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O direito à educação integral nos planos de educação (2015-2025) dos municípios da Região Metropolitana de Campinas

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Educação

ANDRÉIA SILVA ABBIATI

O DIREITO À EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS PLANOS

DE EDUCAÇÃO (2015-2025) DOS MUNICÍPIOS DA

REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS

CAMPINAS/SP 2019

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O DIREITO À EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS PLANOS

DE EDUCAÇÃO (2015-2025) DOS MUNICÍPIOS DA

REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora em Educação, na área de concentração de Educação.

Orientador: Prof. Dr. Pedro Ganzeli

ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA ANDRÉIA SILVA ABBIATI E ORIENTADA PELO PROF. DR. PEDRO GANZELI.

CAMPINAS/SP 2019

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Rosemary Passos - CRB 8/5751

Abbiati, Andréia Silva,

Ab19d AbbO direito à educação integral nos planos de educação (2015-2025) dos municípios da Região Metropolitana de Campinas / Andréia Silva Abbiati. – Campinas, SP : [s.n.], 2019.

AbbOrientador: Pedro Ganzeli.

AbbTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.

Abb1. Plano Municipal de Educação. 2. Direito à educação. 3. Educação integral. 4. Campinas, Região Metropolitana de (SP). I. Ganzeli, Pedro, 1960-. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital Título em outro idioma:

The right to integral education in the education plans (2015-2025) of the municipalities of the Campinas Metropolitan Region

Palavras-chave em inglês: Municipal education plan Right to education Integral education

Campinas Metropolitan Region Área de concentração: Educação Titulação: Doutora em Educação Banca examinadora:

Pedro Ganzeli [Orientador] Cleiton de Oliveira

Cristiane Machado João Augusto Gentilini

Romualdo Luiz Portela de Oliveira Data de defesa: 25-02-2019

Programa de Pós-Graduação: Educação

Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a)

- ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0003-3557-1279

- Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/5453441151011744

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FACULDADE DE EDUCAÇÃO

TESE DE DOUTORADO

O DIREITO À EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS PLANOS

DE EDUCAÇÃO (2015-2025) DOS MUNICÍPIOS DA

REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS

Autora: Andréia Silva Abbiati

COMISSÃO JULGADORA:

Prof. Dr. Pedro Ganzeli Prof. Dr. Cleiton de Oliveira Profa. Dra. Cristiane Machado Prof. Dr. João Augusto Gentilini

Prof. Dr. Romuado Luiz Portela de Oliveira

A Ata da Defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da Unidade.

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Aos meus pais, José e Benedicta, minha

alegria, meu orgulho e fonte de

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Ao meu orientador, Prof. Dr. Pedro Ganzeli, pela generosidade, competência e orientações sempre zelosas e repletas de ensinamento para a pesquisa, para a docência e para a vida. Meu sonho é me tornar, um dia, uma pesquisadora tão ética e comprometida quanto o Pedro, por quem tenho grande admiração.

Ao Prof. Dr. Cleiton de Oliveira, meu eterno orientador, pela apresentação do LAGE, incentivo e apoio constantes. Agradeço incansável e imensamente a fecunda presença em minha formação acadêmica.

À Profa. Dra. Cristiane Machado, ao Prof. Dr. Romualdo Luiz Portela de Oliveira e ao Prof. Dr. João Augusto Gentilini, pelas inestimáveis contribuições no exame de qualificação e na defesa pública deste trabalho.

Aos demais professores do PPGE, funcionários da Faculdade de Educação da UNICAMP, colegas do LAGE e do curso, pelas palavras de incentivo e gestos de cordialidade e respeito.

À Ana Carolina Andreato e Sérgio Ricardo Evangelista, pela acolhida inicial no LAGE e pelos melhores momentos vividos ao longo da pós-graduação. Nossa amizade é eterna!

Aos meus pais, José e Benedicta, pelo colo que me segura nas necessidades e nas conquistas.

Ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), nas pessoas dos professores Eduardo Marmo Moreira e Menoti Borri, pelo apoio institucional para a conclusão do trabalho.

A Deus, pelo dom da vida e por me permitir gozar de saúde, paz e felicidade como filha, professora e pesquisadora.

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A Constituição Federal de 1988 reconheceu a educação integral como um direito humano fundamental, de natureza social, direito de todos e dever do Estado. A concretização desse direito demanda o planejamento de políticas públicas no âmbito dos diferentes sistemas de ensino, dentre os quais, o sistema municipal. Considerando a relevância do poder local para o processo de formulação e implementação de políticas educacionais, o objetivo do trabalho foi investigar como se configurou o direito à educação integral nos planos de educação (2015-2025) dos municípios da Região Metropolitana de Campinas que instituíram sistema próprio de ensino. O estudo, de natureza qualitativa, elegeu como categorias de análise as dimensões a serem atendidas pelo poder público para a efetivação desse direito e que se estruturam em torno de uma educação disponível, acessível, admissível e adaptável (TOMAŠEVSKI, 2001). Pautado na análise de conteúdo (BARDIN, 2016), verificou-se que os planos municipais atenderam às quatro dimensões do direito à educação integral, mesmo com a constatação de “silêncios” que sinalizaram a necessidade de aprofundamento da discussão sobre o significado desse direito junto ao poder público municipal. Compreende-se, assim, a importância de planos municipais de educação para o processo de materialização do direito à educação integral.

Palavras-chave: Plano Municipal de Educação. Direito à educação. Educação integral. Região Metropolitana de Campinas.

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The Federal Constitution of 1988 recognized the integral education as a fundamental human right, of a social nature, right of everyone and duty of the State. The realization of this right demands the planning of public policies within the framework of the different education systems, among which, the municipal system. Considering the relevance of the local power to the process of formulation and implementation of educational policies, the objective of this work was to investigate on how the right to integral education was configured in the education plans (2015-2025) of the municipalities of the Campinas Metropolitan Region that established their own teaching system. The study, of a qualitative nature, chose as categories of analysis the dimensions to be met by the public power for the accomplishment of this right and which are structured around an available, accessible, admissible and adaptable education (TOMAŠEVSKI, 2001). Based on the content analysis (BARDIN, 2016), it was verified that the municipal plans addressed the four dimensions of the right to integral education, even with the observation of "silences" that signaled the need to deepen the discussion about the meaning of this right together the municipal public power. It is understood, therefore, the importance of municipal plans of education for the materialization process of the right to integral education.

Keywords: Municipal Education Plan. Right to education. Integral education. Campinas Metropolitan Region.

