A PRÁTICA CULTURAL DO BOI-SURUBIM

NATAL/RN 2020

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PEDRO PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE PINHO

LETRAMENTOS, CONSCIÊNCIA E PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA: A PRÁTICA CULTURAL DO BOI-SURUBIM

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Letras (PROFLETRAS) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre. Orientadora: Profa. Dra. Maria do Socorro Oliveira

Linha de pesquisa: Letramentos e Contemporaneidade

NATAL/RN 2020

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Universida de Federa l do Rio Gra nde do Norte - UFRN Sistema de Biblioteca s - SISBI

Ca ta loga ção de Publica çã o na Fonte. UFRN - Biblioteca Setoria l do Centro de Ciência s Huma nas, Letra s e Artes - CCHLA

Pinho, Pedro Paulo Barbosa de Albuquerque.

Letramentos, consciência e preservação da memória: a prática cultural do Boi-surubim / Pedro Paulo Barbosa de Albuquerque Pinho. - Natal, 2020.

174f.: il. color.

Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem,

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020. Orientadora: Profa. Dra. Maria do Socorro Oliveira.

1. Projeto de letramento - Dissertação. 2. Oralidade - Dissertação. 3. Escrita - Dissertação. 4. Cultura local - Dissertação. 5. Pedagogia crítica - Dissertação. I. Oliveira, Maria do Socorro. II. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 81'33

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PEDRO PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE PINHO

LETRAMENTOS, CONSCIÊNCIA E PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA: A PRÁTICA CULTURAL DO BOI-SURUBIM

Dissertação apresentada como requisito para a obtenção do título de Mestre em Letras pelo Programa de Mestrado Profissional em Letras – PROFLETRAS – da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Aprovada em: _____/_____/__________.

BANCA EXAMINADORA:

_______________________________________________ Profa. Dra. Maria do Socorro Oliveira

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN Presidente

_______________________________________________ Profa. Dra. Ana Virgínia Lima da Silva Rocha

Examinadora interna (UFRN/PROFLETRAS)

_______________________________________________ Profa. Dra. Ivoneide Bezerra de Araújo Santos Marques

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À minha base familiar, em especial a Terezinha Neuma Barbosa Pinho, minha mãe, pelo amor incondicional a seus filhos dedicado.

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AGRADECIMENTOS

A Deus pelo milagre e pela beleza da vida.

A Terezinha Neuma Barbosa Pinho, minha mãe, amor eterno de minha vida, pelo exemplo de bondade, dignidade, sabedoria e amor incondicional.

A Geraldo de Albuquerque Pinho (in memoriam), meu pai, pelo exemplo de coragem para enfrentar os dilemas e as angústias da vida com cabeça erguida e decência.

A Rita de Cássia Barbosa (in memoriam), minha amada avó, pela grandeza divina de sua presença, bravura, amor e sabedoria.

A Mara Janne Barbosa de Albuquerque Pinho, Marcílio Barbosa de Albuquerque Pinho e Sérgio Barbosa de Albuquerque Pinho, meus amados irmãos, pelo amor e companheirismo independente das distintas visões de mundo e das circunstâncias da vida.

A Otana Mary da Costa Barbosa, minha prima, e sua família, pelo abrigo, companheirismo e amizade nas estradas da vida.

A Antonia Vilma de Sousa Costa, ser encantador, com quem dividi todas as estações do caminho.

À professora Dra. Maria do Socorro Oliveira, minha estimada orientadora, pela grandeza intelectual, altruísmo, humildade e notório amor ao saber.

À profícua contribuição das professoras Dra. Ana Virgínia Lima da Silva Rocha (UFRN/PROFLETRAS) e Dra. Ivoneide Bezerra de Araújo Santos Marques (IFRN/Natal).

À Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz, meu segundo lar, pelo total apoio.

Aos talentosos e brilhantes alunos do 9º ano (2019) da Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz, pelos saberes e esforços que possibilitaram mudarmos um pouco nossa realidade.

A Antônio José da Silva Uchôa, Antônio Ronélio Costa Arruda, Fábio Barros Pinho e Pedro Fárney Alves de Castro, estimados amigos, pela rica e engenhosa ajuda na construção da pesquisa e do Memorial Boi-Surubim.

À Família Rodrigues, guardiã da cultura local, em especial, ao grande Luís Rodrigues da Silva, pela brava resistência e alegria de seus festejos.

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A Francisco Valdevan Alves Dias, amante da cultura, compadre, amigo de longas datas, por enriquecer a cultura madalenense com seus diversos dons artísticos.

A Edinaldo Monteiro, colega com quem dividi as alegrias e dilemas da caminhada, pela parceria e pelos risos nas longas viagens até à Universidade.

À turma V do PROFLETRAS, minha pequena grande turma, pelos conhecimentos compartilhados, pelos laços fraternos construídos e pelas constantes caronas ofertadas no fim de tarde.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pesquisa em Nível Superior (CAPES), pelo auxílio financeiro concedido sob a forma de bolsa, sem a qual seria inviável esta pesquisa.

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A educação como prática da liberdade, ao contrário daquela que é prática da dominação, implica a negação do homem abstrato, isolado, solto, desligado do mundo, assim como também a negação do mundo como uma realidade ausente dos homens.

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RESUMO

O descaso com a cultura local, no município de Madalena-CE, coloca em xeque a sobrevivência de uma das manifestações tradicionais mais relevantes para identidade cultural da cidade, o Boi-Surubim. Devido a essa problemática e à necessidade de se tornar o ensino-aprendizagem uma prática contextualizada e mais efetiva, mais próxima à realidade do aluno, é que esta pesquisa, de valor prático e acadêmico, foi desenvolvida. Ela tem, pois, como objeto de estudo, a prática cultural do Boi-Surubim, explorada a partir da necessária interconexão entre escola e comunidade. O estudo teve como objetivo geral investigar o impacto de um Projeto de Letramento voltado para o resgate e a preservação da tradição oral do Boi-Surubim em um contexto situado. Vinculados a esse propósito maior, quatro objetivos específicos foram traçados: 1) desenvolver um projeto de letramento com os alunos do 9º ano de uma escola pública que aliasse o trabalho da escrita e da leitura à preservação das práticas orais do Boi-Surubim; 2) articular os saberes provenientes da cultura local aos saberes da cultura escolar por meio de um projeto de letramento; 3) contribuir para o desenvolvimento de uma consciência crítica nos alunos do 9º ano em relação à importância da cultura local; 4) refl etir sobre o papel do projeto de letramento como dispositivo didático para o (re)posicionamento identitário do professor. Esta pesquisa foi realizada, na Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz, tendo como principais colaboradores os alunos do 9º ano. Ela se fundamenta, teoricamente, nos estudos sobre letramentos (STREET, 1983; KLEIMAN, 1995, 2000; OLIVEIRA, KLEIMAN, 2008), nas discussões acerca da relação oralidade/escrita (MARCUSCHI, DIONÍSIO, 2007), nas ponderações sobre cultura e memória (BOAS, 2010; LE GOFF, 1990), nos estudos referentes aos projetos de Letramentos (KLEIMAN, 2000; OLIVEIRA, TINOCO, SANTOS, 2014; OLIVEIRA, 2016) e nas contribuições da pedagogia crítica (FREIRE, 2018). Metodologicamente, trata-se de uma abordagem de pesquisa qualitativa-interpretativista, com viés etnográfico (MOITA LOPES, 1994; BOGDAN, BIKLEN, 1991). As análises dos dados gerados[ por meio de instrumentos, tais como: observação e registro de condutas interacionais e procedimentos de busca informacional em sala de aula, notas de campo, registros de interações comunicativas via mídia digitais, entrevistas, depoimentos, registros fotográficos e textos produzidos em oficinas de letramento nos permitiram evidenciar que o projeto de letramento se mostrou um profícuo dispositivo didático (OLIVEIRA, 2016) capaz de transformar a realidade local, ressignificar nossa prática de ensino e promover o protagonismo discente.

