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Por novos materiais didáticos que contemplem os multiletramentos : gamificação e elementos de narrativa transmídia no Aventuras Currículo+

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

CAMILA DE CASTRO CASTILHO

POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE CONTEMPLEM

OS MULTILETRAMENTOS:

GAMIFICAÇÃO E ELEMENTOS DE

NARRATIVA TRANSMÍDIA NO AVENTURAS CURRÍCULO+

CAMPINAS,

2018

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CAMILA DE CASTRO CASTILHO

POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE CONTEMPLEM

OS MULTILETRAMENTOS:

GAMIFICAÇÃO E ELEMENTOS DE

NARRATIVA TRANSMÍDIA NO AVENTURAS CURRÍCULO+

Dissertação de mestrado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestra em Linguística Aplicada, na área de Linguagem e Educação.

Orientadora: Profa. Dra. Jacqueline Peixoto Barbosa.

Este exemplar corresponde à versão final da Dissertação defendida pela aluna Camila de Castro Castilho e orientada pela Profa. Dra. Jacqueline Peixoto Barbosa.

CAMPINAS,

2018

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“Ninguém pode prever as transformações do século XXI

durante a revolução tecnológica da informação. Nós certamente não podemos continuar ensinando nossos estudantes apenas os letramentos da metade do século XX, ou simplesmente colocar na frente deles os letramentos mais avançados e diversos de hoje. Precisamos ajudar essa geração a aprender a usar sabiamente os letramentos e esperar que eles saiam-se melhor do que nós”.

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Ao grande Contador de Histórias e ao player 2, que topou o jogo da vida ao meu lado.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, à minha orientadora, Profª Drª Jacqueline Peixoto Barbosa, pela competência e exemplo enquanto profissional e educadora, pela paciência e pelo incentivo em explorar diferentes caminhos e possibilidades na pesquisa de um objeto com categorias de análises inter/transdisciplinares. À sua atenção e generosidade que marcaram essa trajetória, meus sinceros agradecimentos.

E à Profª Drª Roxane Rojo, com que tive o privilégio de iniciar as discussões na área, que incentivou meu ingresso no programa e que enriqueceu minhas leituras com seus textos, por sua contribuição para o estudo e a pesquisa, pelo aprendizado e por engrandecer os momentos da qualificação e da defesa.

À minha querida amiga, colega editora e veterana, a então doutoranda Fabiana Marsaro, pelas amizade, trocas e generosidade em dividir comigo aspectos da vida tão caros para nós. Sem você não teria chegado à LA.

À minha mãe, Lucília, e minha tia, Marília, que sempre se sacrificaram e/ou incentivaram meus estudos e permitiram que eu chegasse até esse momento, permitindo que eu sempre seja a melhor versão de mim mesma. À Vânia, Tati, Paula, Otávio, Alberto, Laura e Beto, que mesmo não compreendendo o que estudo sempre torceram por mim. Assim como à minha avó, Joana, às minhas tias, Ione, Lu e Maura, e ao meu pai, Alberto.

À Ana Amélia, Ane Caroline, Bruno, Camila, Cauê, Dani, Eduardo, Elaine, Elis, Gabriel, Juliana, Kátia, Liliane, Nayara, Rosane, Vinícius e a todos que, em algum momento, fizeram parte de grupos, disciplinas, trabalhos e eventos, por amizade, contribuições, suporte e/ou lembranças, sobretudo à Naiara.

À Ana Carolina, Ana Paula, André, Babi, Breno, Bruna, Cláudia, Del, Didi, Eduardo, Fabiana, Gabriela, Gabriele, Luciene, Mel, Newton, Priscila, Ramon, Ricardo, Roberta, Rodrigo, Victoria e Wesley, por trazerem leveza e alegria a tantos

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momentos e por serem pacientes na minha ausência. Ao Del meu duplo agradecimento pela revisão da dissertação com toda a sua competência.

À Célia Assis, Elza Fujihara, Pedro Cunha, Tomás Troppmair e outros colegas da IBEP (Márcia, Val, Karina, Ivi), pelo incentivo durante o caminho e por terem se comprometido e investido nesta etapa da minha formação. Em especial à Célia, à Elza e ao Pedro por compreenderem os momentos de ausência e dedicação ao mestrado. Ao Tomás pela ideia na criação e parceria na produção de materiais didáticos transmídia, que inspiraram a pesquisa. Da mesma forma, agradeço à Glaucia Miyazaki, Matheus Spedo e Andressa Karen, pelo incentivo e pela garantia de que continuaria o mestrado no ano em que trabalhei na FS.

À Profª Drª Denise Bértoli Braga e à Profª Drª Daniela Palma, por marcarem positivamente minha trajetória na Pós-Graduação. À Profª Drª Cláudia Hilsdorf, por todas as interlocuções inspiradoras que tanto contribuíram para a realização do trabalho, pelas trocas e ensinamentos e pela gentileza de aceitar compor a banca de defesa.

À Profª Drª Ana Luiza Marcondes Garcia, por sua atenção e pelo privilégio de sua presença na banca de defesa. À Profª Drª Lucila Maria Pesce de Oliveira, por sua atenção e pelo aceite da suplência na banca de defesa. Ao Prof. Dr. João Carlos Massarolo, pelos aprendizados que a leitura de seus textos proporcionou e por suas contribuições na banca de qualificação.

A todos os funcionários do IEL, principalmente Cláudio e Miguel, da Secretaria de Pós, pela eficiência e boa vontade com que me auxiliaram quando preciso. Aos funcionários da SEE-SP, que permitiram meu acesso ao Aventuras Currículo+, em especial à Liliane Costa, por sua gentileza, contribuições e disponibilidade em trocar informações sobre o material sempre que necessário.

Ao Rafael, por estar comigo em todos os momentos, pelo cuidado, atenção e amor e por me lembrar sempre do que realmente importa.

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RESUMO

A presente pesquisa é caracterizada por ser uma análise documental inserida no campo da Linguística Aplicada, que tem como objeto de análise o

Aventuras Currículo+. Com o objetivo de atender a uma iniciativa da Secretaria de

Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP), o material foi inicialmente concebido para ser um projeto de recuperação de aprendizagem para estudantes da rede estadual do Estado de São Paulo. Para tanto, esse material apresenta atividades relativas à leitura e à escrita, cujas atividades são relacionadas por meio de uma narrativa, além de contar com estratégias de gamificação na sua produção e com a articulação com objetos de aprendizagem (OA), disponíveis na plataforma

Currículo+, e ferramentas digitais. Com a crescente demanda pela integração de

tecnologias digitais em novas práticas, que devem ser caracterizadas pela diversidade de linguagens e multiplicidade cultural, tornam-se cada vez mais necessários materiais que contemplem os multiletramentos e que sejam produzidos a partir de novas estratégias. Por esse motivo, a análise do Aventuras Currículo+ destinou-se a avaliar se o material contempla os multiletramentos e de que forma, além de verificar como se utiliza da estratégia da gamificação e em que medida se aproxima de elementos da narrativa transmídia. Por meio da análise, foi possível verificar que o Aventuras contempla os multiletramentos por meio de textos/produções multissemióticas e da diversidade cultural trabalhados a medida que alguns gêneros e textos/produções são explorados. No que diz respeito à gamificação, o material faz uso de elementos de games na organização das atividades, o que contribui para o desenvolvimento das habilidades e para a relação dos alunos com os conteúdos de forma lúdica. Quanto à aproximação com os elementos da narrativa transmídia, constatou-se que há pouca proximidade, porém também há muitas possibilidades de o universo construído ser ampliado para que essa aproximação seja mais efetiva, além de considerar outras adequações pensar em diversidade de mídias e de gêneros no contexto de Língua Portuguesa.

