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Considerações históricas e interpretativas sobre a serenata La Pace Fra la Virtù e la Bellezza, de David Perez

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Academic year: 2021

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Universidade de Aveiro Ano 2020

Departamento de Comunicação e Arte

CHARLES

BRUNO

ROUSSIN

CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS E

INTERPRETATIVAS SOBRE A SERENATA

LA PACE FRA LA VIRTÙ E LA BELLEZZA,

DE DAVID PEREZ.

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Universidade de Aveiro Ano 2020

Departamento de Comunicação e Arte

CHARLES

BRUNO

ROUSSIN

CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS E

INTERPRETATIVAS SOBRE A SERENATA

LA PACE FRA LA VIRTÙ E LA BELLEZZA,

DE DAVID PEREZ.

Tese apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Música, ramo de Direção de Orquestra, realizada sob a orientação científica do Doutor Vasco Manuel Paiva de Abreu Trigo de Negreiros, Professor Auxiliar do Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro.

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Dedico este trabalho à minha esposa Patricia, companheira inseparável em todos os passos desta jornada.

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o júri

presidente Doutor João Manuel Nunes Torrão

Professor Catedrático – Universidade de Aveiro

Doutor Jorge Manuel da Matta Silva Santos Professor Adjunto Jubilado – Universidade Nova de Lisboa

Doutora Cristina Isabel Videira Fernandes Investigadora Integrada – Universidade Nova de Lisboa

Doutor Pedro Lopes e Castro

Professor Adjuto Convidado – Escola Superior de Música de Lisboa

Doutor António José Vassalo Neves Lourenço Professor Auxiliar – Universidade de Aveiro

Doutor Vasco Manuel Paiva de Abreu Trigo de Negreiro (orientador) Professor Auxiliar – Universidade de Aveiro

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agradecimentos Ao orientador deste trabalho, Doutor Vasco Negreiros, por dividir comigo a sua paixão e o seu respeito pela Música, e por seu inestimável apoio em todas as fases dessa pesquisa.

Aos cantores Carolina Andrade, Carolina Prates, Ivo Magalhães, Luísa Tinoco, Madalena d’Oliveira Martins, Mariana Caldeira e Mariana Pinto da Silva, alunos do Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro, que não pouparam esforços para dar voz “celestial” aos personagens de Metastasio e Perez.

À Professora Isabel Alcobia, por coordenar e orientar esses alunos, insuflando-lhes o entusiasmo que dá vida à prática artística.

À Orquestra Filarmonia das Beiras e ao seu diretor, o Maestro António Vassalo Lourenço, por possibilitaram a performance de La Pace fra la Virtù e la Bellezza neste doutoramento. Não há como dimensionar o quanto sou devedor aos integrantes dessa orquestra por suas considerações e sugestões.

Ao Doutor Rodrigo Teodoro de Paula, pelo auxílio prestado durante a pesquisa documental.

Ao colega de doutoramento Belquior Guerrero, pela oportunidade de crescermos juntos nesta etapa acadêmica, dividindo as dúvidas, as descobertas, os acertos e os erros deste processo.

Aos colegas músicos, Rui Gama e Osvaldo Ferreira, por possibilitarem e compartilharem experiências musicais tão significativas no período em que estive em Portugal.

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palavras-chave Serenata, La Pace fra la Virtù e la Bellezza, David Perez, direção orquestral, performance musical.

resumo O foco desta pesquisa é a serenata La Pace fra la Virtù e la Bellezza, escrita em 1777 pelo compositor napolitano David Perez sobre libreto de Pietro Metastasio, e destinada às celebrações do aniversário da rainha de Portugal, D. Maria I. Nela são discutidas as caracterísitcas do gênero serenata e a sua presença em Portugal no século XVIII, assim como as condições que propiciaram a gênese do texto e da música da obra estudada.

Para além da pesquisa histórica, esta pesquisa procurou descobrir e superar os desafios que se apresentam para a performance desta obra no que se refere à prática da Direção. Para sustentar teoricamente a abordagem interpretativa, são discutidos os aspectos construtivos e expressivos da escrita de David Perez e relacionados, na medida do possível, a práticas interpretativas encontradas em tratados da época de sua composição.