Palavras-chave: Projeto de letramento. Oralidade. Escrita. Cultura local. Pedagogia

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ABSTRACT

The severe neglect towards local culture displayed in the town of Madalena, Ceará, endangers one of its most relevant traditional expressions, crucial to the cultural identity of the town, the “Boi-Surubim”. Due to this issue and to the need of making the teaching-learning process a more contextualized and effective practice, closer to the students’ realities, this research, of practical and academic value, was developed. Its object of study is the cultural practice of “Boi-Surubim”, observed through the required interconnection between school and community. The study had as its general goal to investigate the impact of a literacy project aimed at saving and preserving the oral tradition of “Boi-Surubim” in a situated context. Associated to this main objective, four specific goals were set: 1) to develop a literacy project with 9th grade public school students which combined the readin g and writing of assignments to the preservation of “Boi-Surubim’s” oral tradition; 2) to articulate the knowledge that originates from local and school cultures through a literacy project; 3) to contribute to the development of the 9th grade students’ critical awareness regardin g the importance of local culture; 4) to ponder over the role of literacy projects as a teaching device for the (re)consideration of teachers’ identity. This research was conducted at the Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz (Paula Queiroz Elementary School), having as its main collaborators the 9th grade students. This research is theoretically based on literacy studies (STREET, 1983; KLEIMAN, 1995, 2000; OLIVEIRA, KLEIMAN, 2008), on discussions regarding the relation of orality/writing (MARCUSCHI, DIONÍSIO, 2007), on deliberations regarding memory and culture (BOAS, 2010; LE GOFF, 1990), on studies referring to Literacy projects (KLEIMAN, 2000; OLIVEIRA, TINOCO, SANTOS, 2014; OLIVEIRA, 2016) and on the contributions of critical pedagogy (FREIRE, 2018). Methodologically, it is a qualitative research of ethnographic method (MOITA LOPES, 1994; BOGDAN , BIKLEN, 1991). The data analysis was generated by instruments such as: observation and recording of interactive behaviors and of in formation search procedures in the classroom, field notes, recording of communicative interactions through digital media, interviews, statements, photographic records and text produced during literacy workshops. These allowed us to evidence that the litera cy project presented itself to be a fruitful didactic device, capable of transforming local reality, of giving new meaning to our teaching practices and of promoting student protagonism.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Visão panorâmica da sede do município de Madalena-CE ... 30

Figura 2 - Sede da Fazenda Teotônio ... 31

Figura 3 - Escola Paula Queiroz em 2007. ... 33

Figura 4 - Espaços internos da escola (Oficina de Arte, salas, auditório, cozinha) ... 36

Figura 5 - Confecção das fantasias ... 100

Figura 6 - Pátio da escola antes e depois da aplicação do projeto ... 101

Figura 7 - Imagens do Memorial Boi-Surubim... 102

Figura 8 - Alunos se divertindo ao som da banda musical durante preparação para apresentação ... 111

Figura 9 - Momento com os colaboradores ... 112

Figura 10 - Desenho referente ao eu lírico do poema RETRATO ... 134

Figura 11 - Convite para a culminância do projeto... 135

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Quantidade de alunos por turma da escola Paula Queiroz ... 32 Quadro 2 - Quantidade de funcionários da escola Paula Queiroz ... 32 Quadro 3 - Lista de ações a serem desenvolvidas no PL... 44

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Histórico das metas e resultados obtidos no Ideb nos anos iniciais do ensino fundamental da EEFPQ ... 35 Gráfico 2 - Histórico das metas e resultados obtidos no Ideb nos anos finais do

ensino fundamental da EEFPQ ... 36 Gráfico 3 - Distribuição dos alunos de acordo com a idade ... 39 Gráfico 4 - Distribuição dos alunos de acordo com a região onde moram ... 39

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AILA Associação Internacional de Linguística Aplicada BNCC Base Nacional Curricular Comum

CEMA Centro Educacional de Madalena

EEFPQ Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz EJA Educação de Jovens e Adultos

GNL Grupo de Nova Londres

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INEP O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

OBA Matemática Brasil e a Olimpíada Brasileira de Astronomia OBMEP Olimpíadas de Matemática das Escolas Públicas

IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IT Instituto Teotônio

LA Linguística Aplicada

PCN Parâmetro Curricular Nacional PL Projeto de Letramento

PROFLETRAS Programa de Mestrado Profissional em Letras TDIC Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação TIC Tecnologias da Comunicação e Informação

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 17

2.0 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA ... 25

2.1 Inserção no campo da linguística aplicada ... 25

2.2 Paradigma de pesquisa ... 27

2.3 Abordagem da pesquisa ... 29

2.4 Ambiente da pesquisa ... 29

2.5 Colaboradores ... 37

2.6 Constituição do corpus, procedimentos e instrumentos de geração de dados ... 40

2.7 Procedimentos de análise dos dados ... 44

3.0 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS ... 46

3.1 Letramentos... 47

3.1.1 Letramento crítico e pedagogia crítica ... 51

3.1.2 Multiletramentos: multimodalidade e multiculturalidade ... 55

3.1.3 Letramento, tecnologia e inovação ... 58

3.2 Projetos de letramento ... 62

3.2.1 Oficinas de letramento... 66

3.2.2 Projetos de letramento e gêneros textuais... 68

3.3 Projeto de letramento e culturas ... 71

3.3.1 A cultura do bumba-meu-boi: breve histórico ... 74

3.3.2 Boi-surubim: desafios da cultura popular em madalena... 75

3.4 Oralidade, escrita e memória ... 77

3.4.1 Oralidade e memória ... 80

4.0 PROJETO DE LETRAMENTO “BOI-SURUBIM: DESAFIOS DA CULTURA POPULAR EM MADALENA” – DESCRIÇÃO E ANÁLISE ... 83

4.1 Oficinas de letramento ... 83

4.2 Um olhar sobre os usos sociais da língua na construção de diálogo entre saberes no PL ... 113

4.2.1 Reposicionamento identitário do professor no PL ... 113

4.2.2 Leitura e escrita como práticas agentivas e identitárias ... 119

(16)

4.2.4 Oralidade, memória e afetividade... 127

4.2.5 Multiletramentos e multimodalidade... 131

4.2.6 Tecnologias digitais no PL ... 138

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 143

REFERÊNCIAS ... 147

APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO DESTINADO AOS PAIS OU RESPONSÁVEIS ... 154

APÊNDICE B – TERMO DE ASSENTIMENTO DESTINADO AOS COLABORADORES ... 157

APÊNDICE C – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA USO DE IMAGENS (FOTOS) ... 159

APÊNDICE D - TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA USO DE IMAGENS (VÍDEOS) ... 160

APÊNDICE E – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA USO DE VOZ ... 161

APÊNDICE F – QUESTIONÁRIO SOCIOECONÔMICO DA ESCOLA PAULA QUEIROZ ... 162

APÊNDICE G – QUESTIONÁRIO PARA TRAÇAR UM PERFIL DA TURMA DE 9º ANO DA ESCOLA PAULA QUEIROZ ... 163

APÊNDICE H – POEMA “RETRATO”, DE CECÍLIA MEIRELES ... 164

APÊNDICE I – FORMULÁRIO PARA AUXILIAR A PRODUÇÃO DA AUTOBIOGRAFIA ... 165

ANEXO A – LETRA DA MÚSICA “ERA UMA VEZ”, DA CANTORA E COMPOSITORA KELL SMITH ... 166

ANEXO B – POEMA “RETRATO” DE CECÍLIA MEIRELES ... 167

ANEXO C – TRECHO DO LIVRO “CHEIRO BOM DE TERRA MOLHADA”, DE MAGGY CÂMARA BEZERRA ... 168

ANEXO D – QUESTIONÁRIO DA ENTREVISTA COM SEU LUÍS... 169

ANEXO E – CONVITE PARA A CULMINÂNCIA DO PROJETO E INAUGURAÇÃO DO MEMORIAL BOI-SURUBIM ... 170

ANEXO F – ARTIGOS 215 E 216 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988, QUE DISPÕEM SOBRE A CULTURA... 171

ANEXO G – NOTA EXPLICATIVA REFERENTE À FINALIDADE DO MEMORIAL BOI-SURUBIM... 173

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ANEXO I – COMENDAS EM HOMENAGEM AOS MESTRES DOS

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1 INTRODUÇÃO

Durante décadas, de dezembro a janeiro, pessoas de várias comunidades circunvizinhas visitavam os terreiros da família Rodrigues, na Fazenda Teotônio, no município de Madalena- CE, para assistir aos festejos do Bumba-meu-boi, também conhecido na região como Boi-Surubim. Era a data mais esperada pelos moradores desse lugar, visto ser um momento em que os trabalhadores esqueciam, por instantes, as dores da labuta. Cipós, cabaças, roupas de carnaúba, máscaras de couro de bodes e cabeças de animais mortos davam vida a uma noite de muita alegria ao som de grupos de músicos da comunidade. “Os Caretas da Teotônio” (outro nome para o Boi-Surubim) era o auto mais famoso de todos n a região e, infelizmente, deixou de se apresentar por 14 anos.