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Gráfico 1 - Quantidade de estratégias relativas a cada uma das metas do PNE (2014-2024) ... 80 Gráfico 2 - Quantidade de metas e/ou estratégias previstas nos PMEs (2015-2025) ... 137

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Quadro 1 - Relação de municípios da RMC e leis de aprovação do sistema próprio de ensino ... 22 Quadro 2 - Relação de municípios da RMC e leis de aprovação do Plano Municipal de Educação (2015-2025) ... 24 Quadro 3 - Distribuição e frequência das temáticas do PNE (2014-2024) nas dimensões do direito à educação integral ... 82 Quadro 4 - População, área, densidade demográfica e grau de urbanização dos municípios da RMC (2018) ... 88 Quadro 5 - Condições de vida da população em municípios da RMC (2010) ... 90 Quadro 6 - Taxa de analfabetismo e população com ensino médio nos municípios da RMC, na RMC e no estado de São Paulo (2010) ... 93 Quadro 7 - Data de promulgação e última alteração das LOs dos municípios da RMC ... 108 Quadro 8 - Municípios com sistema próprio de ensino e respectivas leis de criação ... 119 Quadro 9 - Enquadramento jurídico dos PMEs da RMC articulados ao PNE (2014-2024) ... 124 Quadro 10 - Instâncias de avaliação da execução do PME (2015-2025) nos municípios da RMC ... 132 Quadro 11 - Quantitativo de metas e/ou estratégias relativas à dimensão “Disponibilidade” ... 140 Quadro 12 - Quantitativo de metas e/ou estratégias relativas à dimensão “Acessibilidade” ... 154 Quadro 13 - Quantitativo de metas e/ou estratégias relativas à dimensão “Admissibilidade” ... 160 Quadro 14 - Quantitativo de metas e/ou estratégias relativas à dimensão “Adaptabilidade” ... 168

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Tabela 1 - População em idade escolar e número de matrículas iniciais na educação infantil (2017) ... 96 Tabela 2 - População em idade escolar e número de matrículas iniciais no ensino fundamental (2017) ... 98 Tabela 3 - População em idade escolar e número de matrículas iniciais no ensino médio (2017) ... 100 Tabela 4 - Matrículas iniciais na educação infantil, por dependência administrativa, em municípios da RMC (2017) ... 102 Tabela 5 - Matrículas iniciais no ensino fundamental, por dependência administrativa, em municípios da RMC (2017) ... 104 Tabela 6 - Matrículas iniciais no ensino médio, por dependência administrativa, em municípios da RMC (2017) ... 106

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AEE Atendimento Educacional Especializado

CAIC Centro de Educação Integral à Criança e ao Adolescente CDESC Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

CE Ceará

CEE Conselho Estadual de Educação

CEEGP Centro de Ensino Experimental Ginásio Pernambucano

CEU Centro Educacional Unificado

CF Constituição Federal

CIEP Centro Integrado de Educação Pública

CME Conselho Municipal de Educação

CNE Conselho Nacional de Educação

DUDH Declaração Universal dos Direitos Humanos

EC Emenda Constitucional

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

EI Educação Infantil

EMPLASA Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S/A

FE Faculdade de Educação

FME Fórum Municipal de Educação

FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

GO Goiás

IDHM Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

IPRS Índice Paulista de Responsabilidade Social

LAGE Laboratório de Gestão Educacional

LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LO Lei Orgânica

ONU Organização das Nações Unidas

PDT Partido Democrático Trabalhista

PE Pernambuco

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PIDESC Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

PME Plano Municipal de Educação

PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PNE Plano Nacional de Educação

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PT Partido dos Trabalhadores

RJ Rio de Janeiro

RMC Região Metropolitana de Campinas

SE Sergipe

SEADE Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados

SEE Sistema Estadual de Educação

SME Secretaria Municipal de Educação

SP São Paulo

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INTRODUÇÃO ... 18

CAPÍTULO I - O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E A EDUCAÇÃO INTEGRAL COMO DIREITO DE CIDADANIA ... 29

1.1 Estado, cidadania e educação ... 30

1.1.1 O Estado Democrático de Direito e a organização do Estado brasileiro ... 30

1.1.2 O princípio da cidadania no Estado Democrático de Direito ... 33

1.1.3 A educação como direito humano fundamental de natureza social ... 36

1.1.3.1 O conteúdo do direito à educação: a contribuição de Katarina Tomaševski (2001) ... 44

1.1.3.2 O direito à educação na Constituição de 1988 ... 46

1.2 O direito à educação integral no Estado Democrático de Direito ... 48

1.2.1 A educação integral como direito de cidadania e dever do Estado ... 48

1.2.2 A educação integral no Brasil: antecedentes históricos ... 54

1.2.3 A educação em tempo integral como direito à educação integral: uma análise da regulamentação desse direito ... 58

CAPÍTULO II - A EDUCAÇÃO INTEGRAL COMO POLÍTICA PÚBLICA ... 66

2.1 Educação integral e planejamento: uma articulação necessária ... 66

2.1.1 Política pública: a necessária conceituação do termo ... 67

2.1.2 Abordagens no estudo de políticas públicas ... 69

2.1.3 O planejamento educacional e a política pública ... 73

2.2 Os planos de educação no Brasil e o direito à educação integral ... 74

2.3 O direito à educação integral no PNE (2014-2024): uma análise de contéudo ... 80

(16)

3.1 A Região Metropolitana de Campinas: algumas características dos

municípios ... 85

3.1.1 Os municípios da RMC ... 87

3.1.2 Informações educacionais dos municípios da RMC ... 92

3.2 Direito à educação integral nas leis orgânicas dos municípios da RMC . 107 3.2.1 A educação nas Leis Orgânicas ... 109

3.2.1.1 A concepção de direito à educação integral nas LOs ... 110

3.2.1.2 Sistema Municipal de Educação ... 112

3.2.1.3 Plano Municipal de Educação ... 114

3.3 Sistemas de ensino e planos municipais de educação: uma articulação necessária ... 117

CAPÍTULO IV - O DIREITO À EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS PLANOS DE EDUCAÇÃO (2015-2025) DOS MUNICÍPIOS DA RMC ... 122

4.1 A normatização jurídica dos PMEs ... 123

4.1.1 Aprovação, execução e financiamento do PME ... 125

4.1.2 Acompanhamento e avaliação do PME ... 130

4.1.3 Estrutura dos planos aprovados ... 134

4.2 Os Planos Municipais de Educação (2015-2025) e o direito à educação integral ... 138

4.2.1 Disponibilidade ... 139

4.2.1.1 Construção e manutenção da rede física ... 142

4.2.1.2 Recursos humanos e materiais didático-pedagógicos ... 143

4.2.1.3 Valorização dos profissionais da educação ... 144

4.2.1.4 Gestão e financiamento da educação ... 147

4.2.1.5 Regime de colaboração e parcerias... 151

4.2.2 Acessibilidade ... 153

4.2.2.1 Oferta e atendimento à demanda ... 154

4.2.2.2 Acesso e permanência ... 156

(17)

4.2.3.2 Currículo e práticas pedagógicas ... 162

4.2.3.3 Direitos e objetivos de aprendizagem ... 164

4.2.4 Adaptabilidade ... 168

4.2.4.1 Educação de Jovens e Adultos (EJA) ... 169

4.2.4.2 Educação especial ... 170

4.2.4.3 Atendimento às populações e/ou estratégias específicas ... 172

REFLEXÕES FINAIS ... 174

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 177

APÊNDICE A – Metas e estratégias da educação básica no PNE (2014-2024) 196 APÊNDICE B – Disponibilidade ... 237

APÊNDICE C – Acessibilidade ... 363

APÊNDICE D – Admissibilidade ... 393

(18)

INTRODUÇÃO

Em um momento histórico em que os direitos do cidadão se encontram sob ameaça, haja vista a aprovação da Emenda Constitucional (EC) n. 95/2016 e a consequente limitação dos gastos e investimentos da União, em especial nas áreas sociais, é premente analisar a temática do direito à educação integral em nosso país. Assim, este estudo trata-se de uma pesquisa, circunscrita à esfera municipal, com o objetivo de investigar o direito à educação integral conforme documentos que informam o planejamento da política educacional nessas localidades, ou seja, os planos municipais de educação, elaborados para o decênio 2015-2025.