Por fim, são apresentados os critérios a partir dos quais foi elaborada uma edição prática da obra.

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keywords Serenata, La Pace fra la Virtù e la Bellezza, David Perez, orchestral conducting, musical performance.

abstract The focus of this research is the serenata La Pace fra la Virtù e la Bellezza, written in 1777 by the Neapolitan composer David Perez on Pietro Metastasio's libretto, and intended for the birthday’s celebrations of Maria I, Queen of Portugal. It discusses the characteristics of the serenata genre and its presence in Portugal in the eighteenth century, as well as the conditions that provided the genesis of the text and music of the studied work.

In addition to the historical research, this project sought to discover and overcome the challenges that are presented for the performance of this work regarding the practice of Conducting. To theoretically support the interpretative approach, the constructive and expressive aspects of the composer's writing are discussed, and as far as possible related to the interpretative practices found in treatises of the time of its composition.

Finally, the criteria that sustained the practical edition of the work, which made its study and performance possible, are presented.

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ÍNDICE

VOLUME I

Abreviaturas e convenções...xix Lista de figuras...xxi Lista de tabelas...xxiii Lista de exemplos...xxv INTRODUÇÃO...1

1 A SERENATA E SUA PRESENÇA EM PORTUGAL NO SÉCULO XVIII...7

1.1 A serenata e sua dupla natureza...7

1.2 O aparecimento e a disseminação da serenata...15

1.3 A introdução da música dramática e a presença da serenata em Portugal...19

2 METASTASIO E O LIBRETO DE LA PACE FRA LA VIRTÙ E LA BELLEZZA...29

2.1 Pietro Metastasio – dados biográficos...29

2.2 A gênese do libreto de La Pace fra la Virtù e la Bellezza...34

2.3 O enredo da obra...36

2.4 Uma possível visão metastasiana sobre a Virtude e a Beleza...39

2.5 A estrutura do libreto...41

2.6 Produções musicais sobre o libreto de La Pace fra la Virtù e la Bellezza...42

2.7 Revisão e tradução...46

3 DAVID PEREZ E A SERENATTA DOS ANNOS DA RAYNHA...49

3.1 David Perez – dados biográficos...50

3.2 A ascensão de D. Maria I ao trono português...58

3.3 As performances de La Pace fra la Virtù e la Bellezza no reinado de D. Maria I...61

3.4 As fontes da música de La Pace fra la Virtù e la Bellezza, de David Perez...75

3.5 Metodologia editorial empregada na edição de La Pace fra la Virtù e la Bellezza...79

4 A MÚSICA DE DAVID PEREZ PARA LA PACE FRA LA VIRTÙ E LA BELLEZZA...95

4.1 A utilização do libreto e a organização da obra...95

4.2 Vozes e instrumentos utilizados...97

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4.4 Sinfonia...106

4.5 Os recitativos...112

4.5.1 [Recitativi accompagnato] Venere (número 9)...115

4.5.2 Recitativo [accompagnato] Pallade (número 12)...116

4.5.3 [Recitativo accompagnato] Apollo (número 14)...118

4.5.4 [Recitativo accompagnato] Venere e Pallade (número 19a)...119

4.5.5 [Recitativo accompagnato] Venere, Pallade e Amore (número 22a)...120

4.6 As árias e o dueto...120

4.6.1 Aria Venere [Io paventar?, número 2]...124

4.6.2 Aria Apollo [Se divise sì belle splendete, número 5]...126

4.6.3 Aria Amore [Non è ver, número 7]...127

4.6.4 Aria Venere [Quel suo real sembiante, número 10]...129

4.6.5 Aria Pallade [La meritata palma, número 13]...131

4.6.6 Aria Apollo [Così fra doppio vento, número 15]...134

4.6.7 Aria Marte [D’ogni cor, d’ogni pensiero, número 17]...136

4.6.8 Duetto Venere e Pallade [Odi l’aura che dolce sospira, número 20]...139

4.6.9 Aria Amore [Cieco ciascun mi crede, número 23]...141

4.6.10 Aria Venere [Sublime si vegga, número 25]...143

4.7 O Coro [Tutto il Ciel discenda raccolto, número 27] ...145

5 QUESTÕES DE PERFORMANCE...149

5.1 Diapasão...151

5.2 Tamanho da orquestra e suas proporções ...154

5.3 A constituição do baixo continuo ... 155

5.4 Andamento...156

5.5 Dinâmica...159