Nesse período em que esse folguedo popular se manteve silenciado, percebeu-se que os próprios alunos, filhos das tradicionais famílias que promoviam os festejos dos Caretas, não conheciam essa prática cultural. Foi somente através de ações promovidas pelas instituições de ensino Centro Educacional de Madalena (CEMA) e Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz (EEFPQ) que esses educandos tiveram contato com o folguedo local. Os próprios alunos entrevistaram as pessoas que realizavam essas práticas, conheceram os personagens e promoveram uma noite cultural na qual o Boi-Surubim e os demais personagens estiveram presentes. Essas atividades foram realizadas em 2005 com o intuito de resgatar a cultura do Bumba-meu-boi.

A partir dessas ações das escolas citadas, promovidas pelos alunos, a família guardiã desse folguedo (família Rodrigues) sentiu -se animada para ressuscitar as práticas dos festejos que sempre realizaram. Depois de 14 anos de emudecimento, o Boi-Surubim retorna aos terreiros da Fazenda Teotônio, em 2006, sob a maestria de Luís Rodrigues da Silva (filho de Marcelino Rodrigues da Silva, precursor das práticas culturais dos Caretas da Teotônio), enriquecendo o calendário cultural da comunidade e da escola, mostrando às novas gerações fatos cultu rais que desconheciam de sua própria identidade cultural.

Além da retomada da tradição das práticas do Boi-Surubim na fazenda, isso inspirou também o madalenense, poeta, cordelista, escultor, compositor, cantor e funcionário público Francisco Valdevan Alves Dias a dançar o boi nas ruas da cidade e nos distritos do município. De forma itinerante, o poeta juntamente com um grupo

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composto por alunos e membros da comunidade visitavam os bairros do município, encenando o auto, algo que perdurou de 2006 a 2014. Por falta de condições financeiras para confecção dos personagens e promoção do evento, o Surubim do cordelista, conhecido como “Devan”, some das ruas da sede e dos distritos de Madalena.

Atento à grandeza desse evento cultural, em 2014, o Programa Mais Cultura, da Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz desenvolveu um projeto muito significativo para a comunidade da Fazenda Teotôn io ligado aos festejos do Boi-Surubim. Esse programa repassava um valor financeiro simbólico como incentivo, para que o mestre Luís mantivesse vivo os festejos do Bumba-meu-boi. Devido aos esforços de seu Luís, dos alunos e demais dançantes da comunidade, esse folguedo volta ao calendário cultural da fazenda.

Como atividade escolar, os alunos do 6º ao 9º ano foram a campo registrar esse auto popular. Filmaram conversas com seu Luís, falando sobre as práticas do boi. Registraram em vídeo a realização do festejo. Esse material, organizado em DVD, foi distribuído na comunidade e doado para as demais escolas circunvizinhas.

Com a extinção do Programa Mais Educação na escola, em 2016, seu Luís sentiu grandes dificuldades em realizar as festas do auto popular, porque a manutenção dos personagens exigia demandas financeiras consideráveis, além das despesas com os músicos (sanfoneiro, zabumbeiro, entre outros).

Embora todas as ações supracitadas tenham contribuído significativamente para “ressuscitar” o Boi-Surubim, toda a tradição dos festejos do boi como música, dança, criação e confecção dos personagens, repentes, habilidade de improviso e uma vasta memória de muitas histórias contadas pelos ascendentes do mestre Luís corre um sério risco de desaparecer n ovamente, pois o senhor Luís é o único membro vivo da família Rodrigues que promove, com muitas dificuldades, os festejos populares dos Caretas. Caso ele pare de realizar esse ritual e não seja feito nenhum registro mais amplo de toda essa tradição, haverá, em Madalena, um silenciamento e, quem sabe, até a extinção da tradição do Boi-Surubim da Fazenda Teotônio, visto que quase todos os filhos de seu Luís estão indo embora para capital (Fortaleza) para estudar e trabalhar. Devido a tais contingências, há fortes possibilidades de sua prole não dar continuidade a essa tradição.

Essa festa tão importante para a comunidade, atualmente, é realizada com a participação de membros da comunidade local e de pessoas de localidades vizinhas,

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sendo que boa parcela dos personagens do festejo é composta, também, por alunos da própria escola Paula Queiroz. A idade do público discente que participa varia entre 9 a 16 anos.

Em um momento específico, foi criado um “brainstorm” (tempestade de ideias) com a sala do 9º ano da Escola Paula Queiroz, em 2019, a fim de identificar questões problemáticas as quais afetassem tais discentes. A turma sugeriu algumas questões de seu próprio contexto como: violência no município, bullying, rádio escolar, racismo, entre outras proposições.

Na ocasião, lembramo-nos dessa iminente extinção das práticas culturais do Boi-Surubim e comentamos com os alunos. Como houve muito interesse da turma sobre o assunto, falamos acerca das ações realizadas pelas escolas que motivaram a retomada dos festejos do auto popular na Fazenda Teotônio. Referimo-nos também à relevância do trabalh o realizado pelo poeta Valdevan Dias na sede e nos distritos municipais de Madalena, frisando a importância da família Rodrigues na pessoa do mestre Luís bem como as dificuldades deste em dar continuidade às práticas do festejo do Boi-Surubim.

Antes de terminarmos nossos comentários, a maioria dos alunos sugeriu colocar essa questão em pauta. Como havia muitas sugestões, propusemos uma votação para que escolhessem a proposição com a qual mais se identificassem. Escrevemos todas as propostas na lousa e, por unanimidade, escolheram as práticas orais do auto do Boi-Surubim.

Durante o diálogo, notamos um expressivo interesse dos alunos devido ao caráter prático do projeto que extrapolava a sala de aula, pois muitos falaram em visitar seu Luís e participar dos festejos. Houve uma identificação imediata com a questão, porque alguns já tinham participado do Boi-Surubim. Dos 31 alunos matriculados no 9º ano, todos votaram a favor, sem exceções.

Como bem sabemos, as práticas de leitura/escrita desenvolvidas nas escolas, quase sempre, são moldadas por um contexto artificial que, raramente, dão respostas aos problemas da vida dos discentes. Julgamos, entretanto, que a escola precisa atuar junto com a comunidade, aproximar o currículo dos saberes locais do meio em que os alunos vivem, visto que, de modo geral, a escola não tem dado relevância às questões culturais.

A organização do espaço escolar e a forma como estão dispostas as carteiras, os alunos passam mais de quatro horas por dia vendo a nuca de seus

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colegas e as longas explicações do professor. Ele (educando) assume um papel de aguda passividade na dinâmica expositiva das atividades propostas.

Em virtude dessas problemáticas, a realização desta pesquisa se justifica pela necessidade de se criar na escola situações comunicativas nas quais os alunos do 9º ano da Paula Queiroz usem a leitura e a escrita como uma prática situada na resolução de problemas de seu próprio contexto, trazendo para dentro da escola os saberes populares da comunidade, amenizando, assim, o agudo descaso com a cultura local, o qual coloca em xeque a sobrevivência das manifestações tradicionais mais relevantes para a identidade cultural da cidade, as práticas do Boi-Surubim. Para atingir tal intento, pensamos, juntamente com os alunos, em desenvolver um projeto que tivesse como finalidade aliar o trabalho com a escrita e a oralidade às práticas de preservação da cultura do Boi-Surubim na Fazenda Teotônio, comunidade na qual está inserida a escola pertencente à rede municipal de ensino da cidade, Paula Queiroz, e da qual sou professor efetivo de Língua Portuguesa desde 2007.