Palavras-chave: Materiais Didáticos; Multiletramentos; Gamificação; Narrativa

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ABSTRACT

The present research is characterized as a documental analysis of the

Aventuras Currículo+ inserted in the field of Applied Linguistics. With the purpose of

attending an initiative of the Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP), the Aventuras Currículo+ was initially designed to be a recovery of learning project for the state network. To do so, this material possesses activities related to reading and writing, linked to a narrative, in addition to counting on gamification strategies in its production and with the articulation with learning objects, available on the Currículo+ platform, and digital tools. With the increasing demand for the integration of digital technologies into new practices, which must be characterized by the diversity of languages and cultural multiplicity, it becomes increasingly necessary teaching materials that contemplate multiliteracies and are produced from new strategies. For this reason, the analysis of the Aventuras Currículo+ was intended to evaluate if the material contemplates the multiliteracies and, also, verify how it uses the gamification strategy and approaches of the transmedia narrative’s elements. Through the present analysis, it was possible to confirm that the Aventuras contemplates the multiliteracies through texts/multisemiotics productions and cultural diversity worked as some genres and texts/productions are explored. As far as gamification is concerned, the material consists of elements of games in the arrangement of the activities, which contributes to the development of the student’s abilities and to the relation of them with the contents in a playful way. As for the approximation with the elements of the transmedia narrative, it was verified that there is little the proximity, but also there are many possibilities of the constructed universe being enlarged so that this approximation is more effective, besides considering other adaptations to think about diversity of media and genres in the context of Portuguese Language.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Mapa da pedagogia dos multiletramentos ... 19

Figura 2 Quadro diferenciando multimídia, crossmídia e transmídia ... 34

Figura 3 O que é transmídia? ... 37

Figura 4 Doze passos ou estágios da jornada do herói ... 53

Figura 5 Sete princípios da narrativa transmídia ... 56

Figura 6 Página de entrada do Aventuras com trailer e espaço para inserir usuário e senha ... 66

Figura 7 Tela de Convocação para alunos, dos 6 e 7 anos ... 66

Figura 8 Cursos do Aventuras Currículo+ disponibilizados por ano/série (visualização do professor) ... 67

Figura 9 Tela Missão 0, convocatória para professores, “Língua Portuguesa – Professores” ... 68

Figura 10 Quadro com as missões do Aventuras Currículo+ ... 70

Figura 11 Tela “Conheça sua missão” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos ... 71

Figura 12 Quadro com as fases das missões do Aventuras Currículo+ ... 72

Figura 13 Tela “Mensagem Final” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos ... 73

Figura 14 Quadro do Mapa das Missões (com gêneros, produções e mídias do Aventuras Currículo+) ... 77

Figura 15 Quadro das 7 (sete) missões selecionadas para análise em multiletramentos ... 80

Figura 16 Quadro da categoria de análise (1) multiletramentos ... 82

Figura 17 Quadro da categoria de análise (2) gamificação ... 84

Figura 18 Quadro da categoria de análise (3) narrativa transmídia ... 86

Figura 19 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 1: Produções culturais”, Nível 1, Quiz – Questão 3 sobre o quadro Retirantes, de Portinari ... 92

Figura 20 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 2: Quiz da fome”, Megadesafio – Questões 1 e 2

(12)

sobre o poema Tem gente com fome, de Solano Trindade, declamado por Raquel Trindade ... 93

Figura 21 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”, projeção do professor ... 94

Figura 22 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,

Arquivo secreto, Questões 1 e 2 ... 95 Figura 23 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do

Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,

Arquivo secreto, Questão 3 ... 96 Figura 24 Grade de avaliação da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos,

“Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQs?”,

Arquivo secreto ... 100 Figura 25 Grade de avaliação da Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: Seleção de contos e início da gravação”, Arquivo secreto ... 101

Figura 26 Grade de avaliação da Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, “Fase 6: Desafio final”, Arquivo secreto ... 102

Figura 27 Quadro de avaliação dos jogos Zombie Tsunami e Odd Planet, dos 8º e 9º anos, “Fase 5: Análise de games”, “Nível 3 – O que avaliar em um jogo?”, no Arquivo Secreto ... 103

Figura 28 Grade de avaliação da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, dos 8º e 9º anos, “Fase 4: Virada Cultural”, Arquivo secreto ... 104

Figura 29 Grade de avaliação da Missão 5: O poder das imagens – Parte 2, dos 8º e 9º anos, “Fase 3: A imagem que denuncia”, Arquivo secreto ... 105

Figura 30 Grade de avaliação da Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º ano,

“Fase 4: Música no ar”, Arquivo secreto ... 106

Figura 31 Tela sobre Forma de organização das atividades do material “Língua

Portuguesa – Professores” ... 112

Figura 32 Tela inicial do material de 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+, de Língua Portuguesa ... 117

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Figura 33 Tela Halo 4 (2012) ... 117

Figura 34 Tela da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, “Fase 2: Olhares e opiniões”, “Nível 1 – Quiz”, dos 8º e 9º anos ... 125

Figura 35 Tela da Selos e patentes, dos 8º e 9º anos, de um usuário ativo ... 131

Figura 36 Quadro de selos e patentes de Língua Portuguesa ... 132

Figura 37 Transcrição das narrativas iniciais e das narrativas finais das missões dos 6º e 7º anos (com grifos nossos) ... 140

Figura 38 Transcrição do áudio e enunciados escritos das narrativas presentes na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos ... 143

Figura 39 Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 2: Quiz

de tirinhas”, “Nível 4 – Quiz”, Questão 1 (trecho com a narrativa) .... 145

Figura 40 Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: De

leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQz?”, Arquivo

secreto ... 146 Figura 41 Relação das narrativas com suas respectivas mídias na Missão 2:

(14)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAP – Avaliação da Aprendizagem em Processo ABED – Associação Brasileira de Educação a Distância

ARG – Alternate Reality Games (Jogo de Realidade Alternativa) AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem

BNCC – Base Nacional Comum Curricular

CC-BY-NC – Creative Commons Atribuição-NãoComercial CETEC – Centro de Estudos e Tecnologia Educacionais CGEB – Coordenadoria de Gestão da Educação Básica DE – Diretorias de Ensino

EFAP – Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores de São Paulo

Enem – Exame Nacional do Ensino Médio

FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação GNL – Grupo de Nova Londres

MEC – Ministério da Educação

PCNP – Professores Coordenadores do Núcleo Pedagógico PNBE – Programa Nacional Biblioteca da Escola

PNLD – Programa Nacional do Livro e do Material Didático OA – Objeto de Aprendizagem

ODA – Objeto Digitais de Aprendizagem OED – Objeto Educacional Digital

LDDI – Livros didáticos digitais interativos RPG – Role-playing game

SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica

SARESP – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo

SEB – Secretaria de Educação Básica

SSE-SP – Secretaria da Educação do Estado de São Paulo TDIC – Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação

(15)