5.6 Articulação...168

5.7 Vibrato...170

5.8 Ornamentação...171

5.9 A performance dos recitativi secchi...176

5.10 A direção dos recitativi accompagnati... 180

CONSIDERAÇÕES FINAIS...183

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xvii

VOLUME II – Anexos

Anexo I – La Pace fra la Virtù e la Bellezza – Libreto e tradução

Anexo II – La Pace fra la Virtù e la Bellezza – Partitura

Anexo III – La Pace fra la Virtù e la Bellezza – Comentário Crítico

Anexo IV – Notas de programa e material de divulgação

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ABREVIATURAS E CONVENÇÕES

Abreviatura Termo por extenso Tradução para o português

(quando aplicável)

Am. Amore Amor

Ap. Apollo Apolo

B., [B.] Basso, Bassi Baixo, Baixos

c. compasso, compassos ---

Cb. Contrabasso, Contrabassi Contrabaixo, Contrabaixos

Cem. Cembalo Cravo

Cont. Continuo Baixo contínuo

Cor. Corno, Corni Trompa, Trompas

Cor. I Corno I Trompa I

Cor. I, II Corno I, [Corno] II Trompa I, [Trompa] II

Cor. II Corno II Trompa II

Fg. Fagotto Fagote

Fl. Flauto, Flauti Flauta, Flautas

Fl. I Flauto I Flauta I

Fl. I, II Flauto I, [Flauto] II Flauta I, [Flauta] II

Fl. II Flauto II Flauta II

LPVB La Pace fra la Virtù e la Bellezza A Paz entre a Virtude e a Beleza

M. Marte Marte

Ob. Oboe, Oboi Oboé, Oboés

Ob. I Oboe I Oboé I

Ob. I, II Oboe I, [Oboé] II Oboé I, [Oboé] II

Ob. II Oboe II Oboé II

OFB Orquestra Filarmonia das Beiras ---

P. Pallade Palas

Tb. Tromba, Trombe Trompete, Trompetes

Tb. I Tromba I Trompete I

Tb. I, II Tromba I, [Tromba] II Trompete I, [Trompete] II

Tb. II Tromba II Trompete II

V. Venere Vênus

Vc. Violoncello, Violoncelli Violoncelo, Violoncelos

Viol. Violino, Violini Violino, Violinos

Viol. I Violino I Violino I

Viol. I, II Violino I, [Violino] II Violino I, [Violino] II

Viol. II Violino II Violino II

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O sistema de identificação de alturas empregado neste trabalho é o American Standard Pitch

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Palas de Velletri, escultura romana do século I – Museu do Louvre, Paris...1 Figura 2: Vênus de Milo, escultura atribuída a Alexandre de Antioquia – Museu do Louvre, Paris..1 Figura 3: D. João V (1689-1750) - Retrato realizado por Jean Ranc (1674-1735) – Museu do Prado, Madri...21 Figura 4: D. Maria Ana de Áustria (1683-1754) - Retrato realizado por Jean Ranc (1674-1735) – Museu do Prado, Madri...23 Figura 5: Pietro Metastasio, em retrato de cerca de 1707 atribuído a Pompeo Batoni (1708-1787)...33 Figura 6: Arquiduquesa Maria Teresa de Áustria, em retrato realizado em 1727 por Andreas Möller (1684-1762) – Kunst Historiches Museum, Viena...36 Figura 7: O Julgamento de Páris, pintura de Peter Paul Rubens (1577-1640), datada entre 1632 e 1635. National Gallery, Londres...37 Figura 8: Folha de rosto das Opere Drammatiche de Pietro Metastasio e página inicial do libreto de LPVB, impressas em 1747 por Giuseppe Bettinelli, em Veneza...44 Figura 9: Páginas iniciais do libreto de LPVB, editado em Roma em 1779 por “Il Casaletti”...45 Figura 10: Folha de rosto da parte do órgão da serenata Questo è il grato e ameno giorno, escrita por David Perez em 1733...52 Figura 11: Cenário da ópera Alessandro nell’Indie, de David Perez, desenho de Giovanni Carlo Sicino Galli Bibiena (1717-1760)...55 Figura 12: David Perez, gravura de 1774 de autoria de Francesco Bartolozzi (1727-1815). Biblioteca Nacional de França, Paris...57 Figura 13: D. Maria I, rainha de Portugal. Pintura atribuída a Giuseppe Troni (1739-1810) – Palácio Nacional de Queluz, Lisboa...60 Figura 14: Documento convocatório para os ensaios da serenata LPVB, com previsão das despesas para sua produção – Biblioteca Nacional da Ajuda, Lisboa, 52-XIV-35, no. 81...64 Figura 15: Recibo de pagamento dos libretos e outras despesas referentes à serenata LPVB, de David Perez. Biblioteca da Ajuda, Lisboa, 52-XIV-35, no. 82...69 Figura 16: Recibo de pagamento dos copistas que atuaram na confecção de partes da serenata