O debate acerca da educação municipal não é algo recente e coaduna-se com a discussão sobre a capacidade deste espaço político e territorial em prover meios para o atendimento educacional de sua população, embora o sistema federativo brasileiro, instituído pela Constituição Federal (CF) de 1988, compreenda o regime de colaboração entre os entes federados, os quais devem se responsabilizar, mutuamente, pela garantia dos direitos dos cidadãos. Em outras palavras:

A questão federativa é indissociável do direito à educação, visto que a forma administrativa e político institucional do Estado brasileiro imprime um formato à educação que deve ser oferecida por esse Estado, ou seja, a forma que assumirão os poderes e as responsabilidades estatais na tarefa de educar a população. A análise dessa forma incorpora o debate sobre a pertinência ou não de adotar políticas (des) centralizadas, mas não se reduz a ela, pois se trata, sobretudo, do debate sobre os fundamentos e as características do Estado brasileiro como núcleo de poder e de responsabilidade (ARAÚJO, 2013, p. 32).

A forma administrativa e político institucional do Estado brasileiro encontra-se expressa no Artigo 1º da Lei Maior, assim: “a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito” (BRASIL, 1988), tendo como fundamentos a soberania (inciso I), a cidadania (inciso II), a dignidade da pessoa humana (inciso II), os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV), o pluralismo político (inciso V) e a soberania popular (parágrafo único).

(19)

A Carta Magna estabelece, ainda, os objetivos fundamentais da República, quais sejam: a busca por uma sociedade livre, justa e solidária (inciso I) e a redução das desigualdades sociais (inciso III), explicitando, assim, o caráter social do modelo de Estado adotado.

Nesta perspectiva, a concretização do Estado Democrático de Direito requer dos poderes públicos duas obrigações distintas: a) o respeito aos direitos individuais do cidadão (liberdade de expressão, direito de ir e vir, direito de voto); e b) a responsabilidade pela garantia e efetivação dos direitos sociais (DUARTE, 2007), direitos estes relacionados no Artigo 6º da Lei Maior: “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 1988, grifos nossos).

Observa-se que o constituinte conferiu posição de destaque à educação relacionando-a, com primazia, no tocante aos demais direitos sociais, o que pode ser justificado, dentre outras possíveis motivações, por tratar-se não apenas de um direito social, mas, também, por constituir-se em premissa necessária, ainda que não suficiente, para o exercício dos demais direitos (SAVIANI, 2013).

Assim, a responsabilidade do Estado para com a garantia do direito à educação e, por conseguinte, para com a formação do sujeito de direito, compreende a observação irrestrita de três finalidades, as quais se encontram previstas no caput do Artigo 205 da Constituição Federal de 1988, quais sejam: a) o pleno desenvolvimento da pessoa; b) seu preparo para o exercício da cidadania; e c) a qualificação para o trabalho. Segundo Ganzeli (2017), estas finalidades correspondem às premissas de uma concepção de educação que busca atender o ser humano em todas as suas dimensões, ou seja, a uma educação integral.

Conforme adverte Duarte (2004), a educação integral extrapola a prerrogativa de o indivíduo ter acesso e poder cursar uma educação básica obrigatória que esteja voltada, apenas e tão somente, para o desenvolvimento de habilidades visando à sua empregabilidade futura.

Deve ter como escopo o oferecimento de condições para o desenvolvimento pleno de inúmeras capacidades individuais, jamais se limitando às exigências do mercado de trabalho, pois o ser humano é fonte inesgotável de crescimento e expansão no plano intelectual, físico, espiritual, moral, criativo e social (DUARTE, 2004, p. 115).

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Para a mesma autora, cabe aos diferentes sistemas de ensino a responsabilidade por prover meios que favoreçam a formação integral do educando, alicerçada na disseminação de valores, no respeito aos direitos humanos e na participação social. Nesse sentido, a proteção do direito individual à educação integral encerra a garantia do bem comum (DUARTE, 2004).

A organização federativa do Brasil compreende a união de entes que compõem uma entidade soberana: o Estado Nacional. Assim, “no regime federal, só há um Estado Soberano cujas unidades federadas subnacionais (estados) gozam de autonomia dentro de limites jurisdicionais atribuídos e especificados” (CURY, 2010, p.12).

Com a elevação do município à condição de terceiro ente federado, a Constituição de 1988 ampliou a autonomia da localidade, em relação às responsabilidades que lhe são atribuídas na área educacional. Assim, o parágrafo 2º do Artigo 211 definiu, como competência municipal, a atuação, prioritária, no ensino fundamental e na educação infantil, além da possibilidade de constituir sistema próprio de ensino (caput do mesmo Artigo).

Conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei n. 9.394 de 1996, a criação do sistema próprio é uma possibilidade apresentada aos municípios, no entanto, estes podem optar por outras duas, quais sejam, atuar integradamente ao sistema estadual ou compor com este um sistema único.

Para o Conselho Estadual de Educação (CEE) do Estado de São Paulo, órgão normativo, deliberativo e consultivo do sistema de ensino, a institucionalização do sistema de ensino autônomo configura-se como o recurso adequado para organização da educação nos municípios. No entanto, ao optar pela criação de seu sistema próprio, o ente subnacional deve observar as seguintes condições: a) compromisso com a educação; b) conjunto de normas de educação; c) Conselho Municipal de Educação; d) órgão de administração da educação municipal; e) Plano Municipal de Educação; f) rede escolar (SÃO PAULO, 1997).

A justificativa apresentada pelo CEE por ter relacionado o Plano Municipal de Educação (PME) como uma das condições para a instituição dos sistemas próprios de ensino, assenta-se no entendimento de que a elaboração de um documento “que identifique as necessidades a serem atendidas, estabeleça as prioridades e aponte as metas a serem atingidas, dentro de prazos realistas” (SÃO PAULO, 1997, p. 13), consolida o compromisso do município com a educação.

(21)

Nesse sentido, o plano de educação constitui-se em um documento, imprescindível, para a organização dos sistemas de ensino municipais.

A CF de 1988 estabeleceu, ainda, em seu Artigo 214, a elaboração de um Plano Nacional de Educação (PNE), de duração plurianual, com vistas à articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diferentes níveis. Em 2009, a EC n. 59 deu nova redação a este Artigo, instituindo o PNE com duração decenal e orientando para que o documento fosse elaborado, em regime de colaboração, pelos diferentes entes federados.

Após a promulgação da Constituição de 1988, foram sancionados, pelo poder executivo nacional, dois planos de educação: a Lei 10.172/2001, que aprovou o PNE (2001-2010), e a Lei n. 13.005/2014, que aprovou o PNE (2014-2024).

O PNE (2001-2010), aprovado em 09 de janeiro de 2001, consubstanciou a perspectiva de um Estado minimalista a qual desresponsabiliza o poder público da elaboração de políticas para o atendimento à educação. Esta proposição foi reafirmada pelos nove vetos impostos à Lei, pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Os vetos, impulsionados pela equipe econômica do governo, incidiram diretamente nas propostas relativas ao financiamento da educação, reduzindo o documento, ao que Valente e Romano (2002) denominaram, a uma “carta de intenções”.