CAPÍTULO 1. POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE

CONTEMPLEM OS MULTILETRAMENTOS 23

1.1 OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE WEB 2.0 23

1.1.1 Os multiletramentos e a pedagogia do multiletramentos 30

1.2 NOVAS ESTRATÉGIAS E ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS 39

1.2.1 Gamificação na educação 40

1.2.2 Narrativa transmídia na educação 46

1.1.3 Gamificação, narrativa transmídia e os materiais didáticos 65

CAPÍTULO 2. METODOLOGIA DE PESQUISA 74

2.1 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS 74

2.2 AVENTURANDO-SE COM O AVENTURAS CURRÍCULO+ 78

2.3 GERAÇÃO DE DADOS 90

CAPÍTULO 3. ANÁLISE DO AVENTURAS CURRÍCULO+ 102

3.1 OS MULTILETRAMENTOS NO AVENTURAS 102

3.1.1 Análise da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 102

3.1.2 Diversidade de linguagens e mídias no Aventuras 115

3.1.3 Diversidade cultural no Aventuras 124

3.2 A GAMIFICAÇÃO DO AVENTURAS 127

3.3 A NARRATIVA DO AVENTURAS E OS ELEMENTOS DA

NARRATIVA TRANSMÍDIA 152

CONSIDERAÇÕES FINAIS 168

REFERÊNCIAS 173

(16)

INTRODUÇÃO

A motivação inicial para a realização da presente pesquisa deu-se com o início de minha atuação como produtora e editora de materiais didáticos digitais, cuja principal atividade é atender às solicitações dos editais das políticas públicas do livro, sobretudo do Programa Nacional do Livro e do Material Didático1

(PNLD). Nesse contexto, surgiu a necessidade e o interesse em conhecer e pensar em novos materiais didáticos.

Consolidado desde 1930, o mercado editorial vem mudando com a intenção de acompanhar e atender às demandas educacionais. Embora muitos materiais2

, como livros paradidáticos, enciclopédias, dicionários, CDs, DVDs, jogos etc. existam desde 1980, as editoras ainda têm o livro didático impresso como seu principal produto.

Com as tecnologias digitais da informação e da comunicação (TDIC) e a cultura digital, o mercado percebeu a necessidade de diversificar a oferta de instrumentos educacionais, incluindo em sua produção materiais que promovam a integração das TDIC às práticas educativas. Do mesmo modo, há uma crescente demanda por materiais digitais, sendo previstas produções a partir de diferentes vias, incluindo os editais do PNLD.

Além dessas solicitações de materiais digitais, o Ministério da Educação (MEC) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) seguem no processo de elaboração e implementação de políticas educacionais relacionadas à tecnologia e à inovação. Por meio da Secretaria de Educação Básica (SEB), MEC e FNDE oferecem, por exemplo, o Guia de Tecnologias Educacionais que tem como objetivo auxiliar gestores educacionais na aquisição de materiais e tecnologias para uso nas escolas brasileiras.

1

O Programa Nacional do Livro Didático alterou a nomenclatura para Programa Nacional do Livro e do Material Didático, em decreto nº 9.099, de 18 de julho de 2017. Embora mantenha a sigla PNLD, o programa unificou as ações de aquisição e distribuição de livros didáticos e literários, anteriormente contempladas respectivamente pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e pelo Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE). A nova nomenclatura também tem como intuito ampliar seu escopo, incluindo o que o programa concebe como outros materiais de apoio à prática educativa. Segundo o site oficial do PNLD, esses materiais são: obras pedagógicas, softwares e jogos educacionais, materiais de reforço e correção de fluxo, materiais de formação e materiais destinados à gestão escolar, entre outros.

2

Segundo Batista (2002, p. 555), os materiais complementares aos livros didáticos são: paradidáticos, livros de referência, CD, DVD, entre outros de “satélites”, termo conhecido na área para designar materiais que servem de apoio na aprendizagem dos alunos.

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Também são comuns editais estaduais e municipais e outras demandas específicas, que têm como base o currículo e os aspectos sociopolíticos, econômicos, técnicos e pedagógicos da rede3

. Um exemplo de material desenvolvido com o objetivo de atender a uma dessas demandas específicas da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP) é o Aventuras Currículo+ (doravante, Aventuras), objeto de estudo da presente pesquisa.

Produzido por meio de uma parceria entre a SEE-SP, Fundação Carlos Alberto Vanzolini e Institutos Inspirare e Natura, o Aventuras foi concebido como projeto voltado para a recuperação intensiva em Língua Portuguesa e Matemática de alunos do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio, contribuindo para o desenvolvimento de competências e habilidades relativas à leitura, à escrita e aos conhecimentos matemáticos.

O Aventuras é composto por atividades que foram desenvolvidas por Professores Coordenadores de Núcleo Pedagógico (PCNP) da rede, coordenados por professores universitários e pesquisadores da área de ensino de Língua Portuguesa e de Matemática, e que são articuladas ao uso de objetos de aprendizagem4 (OA), disponíveis na plataforma Currículo+, e de ferramentas digitais. O Aventuras está alocado no ambiente virtual de aprendizagem Moodle

(AVA-Moodle), o que requer conhecimentos funcionais para acessar, navegar etc.

Com a homologação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que procura contemplar a cultura digital, será cada vez mais necessária a produção de novos materiais didáticos, como o Aventuras, que integrem tecnologias digitais e contemplem diferentes linguagens e letramentos5, propondo práticas pedagógicas que propiciem o trabalho com competências e habilidades relacionadas à cultura digital.

3

É preciso destacar que os materiais, impressos e digitais, que surgem a partir dessas demandas estão inseridos em contextos e possibilidades de produção diferentes dos solicitados nos editais do PNLD, por exemplo, pois são demandas que se submetem a pré-requisitos específicos, cujas produções concebidas são, geralmente, em parceria com instituições, institutos, organizações, outras empresas privadas etc.

4

Também denominados objetos digitais, objetos digitais de aprendizagem (ODA) ou objetos educacionais digitais (OED), esses objetos surgiram na década de 1990, “em função da necessidade de se criarem novas estratégias de ensino-aprendizagem para a Web e da necessidade de economia pessoal e de tempo na elaboração de materiais instrucionais” (ARAÚJO, 2013, p. 181). Eles estão presentes em repositórios e são conteúdos que podem ter licença livre ou direitos autorais concedidos; são reutilizáveis, em qualquer contexto, acessíveis por meio da Internet etc. (CHINAGLIA, 2016, p. 48)

5

A BNCC para Educação Infantil e Ensino Fundamental – Anos Iniciais e Finais foi homologada em 20 de dezembro de 2017. A proposta de contemplação da cultura digital pode ser conferida tanto na apresentação das competências gerais (p. 9), como em Língua Portuguesa (p. 68). Disponível em:

http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wp-content/uploads/2018/06/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

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Isso porque, conforme afirma Rojo (2012), é necessário que a escola contemple práticas letradas multiculturais e multissemióticas que façam uso de multiplataformas de mídias e, consequentemente, de diversas linguagens, incluindo aquelas que circulam nas mais variadas culturas. As multiplicidades de linguagens e de mídias, além da diversidade cultural, característica das populações atuais, também devem estar presentes nos materiais didáticos.

Nesse sentido, pode-se atribuir ao material aspectos que o categorizem como “novo”, pois, no contexto das demandas da política pública do livro, esse tipo de material didático distancia-se de propostas digitalizadas e das que reproduzem a lógica do impresso.

Na presente pesquisa, considera-se “novo” o material didático que não se limita a enfatizar os letramentos da letra ou do impresso, mas que enfoca os multiletramentos6

, que circulam na vida contemporânea dos alunos. Entre as características, esses materiais precisariam ser interativos, multissemióticos e/ou hipermidiáticos. Essas características assemelham-se às características indicadas por Rojo (2017, p. 17) em relação aos livros didáticos digitais interativos (LDDI)7.