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Figura 17: Folhas 51 e 52 do livro de despesas da Casa Real, onde estão assentados os custos referentes à produção da serenata LPVB, de David Perez, no ano de 1777. Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Lisboa, Casa Real, Livro 503...73 Figura 18: Folha 73 do livro de despesas da Casa Real, onde estão assentados os custos referentes à produção da serenata LPVB, de David Perez, no ano de 1779. Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Lisboa, Casa Real, Livro 504...74 Figura 19: Visão frontal e laterais do manuscrito da serenata LPVB, de David Perez (Fonte C). Real Biblioteca, Madri, MUS/MSS/116...76 Figura 20: Frontispício da serenata LPVB, de David Perez. Fonte A – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-40...77 Figura 21: Primeira página da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte A – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-40...77 Figura 22: Frontispício do libreto da serenata LPVB, de David Perez, impresso em 1777, em Lisboa, na Stamperia Reale (Fonte D). Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, V-251, 1, 10, no. 16...78 Figura 23: Relações estruturais encontradas no primeiro movimento, Allegro molto, da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez...109 Figura 24: Estruturas da aria da capo e da aria dal segno, representadas por Webster (2009, p. 35)...122 Figura 25: Indicações de andamento como apresentadas por Galeazzi (1791, p. 36)...157

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Produções musicais sobre o libreto da serenata LPVB, de Pietro Metastasio, de 1738, ano de sua criação, até meados do século XIX...43 Tabela 2: Distribuição provável dos músicos que participaram da performance da serenata LPVB, de David Perez, em 18 de dezembro de 1777...68 Tabela 3: Diferenças encontradas na atribuição de personagens a duas árias da serenata LPVB, nas versões de Luca Antonio Predieri (1738) e Antonio Bioni (1739)...95 Tabela 4: Ordenação e identificação dos diversos movimentos da serenata LPVB, de David Perez...96 Tabela 5: Instrumentos utilizados na serenata LPVB, de David Perez...98 Tabela 6: Orquestração utilizada nos diversos números da serenata LPVB, de David Perez...100 Tabela 7: Tonalidades empregadas na Sinfonia, nas árias, no dueto e no Coro da serenata LPVB, de David Perez...105 Tabela 8: Organização estrutural do primeiro movimento, Allegro Molto, da Sinfonia da serenata

LPVB, de David Perez...108

Tabela 9: Organização estrutural do terceiro movimento, Allegrissimo, da Sinfonia da serenata

LPVB, de David Perez...111

Tabela 10: Configurações estruturais empregadas nas árias da serenata LPVB, de David Perez...123 Tabela 11: Organização estrutural da ária Io paventar?, da serenata LPVB, de David Perez...124 Tabela 12: Organização estrutural da ária Se divise, sì belle splendete, da serenata LPVB, de David Perez...126 Tabela 13: Organização estrutural da ária Non è ver, da serenata LPVB, de David Perez...128 Tabela 14: Organização estrutural da ária Quel suo real sembiante, da serenata LPVB, de David Perez...130 Tabela 15: Organização estrutural da ária La meritata palma, da serenata LPVB, de David Perez...132 Tabela 16: Organização estrutural da ária Così fra doppio vento, da serenata LPVB, de David Perez...135

