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CAPÍTULO IV O DIREITO À EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS PLANOS DE

4.2 Os Planos Municipais de Educação (2015-2025) e o direito à educação

4.2.1 Disponibilidade

4.2.1.4 Gestão e financiamento da educação

A temática “gestão e financiamento do ensino” reuniu 342 (trezentas e quarenta e duas) metas e/ou estratégias, as quais, em sua maioria, relacionaram-se aos mecanismos para a consolidação da gestão democrática da escola pública e para o controle social dos recursos públicos da educação, assuntos aos quais nos dedicaremos neste item do capítulo.

A gestão democrática do ensino público foi prevista, no Artigo 206 da CF de 1988, como um dos princípios que devem balizar a educação nacional. O mesmo princípio comparece no Artigo 14 da LDBEN de 1996, incumbindo os sistemas de

ensino a estabelecerem as normas de gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e com a participação dos sujeitos envolvidos no processo educacional, tanto na construção do projeto político pedagógico da escola quanto em conselhos escolares ou equivalentes (BRASIL, 1996).

O PNE (2014-2024) tratou a gestão democrática da educação nos seguintes termos:

Meta 19: assegurar condições, no prazo de dois anos, para a efetivação da gestão democrática da educação, associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade escolar, no âmbito das escolas públicas, prevendo recursos e apoio técnico da União para tanto (BRASIL, 2014).

Segundo Cury (2002, p. 173), “a gestão democrática da educação é, ao mesmo tempo, transparência e impessoalidade, autonomia e participação, liderança e trabalho coletivo, representatividade e competência”, capacidades estas desenvolvidas nas relações sociais que o indivíduo possa estabelecer, em diferentes espaços, dentre eles, a unidade escolar.

Dito de outro modo, “respeitado o caráter específico da instituição escola como lugar de ensino/aprendizagem” (CURY, 2002, p. 173), a unidade escolar constitui-se em local privilegiado para a construção da gestão democrática desde que sejam ampliados os espaços para a “participação e a deliberação pública, além do crescimento dos indivíduos como cidadãos e do crescimento da sociedade enquanto sociedade democrática”, o que, em última instância, podemos compreender como uma das instâncias de materialização do direito à educação integral.

Nos PMEs (2015-2025) analisados, a gestão democrática da educação foi assunto abordado em todos os documentos, variando na forma, mais ou menos explícita, e também no conteúdo. Em linhas gerais, os legisladores municipais utilizaram o texto da meta 19 do PNE (2014-2024) como parâmetro para a redação dos planos municipais, sendo que a elocução “assegurar condições [...] para a efetivação da gestão democrática” (BRASIL, 2014) foi utilizada em 7 (sete) documentos: Artur Nogueira (2015), Engenheiro Coelho (2015), Hortolândia (2015), Monte Mor (2015), Nova Odessa (2015), Santa Bárbara d’Oeste (2015) e Santo Antônio de Posse (2015).

Campinas (2015) também se apropria do texto nacional, no entanto, a gestão é duplamente qualificada: “Assegurar condições, no prazo de 2 (dois) anos, para efetivação da gestão democrática participativa da educação, no âmbito das escolas públicas e conveniadas, prevendo recursos e apoio técnico do poder público” (CAMPINAS, 2015, grifos nossos).

A redundância de termos observada no PME (2015) de Campinas indica a preocupação do legislador em detalhar o sentido da gestão democrática na educação. A nosso ver a dupla adjetivação supõe a necessidade de que sejam, efetivamente, incorporados nas instituições educacionais mecanismos de participação popular, pois, de outra maneira, corre-se o risco de que decisões arbitrárias sejam tomadas por aqueles gestores com perfis menos democráticos.

Como uma das estratégias voltadas à efetivação da gestão democrática, os PMEs (2015-2025) apontam a necessidade de implementação e fortalecimento dos órgãos colegiados, quais sejam, os grêmios estudantis, as associações de pais e mestres, além do fomento e da articulação dos gestores com os conselhos de educação. Faz-se necessário ressaltar que os diferentes órgãos colegiados se constituem em instâncias auxiliares da gestão escolar e devem atuar visando sempre o bem comum da comunidade educativa.