Ao entrar em contato com o Aventuras foi possível identificar que, apesar de sua proposta ser voltada para o letramento da letra, o material apresentam características interessantes de serem analisadas, que permitem considerá-lo como sendo “novo” objeto.

Para que seja possível verificar em que medida o Aventuras não se limita a enfatizar os letramentos da letra ou do impresso, é necessário analisar sua proposta pedagógica identificando se ele contempla, conforme proposto acima, práticas letradas multiculturais e multissemióticas, que se utilizem de diversas mídias e linguagens, incluindo aquelas que circulam nas diferentes culturas.

6

Segundo Rojo (2017), “multiletramentos são as práticas de trato com os textos multimodais ou multissemióticos contemporâneos – majoritariamente digitais, mas também impressos –, que incluem procedimentos (como gestos para ler, por exemplo) e capacidades de leitura e produção que vão muito além da compreensão e produção de textos escritos, pois incorporam a leitura e (re)produção de imagens e fotos, diagramas, gráficos e infográficos, vídeos, áudio etc.” (ROJO, 2017, p. 4).

7 O termo “interativo”, conforme afirma Rojo (2017) dá nome aos LDDI e “não é pouco importante, na medida em

que indica a interatividade conectada que cada um desses materiais (seja LDDI, seja plano de aula, gamificação etc.) precisa ter para que o usuário possa fazer suas escolhas mais interessantes de percurso, assim como navegar pela Web. Trata-se de interatividade com a mídia e de interatividade com outros usuários remotos ou presentes no mesmo espaço físico, conforme requer uma pedagogia colaborativa por design.” (ROJO, 2017, p. 15).

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Outra característica do Aventuras interessante de ser analisada é a estratégia utilizada na elaboração do material e na organização das atividades: a gamificação. O material apresenta uma narrativa gamificada e estrutura as atividades em missões, fases e níveis, além de apresentar pontos, premiações, entre outros elementos próprios dos games com o objetivo de incentivar os alunos, propiciando o engajamento, ao se aproximar das práticas contemporâneas da vida dos alunos.

Segundo Kapp (2012), a gamificação tem relação com o uso de mecânica, estética e pensamento dos games para motivar ações e a participação, promover a aprendizagem e resolver problemas no contexto educacional.

E, embora o material apresente apenas a gamificação como estratégia de elaboração e organização, foram identificados elementos de composição do material que despertaram o interesse de análise de modo que fosse possível verificar a aproximação da elaboração do material com a estratégia da narrativa transmídia.

Para que seja possível verificar essa aproximação, o conceito de narrativa transmídia adotado tem como principal base teórica Jenkins (2009[2006]), mas que teve que ser discutido e contextualizado para a educação, mais especificamente, para a produção de materiais didáticos, como ele mesmo o faz em seu artigo

Transmedia Education: the 7 principles revisited, em 2010, quando discute os

conceitos de transmídia relacionados à educação, retomando algumas das lógicas transmídias existentes8.

Embora Jenkins (2010) indique a transmídia learning (ensino transmídia) como sendo a lógica da transmídia correspondente ao contexto educacional, o autor afirma que há uma sobreposição entre as diferentes lógicas e que alguns aspectos e princípios transitam entre elas. Um exemplo é o uso que se faz de franquias da

transmedia entertainment (transmídia de entretenimento), como Star Wars, Harry Potter e Senhor dos Anéis, com o objetivo de aproximar os alunos dos conteúdos

por meio dessas narrativas ou mesmo da transmedia storytelling (narrativa

8

Jenkins (2010) diferencia as lógicas transmídia, como, por exemplo: transmedia branding (que tem como principal objetivo a promoção de marcas), transmedia entertainment (transmídia com foco nas franquias de entretenimento, como Star Wars), transmedia storytelling (narrativa transmídia, utilizada em diferentes contextos, mas com foco principal a construção de um universo narrativo) e transmedia learning (ensino ou metodologia transmídia para a educação, que pode partir de um tema ou conteúdo). Essas são algumas das lógicas apresentadas por terem fluxos de conteúdo que permitem integração de mídias, criação de storytelling e participação do público.

(20)

transmídia), que promove a convergência de mídias e, por meio da criação de uma grande narrativa, engendra diferentes histórias contadas por múltiplas plataformas.

Essa última lógica pode estar presente no contexto educacional em propostas que focam na ampliação de narrativas de clássicos de literatura – sobretudo em atividades de produções de fanfics a partir desses textos – e o trabalho com gêneros narrativos do campo artístico-literário, como contos, romances, novelas etc.

No caso do Aventuras, a aproximação com a narrativa transmídia é sugerida pelo fato de o material apresentar atividades articuladas a um universo narrativo que, embora dialogue intertextualmente com diferentes narrativas de entretenimento, foi pensado e criado para o contexto educacional, sem utilizar uma franquia específica. A narrativa do material convida professores e alunos para participarem da aventura, atuando como mestres e agentes.

Torna-se, portanto, necessário definir o conceito de narrativa transmídia e esboçar uma breve discussão sobre a sua adequação para o contexto educacional e sobre sua relação com a gamificação, sobretudo enquanto estratégias para a produção de materiais didáticos.

Como área de investigação multi/pluri/interdisciplinar, a área de Linguística Aplicada possibilita não apenas a integração entre teoria e prática como incentiva as pesquisas por novos formatos de materiais didáticos, inclusive aqueles que se proponham a integrar tecnologias digitais. Por esse motivo, os objetivos desta pesquisa documental estão delineados no campo.

Por ser um material criado para atender à uma demanda da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, a análise documental do Aventuras tem relevância no que diz respeito às políticas públicas, assim como pelo fato de sugerir a integração às TDIC, também pode contribuir com as pesquisas sobre materiais didáticos.

A presente dissertação tem como objetivo geral analisar se o Aventuras

Currículo+, enquanto material didático de Língua Portuguesa, contempla os

multiletramentos e verificar de que modo a estratégia da gamificação está presente no material e suas implicações para a proposta pedagógica, além de identificar em que medida a narrativa criada se aproxima dos elementos da narrativa transmídia.

(21)

Para possibilitar a análise de um material didático complexo como o

Aventuras, a pesquisa tem como objetivos específicos:

 Identificar se os multiletramentos são contemplados e de que forma, além de avaliar em que medida as atividades permitem aos alunos atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores de sentidos e transformadores e possibilitam a formação de designers.

 Analisar os elementos da gamificação presentes na proposta editorial e na organização do material (missões, níveis, fases, narrativa, interface customizada etc.), verificando quais as implicações de seu uso para a proposta pedagógica.

 Analisar a grande narrativa, a sequência narrativa de algumas missões e de suas respectivas fases, indicando se há diversidade de mídias, linguagens e/ou gêneros e qual o papel do aluno nessas missões, de que modo ele participa, com o intuito de verificar o grau de aproximação desses elementos com as características da narrativa transmídia.

Para que os objetivos apresentados possam ser atingidos, as seguintes perguntas norteiam a análise documental:

As propostas de atividades do Aventuras Currículo+ contemplam os multiletramentos? De que forma? Apresentam propostas que permitem aos alunos atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores de sentidos e transformadores? Há atividades que contribuem para a formação de designers?

 Quais os elementos da gamificação presentes nas propostas editorial (estrutura e interface) e do Aventuras e de que forma eles potencialmente motivam as ações dos alunos e promovem situações de ensino-aprendizagem?

 O universo criado e as atividades costuradas por uma narrativa apresentam aspectos que permitem aproximação com elementos da estratégia da narrativa transmídia?