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Tabela 17: Organização estrutural da ária D’ogni cor, d’ogni pensiero, da serenata LPVB, de David Perez...137 Tabela 18: Organização estrutural do dueto Odi l’aura che dolce sospira, da serenata LPVB, de David Perez...140 Tabela 19: Organização estrutural da ária Cieco ciascun mi crede, da serenata LPVB, de David Perez...142 Tabela 20: Organização estrutural da ária Sublime si vegga la pianta immortale, da serenata LPVB, de David Perez...144 Tabela 21: Organização estrutural do coro Tutto il Cielo discenda raccolto, da serenata LPVB, de David Perez...146 Tabela 22: Constituição dos grupos orquestrais empregados nas performances da serenata LPVB, de David Perez, ocorridas em 1777 e 2019...154 Tabela 23: Indicações de andamento encontradas na serenata LPVB, de David Perez...158

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LISTA DE EXEMPLOS

Exemplo 1.a: Compassos 1 a 3 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte A – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-40...81 Exemplo 1.b: Compassos 1 a 3 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte B – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-47...81 Exemplo 1.c: Compassos 1 a 3 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte C – Real Biblioteca, Madri, MUS/MSS/116...82 Exemplo 2: Página inicial da ária La meritata palma, da serenata LPVB, de David Perez. Fonte A – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-40...86 Exemplo 3: Página inicial do coro Tutto il Ciel discenda raccolto, da serenata LPVB, de David Perez. Fonte A – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-40...86 Exemplo 4.a: Compassos 92 a 97 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte A – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-40...90 Exemplo 4.b: Compassos 92 a 97 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte B – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-47...91 Exemplo 4.c: Compassos 92 a 97 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte C – Real Biblioteca, Madri, MUS/MSS/116...91 Exemplo 4.d: Compassos 92 a 96 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Edição deste autor...92 Exemplo 5: Compassos 207 a 214 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez. Fonte A – Biblioteca da Ajuda, Lisboa, Mús. Ms. 45-V-40...92 Exemplo 6: Compassos 1 a 4 do recitativo Madre, qual nube adombra (número 1), da serenata

LPVB, de David Perez. Edição deste autor...93

Exemplo 7: Extensão vocal apresentada pelos personagens da serenata LPVB, de David Perez....97 Exemplo 8: Trechos da parte dos oboés (compassos 97 a 99) da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez...110 Exemplo 9.a: Compasso 102 da parte de violino I, da serenata LPVB, de David Perez...111 Exemplo 9.b: Compassos 124 e 125 da parte de violino I, da serenata LPVB, de David Perez...111 Exemplo 10: Compassos 214 a 230 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez, com modificações de dinâmicas inseridas por este autor...162

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Exemplo 11: Compassos 13 a 29 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez...166 Exemplo 12: Compassos 47 a 53 da ária Sublime si vegga, da serenata LPVB, de David Perez...167 Exemplo 13: Compassos 77 a 84 da ária D’ogni cor, d’ogni pensiero, da serenata LPVB, de David Perez...169 Exemplo 14: Compassos 34 a 40 da parte de flautas e oboés da ária La meritata palma, da serenata LPVB, de David Perez...170 Exemplo 15: Parte dos primeiros e segundos violinos no c. 4 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez...172 Exemplo 16: Compassos 81 a 84 da parte de Vênus e do baixo contínuo da ária Io paventar (número 2), da serenata LPVB, de David Perez...172 Exemplo 17: Compassos 12 a 19 da ária La meritata palma, da serenata LPVB, de David Perez..173 Exemplo 18: Compassos 98 a 103 da Sinfonia, da serenata LPVB, de David Perez, onde nos trechos em destaque (Oboe I & II e Violino I e II) se vê a utilização do ornamento conhecido como