Em 25 de junho de 2014, a presidenta Dilma Rousseff (2011-2016), do Partido dos Trabalhadores (PT), sancionou a Lei n. 13.005 aprovando o PNE para o decênio 2014-2024. O plano constituiu-se de uma Lei contendo 14 (quatorze) artigos e de um anexo, no qual foram estabelecidas 20 (vinte) metas e 254 (duzentas e cinquenta e quatro) estratégias a serem cumpridas pelos sistemas de ensino, durante o período de vigência da legislação. O Artigo 8º da Lei definiu o prazo de 1 (um) ano para que os estados, o Distrito Federal e os municípios elaborassem ou adequassem seus respectivos planos, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas no Plano Nacional.

Nesse contexto, esse estudo propõe-se à análise do direito à educação integral conforme configurado nos planos de educação (2015-2025) dos municípios da Região Metropolitana de Campinas (RMC) que instituíram seus sistemas próprios de ensino, tendo presente que, debruçar-se sobre os documentos que informam o planejamento da educação municipal pode implicar em uma análise parcial da realidade.

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A RMC foi criada no ano 2000 por meio da Lei Complementar n. 870/2000, sendo constituída, inicialmente, por dezenove municípios: Americana, Artur Nogueira, Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Holambra, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Jaguariúna, Monte Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Bárbara D’Oeste, Santo Antônio de Posse, Sumaré, Valinhos e Vinhedo. No ano de 2014, o município de Morungaba passou a integrar o bloco regional por meio da Lei Complementar n. 1234, de 13 de março de 2014.

No que diz respeito à criação de sistemas próprios de ensino, possibilidade expressa pela Constituição de 1988 e ratificada pela LDBEN de 1996, conforme explicitado anteriormente, no âmbito da RMC, este processo vem transcorrendo de forma progressiva. No período compreendido entre os anos de 1997 e 2018, quinze municípios, num universo de vinte, criaram os seus respectivos sistemas, conforme levantamento das Leis descritas no Quadro 1.

Quadro 1 - Relação de municípios da RMC e leis de aprovação do sistema próprio de ensino

Município Lei Municipal

Americana Lei n. 3.129, de 18 de dezembro de 1997

Artur Nogueira Lei n. 2.795, de 28 de dezembro de 2005

Campinas Lei n. 12.501, de 13 de março de 2006

Cosmópolis Lei n. 2.785, de 23 de dezembro de 2004

Engenheiro Coelho Lei n. 926, de 21 de julho de 2014 Hortolândia Lei n. 1.460, de 05 de novembro de 2004

Indaiatuba Lei n. 3507, de 08 de janeiro de 1998

Itatiba Lei n 2.976, de 25 de fevereiro de 1998

Monte Mor Lei n. 1.297, de 16 de dezembro de 2008

Nova Odessa Lei n. 49, de 11 de outubro de 2016

Paulínia Lei n. 50, de 16 de novembro de 2011

Santa Bárbara D’Oeste Lei n. 2493, de 24 de maio de 2000 Santo Antônio de Posse Lei n. 2.233, de 18 de abril de 2007

Sumaré Lei n. 4.400, de 26 de março de 2007

Valinhos Lei n. 4.845, de 02 de maio de 2013

(23)

Os dados do Quadro 1 revelam que a aprovação das leis de criação de sistemas de ensino na Região Metropolitana de Campinas iniciou-se no ano de 1997, quando Americana instituiu seu sistema próprio, e perdurou até o ano de 2016, ano em que foi aprovada a Lei de Nova Odessa. Observa-se uma concentração maior de leis de criação na década de 2000, o que pode ter sido motivado, dentre outras possíveis razões, pelas medidas tomadas pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo visando à municipalização do ensino paulista (OLIVEIRA; GANZELI, 2001).

Das 15 (quinze) localidades que aprovaram leis de criação do sistema municipal de ensino, apenas os municípios de Americana, Campinas, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Monte Mor, Paulínia, Santa Bárbara D’Oeste e Valinhos atuam com supervisão própria. De outra maneira, Artur Nogueira, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Nova Odessa, Santo Antônio de Posse e Sumaré, embora tenham constituído seus sistemas próprios, permanecem subordinados às Diretorias Regionais de Ensino, órgão fiscalizador do Sistema Estadual de Educação (SEE).

Segundo pesquisa empreendida por Ganzeli et al. (2015, p. 137) junto aos secretários de educação dos municípios da RMC, “a existência de um sistema próprio resulta em maior autonomia, porém gera mais atribuições e implicações de ordem financeira, além do necessário desenvolvimento de recursos humanos capazes de lidar com os desafios do dia a dia”, o que justificaria a opção feita por alguns municípios da região em tela por não assumirem supervisão própria ou, até mesmo, não institucionalizarem seus respectivos sistemas de ensino, alternativa adotada por Holambra, Jaguariúna, Morungaba, Pedreira e Vinhedo.

Para o atendimento das crianças matriculadas nas diferentes etapas da educação básica obrigatória e garantia do direito à educação integral, conforme prevê a legislação, os governos municipais necessitam planejar políticas que assegurem um atendimento educacional de qualidade. Sendo assim, e em atendimento à Lei do PNE (2014-2024), os municípios da RMC elaboraram seus respectivos planos decenais de educação.

No Quadro 2 são apresentadas as leis municipais que aprovaram os Planos Municipais de Educação (PMEs), para o decênio 2015-2025, nos municípios que instituíram sistema próprio de ensino.

(24)

Quadro 2 - Relação de municípios da RMC e leis de aprovação do Plano Municipal de Educação

(2015-2025)

Município Lei do PME

Americana Lei n. 5.760, de 23 de junho de 2015

Artur Nogueira Lei n. 3.236, de 24 de junho de 2015

Campinas Lei n. 15.029 de 24 de junho de 2015

Cosmópolis Lei n. 3.866, de 05 de abril de 2017

Engenheiro Coelho Lei n. 966, de 19 de fevereiro de 2015

Hortolândia Lei n. 3.124, de 19 de junho de 2015

Indaiatuba Lei n. 6.459 de 24 de junho de 2015

Itatiba Lei n. 4.845, de 24 de julho de 2015

Monte Mor Lei n. 2.162, de 16 de junho de 2015

Nova Odessa Lei n. 2.965, de 15 de junho de 2015

Paulínia Lei n. 3444, de 24 de junho de 2015

Santa Bárbara D’Oeste Lei n. 3.737, de 24 de junho de 2015 Santo Antonio de Posse Lei n. 2.962 de 15 de julho de 2015

Sumaré Lei n. 5784, de 22 de junho de 2015

Valinhos Lei n. 5.141 de 23 de junho de 2015

Fonte: AUTORA, 2017.

Os dados do Quadro 2 revelam que os quinze municípios analisados atenderam ao disposto na legislação federal, elaborando e/ou reestruturando seus respectivos planos municipais de educação, em consonância com a Lei n. 13.005/2014. No entanto, a data de aprovação das leis de Cosmópolis, Itatiba e Santo Antônio de Posse excedeu o prazo de 24 de junho de 2015, previsto pela Lei Federal.

Tendo em vista a aprovação dos planos municipais de educação pelos municípios da RMC e considerando que tais documentos podem contribuir, significativamente, para a viabilização do direito à educação das crianças e jovens, este estudo busca responder à seguinte questão: como o direito à educação integral se configura nos planos de educação (2015-2025) dos municípios da Região Metropolitana de Campinas que instituíram sistema próprio de ensino?