(22)

Para responder a essas perguntas, a dissertação está organizada em três capítulos, além da introdução e das considerações finais:

O Capítulo 1 contextualiza a pesquisa, discute os desafios da educação em tempos de Web 2.0 e define os conceitos de cultura da convergência e de multiletramentos e, em linhas gerais, a pedagogia dos multiletramentos. Também apresenta e conceitua as estratégias da gamificação e da narrativa transmídia.

O Capítulo 2 apresenta a metodologia de pesquisa por meio da justificativa da análise documental de abordagem qualitativa e interpretativa. O

Aventuras é apresentado enquanto objeto de estudo de forma mais abrangente. A

geração de dados e as categorias de análise são situadas e justificadas.

O Capítulo 3 apresenta a análise dos dados propriamente dita, dividida nas três partes: (1) multiletramentos; (2) estratégias de gamificação; (3) aspectos que aproximam o universo narrativo criado dos elementos da narrativa transmídia.

As considerações finais retomam os objetivos propostos, verificando se as perguntas de pesquisa foram respondidas. Caberá discutir, brevemente, se ambas as estratégias, de gamificação e narrativa transmídia, podem propiciar um trabalho com os multiletramentos.

Por meio dessa pesquisa, acredita-se incentivar a relação entre a prática da produção editorial e a problematização teórica da pesquisa acadêmica, com o objetivo de promover maior contribuição para as mudanças necessárias aos materiais didáticos do século XXI.

(23)

CAPÍTULO

1.

POR

NOVOS

MATERIAIS

DIDÁTICOS

QUE

CONTEMPLEM OS MULTILETRAMENTOS

O capítulo tem como objetivo contextualizar a pesquisa, discutindo os desafios da educação em tempos da Web 2.0 e apresentando os conceitos de cultura da convergência e de multiletramentos. Também serão apresentados os embasamentos teóricos sobre os conceitos de gamificação e narrativa transmídia.

No que concerne aos multiletramentos, é importante para o embasamento da pesquisa apresentar definir o que são os novos e multiletramentos e a pedagogia dos multiletramentos, pois estes são relacionados aos desafios da educação em tempos de Web 2.0 e devem ser conceitos presentes nas discussões sobre “novos” materiais didáticos.

Em seguida, após conceituaremos gamificação e narrativa transmídia, discutiremos suas possibilidades e adequações ao contexto educacional, situando essas lógicas enquanto estratégias para a elaboração de materiais didáticos e discutindo potenciais aproximações entre ambas.

1.1 OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE WEB 2.0

Atualmente, fazemos parte de uma sociedade multimidiática e digital, que produz conteúdo em escala cada vez maior, em cujo cenário somos impulsionados a sermos autônomos e, cada vez mais, a deixarmos de ser meros consumidores para nos tornarmos divulgadores, reprodutores e produtores de conteúdos em rede. Estamos imersos em processos coletivos de interação, buscas e seleção de informações, desenvolvimento de habilidades e associações de recursos. Por esse motivo, cada vez menos os conhecimentos acabados, definitivos e fixos têm lugar.

Nesse contexto, autores como Jenkins (2009[2006]) apontam para necessidades intrínsecas à cultura da convergência, como acompanhar o fluxo de informação em multiplataformas de mídia, modificar e criar simulações, remixar conteúdos etc. O conceito de cultura da convergência parte da relação entre três das características da sociedade contemporânea: convergência de meios de comunicação, cultura participativa e inteligência coletiva.

(24)

Segundo o autor, a convergência de meios de comunicação é uma transformação cultural que vai além da interação com dispositivos:

A convergência das mídias é mais do que apenas uma mudança tecnológica. A convergência altera a relação entre tecnologias existentes, indústrias, mercados, gêneros e públicos. A convergência altera a lógica pela qual a indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia e o entretenimento. Lembrem-se disto: a convergência refere-se a um processo, não a um ponto final. [...] A convergência não é algo que vai acontecer um dia, quando tivermos banda larga suficiente ou quando descobrirmos a configuração correta dos aparelhos. Prontos ou não, já estamos vivendo numa cultura da convergência. [...] Alimentar essa convergência tecnológica significa uma mudança nos padrões de propriedade dos meios de comunicação. [...] A convergência está ocorrendo dentro dos mesmos aparelhos, dentro das mesmas franquias, dentro das mesmas empresas, dentro do cérebro do consumidor e dentro dos mesmos grupos de fãs. A convergência envolve uma transformação tanto na forma de produzir quanto na forma de consumir os meios de comunicação. (JENKINS, 2009[2006], pp. 44-46)

Trata-se, portanto, de um processo corporativo e de um processo do público. De um lado, as empresas midiáticas aprendem a acelerar o fluxo de conteúdo por canais de distribuição, com o objetivo de aumentar as oportunidades de lucro, ampliar mercados e consolidar públicos. De outro, o público enquanto consumidor utiliza-se das diferentes tecnologias para interagir uns com os outros por meio de canais que promovem um fluxo mais livre de ideias e conteúdos.

No caso específico da atuação do público, que Jenkins (2009[2006]) chama de “processo alternativo”, contribui-se, entre outros aspectos, para a transformação de sua condição enquanto receptor passivo. Com o surgimento e adesão à cultural digital, houve uma mudança no modo como o público se relaciona com os meios de comunicação, pois, além de receptor e consumidor, o público tornou-se produtor.

Por meio da Web 2.0 também são possíveis ações coletivas, como a solução de problemas e a criatividade alternativa, que são características da cultura participativa. Nesse contexto, ao mesmo tempo em que as pessoas utilizam as mídias para processos de consumo e produção de conhecimento, elas também as utilizam como meios para discutir, questionar, divulgar, distribuir, verificar a credibilidade e compartilhar informações, conteúdos e conhecimentos.

(25)

As trocas possibilitam aos participantes compartilhar saberes em um processo coletivo, associando recursos e habilidades. A definição desse processo vem de Pierre Lévy, que o definiu como inteligência coletiva. Trata-se, fundamentalmente, de:

Uma rede de pessoas interessadas pelos mesmos temas é não só mais eficiente do que qualquer mecanismo de busca [...], mas, sobretudo, do que a intermediação cultural tradicional, que sempre filtra demais, sem conhecer no detalhe as situações e necessidades de cada um. (LÉVY, 2002, p.101)

Portanto, a cultura da convergência pressupõe uma transformação nas formas de participação, utilização e produção dos meios de comunicação, tendo os participantes-usuários como corresponsáveis por controlar as mídias. Nesse sentido, “a convergência não ocorre por meio dos aparelhos, mas, sim, dentro de cada cérebro [...] e em suas interações sociais com os outros” (JENKINS, 2009[2006], p. 30).

Diante desse cenário, a responsabilidade da escola, dos educadores e dos demais agentes envolvidos na área educacional aumenta e somos constantemente impulsionados a pensar em como integrar a cultura digital, as tecnologias digitais e as diferentes linguagens e mídias às práticas educativas. Mais do que isso, faz-se necessário refletir sobre como incorporar novos textos, procedimentos e mentalidades contemporâneos no contexto educacional.

Essa preocupação é urgente e constante, pois o desafio de compreender, dialogar e formar as novas gerações de alunos é diário. Atualmente, os alunos da Geração Z (nascidos do final da década de 1990 até o ano de 2010), também chamados “nativos digitais”, ou seja, aqueles que são nascidos em um ambiente digital estão, em sua maioria, em sala de aula.