Em função disso, assumimos como objeto de estudo desta pesquisa a prática cultural do Boi-Surubim. Para tanto, está previsto um projeto de letramento (doravante PL) na Escola de En sino Fundamental Paula Queiroz.

Julgamos que a realização desta pesquisa possa potencializar os estudos de letramento como prática sociocultural, assumindo um papel social relevante para a preservação dos festejos do Boi-Surubim para as gerações futuras, pois não há registros escritos sobre esse folguedo na Fazenda Teotônio. Apresenta, também, contribuições teóricas para a academia, porque, ainda que existam pesquisas sobre tradições orais, normalmente, elas são desenvolvidas na área de sociologia e antropologia. O inovador, diferencial, nesta pesquisa, é que ela aborda a questão sob uma perspectiva dos estudos de letramento, entendidos como uma prática social, conforme afirmam Street (2014) e Kleiman (1995).

Após concluir minha graduação em 2006, passei mais de uma década lon ge das discussões acadêmicas, limitado aos livros didáticos e à retórica fatalista de que os problemas educacionais não têm jeito. Assumir uma postura de professor/pesquisador promovido pelo Programa de Mestrado Profissional em Letras (PROFLETRAS) tem contribuído, significativamente, para eu reposicionar meu fazer docente. Essa atualização de repertório e a intenção aqui adotada de se trabalhar com projetos de letramento estão desenvolvendo em mim um olhar mais crítico

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sobre a minha prática em sala de aula. Com mais embasamento teórico, vejo a possibilidade de desenvolver ações que transformem o fazer docente. Todo esse processo de reflexão e conscientização realizado também é um aspecto importante que atribui relevância a esta pesquisa.

São contribuições múltiplas, porque, além de ressignificar meu fazer pedagógico, têm-me dado mais “sensibilidade” para perceber o meu aluno e minha comunidade escolar. Ter como objeto de estudo elementos concretos presentes no meio social no qual os meus alunos estão inseridos, é dar sentido real às aulas, contextualizando o trabalho com a escrita e a oralidade em uma perspectiva crítica.

Cria possibilidades também de os alunos valorizarem mais seus saberes e adotarem um posicionamento menos passivo diante do processo de ensino e aprendizagem, visto que eles estão tentando resolver um problema que também os aflige, ao invés de assimilar um conteúdo “alien ígena” elaborado, muitas vezes, em outro estado, e completamente desvinculado das suas necessidades e inspirações pessoais e coletivas.

Assim, considerando a natureza da pesquisa, elegemos como questões de pesquisa:

1. O trabalho com um projeto de letramento pode contribuir para que os saberes da comunidade local dialoguem com o currículo escolar?

2. Que práticas de letramento podem favorecer a articulação da cultura local aos saberes da cultura escolar?

3. Que práticas de letramento podem motivar os alunos a agirem como pesquisadores de cultura, levando-os a desenvolverem a consciência crítica sobre o valor das tradições culturais locais?

4. Os projetos de letramento podem favorecer o (re)posicionamento identitário do professor?

Como resposta a essas indagações, traçamos como objetivo geral:

Investigar o impacto de um Projeto de Letramento no resgate e preservação das tradições orais do Boi-Surubim.

E os seguintes objetivos específicos:

1. Desenvolver um projeto de letramento com os alunos do 9º ano que alie o trabalho da escrita e da leitura à preservação das práticas orais do Boi -Surubim;

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2. Articular os saberes provenientes da cultura local aos saberes da cultura escolar por meio de um projeto de letramento;

3. Contribuir para o desenvolvimento de uma consciência crítica nos alunos do 9º ano em relação à importância da cultura local;

4. Refletir sobre o papel do projeto de letramento como dispositivo didático para o (re)posicionamento identitário do professor.

Com vista a esses objetivos, será realizado um projeto de letramento com os educandos. Além dos alunos, teremos como colaboradores os professores de outras disciplinas e os próprios moradores da Fazenda Teotônio.

Esta pesquisa tem como referencial teórico os estudos sobre letramento (STREET, 1983; KLEIMAN, 1995, 2000; OLIVEIRA; KLEIMAN, 2008). Embora se atribuam muitos sentidos à palavra letramento, o conceito aqui adotado diz respeito ao impacto dos múltiplos usos e finalidades da leitura e da escrita na sociedade. Um letramento compreendido, segundo Kleiman (1995, p. 19), como “um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos”.

Quanto aos aspectos culturais, baseamo-nos na conceituação de cultura (BOAS, 2010), nas reflexões sobre processos culturais (POZENATO, 2003; ZUCON; BRAGA, 2013), ponderando acerca da influência da cultu ra de massa sobre a cultura popular. Observamos os estu dos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN, 2011), para compreender as diversas teorias acerca das origens do Bumba-meu-boi. Recorremos também à obra Literatura Oral no Brasil, de Luís da Câmara Cascudo (2006), a fim de esclarecer em que consistem os festejos do Bumba-meu-boi.

Como dispositivo didático, recorremos ao uso dos projetos de letramento, especificamente, nas contribuições dos trabalhos de Kleiman (2000). Nas ponderações do livro “Projetos de letramento e formação de professores de língua materna” (OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS; 2014), destacamos a relevância de se trabalhar com PL para a inclusão social através de práticas de leitura e escrita situadas, uma vez que “não é possível pensar educação e, mais particularmente, a educação linguística se não a relacionarmos com a sociedade” (OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS; 2014, p. 11). Uma prática na qual professor e alunos aprendem e ensinam mutuamente, dividindo tarefas.

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No que se refere à oralidade e à escrita, buscamos subsídio teórico nos trabalhos sobre oralidade/escrita (MARCUSCHI; DIONÍSIO, 2007) e nas considerações acerca dos gêneros textuais (MARCUSCHI, 2008; OLIVEIRA, 2010).

Além disso, pautamo-nos na pedagogia crítica (FREIRE, 2018), pois concebemos o processo educacional como uma construção histórica feita por homens guiados por ideologias políticas, sociais e culturais. Essa ótica discordante do fatalismo de que tudo é necessário nos instiga a acreditar que podemos mudar nossa realidade a partir de práticas educacionais através da reflexão e da ação.

No que concerne à metodologia, esta dissertação está inserida no campo da Linguística Aplicada (LA), área de estudo que concebe a língua “como um instrumento de uso para a comunicação entre as pessoas em diferentes contextos” (LEFFA, 2001, p. 7), partindo de problemas existentes que envolvem o uso da linguagem. Assumimos uma abordagem metodológica de caráter qualitativo com viés etnográfico.

A presente dissertação, além da introdu ção e das considerações finais, está dividida em três capítulos: (i) contextualização da pesquisa, (ii) pressupostos teóricos e (iii) análise, composta por seis categorias: Reposicionamento identitário do professor no PL; Leitura e escrita como práticas agentivas e identitárias; Práticas de letramento e afetividade; Oralidade, memória e afetividade; Multiletramentos e multimodalidade; Tecnologias digitais no PL.

Expusemos, na introdução, as questões problemáticas que instigaram a realização desta pesquisa. Apresentamos também a justificativa e as contribuições do trabalho para a comunidade, para a escola, para os alunos envolvidos, para o professor e para a própria academia. Em seguida, exibimos o objeto de pesquisa, as questões de pesquisa, os objetivos (geral e específicos) e os referenciais teóricos e metodológicos.

No capítulo (i), apresentamos o campo de estudos (Linguística Aplicada) no qual a presente dissertação está inserida; o paradigma de pesquisa que consideramos mais adequado para este tipo de trabalho que é o qu alitativo interpretativista, buscando embasamento teórico em Moita Lopes (1994); o viés etnográfico presente na pesquisa à luz dos estudos de Cançado (2012). Apresentamos também nessa seção o ambiente de pesquisa e os colaboradores.

No capítulo seguinte (ii), expusemos os pressupostos teóricos assumidos para subsidiar a pesquisa: estudos sobre letramento, concepções de oralidade e

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escrita, discussões sobre projetos de letramentos, exposição sobre a origem do Bumba-meu-boi, gêneros textuais, entre outras questões.