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Saviani (1999, p. 131) afirma existir uma estreita relação entre sistema de ensino e planos de educação, pois “a opção por organizar os sistemas municipais de educação implica, a fortiori, a formulação de planos municipais de educação”. Nesse sentido, apresenta-se como objetivo geral desta pesquisa investigar a configuração do direito à educação integral nos documentos orientadores das políticas educacionais nos municípios da RMC que instituíram sistema próprio de ensino e que, por conseguinte, possuem maior autonomia para o planejamento de suas ações na área da educação.

A metodologia da pesquisa

O estudo intitulado “O direito à educação integral nos planos de educação (2015-2025) dos municípios da Região Metropolitana de Campinas” desenvolveu-se no âmbito do Laboratório de Gestão Educacional (LAGE), da Faculdade de Educação (FE), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Justifica-se pela relevância que o direito à educação integral assume para o exercício da cidadania no Estado Democrático de Direito, modelo de organização estatal no qual se inscreve o Estado brasileiro.

A opção por investigar o direito à educação integral nos planos de educação dos municípios da RMC, aprovados em consonância com o PNE (2014-2024), decorreu da participação da autora em pesquisa1 anteriormente desenvolvida

no âmbito do LAGE, fato este que poderia contribuir para a ampliação da capacidade de contextualização e de interpretação dos dados recolhidos nas fontes documentais.

O estudo ancorou-se em uma abordagem qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994) de pesquisa, apreendida “numa perspectiva que concebe o conhecimento como um processo socialmente construído pelos sujeitos nas suas interações cotidianas, enquanto atuam na realidade, transformando-a e sendo por ela transformados” (ANDRÉ, 2013, p. 97).

1 A pesquisa “Políticas Educacionais na Região Metropolitana de Campinas: regime de colaboração”

teve apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e foi desenvolvida no período de outubro de 2012 a setembro de 2014, sob a coordenação do Prof. Dr. Pedro Ganzeli, com a participação de 14 (quatorze) pesquisadores.

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Os procedimentos indicados para este trabalho iniciaram-se por uma revisão da literatura sobre o direito à educação, à educação integral e ao planejamento da educação no Brasil. A revisão empreendida teve o propósito de possibilitar uma visão abrangente sobre as referidas temáticas além da identificação do referencial teórico para a análise dos dados (THERRIEN; THERRIEN, 2004).

Sendo assim, para a investigação da configuração do direito à educação integral nos planos municipais, foram adotadas as quatro dimensões definidas por Katarina Tomaševski (2001), ex-relatora especial para o direito à educação no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), e que devem ser perseguidas pelo poder público para a efetivação desse direito, quais sejam: availability (disponibilidade), accessibility (acessibilidade), acceptability (admissibilidade) e

adaptability (adaptabilidade), dimensões estas apresentadas, detalhadamente, no

Capitulo 1 deste estudo.

Empregou-se, ainda, a análise de conteúdo como procedimento de análise dos documentos legais, visando obter, por meio da “descrição do conteúdo das mensagens [,] indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens” (BARDIN, 2016, p. 48, grifos do autor).

O procedimento metodológico adotado extrapola a descrição do conteúdo dos planos de educação e visa à interpretação dos dados contidos nos mesmos, por meio da produção de inferências. Esta, por sua vez, consiste na razão de ser da análise de conteúdo, conferindo “a esse procedimento relevância teórica, uma vez que implica pelo menos uma comparação, já que a informação puramente descritiva, sobre conteúdo, é de pequeno valor” (FRANCO, 2018, p. 32).

Segundo Bardin (2016), a análise de conteúdo organiza-se em três etapas: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados. Na pré-análise, por meio da leitura flutuante, o pesquisador estabelece o primeiro contato com os documentos e com as mensagens neles contidas, deixando-se impregnar por impressões e orientações. Na segunda etapa, a da exploração do material, a leitura torna-se mais precisa, permitindo o levantamento e o agrupamento das temáticas presentes nos documentos analisados. Por fim, tem-se a etapa de interpretação dos dados, por meio da produção de inferências, processo que implica em comparações com a abordagem teórica que orienta o estudo.

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Assim, o presente trabalho observou as prescrições metodológicas que são exigidas pela pesquisa, buscando uma interpretação dos dados à luz da teoria. Em vista disso, procurou-se compreender o processo histórico de conquista do direito humano à educação e suas diferentes concepções para, em seguida, analisar o conteúdo dos planos municipais em relação ao direito à educação integral.

Para se atingir o objetivo proposto, o trabalho foi organizado em quatro capítulos, além desta introdução e das reflexões finais. O primeiro capítulo, intitulado “O Estado Democrático de Direito e a educação integral como direito de cidadania”, discute a relevância do direito à educação integral para o exercício da cidadania, no âmbito do Estado Democrático de Direito. Apresenta, ainda, as dimensões do direito à educação integral que orientam a análise do conteúdo dos planos de educação, objeto deste estudo.

O segundo capítulo “A educação integral como política pública” analisa o conceito de política pública bem como a relação entre educação e planejamento educacional, processo este necessário à materialização das políticas educacionais. Apresenta-se uma revisão histórica dos planos de educação no Brasil bem como o tratamento dispensado por estes à educação integral. Por fim, tem-se a análise do direito à educação integral no PNE (2014-2024), à luz das dimensões apresentadas no primeiro capítulo do trabalho.

A gestão da educação municipal é o tema do terceiro capítulo no qual são analisados alguns dados dos municípios da RMC que instituíram sistema próprio de ensino. A caracterização municipal, os dados censitários relativos à oferta e manutenção do ensino, bem como a análise do direito à educação integral nas Leis Orgânicas Municipais constituem os elementos que dão o aporte necessário a essa discussão.

Por fim, o último capítulo denominado “O direito à educação integral nos planos de educação (2015-2025) dos municípios da RMC” apresenta a análise do direito à educação integral nos documentos de planejamento da educação municipal para o decênio (2015-2025), tendo como objetivo verificar se as obrigações do poder público, relativas a esse direito, foram previstas pelos entes subnacionais nos documentos norteadores das políticas da área.

Espera-se, no limite do trabalho, que a pesquisa empreendida possa contribuir para o debate acerca da necessária articulação entre o planejamento

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educacional e a garantia do direito à educação integral nos municípios da Região Metropolitana de Campinas.

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CAPÍTULO I - O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E A

EDUCAÇÃO INTEGRAL COMO DIREITO DE CIDADANIA

A análise da relação entre a temática da educação e o exercício da cidadania suscita a reflexão acerca de uma determinada concepção de educação, essencialmente aquela que objetiva a formação integral do ser humano bem como a discussão relativa à natureza e à intervenção do Estado no âmbito da sociedade brasileira, sociedade esta na qual se inscreve esse estudo. Nesta perspectiva, apresenta-se como objetivo geral deste capítulo analisar a relevância do direito à educação integral como condição inalienável para o exercício da cidadania, no âmbito do Estado Democrático de Direito.

Para tanto, o capítulo está organizado em duas seções. A primeira, denominada “Estado, cidadania e educação”, apresenta uma revisão do processo histórico da configuração do Estado Democrático de Direito, modelo de organização sob o qual se assenta o Estado brasileiro. Discute o conceito de cidadania e os seus elementos constitutivos, quais sejam, os direitos civis, políticos e sociais, sendo a educação não apenas um direito social, mas também condição para o exercício dos demais direitos. Sequencialmente, analisa o conteúdo do direito à educação enquanto um direito fundamental de natureza social, previsto em diferentes instrumentos internacionais de proteção dos direitos do homem e também nas normativas brasileiras.