gruppo...174

Exemplo 19: Compasso 11 da ária D’ogni cor, d’ogni pensiero, da serenata LPVB, de David Perez...175 Exemplo 20: Compasso 11 da ária D’ogni cor, d’ogni pensiero, da serenata LPVB, de David Perez...175 Exemplo 21: Compassos 52 a 54 da ária Se divise sì belle splendete, da serenata LPVB, de David Perez, onde aparece indicação de trillo sem terminação...176 Exemplo 22: Compassos 135 a 137 da ária Se divise sì belle splendete, da serenata LPVB, de David Perez, onde aparecem indicações de trillo com terminação...176 Exemplo 23: Compassos 7 a 11 do recitativo Taci, non più (número 3), serenata LPVB, de David Perez, com texto musical original...178 Exemplo 24: Compassos 7 a 11 do recitativo Taci, non più (número 3), serenata LPVB, de David Perez, com inserções de apojaturas na parte do canto...178

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1

INTRODUÇÃO

No Museu do Louvre, na Ala Sully, a sala 345 apresenta duas grandes esculturas posicionadas nos seus lados extremos. De um lado está a Palas (ou Atena) de Velletri, uma cópia romana do século I em mármore de uma estátua em bronze bastante anterior, de cerca de 430 a.C., atribuída a Kresilas. Do outro lado está a célebre Vênus de Milo, também em mármore e datada provavelmente do século II a. C., trabalho atribuído a Alexandre de Antioquia.

Figura 1: Palas de Velletri, escultura romana do século I – Museu do Louvre, Paris.

Figura 2: Vênus de Milo, escultura atribuída a Alexandre de Antioquia – Museu do Louvre,

Paris.

A disposição dessas esculturas, que polarizam o ambiente, não parece ser fruto do acaso, já que essas deusas personificam dois conceitos muitas vezes contrapostos: Virtude e Beleza. Segundo Costa (2004), essa contraposição está presente já em obras filosóficas da Antiguidade Clássica, mas a partir da Idade Média ela foi ampliada e se lhe acrescentou um novo elemento: diversos pensadores passaram a relacionar o conceito de Beleza ao corpo feminino, atribuindo-lhe os aspectos negativos advindos dos acontecimentos descritos no Gênesis. Como aponta a mesma autora,

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2

A beleza de Eva, símbolo da perfeita obra divina, adquire após a queda, ou no momento mesmo em que toma do fruto proibido, simbologia de sedução. Beleza e sedução passam a andar juntas. Um Belo que seduz os sentidos, entorpecendo-os, manipulando-entorpecendo-os, subjugando-os em detrimento da Razão. (Costa, 2004, p. 45).[negrito meu]

Esta visão da Beleza enquanto atributo feminino por excelência, capaz de levar à transgressão e à ruína, se manteve presente no pensamento ocidental mesmo com o advento da Idade Moderna e com as transformações culturais que se seguiram, e foi frequentemente utilizada como pretexto para limitar o papel da mulher na sociedade (Costa, 2004, p. 65 e seguintes). Mas o que fazer quando por algum motivo uma mulher alcançasse um lugar de relevo no quadro social e político?

O objetivo deste trabalho foi investigar e resgatar uma obra dramático-musical escrita para dar resposta a esta questão, a serenata La Pace fra la Virtù e la Bellezza (doravante denominada LPVB), cuja criação ocorreu em dois diferentes momentos históricos. O primeiro foi em 1738, em Viena, quando seu texto poético foi escrito pelo maior libretista do século XVIII, Pietro Metastasio (1698-1782), para comemorar o dia onomástico da arquiduquesa Maria Teresa de Áustria (1717-1780), numa época em que sua iminente ascensão ao trono provocava grandes descontentamentos no Sacro Império Romano-Germânico. Nessa ocasião o libreto foi posto em música pelo compositor bolonhês Luca Antonio Predieri (1688-1767).

O segundo momento ocorre 39 anos depois, em 1777, em Lisboa, quando o compositor napolitano David Perez (1711-1778) coloca novamente em música o texto de Metastasio para as comemorações do aniversário da recém-aclamada rainha de Portugal, D. Maria I (1734-1816). Em ambas as situações a performance dessa obra fez parte de um ritual simbólico cuidadosamente calculado para promover e legitimar a posição dessas duas mulheres no contexto político em que estavam inseridas.