O último capítulo é destinado à análise dos dados, após a realização do trabalho etnográfico e das oficinas de letramento previstas. Essa seção tem o intuito de investigar o impacto de um Projeto de Letramento no resgate e preservação das tradições orais do Boi-Surubim.

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2.0 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA

Neste capítulo, tratamos da metodologia adotada na pesquisa: a inserção no campo da Linguística Aplicada, o paradigma qualitativo-interpretativista, com viés etnográfico. Além disso, traçamos um perfil da escola e dos colaboradores.

2.1 Inserção no campo da linguística Aplicada

A presente dissertação se insere nos campos de estudos da Linguística Aplicada (doravante LA), disciplina que surge centrada nos estudos sobre o ensino de línguas estrangeiras, em meados do século XX, e hoje abrange uma ampla área de pesquisas relacionadas às questões da linguagem em diversos contextos, utilizando-se de saberes de outras ciências como Psicologia, Sociologia, Semiótica entre outras (MENEZES; SILVA; GOMES, 2009).

Apesar de recente, a LA mudou várias vezes o foco de seus interesses de pesquisa, redimensionando seus estudos e expandindo seu campo teórico para outros contextos que envolvam o uso da linguagem como uma prática social. Vale destacar que segundo Menezes, Silva e Gomes:

a LA não nasceu como uma aplicação da linguística, mas como uma perspectiva indutiva, isto é, uma pesquisa advinda de observações de uso da linguagem no mundo real, em oposição à língua idealizad a. Essa nova f orma de f azer ciência abalou a academia e se conf rontou coma pesquisa dentro de modelos teóricos e metodológicos muito rígidos (MENEZES ; SILVA; GOMES, 2009, p. 3).

Ainda de acordo com Menezes, Silva e Gomes (2009), a LA expande suas fronteiras para outros países, inclusive para o Brasil, na segunda metade do século passado. Em solo brasileiro, foram desenvolvidas várias linhas de pesquisas e criados programas de Pós-graduação ou área de concentração em LA, permeando os diversos setores da vida social e as múltiplas áreas de conhecimento com foco no uso da linguagem nas práticas sociais do cotidiano. Sob esse prisma, a língua é compreendida tanto como uma prática material, situada em um contexto socio-histórico-ideológico, quanto constituída na interação social. Em outras palavras, a língua é pensada para além dos processos físicos, levando-se em consideração processos fisiológicos e psicológicos, os quais se inserem nos interstícios das relações sociais. Nesse sentido, a língua é vista como um ato dialógico, ou seja, com

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destaque para o caráter social e coletivo da produção dos discursos nas práticas da vida cotidiana (BAKHTIN, 2003; BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2009).

A LA concebe a comunicação como um ato coletivo e situado que se dá através da linguagem, em contextos os mais variados possíveis (LEFFA, 2001). Ela (LA) tem se mostrado capaz de trabalhar na diversidade, utilizando-se de uma metodologia dinâmica de pesquisa de maneira interdisciplinar. Como afirma o professor Leffa (2001), a LA é uma área de conhecimento que assume expressivo compromisso social, através da prestação de serviços e através de pesquisas.

Não se pesquisa para explicar uma teoria; pesquisa-se principalmente para resolver um problema, e por isso, está-se mais próximo de dar um retorno à sociedade.

O outro retorno é dado pela maneira como se conduz a pesquisa em Linguística Aplicada. O conhecimento é construído não pela a extração de dados a partir de inf ormantes previamente selecionados, mas pela convivência entre esses inf ormantes – que ajudam a construir o conhecimento, do qual muitas vezes serão os primeiros a se benef iciarem (LEFFA, 2001, p. 7).

São múltiplas as possíveis contribuições dessa área de estudos, seja estudando a melhor maneira para aprendizagem de uma nova língua, seja entendendo como as novas tecnologias afetam o processo comunicativo, seja orientando como alguém deva tratar seus clientes etc. Ela lida com vários problemas que envolvam a linguagem como letramento, variação linguística, distúrbios de linguagem, política linguística etc. Atualmente é reconhecido o caráter transdisciplinar da LA em sua forte relação com a Educação, a Sociologia, a Psicologia, a Etnografia, dentre outras áreas de conhecimento. Assim, dentre os inúmeros temas de pesquisas da LA, podemos destacar algumas redes de pesquisa da Associação Internacional de Linguística Aplicada, como: Publicação Acadêmica e Apresentação em Contexto Global, Aprendizagem Precoce de Idiomas, Linguística Folclórica, Raça, Gênero e Sexualidade e Linguagem etc. (AILA, 2019).

A concepção de letramento adotada nesta pesquisa, descrita mais detalhadamente em seção específica, posteriormente, refere-se aos usos reais da leitura e da escrita nas práticas sociais do dia a dia. Isso significa dizer que os estudos de letramento transcendem a esfera de ensino formal e se utiliza de conhecimentos diversos para resolução de problemas rotineiros. Essa perspectiva corrobora as investigações da LA que também concebe a língua como prática social,

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buscando, através de conhecimentos multidisciplinares, respostas para os problemas reais e específicos que envolvem a linguagem.

2.2 Paradigma de pesquisa

São inegáveis os frutos da evolução científica para a humanidade, basta olharmos ao nosso redor. Muitas pesquisas foram realizadas para termos o nível de desenvolvimento nas mais diversas áreas do saber atualmente. A necessidade de superar os problemas diários nos força a buscar métodos para saná-los, seja nas questões relacionadas ao uso do conhecimento do senso comum, seja nas referentes ao uso do saber acadêmico.

Em se tratando do fazer científico das Ciências Sociais, Bortoni-Ricardo (2008) destaca o conflito existente entre dois paradigmas: o de tradição-lógico empirista, chamado de paradigma positivista, e outro de tradição hermenêutico-dialética, denominado paradigma interpretativista. Atentos a essas questões, assumimos neste trabalho um paradigma qualitativo interpretativista de pesquisa, pois acreditamos ser esta vertente que melhor atende ao propósito de investigação aqui adotado.

Segundo Moita-Lopes (1994), essa perspectiva in terpretativista confronta as formas ditas tradicionais de fazer ciência (positivismo), pois a natureza do mundo social é distinta dos fenômenos ditos naturais. Assim são necessários meios mais concordes com a complexidade das relações sociais que têm vários sentidos atribuídos pelo próprio homem uma vez que, consoante o autor, “o que é específico, no mundo social, é o fato de os significados que o caracterizam serem construídos pelo homem, que interpreta e reinterpreta o mundo a sua volta, fazendo, assim, com que não haja uma única realidade, mas várias realidades” (MOITA-LOPES, 1994, p. 331).

A visão positivista não leva em consideração interpretações indiretas em relação ao fato observado ou os sentidos construídos pelos homens através de suas relações e interações. Para esta concepção metodológica, “as variáveis do mundo social são passíveis de padronização, podendo, portanto, ser tratadas estatisticamente para gerar generalizações” (MOITA-LOPES, 1994, p. 332). Já no paradigma priorizado nesta pesquisa, os múltiplos significados constitutivos da realidade social são exclusivamente passíveis de interpretação. Segundo Moreira e

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Caleffe (2006, p. 73), “a pesquisa qualitativa explora as características dos indivíduos e cenários que não podem ser facilmente descritos numericamente”. Por isso, explorando os estudos de Gressler (2007), nota-se que ele aponta seis características da pesquisa qualitativa que julga essenciais, a saber:

a) A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como f onte direta dos dados.

b) A intervenção do pesquisador no contexto observado é reduzida ao mínimo.

c) Os métodos da pesquisa qualitativa são múltiplos, interativos e humanísticos.

d) O processo de pesquisa (objetivos, métodos, dados) emerge do contexto estudado, ao invés de pré-f ixado. Em uma abordagem indutiva, o pesquisador parte de questões amplas, f ocos de interesse ou recorte de uma determinada realidade, deixando que dimensões e categorias surjam, progressivamente, durante os processos de coleta e análise de dados. e) A pesquisa qualitativa é f undamentalmente interpretativa. A interpretação dos resultados desponta com a totalidade de uma especulação que tem como base a descrição de um f enômeno em um contexto.

f ) A investigação qualitativa é um projeto cívico, participativo e colaborativo (GREESLER, 2007, p. 98).