A expressão cunhada por Prensky (2001) serve para diferenciá-los dos denominados “imigrantes digitais”, que são aqueles que não nasceram em um contexto completamente digital, mas em um ambiente mais analógico e linear ou híbrido, como nos casos das Gerações X e Y9

(que hoje têm entre sessenta e trinta

9

Atualmente, o conceito de Geração C, criado por Dan Pankraz (2010), tem se tornado popular. Ele não está relacionado a uma época específica, mas ao tipo de comportamento. O Google definiu a geração como sendo própria do YouTube, e a letra C designa quatro comportamentos: criação, curadoria, comunidade e conexão. Entretanto, o conceito ainda é menos aceito que os demais.

(26)

anos), tendo que se adaptar às mudanças trazidas pela cultura digital. Segundo o autor, enquanto os imigrantes digitais enxergam as tecnologias como ferramentas e utilizam-nas de forma instrumental, os nativos digitais as entendem como fundações e não as reconhecem como novas.

Apesar de os estudos a respeito da Geração Z nomeá-los como “nativos digitais” e caracterizá-los pela alta conectividade, é importante lembrarmos que as inovações tecnológicas não estão, democraticamente, ao alcance de todos os jovens, sobretudo em países com uma estrutura social diversa e desigual, como o Brasil. Por esse motivo, o acesso e a formação desses jovens se fazem urgentes e tornam-se mais um item de preocupação e responsabilidade escolar.

Coelho e Gallo (2010) afirmam a importância do papel estruturante que a cultura digital exerce na constituição de novas habilidades e na ampliação do campo de inclusão e formação social de educadores e alunos. De um ponto de vista mais prático, Rojo e Barbosa (2015) reforçam que, embora a presença de computadores,

tablets e outros recursos nas escolas tenha crescido, ainda há problemas técnicos

com a velocidade da conexão e educacionais com a formação docente e com os currículos, que, de uma forma geral, ainda contemplam as TDIC de maneira instrumental.

Para Moran (2008), é necessário que a escola reaprenda a ser uma instituição significativa e inovadora:

A escola precisa partir de onde o aluno está, das suas preocupações, necessidades, curiosidades e construir um currículo que dialogue continuamente com a vida, com o cotidiano. Uma escola centrada efetivamente no aluno e não no conteúdo, que desperte curiosidade, interesse. Precisa de bons gestores e educadores, bem remunerados e formados em conhecimentos teóricos, em novas metodologias, no uso das tecnologias de comunicação mais modernas. (MORAN, 2008, s/p)

As TDIC na sociedade contemporânea, assim como a cultural digital e as redes de compartilhamento de informações, permitiram a descentralização de conhecimento e de informação. O modelo ainda dominante na educação formal atual é “centralizador”, tem o professor como “transmissor” do conhecimento. O papel do aluno é limitado à recepção e à memorização de conteúdo. De modo geral, o ensino é segmentado por disciplinas, os conteúdos são expostos coletivamente, mas com

(27)

foco na aprendizagem individual e os temas são dissociados da realidade dos alunos.

Por isso, desde a segunda metade do século XX, esse modelo vem sendo mais fortemente questionado e algumas iniciativas buscam adotar novos modelos pedagógicos em busca de uma mudança. Para Lemke (2010[1998]), existem dois paradigmas de aprendizagem em disputa atualmente - o de aprendizagem curricular e de aprendizagem interativa:

O paradigma de aprendizagem curricular é dominante em instituições tais como escola e universidades. O paradigma curricular assume que alguém decidirá o que você precisa saber e planejará para que você aprenda tudo em uma ordem fixa e em um cronograma fixo. Este é o paradigma do capitalismo industrial e da produção de massa baseada na fábrica. (LEMKE, 2010[1998], p. 9)

Apesar de o paradigma de aprendizagem curricular ser dominante nas instituições escolares, para o autor, a cultura digital e as tecnologias digitais estão relacionadas ao paradigma da aprendizagem interativa:

O paradigma da aprendizagem interativa domina instituições como as bibliotecas e os centros de pesquisa. Assume-se que as pessoas determinam o que elas precisam saber baseando-se em suas participações em atividades em que essas necessidades surgem e em consulta a especialistas conhecedores; que eles aprendem na ordem que lhes cabe, em um ritmo confortável e em tempo para usarem o que aprenderam. Este é o paradigma da aprendizagem das pessoas que criaram a internet e o ciberespaço. É o paradigma mais do acesso à informação do que da imposição à aprendizagem. É o paradigma de como pessoas com poder e recursos escolhem aprender. (LEMKE, 2010[1998], p. 9-10)

Estamos, portanto, retomando a antiga discussão da necessidade de se pensar em uma nova escola e em um novo processo de ensino-aprendizagem e, portanto, em uma nova estruturação curricular e em novos materiais didáticos. Devemos considerar, entretanto, a possibilidade de uma terceira via que tenha como ponto de partida o paradigma curricular, mas que se aproxime de características importantes do paradigma da aprendizagem interativa.

Consequentemente, a produção e o uso dos materiais didáticos, o papel do professor e a participação dos alunos em sala de aula também devem ser

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revistos, redesenhados e adequados. Para a presente pesquisa o que interessa são as implicações desses desafios e paradigmas na produção de materiais didáticos, mais especificamente os de Língua Portuguesa.

Choppin (2004[2002]) afirma que, durante muito tempo, os livros didáticos foram negligenciados por historiadores e bibliógrafos, mas têm sido objeto de pesquisa nos últimos trinta anos. Segundo o autor, o estudo histórico realizado com os livros didáticos mostrou que esse objeto cultural pode exercer quatro funções, dependendo do ambiente sociocultural, da época, da disciplina, do nível de ensino, do método e/ou da forma de utilização.

Para Choppin (2004[2002], p. 552-553), o livro didático tem função referencial, curricular ou programática quando é um suporte de conteúdos educativos, que devem ser transmitidos às novas gerações; função instrumental quando possui atividades e exercícios para facilitar a memorização de conhecimentos e favorecer a aquisição de competências e apropriação de habilidades; função ideológica e cultural quando é um instrumento de construção de identidade; função documental quando fornece conteúdos com o objetivo de desenvolver o espírito crítico do aluno.

O autor também reforça que o livro didático é um instrumento de poder, que faz parte da educação dos jovens, e indica outros materiais didáticos que fazem parte do universo escolar, tanto impressos (como mapas, enciclopédias) como em outros suportes (CD-ROM, por exemplo) e afirma:

Eles podem, até mesmo, ser funcionalmente indissociáveis, assim como as fitas cassetes e os vídeos, nos métodos de aprendizagem de línguas. O livro didático, em tais situações, não tem mais existência independente, mas torna-se um elemento constitutivo de conjunto multimídia. (CHOPPIN, 2004[2002], p. 553)

Essa afirmação de Choppin reforça o caráter instrumental que as TDIC vêm tendo nas práticas educativas e na produção de materiais digitais. Como as práticas ainda estão ligadas ao ensino que consideramos “tradicional” e a um currículo estabelecido a partir de uma pedagogia relacionada à “transmissão” de conhecimento, o paradigma dominante na produção e no uso de materiais didáticos, assim como nas instituições escolares, é o da aprendizagem curricular.

(29)

Para que o paradigma educacional esteja voltado para uma aprendizagem interativa, que dialogue com a cultura da convergência, faz-se necessário pensar em novos materiais didáticos, que contribuam para a mudança das relações entre professores e alunos, cuja estrutura curricular seja mais flexível, com propostas de atividades colaborativas e coletivas. Porém, esse tipo de material exige outra pedagogia.