A segunda seção, intitulada “O direito à educação integral no Estado Democrático de Direito”, dedica-se, inicialmente, à análise da concepção de educação integral derivada do texto constitucional de 1988, uma vez que este regula e ordena as relações políticas, sociais e econômicas da sociedade brasileira. Na sequência, aborda as concepções de educação integral que permearam a história da educação em nosso país, concepções estas fundamentadas em distintos projetos societários. Por fim, examina as legislações supranacionais buscando compreender a opção pela educação em tempo integral como um mecanismo para a garantia da educação integral.

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1.1 Estado, cidadania e educação

A democracia compreendida como “governo do povo, em contraposição ao governo de uns poucos” (BOBBIO, 2013, p. 31), supõe a participação ativa das pessoas nas decisões que dão forma e organizam o Estado ao qual pertencem. No âmbito do Estado Democrático de Direito, a participação ativa supõe o exercício dos direitos civis, políticos e sociais, os quais encerram o sentido do conceito de cidadania.

O direito à educação constitui-se em um direito social e também contém, em si, a base para a realização dos demais direitos do homem, uma vez que o acesso ao sistema escolar possibilita ao cidadão melhores condições para realizar e defender os outros direitos que lhe são inerentes.

Nesta perspectiva, propõe-se a análise dos elementos relacionados nesta reflexão introdutória, quais sejam: o Estado Democrático de Direito, a cidadania e o direito à educação, elementos estes que correspondem ao ideal de uma organização social justa e igualitária.

1.1.1 O Estado Democrático de Direito e a organização do Estado brasileiro

A Constituição Federal de 1988 estabelece, em seu Artigo 1º, que a República Federativa do Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, tendo como fundamentos a cidadania (inciso II), a dignidade da pessoa humana (inciso III), os valores sociais de trabalho e da livre iniciativa (inciso IV), o pluralismo político (inciso V) e a soberania popular (parágrafo único).

A concepção de Estado adotada pela Lei Maior reúne elementos tanto do Estado de Direito quanto do Estado Democrático, concepções estas que passamos a discutir, tendo em vista a pretensa necessidade de compreensão do modelo de Estado sob o qual se assenta a nossa Constituição.

Historicamente, é possível afirmar que a resignação do Estado ao direito decorreu das denominadas Revoluções Burguesas ocorridas na Europa ao longo dos séculos XVII e XVIII, orientadas contra o Estado absolutista e tendo como objetivo a conquista e a manutenção das liberdades individuais (SILVA, 2005).

Coelho (1993, p. 7) recorre às lições de Elias Diaz (1975) para afirmar que o Estado de Direito pode “ser caracterizado, em sua essência, como aquele

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Estado submetido ao Direito, aquele Estado cujo poder e atividades estão regulados e controlados pela lei, Direito e lei entendidos, nesse contexto, como expressão da vontade geral”. Assim, o Estado de Direito não se submete aos desígnios, arbitrários ou não, daquele que detém o poder, pelo contrário, os limites desta atuação encontram-se, previamente, estabelecidos no arcabouço legal que regulamenta e disciplina a sua organização.

Nesse cenário, assim circunstanciado, o Estado de Direito objetiva tanto a limitação dos poderes do Estado quanto o respeito às liberdades individuais. Esta perspectiva encontra-se no cerne da doutrina denominada de liberalismo, a qual compreende, além das limitações dos poderes do Estado, também o limite de suas funções (BOBBIO, 2013).

Segundo Sundfeld (2009), o absenteísmo estatal, observado no Estado de Direito, pode ser assim justificado: “era preciso que o Estado não interferisse nos negócios dos indivíduos, restringindo sua ação à garantia da ordem, da paz, da segurança. Em suma queria-se um Estado mínimo, com reduzidas funções, sem interferência na vida econômica” (SUNDFELD, 2009, p. 54, grifos do autor).

Em outras palavras, o Estado de Direto, de cunho liberal, portanto, caracteriza-se pelo exercício do poder no âmbito de um ordenamento jurídico, o qual delimita a competência e orienta as decisões tomadas, ou seja, um Estado em que o poder público é regulado pelas normas gerais ou constitucionais, devendo ser exercido na esfera das leis que o regulam (BOBBIO, 2013). Em vista disso, os mecanismos constitucionais próprios desta concepção de Estado têm como objetivo proteger o cidadão dos abusos da autoridade e configuram-se, portanto, como garantia de liberdade individual, haja vista a abstenção do poder público em relação aos direitos dos cidadãos.

A liberdade individual experimentada no Estado de Direito deflagrou um cenário de desigualdades sociais no qual o “liberalismo, na estreiteza de sua formulação habitual, não pode resolver o problema, essencial de ordem econômica das vastas camadas proletárias da sociedade, e por isso entrou irremediavelmente em crise” (BONAVIDES, 2007, p. 188). A classe trabalhadora, sem meios para usufruir das liberdades asseguradas pelo Estado, passou a se organizar e a criticar os ideais liberais, defendendo os direitos coletivos e sociais da população, os quais possibilitariam uma vida digna aos trabalhadores.

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Ao final da Primeira Grande Guerra (1914-1919), em um contexto histórico de luta contra as desigualdades, emerge um novo conceito de Estado, o Estado Social de Direito ou de Bem-Estar Social, “no qual a expressão social significa o propósito de corrigir o individualismo clássico de caráter liberal pela afirmação dos direitos sociais e a consequente realização da Justiça Social” (COELHO, 1993, p. 11, grifos do autor).

Depreende-se desta afirmação que o Estado Social de Direito se constitui, pois, em uma forma de superação do caráter individualista do Estado Liberal, por meio da intervenção estatal e da atenção aos denominados direitos sociais, podendo ser definido nos seguintes termos:

O Estado social, por sua própria natureza, é um Estado intervencionista, que requer sempre a presença militante do poder político nas esferas sociais, onde cresceu a dependência do indivíduo, pela impossibilidade em que este se acha, perante fatores alheios à sua vontade, de prover certas necessidades existenciais mínimas (BONAVIDES, 2007, p. 200).

Ocorre que a ampliação dos poderes do Estado bem como a sua necessária intervenção em diversas áreas, sobretudo no que diz respeito às questões econômicas relativas à distribuição da riqueza e, por conseguinte, à igualdade material entre os homens, coadunou-se com uma estrutura política concentradora de poder, autocrática e sem legitimidade popular (SILVA, 2005), desencadeando o colapso do Estado Social de Direito.

Assim, após a Segunda Grande Guerra (1939-1945), objetivando deter o poder dos governos que, adotando a forma de Estado Social de Direito, passaram a violar as liberdades individuais e impediam a participação popular nas decisões políticas, deu-se a consolidação do Estado Democrático de Direito, fundamentado nos pilares da democracia e dos direitos e garantias fundamentais (LA BRADBURY, 2006).

Enquanto no Estado Liberal de Direito o homem experimentou a fase de declaração dos direitos individuais e, no Estado Social de Direito, a fase da salvaguarda dos direitos sociais, no Estado Democrático de Direito, vivencia-se a fase de concretização dos direitos fraternais mediante a formação de uma sociedade plural, com respeito às diferenças de credo, sexo, cor e religião (LA BRADBURY, 2006).