Ouro aspecto relevante que devemos colocar em pauta nesta seção é justamente o papel do pesquisador e dos pesquisados. Uma vez que este estudo pretende analisar os múltiplos sign ificados que formam a realidade dos festejos da cultura do Boi-Surubim, não podemos conceber, sob esse prisma metodológico, as práticas culturais do auto do Boi-Surubim com neutralidade, pois não é “possível ignorar a visão dos participantes do mundo social caso se pretenda investigá-lo”, conforme chama a atenção Moita-Lopes (1994, p. 331). Como não podemos desprezar a multiplicidade de olhares das pessoas pesquisadas, também não devemos descartar a visão do próprio pesquisador.

Pensando-se nesse papel indispensável do pesquisador, frisamos novamente o trabalho de Greesler (2007), para expor as características de quem realiza a pesquisa qualitativa:

a) O pesquisador é o principal instrumento da pesquisa qualitativa. b) O pesquisador parte de uma visão holística do f enômeno social, que busca entender sua inter-relações. Todos os dados da realidade são considerados importantes na descrição de um comportamento ou evento. c) O pesquisador ref lete sistematicamente sobre seu próprio papel na pesquisa. Ele não é um observador objetivo, autoritário, nem politicamente neutro; junta-se ao pesquisado em um diálogo contínuo.

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d) O pesquisador mostra-se sensível a sua biograf ia pessoal e a como esta o modela. Ele é historicamente posicionado e situado geograf icamente, como um observador da condição humana que é, acima de tudo humano. e) O pesquisador baseia-se em raciocínios complexos, multif acetados e interrogativos, que se movem entre dedução e indução (GRESSLER, 2007 p. 98).

A fim de reiterar o que foi dito acima, consideramos, pois, ser essa natureza qualitativa a melhor opção para compreen der um pouco a complexidade da sala de aula e sua relação com o contexto sócio-histórico no qual a escola está inserida, pois, como argumenta Bortoni-Ricardo (2008, p. 32), “não há como observar o mundo independentemente das práticas sociais e significados vigentes”.

2.3 Abordagem da pesquisa

O objeto de pesquisa será estudado em seu próprio contexto social, tentando-se analisar a multiplicidade do fenômeno, por isso este projeto apresenta um viés etnográfico definido como “a descrição de culturas ou de grupos de pessoas que são percebidas como portadoras de um certo grau de unidade cultural” (CANÇADO, 2012, p. 55).

A escolha por esse tipo de pesquisa justifica-se pela própria natureza qualitativa do trabalho, pelo fato de os estudos serem realizados dentro de um contexto social concreto e não em situações artificiais, observando o fenômeno “sob o ponto de vista funcional”, tal como afirma Cançado (2012, p. 56). Nesse viés, todos os aspectos do fenômeno devem ser holisticamente observados.

Para o bom desempenho de uma pesquisa como essa, a forma como o pesquisador se relaciona com os pesquisados define a qualidade do trabalho. Aquele deve assumir um olhar o mais imparcial possível diante do objeto, eximir-se de preconceitos e dominar, consoante Cançado (2012, p. 57), “um mínimo de habilidades em técnicas e estratégias de observação e gravação”.

2.4 Ambiente da pesquisa

Nesta seção, temos o propósito de explicitar o ambiente da pesquisa. Com esse intuito, faremos uma breve caracterização da região na qual está inserida a escola, frisando as mudanças, desempenho e destaque desta no município.

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O ambiente de nossa pesquisa é a Escola de Ensino Fundamental Paula Queiroz, localizada na sede da Fazenda Teotônio, a 3km da cidade de Madalena, no sertão central do Ceará.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Madalena tem uma população estimada de 19.906 habitantes, em 2018. Uma cidade de emancipação política recente (1986), até então era um distrito pertencente ao município de Quixeramobim. Apresenta atualmente uma economia que tem como base a agropecuária, reforçada pelos comerciantes, comerciários, servidores públicos e aposentados.

O município tem suas origens embrenhadas em um processo de ocupação semelhante aos demais da região interiorana do Ceará, pois, de acordo com professor e historiador Marum Simão (2010, p. 15), sua ocupação é fruto do processo de colonização “no período em que se expandiu a criação do gado vacu m no Brasil, inclusive no Ceará”. Isso explica a forte relação dos habitantes locais com a cultura do boi ainda hoje.

Figura 1 - Visão panorâmica da sede do município de Madalena-CE

Fonte: www.f erias.tur.br (2020).

Consoante Simão (2010), Plínio Câmara (um dos herdeiros de terras da região), após a grave crise econômica mundial de 1929, sai de Fortaleza e vem tentar a vida em Madalena, na Fazenda Teotônio, na década de 1930. Ele constrói um grande açude e consegue fazer um sistema de irrigação para produzir variadas frutas. Plínio faz morada nesse lugar e consegue desenvolvê-lo, diversificando a produtividade com engenho para a produção de rapadura, alambique para o fabrico

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de aguardente, usina de beneficiamento de algodão, produ ção de pluma e extração de óleo vegetal e uma fábrica de sabão, tornando a região uma das mais produtivas do Estado.

Essa propriedade é adquirida pelo Grupo Edson Queiroz na década de 1974. Com isso, houve uma mudança na dinâmica de produção. Atualmente, de acordo com a administração local do grupo, ela possui 11.500 hectares e tem um ramo mais específico de atividade: a pecuária, criação de vacas leiteiras e produção de leite bovino de forma mecanizada.

Apesar de todo esse histórico de fartura, desenvolvimento mercantil, geração de emprego e renda no semiárido, a fazenda não possuía um lugar apropriado para as atividades educacionais formais. Durante muito tempo, o processo de alfabetização acontecia na capela do Teotônio. Muitos moradores eram obrigados a se deslocar para a zona urbana para continuarem estudando.

Figura 2 - Sede da Fazenda Teotônio

Fonte: Acervo da pesquisa (2019).

A Escola Paula Queiroz, instituição pertencente à rede municipal de en sin o, foi fundada somente em 1993, ano em que iniciam suas atividades escolares com duas professoras para atender a uma turma de alfabetização com 20 alunos, em um galpão ainda ocupado por tambores de milho, e a duas turmas (1ª e 2ª séries) que continuaram funcionando na capela, por não haver estruturas adequadas no novo local destinado a ser a escola. Hoje, 26 anos depois de sua fundação, ela atende a 329 alunos da pré-escola ao ensino fundamental maior, além de contar com a modalidade de Educação de Jovens e Adultos – EJA. Como mostra o quadro 1 a

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seguir. No horário matutino, temos pré-escola, 1º, 2º, 3º e 5º anos; no horário vespertino, 4º, 6º, 7º, 8º e 9º anos; e no horário noturno, duas (02) turmas de EJA, sendo que uma turma desta modalidade funciona em uma comunidade da fazenda, chamada Poltrinha.

Quadro 1 - Quantidade de alunos por turma da escola Paula Queiroz

Nível Turno Quantidade

EJA – A Noite 14 EJA – B Noite 18 INFANTIL V Manhã 14 INFANTIL IV Manhã 20 1º ANO Manhã 30 2º ANO Manhã 25 3º ANO Manhã 22 4º ANO Tarde 26 5º ANO Manhã 29 6º ANO Tarde 33 7º ANO Tarde 30 8º ANO Tarde 37 9º ANO Tarde 31 Total de alunos 329

Fonte: Elaborado pelo autor (2019).

Em virtude dessa progressiva expansão do número de matrículas, naturalmente aumentou-se o número de funcionários como está exposto no quadro 2.

Quadro 2 - Quantidade de f uncionários da escola Paula Queiroz

Função Quantidade Auxiliar de serviços 04 Diretora 01 Digitador 01 Monitor 01 Prof essores 12 Secretário 01 Vigia 02 Total de Funcionários 22

Fonte: Elaborado pelo autor (2019).