Conforme indicado anteriormente, Rojo (2013) conceitua os livros didáticos digitais interativos (LDDI), considerando-os como um tipo de material que possui características hipermidiáticas, intuitivas e interativas. Esse tipo de material contrapõe-se aos materiais digitais solicitados pelos editais do PNLD, que parecem seguir um caminho oposto ao que a autora propõe por causa das limitações tecnológicas (com pouca ou nenhuma multissemiose, hipermídia ou interatividade) e pedagógicas (complementares e dependentes aos impressos).

Nesse sentido, se as demandas governamentais estivessem de acordo com os documentos e referenciais oficiais e com os paradigmas contemporâneos, estariam preocupados em solicitar a produção de materiais didáticos que:

Descortinam, efetivamente, um novo universo de possibilidades de ensino-aprendizagem em que os objetos de ensino e estudo, anteriormente abstratos, longínquos e que tinham de ser captados e compreendidos por meio de uma linguagem verbal escrita altamente complexa, agora podem estar presentificados no livro, por meio de imagens estáticas e em movimento e de áudio e vídeo (objetos e animações 3D interativos, galerias de imagens, imagens interativas, vídeos e áudios, gráficos, tabelas e infográficos animados, assim como quizzes, PDFs e apresentações Power Point animadas), facilitando muito a compreensão e análise de conceitos mais abstratos, como o de DNA ou de átomo, por exemplo. (ROJO, 2013, p. 23)

Mais especificamente, no que concerne à produção de novos materiais didáticos para a Língua Portuguesa, estes deveriam ser produzidos de modo a contemplar os campos de atuação, as práticas de linguagens e as multissemioses, apresentando, portanto, diferentes textos orais, escritos e multissemióticos, na perspectiva dos multiletramentos. Entretanto, para muitos, os materiais didáticos de Língua Portuguesa ainda devem se configurar como uma coletânea de textos canônicos que privilegiam em suas atividades os letramentos convencionais.

(30)

Para podermos vislumbrar novos formatos de material didático que contemplem os multiletramentos, é preciso primeiro conceituar os novos e os multiletramentos e retomar algumas proposições da pedagogia dos multiletramentos (GNL, 1996). Em seguida, pensaremos nas estratégias de produção editorial que alguns aportes sobre gamificação e narrativa transmídia poderão nos ajudar.

Essa tríplice articulação – multiletramentos, gamificação e narrativa transmídia – está presente na análise do nosso objeto: o Aventuras Currículo+.

1.1.1 Os multiletramentos e a pedagogia do multiletramentos

O caminho que a produção de materiais didáticos segue evidencia a importância de uma discussão, que deve ser coletiva, participativa e colaborativa, entre os diferentes agentes educacionais sobre a necessidade de políticas públicas adequadas e relacionadas às solicitações de novos formatos.

Com o objetivo de verificar o que é apropriado aos alunos no contexto da atual sociedade globalizada, que envolve fatores de diversidade, diante da multiplicidade de linguagens, multissemioses, mídias envolvidas na criação de significação de textos contemporâneos e considerando a pluralidade e a diversidade cultural nos contextos de significação, o Grupo de Nova Londres10 (doravante, GNL) elaborou e publicou, em 1996, o manifesto intitulado “Uma pedagogia dos multiletramentos: desenhando futuros sociais” (A pedagogy of multiliteracies:

designing social future).

Em seu manifesto, o GNL (1996) propôs uma mudança do ensino formal, voltado para uma estrutura monocultural, monolíngue e orientado por uma linguagem para uma proposta de ensino multicultural, que valorizasse a diversidade linguística e as diferentes linguagens e mídias, apontando para as multiplicidades cultural e de semioses.

Ou seja, a proposta do Grupo voltou-se para os estudos semióticos de textos que envolvem diferentes formas de produção, veiculação e consumo, expandindo o conceito de letramentos e apontando que, diferentemente dos

10

Grupo de Nova Londres (doravante, GNL), grupo de pesquisadores, formado por teóricos como Bill Cope e Mary Kalantzis, James Paul Gee, Gunther Kress que, após uma semana de discussões na cidade de Nova Londres, Connecticut (USA), em 1996, publicou o manifesto “Uma pedagogia dos multiletramentos : desenhando futuros sociais” (A pedagogy of multiliteracies: designing social futures).

(31)

letramentos da letra ou do impresso (focados nas práticas da cultura escrita), os multiletramentos compreendem dois tipos de multiplicidade que estão presentes na sociedade: a cultural e a semiótica/midiática, propondo o conceito de multiletramentos:

Letramento é, talvez, o principal elemento do projeto de educação moderna. No presente capítulo trazemos três argumentos principais sobre como os educadores podem mudar o conceito e a pedagogia dos letramentos. Através destes argumentos, desafiamos o lugar atribuído ao letramento, entendido como a leitura e a escrita da língua culta. E redefinimos o conceito, que deve ser entendido de forma mais ampla como “multiletramentos”. (GNL, 1996, p. 63, tradução nossa).

Tratava-se, portanto, de aquisições indispensáveis, que, segundo Rojo (2012), incluem, ainda, procedimentos, como gestos, capacidades de leitura e de produção:

(a) eles são interativos; mais que isso, colaborativos; (b) eles fraturam e transgridem as relações de poder estabelecidas, em especial as de propriedade (das máquinas, das ferramentas, das ideias, dos textos [verbais ou não]); (c) eles são híbridos, fronteiriços e mestiços (de linguagens, modos, mídias e culturas). (ROJO, 2012, p. 23)

Em suma, os multiletramentos são práticas relacionadas aos textos multimodais ou multissemióticos/multimidiáticos contemporâneos, tanto impressos como digitais, que abrangem uma diversidade de procedimentos e capacidades de leitura e de produção.

A multiplicidade de linguagens é decorrente das práticas sociais de dentro e fora da sala de aula e está presente em diferentes “textos em circulação social, seja nos impressos, seja nas mídias audiovisuais, digitais ou não” (ROJO, 2012, p.18). Em sua maioria são textos compostos de múltiplas linguagens, que exigem “capacidades e práticas de compreensão e produção de cada uma delas (multiletramentos) para fazer significar.” (ROJO, 2012, p.19).

Para além da diversidade e integração de semioses e mídias, a escola também tem que dar conta da diversidade cultural presente em sua sala de aula. A democratização do ensino é a principal responsável pela multiplicidade de culturas

(32)

na escola. Essa diversidade é ampla e vai além da diversidade de idade, gênero, étnica ou/e classe socioeconômica, incluindo alunos com diferentes valores, realidades, conhecimentos e possibilidades físicas e cognitivas.

Para COPE e KALANTZIS (2000[1996]), há quatro formas de a multiplicidade cultural estar presente na sala de aula, por meio de: exclusão, quando o aluno não compartilha da cultura erudita e, mesmo em meio à tentativa, ele acaba falhando; assimilação, quando o aluno é bem-sucedido na educação institucionalizada, sobretudo por meio do discurso de quem detém o poder; multiculturalismo, quando há o reconhecimento das variedades culturais, entretanto a de quem detém o poder é a que sobressai em relação às demais; pluriculturalismo, o defendido pelos autores como representação cultural com maior abertura e troca, uma vez que as múltiplas culturas coexistem e não se sobrepõem umas às outras: “o processo pluralista de transformação, então, não é uma questão de progressos verticais, mas de expansão de horizontes.” (COPE; KALANTZIS, 2000[1996], p. 124).