Ao contrário do que possa parecer, esta investigação não foi motivada por questões históricas ou políticas, apesar de que no seu decorrer elas acabaram inevitavelmente por ser abordadas. Como professor das disciplinas Direção de Orquestra e Opera Studio na Universidade Federal de Minas Gerais (Brasil), meu interesse ao iniciar este

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3

doutoramento foi pesquisar obras dramático-musicais de menores dimensões (tanto do ponto de vista da duração quanto dos recursos orquestrais empregados), obras que pudessem ser uma alternativa para as produções musicais realizadas em ambiente acadêmico.

Assim, ao iniciar o curso na Universidade de Aveiro e expor meus interesses ao meu tutor (e posteriormente orientador), o Professor Vasco Negreiros, pude descobrir por seu intermédio o riquíssimo movimento musical que ocorreu em Portugal no século XVIII, movimento este que trouxe ao país compositores, cantores e instrumentistas oriundos da Península Itálica, músicos que estavam entre os mais respeitados na Europa de então. Após uma pesquisa preliminar, descobri que no imenso repertório produzido em Portugal nesse período havia diversas obras que poderiam atender aos meus interesses, especialmente as serenatas, um gênero cultivado nos séculos XVII e XVIII nas cortes europeias que, a despeito de ter se desenvolvido muito próximo à ópera, à cantata e ao oratório, tem recebido pouca atenção por parte de intérpretes e musicólogos (Domínguez, 2007, p. 622).

Dentre as inúmeras serenatas escritas em Portugal no século XVIII, a escolha de LPVB como objeto de estudo foi motivada não só por sua qualidade musical, mas também pela importância histórica de sua criação e pelo fato dela utilizar um texto de Metastasio, autor importantíssimo para todos aqueles que desejam abordar a música dramática do século XVIII. Assim, este doutoramento pretendeu responder à seguinte pergunta de pesquisa:

Qual o enquadramento da serenata La Pace fra la Virtù e la Bellezza, de David Perez, no contexto histórico e estético do século XVIII,

e quais os desafios encontrados para a performance desta obra sob a ótica da direção de orquestra?

Para realizar esta investigação em suas principais vertentes – a pesquisa histórica e a performance musical – a metodologia utilizada consistiu em revisão da literatura, na

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4

pesquisa documental referente à criação e às performances da obra no reinado de D. Maria I e nas atividades que conduziram à sua performance. Nessas últimas, incluem-se a edição prática da obra, ensaios e concerto.

ESTRUTURA DA TESE

Esta tese é dividida em cinco capítulos, dos quais o primeiro apresenta as características e o percurso histórico do gênero serenata, dando especial enfoque na sua presença em Portugal durante o século XVIII.

O Capítulo 2 traz informações sobre o criador do texto poético de LPVB, Pietro Metastasio, e as circunstâncias históricas que levaram à gênese do libreto, assim como o seu enredo, sua estrutura, etc. De modo semelhante, o Capítulo 3 enfoca a carreira do criador da música, David Perez, e apresenta diversas evidências históricas ligadas às performances dessa obra nos anos de 1777 e 1779.

Como até o inicio desta investigação a música de LPVB só era disponível em manuscritos históricos, para que se efetivasse sua performance foi necessária a sua edição, de forma a possibilitar o trabalho de cantores e instrumentistas. Com isso, a reflexão sobre o processo de edição musical acabou se revestindo de grande importância para esta investigação, pois muitas questões de performance já se apresentaram nesta fase, tornando imperiosas algumas tomadas de decisão. Assim, no final do Capítulo 3 apresento os critérios adotados para o estabelecimento de uma edição prática da obra e suas justificativas dentro da prática editorial contemporânea. Cumpre ressaltar que as reflexões e revisões da literatura dedicadas a este assunto foram enriquecidas quando de minha participação no Seminário de Investigação Edición crítica de música: estrategias

para la recuperación del patrimonio historico, ministrado na Universidade Nova de Lisboa

em maio de 2018 pela Doutora Judith Ortega Rodrigues, da Universidad Complutense de

Madrid.