Com apoio do Grupo Edson Queiroz e do Instituto Teotônio, a antiga estrutura da escola foi reformada e ampliada, ocupando uma área de 1200m2, com

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um auditório a serviço da comu nidade, cinco salas de aula, uma secretaria, uma sala de informática com acesso à internet, uma sala para o Programa Mais Educação, uma biblioteca, uma cozinha, três banheiros, uma despensa, uma horta, uma pequena oficina de artesanato, duas cisternas, uma quadra para futebol de areia e um anexo no qual funciona a educação infantil. Esse anexo é uma estrutu ra a parte da área supracitada, localizado a aproximadamente 50m das dependências da escola, contando com 3 salas de aula e 2 banheiros, além de um pequeno pátio reservado ao lazer das crianças.

Figura 3 - Escola Paula Queiroz em 2007.

Fonte: Acervo da escola (2019).

Aos poucos a escola aumentou sua oferta e passou a funcionar em três turnos. Até chegar à realidade atual, muitos obstáculos tiveram de ser superados. Um grande problema, além da falta de estrutura, que prejudicava o processo de ensino- aprendizagem, eram as classes multisseriadas. Dada a complexidade de se trabalhar com alunos de idades e séries diferentes na mesma sala, o número de repetência e o baixo desempenho escolar eram altíssimos. Essa situação era presente tanto nos anos iniciais quanto nos anos finais do ensino fundamental. Somente em 2008, a escola conseguiu reverter essa situação de juntar turmas. Em dado momento de sua trajetória, a escola quase fechou por falta de alunos. Muitos fatores contribuíram para isso: difícil acesso na quadra chuvosa devido às más condições das estradas e devido às cheias do rio Barrigas as quais tornavam inviável o percurso; falta de estrutura física e pedagógica; turmas com distorções entre série e idade e alto índice de reprovação. Tais questões afastavam professores

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e alunos, de modo que os docentes quase sempre preferiam trabalhar na sede da fazenda.

Em sua origem, a escola surge para atender aos moradores da sede da fazenda. Com intuito de diminuir o número de turmas multisseriadas no município, a Secretaria Municipal de Educação promoveu uma sequência de nu cleações. A partir de então, a escola passou a receber discentes de outras comunidades do Teotônio e de regiões vizinhas como Cajazeiras, Lagoa do Senador, Manga, Brejo, Guanabara, Mulatas, Currais Novos Barrigas, Poltrinha, Santa Marta.

Como professor efetivo de Língua Portuguesa dessa escola desde 2007, sou testemunho da expressiva mudança tanto da estrutura física quanto pedagógica, pois o velho galpão utilizado para fornecimento de mercadoria e armazenamento, hoje, é um espaço educacional público de referência para o município e tem mudado a vida dos moradores locais e comunidades vizinhas.

Dentre as atividades desenvolvidas qu e conseguiram resultados significativos, destacamos o projeto preparatório para as Olimpíadas de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), iniciado em 2008. Essas turmas olímpicas conseguiram destaque também em competições como a Canguru de Matemática Brasil e a Olimpíada Brasileira de Astronomia – OBA.

Em 2009, criou-se o Projeto de Reforço Escolar cujo objetivo é criar situações de superação das dificuldades das crianças que estão em processo de alfabetização, matriculadas nas turmas de 1º ao 5º anos. De acordo com informações do núcleo gestor, as ações desse projeto de reforço conseguiram diminuir os índices de repetência e evasão.

Custeado pelo Instituto Teotônio (IT), em 2010, foi criado um projeto chamado Oficina de Arte e Cultura na própria escola, qu e oferta bolsas para alunos os quais apresentem habilidades artísticas. A oficina tem como intuito desenvolver esses dons artísticos, ensinar técnicas de marcenaria e artesanato e contribuir para a promoção da cultura local. Nesse espaço, equipado com diversas ferramentas, são produzidas lousas para as salas da própria escola, telas de pintura para as aulas de arte, faz-se a confecção dos personagens do Boi-Surubim, produzem-se as mesas de tênis, promove-se curso de serigrafia, etc.

Os projetos desenvolvidos pela escola, a adesão aos programas nacionais (Mais Educação, Mais Cultura) e o compromisso de toda a comunidade escolar

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contribuíram para que a Paula Queiroz tenha atingido as metas estipuladas, conforme mostram os gráficos 1 e 2 abaixo.

Gráf ico 1 - Histórico das metas e resultados obtidos no Ideb1 nos anos iniciais do ensino

f undamental da EEFPQ

Fonte: Inep (2019)

De acordo com o gráfico 1, os anos iniciais do en sino fundamental tiveram um expressivo avanço em seu desempenho, uma vez que o índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) da escola passa de 4,5, em 2009, para 6,7, em 2017, superando a meta municipal para 2021 que é 5,7 e também a meta estadual para 2021 (6,1), consoante mostram os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira (INEP), referentes ao ano de 2019. Em cinco anos de avaliação, a escola aumentou 2,2. Em todos os anos de avaliação as metas foram atingidas.

1 Esses dados do Ideb escolar e os demais presentes neste estudo f oram extraídos do si te do

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira, aberto para consulta pública, que divulga os resultados do Ideb por escola. Disponível em: http://idebescola.inep.gov.br/ideb/escola/dadosEscola/23100001. Acesso em: 14 maio 2019.

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Gráf ico 2 - Histórico das metas e resultados obtidos no Ideb nos anos f inais do ensino f undamental da EEFPQ

Fonte: Inep (2019).

Quanto às turmas finais do ensino fundamental da Paula Queiroz, percebemos um desempenho maior. De acordo com o gráfico 2, o IDEB aumentou 3,7 pontos de 2011 a 2017. De acordo com o INEP, com dados de 2019, ao ano de 2015 não foi atribuído valor porque a escola não atendeu aos requisitos para ter o desempenho calculado. Como nos anos iniciais do ensino fundamental, os valores obtidos pelos anos finais se mantiveram sempre acima das metas estabelecidas. Este nível também supera a meta municipal e estadual para 2021: 5,3 e 5,1 respectivamente, de acordo com as informações do INEP (BRASIL, 2019).

Figura 4 - Espaços internos da escola (Of icina de Arte, salas, auditório, cozinha)

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2.5 Colaboradores

Os colaboradores desta pesquisa foram os alunos do 9º ano da Escola Paula Queiroz (turma composta por 31 alunos, com idades entre 13 a 16 anos, que estudam à tarde), Seu Luís Rodrigues da Silva, que é o realizador dos festejos do Boi-Surubim na Fazenda Teotônio, e Francisco Valdevan Alves Dias (escritor, compositor, poeta, escultor, cordelista, cantor), responsável pela realização do Boi-Surubim na sede do município.

Seu Luís nasceu em 1952, na Fazenda Teotônio. Ele é o caçula de 11 irmãos filhos de Marcelino Rodrigues da Silva e de Cristina Martins da Silva. O responsável pelas práticas culturais do Boi-Surubim hodierno ainda vive no lugar onde nasceu e é casado com Vanusa Alves da Silva, com quem constituiu uma família de dez filhos (quatro homens e seis mulheres).

De origem familiar desprovida de riquezas materiais, sua vida é marcada pela intensa luta contra as adversidades socioeconômicas e geográficas. Começa a trabalhar ainda criança para ajudar seus pais a garantir a sobrevivência familiar. Os pais de Luís moravam na Fazenda Teotônio, a qual pertencia ao Senhor Plínio Câmara.

As inúmeras dificuldades pelas quais passou, ora advindas do próprio clima típico do semiárido, ora nutridas pela in operância do Estado, afastaram o Senhor Luís da pequena sala dedicada ao ensino na Teotônio. De acordo com o líder do s Caretas, estudar era inviável, dadas as contingências do cotidiano em que vivia.

Inserido nesse ambiente, sabendo apenas assinar o próprio nome, seu Luís tem contato com os folguedos populares dos Caretas, os quais normalmente eram realizados nos terreiros de sua avó paterna pelo seu pai. Seu Marcelino promovia também esses festejos em outras regiões vizinhas. Ele iniciava em dezembro as apresentações e findava no dia de reis, em janeiro do ano seguinte.

As manifestações culturais realizadas pela família Rodrigues simbolizavam o protagonismo do saber local, dos trabalhadores, dos qu e moravam em casas de taipas, dos pobres e excluídos socialmente. Muitas pessoas já participaram das apresentações, mas a família Rodrigues é a grande responsável pela brincadeira dos Caretas existir na comunidade.