Mais do que expansão de horizontes, García-Canclini (2008[1997], p. 348) vai postular a existência de um hibridismo cultural, uma vez que vivemos em um mundo onde “todas as culturas são de fronteira. Todas as artes se desenvolvem em relação com outras artes [...] Assim, as culturas perdem a relação exclusiva com o território, mas ganham em comunicação e conhecimento”. O hibridismo cultural estaria, portanto, presente nas produções culturais letradas, de circulação social, misturando o popular e o erudito, o culto e o inculto, a cultura erudita e a popular, o cânone e a cultura de massa, o que coloca em questão essas dicotomias.

Consequentemente, o currículo tradicional, que busca cada vez mais unificar unidades e objetos de ensino, e teria como principal objetivo transmitir os conhecimentos do cânone ao consumidor massivo, estaria, por sua vez, em dissonância com as demandas emergentes da sociedade contemporânea. Nesse caso, os currículos deveriam levar em conta a multiplicidade cultural presente em sala de aula, primando pela diversidade e propiciando o exercício de alteridade.

E como a multiplicidade semiótica, que constitui os textos e a multiplicidade social, cultural e linguística da sociedade globalizada podem estar

(33)

presentes no ensino? O GNL (1996) defende a pedagogia dos multiletramentos11, que se apresenta como uma alternativa promissora na promoção de mudanças dos sistemas educacionais:

Pedagogia é uma relação de ensino e aprendizagem que cria o potencial de construção da aprendizagem que leva à participação social plena e igualitária. A pedagogia dos letramentos tradicionalmente significa ensinar e aprender a ler e a escrever oficialmente, de modo formal, na língua materna. A pedagogia dos letramentos, em outras palavras, tem tido um projeto restrito cuidadosamente formalizado em uma única língua, uma única cultura e governado por regras formais da língua. [...] Nós decidimos utilizar o termo “multiletramentos” como um caminho para o foco nas realidades do crescimento da diversidade local e conectividade global. Lidar com as diferenças linguísticas e culturais tem se tornado o centro da pragmática do nosso trabalho, da vida cívica e a vida privada. [...] Acreditamos que haverá um benefício cognitivo para todos os alunos na pedagogia do pluralismo cultural e linguístico. (GNL, 1996, p. 60-62, tradução nossa).

Nesse contexto, o grupo propõe o trabalho com as três dimensões da vida social dos alunos, sendo elas: pessoal, profissional e de participação cívica. E, para contemplar essas dimensões, o GNL vale-se de uma concepção dinâmica de representação baseada no Designing Meanings (em tradução livre, Design de sentidos).

Ao se apropriar da palavra da dimensão profissional design, o GNL utiliza-a fortuitutiliza-amente umutiliza-a vez que elutiliza-a utiliza-apresentutiliza-a um sentido utiliza-amplo e dinâmico em inglês, pois descreve a estrutura e a morfologia ao mesmo tempo em que se refere ao ato de construir.

Para o GNL, no contexto do Designing Meanings, a construção se dá no processo de representar significados por meio da leitura, da escuta, da fala etc. No contexto dos multiletramentos, o design apresenta três aspectos: o available

designs, designing e redesigned.

11

Em 2009, os autores escrevem um novo artigo, propondo mudanças na proposta de 1996. Devido às aplicações da pedagogia na Austrália e ao diálogo estabelecido com autores, educadores e movimentos educacionais, teóricos como Cope e Kalantzis retrocederam e redefiniram alguns aspectos da proposta, retomando a proposta de “experimentar, conceituar, analisar e aplicar”. A presente pesquisa, entretanto, utiliza a proposta inicial do GNL para a pedagogia dos multiletramentos, mais adequada aos novos letramentos e novas práticas sociais e também porque as mudanças de 2009 dialogam com o movimento back to basics, contrário aos multiletramentos. Os conceitos de designs disponíveis, designing e redesigned não foram alterados.

(34)

Resumidamente, o available designs é aquilo que é disponibilizado pelos modos de significação; o designing, que se caracteriza pela capacidade de representar, recontextualizar e transformar os conteúdos disponibilizados sem ser por repetição; o redesigned, por sua vez, consiste em reorganizar, reproduzir e transformar, a partir das práticas anteriores, novos significados ou um novo modo de significação, intervindo no mundo.

Para viabilizar o processo de ensino-aprendizagem abrangendo os

designs, há quatro componentes: a prática situada, que se baseia na experiência de

construção de significados, que envolve experiências de mundo, identidades, experiências e conhecimentos prévios; a instrução aberta, que trabalha a metalinguagem explícita do design, a reflexão e a análise da linguagem, e seus conteúdos, significação e função social; o enquadramento crítico, que interpreta contexto e relações socioculturais, políticas, históricas e ideológicas ligadas aos

designs; a prática transformada, na qual os alunos tornam-se designers de futuros

sociais por meio da (re)criação de significação. Em relação às dimensões do usuário, o GNL propõe o seguinte diagrama:

Figura 1 – Mapa da pedagogia dos multiletramentos.

Fonte: COPE, B.; KALANTZIS, M. (Eds.). Multiliteracies: literacy learning and the design of social futures. New York: Routledge, 2006 [2000][1996], p. 35. Retirado de: ROJO, R.; MOURA, E. (Orgs.).

(35)

O diagrama apresenta uma proposta de pedagogia crítica, que correlaciona o desenvolvimento de competências técnicas e conhecimento prático, a prática transformadora, a criação e recriação de sentido e as análises, reflexão e leitura críticas, em uma pedagogia por design.

Essa proposta é desenvolvida por meio de estratégias de ensino-aprendizagem que contemplem: práticas situadas, que fazem parte das culturas dos alunos e nos gêneros e designs disponíveis para essas práticas; instruções abertas,

análise sistemática e consciente das práticas vivenciadas e dos gêneros e designs

familiares aos alunos e de seus processos de produção e de recepção; enquadramentos críticos, interpretação dos contextos sociais e culturais de circulação e produção dos designs e enunciados; e práticas transformador(as), de

recepção ou de produção/distribuição (redesign).

Desse modo, o aluno deixa de ser um simples memorizador de conteúdos e passa a ser um sujeito ativo, crítico, autoral, transformador, com voz e espaço. O processo de ensino-aprendizagem passa a ser coletivo, colaborativo e participativo. O papel do professor também tem novo sentido: sua função passa a ser a de coautor, mediador, curador e co-designer.

Para iniciar uma mudança efetiva na educação e no processo de ensino-aprendizagem na direção apontada, precisamos de uma mudança curricular e, por isso, os currículos devem contemplar nas disciplinas já existentes os multiletramentos. Consequentemente, tornam-se necessários materiais didáticos que contemplem os multiletramentos e esse tipo de pedagogia. Mais do que isso, é necessário, conforme afirmam Rojo e Barbosa12:

Complementar a matriz curricular na direção de contemplar os multiletramentos com diversidade de mídias, linguagens e culturas, de forma articulada com os conteúdos e expectativas de aprendizagem propostos para as disciplinas e áreas do currículo. (ROJO; BARBOSA, 2015, p. 18)

12

A versão homologada da BNCC, que procura contemplar a cultura digital tanto nas competências gerais como integrada aos conteúdos dos componentes curriculares, propõe, por exemplo, no componente curricular de Língua Portuguesa, que se considere as diferentes linguagens e os letramentos, o que propicia o trabalho com habilidades que relacionem as práticas de linguagens com textos multissemióticos, meios, mídias e linguagens próprios da cultura digital, na perspectiva de se considerar os novos e multiletramentos. (BRASIL, 2017, p. 68)

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