A gestão dos recursos financeiros da escola foi uma das estratégias mencionadas para viabilizar a gestão democrática da educação municipal em 5 (cinco) dos 15 (quinze) documentos analisados (Americana, Campinas, Hortolândia, Indaiatuba e Sumaré), nos quais encontra-se previsto:

Apoiar técnica e financeiramente a gestão escolar mediante transferência direta de recursos financeiros municipais e demais recursos à escola, garantindo a participação da comunidade escolar no planejamento e na aplicação dos recursos, visando à ampliação da transparência e ao efetivo desenvolvimento da gestão democrática (CAMPINAS, 2015).

Observa-se que alguns documentos ao fazerem menção à gestão dos recursos financeiros não explicitaram a transferência direta de recursos às escolas, o que nos leva a inferir que tais fundos são administrados pelo órgão central da educação no município, ou seja, pela Secretaria Municipal de Educação. Do nosso ponto de vista, esta perspectiva enfraquece a gestão democrática da educação pública uma vez que a participação direta da comunidade educativa na tomada de decisões relativas à utilização dos recursos financeiros é inviabilizada pelo

distanciamento do gestor da educação municipal da realidade na qual serão empregados os recursos.

No que diz respeito ao financiamento da educação, de modo geral, as metas e/ou estratégias previstas nos PMEs (2015-2025) não avançaram em relação aos percentuais estabelecidos em normativas anteriores, o que pode ser observado no PME de Artur Nogueira (2015) onde se lê: “garantir investimento público em Educação Pública de forma a atingir no mínimo o patamar de 25% de acordo com a legislação vigente”.

Hortolândia (2015) propôs “destinar no mínimo 25% de recursos próprios do Município, na Educação, de acordo com as modalidades de ensino da Rede Municipal” (grifos nossos). A nosso ver, esta proposta vai de encontro ao preceito constitucional ao não fazer alusão aos recursos provenientes das transferências recebidas pelo município.

Nova Odessa (2015) propõe “manter o investimento na educação municipal em no mínimo 26% tendo por base o crescimento dos repasses públicos resultantes de impostos, inclusive o proveniente de transferências para manutenção e desenvolvimento do ensino público”. Chamou-nos a atenção o percentual estabelecido, 1% acima do limite mínimo obrigatório, denotando um possível equívoco na redação do texto do PME.

Santo Antônio de Posse (2015) propõe “ampliar o investimento em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 28% das receitas mencionadas no artigo 212 da Constituição Federal ao final do decênio”. A ampliação do investimento em educação, do ponto de vista da garantia desse direito, apresenta-se como medida necessária, no entanto, para que a referida proposta seja efetivada, faz-se necessário que tal parâmetro seja incorporado na Lei Orgânica Municipal. Cabe salientar, ainda, que o patamar de 28% estipulado no Plano corresponde ao mínimo a ser atingido, não se configurando, portanto, em um teto para os gastos com a educação.

Visando garantir a execução das metas e/ou estratégias do plano municipal, Sumaré (2015) propôs expandir “em 0,5% (meio por cento), a cada dois anos, até o final da vigência do PME, independente da demanda, vetada a diminuição dos recursos”, o investimento mínimo em educação. É fato que se não forem previstos recursos, os planos municipais talvez nem saiam do papel, no entanto, concordamos com Davies (2016, p. 317):

[...] a questão central não é só aumentar recursos, mas também e sobretudo garantir que eles sejam aplicados pelo menos nos fins legalmente devidos, e não desviados pela corrupção e desperdício, como é tão comum, algo que não depende de plano de educação, mas de transparência por parte dos governos e sobretudo pelo controle social (em particular dos educadores) sobre a aplicação das verbas.

Nesta perspectiva, para que os recursos destinados à educação não sejam desperdiçados, há que serem envidados todos os esforços para o fortalecimento da gestão democrática da educação pública, de modo que o controle social possa ser realizado em sua plenitude, diminuindo, assim, seu caráter meramente formal.