Com a morte de Seu Marcelino, seu filho Simão manteve a tradição viva. Com o falecimento deste, Seu Luís assume a liderança das apresentações que

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realiza até os dias correntes. Assim, foi assistindo e depois participando desses folguedos que Seu Luís e seus irmãos aprenderam a realizar o ritual do Boi-Surubim, de modo que ainda hoje Mestre Luís traz consigo a alegria desses rituais para sobrepor o cansaço do trabalho e as angústias da pós-modernidade. Ele, com seus filhos, irmãos e amigos ressuscitam o Boi-Surubim e transformam restos fúnebres de animais em personagens que encantam e dão contentamento a quem assiste.

Também como colaborador, temos o décimo primeiro filho de uma família de 14 membros, Francisco Valdevan Alves Dias. Filho de Francisco Osvaldo Dias e de Antonieta Alves Dias. Natural de Madalena e um amante da cultura local, ele é artista possuidor de múltiplos talentos. Ainda na infância, revela sua paixão pela literatura de cordel e pelas tradições populares, como os festejos do Bumba-meu-boi. Valdevan vive lutando contra a intensa desvalorização da cultura local. Ele, além de ser cordelista, é escritor, compositor, escultor, cantor e funcionário público.

Atento à cultura local, ele encabeçou, em 2005, um projeto de resgate cultural do Boi-Surubim. Entrevistou o grande percursor do auto do Boi na Fazenda Teotônio, Senhor Marcelino, e outros envolvidos nos festejos locais, para entender como se dava sua realização: personagens, figurino, música, enredo etc.

Com essas informações e muita sensibilidade artística, o poeta ressuscita o Boi-Surubim, dançando-o pelas ruas de Madalena e apresenta essa cultura para uma nova geração que nunca h avia visto essas apresentações.

Além disso, iniciou um projeto de criação de cultura de raiz Madalenense em que dois cordéis foram transformados em danças folclóricas: Barrão do Monteiro e a Cobra encantada da serra da Lagoa, histórias de Madalena que vêm sendo contada de geração em geração.

O cordelista é um grande responsável por esses festejos voltarem ao calendário cultural na região. Seus escritos são u m registro cultural que reverbera o saber popular.

Quanto à turma escolhida para participar da pesquisa, mais da metade dos alunos do 9º ano da Escola Paula Queiroz são filhos de agricultores beneficiados com programas sociais, segundo o registro de matrícula da referida escola, e apresentam uma faixa etária entre 13 e 16 anos. Alunos esses que atuaram como verdadeiros pesquisadores de cultura no projeto de letramento “Boi-Surubim: desafios da cultura popular em Madalena”, uma vez que os alunos foram capazes de desempenhar pesquisas etnográficas em sua própria comunidade que enriqueceram

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o processo de ensino e aprendizagem (EGAN-ROBERTSON; WILLET, 1997) e contribuíram para a preservação da cultura local.

Gráf ico 3 - Distribuição dos alunos de acordo com a idade

Fonte: Elaborado pelo autor (2019).

Este perfil de faixa etária apresentado no gráfico 3 revela uma turma praticamente sem distorção série/idade. Isso é u ma realidade completamente diferente de anos anteriores na escola. Outrora, tínhamos turmas de 9º ano com idades entre 13 a 18 anos, em uma mesma sala. Foram vários anos com distorções dessa natureza. Os alunos com idades de 15 e 16 anos, mostrados no gráf ico anterior, são remanescentes de turmas multisseriadas e são um dos que mais apresentam dificuldades de leitura e escrita.

Gráf ico 4 - Distribuição dos alunos de acordo com a região onde moram

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Como citado anteriormente, a escola conseguiu mudar sua realidade física e pedagógica, atraindo alunos principalmente da sede do município. Consoante mostra o gráfico 4, a turma do 9º ano é um retrato da realidade de todas as turmas da escola, alunos de diversas comunidades e sede em numa mesma sala. Em uma turma de 31 educandos, mais da metade é oriunda da sede. Vale observar que a escola hoje não consegue atender ao número de pedidos de matrícula. A procura aumentou, exponencialmente, devido ao bom desempenho nas avaliações extern as e olimpíadas e à baixa taxa de evasão e repetência.

Vários alunos se destacaram nas olímpiadas de matemática, inclusive recebendo medalhas de ouro. Devido a esse bom desempenho, muitos ganharam bolsas para continuar os estudos na capital (Fortaleza) e transformar suas vidas através da educação.

2.6 Constituição do corpus, procedimentos e instrumentos de geração de dados

Como referido anteriormente, esta pesquisa foi realizada na escola municipal Paula Queiroz com a turma do 9º ano. Essa instituição foi escolhida devido ao fato de o professor pesquisador pertencer ao seu quadro docente efetivo há 12 anos, lecionando as disciplinas de Língua Portuguesa, Língua Inglesa e Artes. Como Programa de Mestrado Profissional em Letras (PROFLETRAS) exige que o mestrando desenvolva sua pesquisa no con texto em que atua como docente e proponha uma intervenção que dê respostas a uma situação problemática identificada na comunidade escolar, escolhemos a turma do 9º ano para aplicar o projeto por ser uma sala com um menor número de alunos e por ser um grupo discente que o pesquisador já tem uma melhor noção de seu perfil, pois é professor da turma desde o ano passado, 2018.

Inicialmente, entramos em contato com a direção e a coordenação pedagógica da escola com o intuito de apresentar a pesquisa e expor sua relevância para a escola e para a comunidade local. Depois dessa explanação, pedimos permissão para aplicá-la. Tarefa que foi realizada após aprovação do projeto pelo comitê de ética da UFRN.

Após essa caracterização, o projeto foi apresentado à turma do 9º ano, convidando-a a participar da pesquisa. Aplicamos também um questionário junto à

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turma para traçarmos um perfil mais detalhado dos alunos. Além de identificar aspectos sociais e econômicos da classe, as perguntas abordaram questões sobre a visão dos discentes em relação às manifestações culturais na Fazenda Teotônio.

O procedimento de geração de dados se deu por meio da implementação do projeto “Boi-Surubim: desafios da cultura popular em Madalena”, nos meses de novembro e dezembro de 2019, logo após a autorização do Comitê do Ética. No PL, foram realizadas seis oficinas de letramento.

Para a constituição do corpus e geração dos dados foram utilizados instrumentos de pesquisa diversificados a fim de atender aos objetivos traçados. Assim, a geração de dados deu-se por meio de questionários respondidos pelos colaboradores; entrevistas realizadas pelos alunos com o Mestre Luís; notas de campo do professor-pesquisador com observações sobre as atividades realizadas, registros digitais (WhatsApp), registro fotográfico e gravações sobre os festejos do auto do Boi-Surubim e transcrições.

Com o intento de dar respostas às indagações presentes na pesquisa, fizemos uso da triangulação de dados que, de acordo com Cançado (2012, p. 3), consiste no “uso de diferentes tipos de corpus, a partir da mesma situação-alvo de pesquisa, com diferentes métodos, e uma variedade de instrumentos de pesquisa” Isso fez com que nossa pesquisa tivesse uma fundamentação metodológica mais consistente e os dados fossem mais confiáveis, pois o objeto de estudo foi explorado de maneiras diferentes, usando muitas perspectivas ao analisar o corpus.

A série de perguntas ordenadas presentes nos questionários foi elaborada com a finalidade de obter informações que julgamos relevantes para traçarmos um delineamento mais consistente do local onde foi desenvolvida a pesquisa. Também nos deu subsídios para traçarmos com mais clareza um perfil da turma do 9º ano. Consideramos ser um instrumento de pesquisa muito útil, pois nos deram mais detalhes sobre as informações das quais necessitamos, além de ser uma ferramenta muito prática.

Durante as oficinas, promovemos uma discussão com a turma sobre a problemática desta pesquisa, interpelan do-os sobre a relevância do assunto para a cultura local. Na ocasião, solicitamos que os participantes fizessem pesquisas mais genéricas sobre os festejos do Bumba-meu-Boi e tomassem nota sobre os aspectos que julgassem relevantes.

Referências

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