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A concepção de Estado Democrático de Direito incorpora, pois, tanto os princípios do Estado de Direito, que compreendem o exercício dos direitos individuais e sociais no âmbito de uma determinada legislação, quanto as exigências de democratização da sociedade, buscando torná-la pluralista e fundamentada na harmonia do convívio social (FERRAZ JUNIOR, 1997).

Desse modo, ao adotar o Estado Democrático de Direito para a organização do Estado brasileiro, a Constituição de 1988 imputa ao poder público a responsabilidade em prover meios para que os direitos humanos, todos eles, sejam garantidos. Para além da proteção ao indivíduo no gozo de suas liberdades, cabe ao Estado a responsabilidade por planejar e implementar políticas públicas ensejando a efetivação dos direitos sociais, com vistas a atingir a igualdade entre os homens e, por conseguinte, a justiça social.

Relevante destacar, ainda, que a democracia se fundamenta no princípio da soberania popular, podendo ser definida, como governo do povo, em contraposição ao governo de uns poucos, supondo a participação de um maior número de pessoas na elaboração das leis, tendo em vista a garantia dos direitos individuais e sociais (BOBBIO, 2013). Desse modo, a participação plena do indivíduo no processo de elaboração e constituição do Estado Democrático de Direito supõe o exercício da cidadania, conceito este que passamos a discutir no próximo item desta seção.

1.1.2 O princípio da cidadania no Estado Democrático de Direito

A cidadania constitui-se em um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito conforme prevê o inciso II do Artigo 1º da CF de 1988. Embora previsto legalmente, o conceito em destaque carece de definição, tendo em vista sua abrangência e os distintos significados que lhe advêm, conforme adverte Oliveira (1995, p. 37):

O termo "cidadania" envolve, pelo menos, dois significados que o tornam um conceito particularmente complexo. De um lado, e este é seu significado histórico, aparece identificado com a ideia de "nação", com os direitos dos nacionais; de outro, com a ideia de direitos que qualquer pessoa tem ao viver em determinada sociedade.

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Etimologicamente, o vocábulo refere-se, tanto em sua matriz latina (civitas) quanto na grega (polis), à participação do indivíduo na organização da cidade. Assim, na Antiguidade, eram considerados cidadãos apenas os detentores de direitos políticos que participavam do funcionamento das denominadas Cidades-Estado.

Com a decadência e o desaparecimento da civilização greco-romana, o conceito de cidadania adquiriu novos contornos e, no mundo ocidental, passa a se relacionar à perspectiva dos direitos humanos. Assim, em Arendt (1989), a cidadania é definida pela expressão “direito a ter direitos”, constituindo-se em direito humano fundamental do qual derivam todos os demais direitos.

Segundo Palma Filho (1998), o conceito de cidadania proposto por Arendt (1989) possui uma abrangência universal, extrapolando a pertença a um determinado Estado. Assim, embora se constitua em um direito fundamental do ser humano, a cidadania é um atributo que precisa ser conquistado por meio de um fazer coletivo, não se restringindo a uma qualidade individual ou a um privilégio.

A cidadania caracteriza-se, pois, como um constructo do convívio humano, convívio este que se dá nas interações sociais ocorridas em um determinado espaço público (LAFER, 1997). Assim, é possível afirmar que a cidadania, e consequentemente o processo de construção dos direitos humanos, adquire características próprias a depender do espaço e do tempo no qual se inscreve.

No mundo ocidental, costuma-se desdobrar o conceito de cidadania em três elementos distintos: os direitos civis, os políticos e os sociais. Thomas H. Marshall (1967), em seu clássico estudo intitulado “Cidadania, classe social e

status”, ao analisar o processo de conquista dos direitos humanos na sociedade

inglesa, assim os define:

O elemento civil é composto dos direitos necessários à liberdade individual – liberdade de ir e vir, liberdade de imprensa, pensamento e fé, o direito à propriedade e de concluir contratos válidos e o direito à justiça. (...) Por

elemento político se deve entender o direito de participar no exercício do

poder político, como um membro de um organismo investido de autoridade política ou como um eleitor dos membros de tal organismo. (...) O elemento

social se refere a tudo o que vai desde o direito a um mínimo de bem-estar

econômico e segurança ao direito de participar, por completo, na herança social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões que prevalecem na sociedade (MARSHALL, 1967, p. 63, grifos nossos).

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Apesar do caráter didático e linear que permeia esta classificação, o processo de construção e consolidação dos direitos humanos na sociedade inglesa ocorreu de forma lenta e gradual, podendo-se atribuir a cada um dos elementos constituintes do conceito em discussão um período de formação diferente. Assim, no século XVIII, consolidaram-se os direitos civis, no século XIX, os direitos políticos e, por fim, no século XX, os direitos sociais (MARSHALL, 1967).

Da concepção de cidadania desenvolvida por Marshall (1967), também denominada de cidadania social, depreende-se que os direitos sociais representam não apenas um dos elementos do conteúdo da cidadania, mas o princípio garantidor de acesso e de desenvolvimento dos demais elementos, bem como o instrumento capaz de assegurar um status mínimo de igualdade entre os indivíduos.

Ancorado nos estudos de Marshall (1967), Carvalho (2012) analisou o processo de conquista dos direitos humanos no Estado brasileiro e verificou que o caminho percorrido no Brasil foi inverso ao da Inglaterra. Nas palavras do autor:

Aqui, primeiro vieram os direitos sociais, implantados em período de supressão dos direitos políticos e de redução dos direitos civis por um ditador que se tornou popular. Depois vieram os direitos políticos, de maneira também bizarra. A maior expansão do direito do voto deu-se em outro período ditatorial, em que os órgãos de representação política foram transformados em peça decorativa do regime. Finalmente, ainda hoje muitos direitos civis, a base da sequência de Marshall, continuam inacessíveis à maioria da população (CARVALHO, 2012, p. 219).

Os dois percursos relativos à expansão e consolidação dos direitos humanos em questão, quer seja na sociedade inglesa, quer seja no Brasil, corroboram a concepção historicista defendida por Bobbio (2004), segundo a qual, os direitos do homem são históricos, nascidos em determinadas circunstâncias e não todos de uma vez e nem de uma vez por todas, e para tanto, faz-se necessário encontrar meios para que os direitos do homem sejam construídos e reconstruídos, cotidianamente, no âmbito de toda e qualquer sociedade. A via da educação constitui-se, pois, em um importante mecanismo para a viabilização deste desafio.

Marshall (1967) reconhece a educação como um direito social relacionado ao exercício da cidadania. Nas palavras do autor:

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A educação das crianças está diretamente relacionada com a cidadania, e, quando o Estado garante que todas as crianças serão educadas, este tem em mente sem sombra de dúvida, as exigências e a natureza da cidadania. Está tentando estimular o desenvolvimento de cidadãos em formação. O direito à educação é um direito social de cidadania genuíno porque o objetivo da educação durante a infância é moldar o adulto em perspectiva. Basicamente, deveria ser considerado não como o direito da criança frequentar a escola, mas como o direito do cidadão adulto ter sido educado. (...) A educação é um pré-requisito necessário da liberdade civil (MARSHALL, 1967, p. 73).

Desta maneira, para além de se constituir em um direito social, o direito à educação configura-se como condição necessária para o exercício dos demais direitos e, por conseguinte, da cidadania. Nesta perspectiva, passamos a analisar, sequencialmente, a fundamentalidade desse direito, previsto em documentos internacionais de proteção dos direitos do homem e reconhecido pelo Estado brasileiro.

1.1.3 A educação como direito humano fundamental de natureza social

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), aprovada em 10 de dezembro de 1948, pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU)2, é considerada um marco na história da humanidade, pois representa a

retomada do processo de reconstrução dos direitos humanos, brutalmente violados durante o período da Segunda Guerra Mundial3.

Norberto Bobbio (2004, p. 18) assinala a importância desse documento para a humanidade, tendo em vista o que ele denomina de “consensus omnium

gentium”, ou seja, o assentimento universal de um sistema de princípios

fundamentais de conduta humana. Em suas palavras,

2 De acordo com o sítio oficial da Organização das Nações Unidas no Brasil, “a Assembleia Geral da

Organização das Nações Unidas (ONU) é o principal órgão deliberativo da ONU no qual os Estados-Membros da Organização (193 países) se reúnem para discutir os assuntos que afetam a vida de todos os habitantes do planeta”, tais como, paz e segurança, questões de orçamento, desarmamento, cooperação internacional, direitos humanos, dentre outros. Disponível em: https://nacoesunidas.org/conheca/como-funciona/#verticalTab5. Acesso em: 20 out. 2018.

3 Flávia Piovesan (2006, p. 13) afirma que o período da Segunda Guerra Mundial (1939-1945),

denominado pela autora de “era Hitler”, foi marcado “pela lógica da destruição e da descartabilidade da pessoa humana, que resultou no envio de 18 milhões de pessoas a campos de concentração, com a morte de 11 milhões, sendo 6 milhões de judeus, além de comunistas, homossexuais, ciganos... O legado do nazismo foi condicionar a titularidade de direitos, ou seja, a condição de sujeito de direitos, ao pertencimento a determinada raça – a raça pura ariana”.

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a Declaração Universal representa um fato novo na história, na medida em que, pela primeira vez, um sistema de princípios fundamentais da conduta humana foi livre e expressamente aceito, através de seus respectivos governos, pela maioria dos homens que vive na Terra (BOBBIO, 2004, p. 18).

Com a aprovação da Declaração de 1948, inicia-se, pois, o desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos, por meio da adoção de diversos tratados internacionais direcionados à salvaguarda dos direitos fundamentais (PIOVESAN, 2006). Deste modo, utilizamos como marco de análise do direito à educação a aprovação da Declaração Universal de 1948 e os documentos que dela decorreram.

Ao final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando o mundo estava em ruínas, veio à cena, no âmbito da Comissão de Direitos Humanos da ONU, a discussão acerca da importância da educação como mecanismo indispensável para a reconstrução da humanidade (CLAUDE, 2005), importância esta consubstanciada pela Assembleia Geral da ONU na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH).

Em seu preâmbulo, a Declaração de 1948 reconheceu a importância do direito à educação para a promoção e respeito aos demais direitos e liberdades, assim:

a Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade tendo sempre em mente esta Declaração, esforce-se, por meio do ensino

e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e,

pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Países-Membros quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição (ONU, 1948, grifos nossos).

Da mesma forma, o Artigo 26 do documento assegurou o direito à educação imputando-lhe três objetivos específicos: a) o pleno desenvolvimento da personalidade humana e o fortalecimento do respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais; b) a promoção da compreensão, da tolerância e da amizade entre todas as nações e grupos raciais e religiosos; e c) incentivo às atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.

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Ao estabelecer “o pleno desenvolvimento da pessoa humana” como um dos objetivos do direito à educação, a DUDH reconheceu a importância de uma concepção ampliada de formação do indivíduo com vistas à efetivação dos demais direitos e liberdades fundamentais. Segundo Claude (2005), embora abstrata, a noção de desenvolvimento pleno da personalidade percorreu toda a Declaração, evidenciando a importância desta concepção de educação para a salvaguarda dos direitos fundamentais e, por conseguinte, para a vida em sociedade, principal contexto onde o desenvolvimento da personalidade humana pode ocorrer, consubstanciando-se, assim, no efetivo exercício da cidadania.

Decorre da Declaração de 1948 a formação de um sistema normativo internacional de proteção dos direitos humanos, constituído por instrumentos de alcance geral e de alcance específico. Assim, no âmbito do sistema geral de proteção, encontram-se os documentos endereçados à proteção de toda e qualquer pessoa, indistintamente. No sistema especial de proteção, por sua vez, encontram-se os documentos direcionados a grupos específicos, tais como as crianças, os grupos étnicos, as mulheres, dentre outros (PIOVESAN, 2017).

Constituem-se em documentos de alcance geral, os Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos e de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, aprovados em 1966. De natureza e alcance específicos, têm-se as convenções internacionais que visam responder às demandas de violações dos direitos de grupos determinados (PIOVESAN, 2017).

Em se tratando do direito à educação, são em número de três as principais disposições internacionais ratificadas pelo Brasil e que visam protegê-lo sendo, duas de alcance específico e uma de alcance geral. De natureza específica, têm-se a Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino (1960) e a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989). No âmbito das disposições de alcance geral, encontra-se o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966).

A Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino foi aprovada pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, em sua 11ª sessão, ocorrida em Paris, entre os dias 14 de novembro e 15 de dezembro de 1960, entrando em vigor, somente em 22 de maio de 1962. No Brasil, a aprovação deste documento deu-se em 6 de setembro de 1968, por meio do Decreto n. 63.223.

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O texto da Convenção compõe-se por 19 (dezenove) artigos, os quais versaram sobre diferentes aspectos relativos à discriminação no ensino e que, portanto, devem ser eliminados pelos Estados membros da ONU. No Artigo 5 da Convenção de 1960, encontramos elementos relativos à educação, conforme excerto extraído deste documento:

§1. Os estados Partes na presente Convenção concordam:

a) Em que a educação atender ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e reforçar o respeito aos direitos humanos e das liberdades fundamentais, e que deve aumentar a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, e o desenvolvimento das atividades nas nações Unidas para a manutenção da paz; (ONU, 1960).

Conforme observamos, o trecho destacado recuperou o texto da Declaração de 1948 e da mesma forma reiterou como um dos objetivos da educação “o pleno desenvolvimento da personalidade humana”. Da mesma maneira, merece destaque a indicação de que o pleno desenvolvimento da pessoa se constitui em mecanismo para a consecução dos demais direitos do homem, ou seja, como condição para o exercício da cidadania.

A segunda disposição denominada “Convenção sobre os Direitos da Criança” foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989, e promulgada pelo Brasil, em 21 de novembro de 1990, pelo Decreto n. 99.710, constituindo-se em um dos documentos mais importantes de direitos humanos, proclamado pela comunidade internacional. Em seus 54 (cinquenta e quatro) artigos, recuperou aspectos relativos à necessidade de tratamento especial à criança e, consequentemente, à salvaguarda de seus direitos, dentre eles o direito à educação, o qual foi aludido em dois momentos específicos, no Artigo 28 e no Artigo 29, recebendo tratamento distinto em cada um deles.

No Artigo 28 foram explicitadas as obrigações dos Estados relativas à garantia do direito à educação, bem como as tratativas relacionadas à disciplina escolar e aos acordos de cooperação para a efetivação desse direito, como se constata a seguir:

Referências

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