No Capítulo 4 é apresentada uma visão da abordagem composicional de Perez na obra em estudo, tanto no que diz respeito à sua macroestrutura (onde são abordadas questões

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5

sobre o tratamento do texto, orquestração, formas musicais empregadas, etc.) quanto nos diversos números musicais tomados isoladamente.

Por fim, no Capítulo 5 são apresentadas algumas das alternativas de performance que utilizei para a performance de LPVB, ocorrida sob minha direção no dia 7 de junho de 2019, no Auditório da Reitoria da Universidade de Aveiro. Nesse concerto, que teve a inestimável participação da Orquestra Filarmonia das Beiras, atuaram como solistas os alunos de canto do Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro. Após as Considerações Finais, uma série de anexos complementa este documento: a tradução do libreto para a Língua Portuguesa, a edição da partitura e um Comentário Crítico acerca desta edição; e também as notas de programa do concerto realizado e a sua gravação em vídeo. Assim, pretende-se com esses materiais contemplar o objetivo último desta investigação, que é trazer ao público e às comunidades artística e acadêmica esta obra de inegável valor histórico e artístico.

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7

CAPÍTULO 1 – A SERENATA E SUA PRESENÇA EM PORTUGAL NO SÉCULO XVIII.

Em 1777, aos 66 anos, o compositor David Perez (1711-1778) escreve a sua última obra conhecida, a serenata La Pace fra la Virtù e la Bellezza, sobre libreto de Pietro Metastasio (1698-1782). Apesar de ter trabalhado com música dramática em grande parte de sua carreira, em particular com a opera seria, nos últimos anos de sua vida as suas composições haviam sido destinadas quase que exclusivamente à música sacra.

Naquele ano, contudo, uma forte motivação levou o compositor napolitano a esse grande e derradeiro esforço criativo:1 acabara de ser aclamada rainha de Portugal a sua aluna de música desde a adolescência, D. Maria I (1734-1816), e a obra escrita por Perez destinava-se à celebração do aniversário da nova monarca, o primeiro após a sua ascensão ao trono.

Surgidas nas cortes italianas e vienenses no século XVII, as serenatas eram um gênero de música dramática para vários cantores e orquestra, escritas para homenagear membros da corte ou importantes personalidades políticas por ocasião de nascimentos, aniversários, onomásticos e casamentos, entre outras. Compartilhando muitos aspectos construtivos com outros gêneros dramáticos, tais como a ópera, a cantata e o oratório, sua natureza ocasional deixou poucos rastros para pesquisadores, o que conduziu ao fato de ela ainda não ter recebido a atenção que merece, tanto no ambiente musicológico quanto na performance artística. Este capítulo procura apresentar as origens desse gênero, suas principais características e contextualizar sua presença na corte portuguesa durante o século XVIII.

1.1 A serenata e sua dupla natureza.

Nos últimos anos do século XVI surgiram os primeiros exemplos de um gênero musical que teria grande impacto sobre diversas atividades artísticas nos séculos seguintes: a

1 Nessa época o compositor enfrentava uma doença crônica que comprometia seriamente a sua visão

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8

ópera. Resultado do interesse da Camerata Fiorentina2 pela forma como eram realizadas as tragédias na Antiguidade, em conjunção com as práticas musicais então empregadas em espetáculos teatrais, intermedi, madrigais e canções, o novo gênero esteve ligado desde a sua gênese a elementos da cultura greco-romana (Hill, 2005, pp. 22-54). Uma de suas principais inovações, a monodia, foi uma tentativa de imitar a fala através do canto, dando forma ao que se supunha ser a prática teatral usual daquela cultura, como expõe Jacopo Peri no prefácio de sua Euridice:

Prima, ch’io vi porga (benigni Lettori) queste Musiche mie, ho stimato, cõnvenirmisi farvi noto quello, che m’ha indotto a ritrovare questa nuova maniera di cãto, poichè di tutte le operazioni humane, la ragione debbe essere principio, e fonte; E chi non puo renderla agevolmente da a credere, d’haver’ operato a caso. Benchè dal Sig. Emilio del Cavalieri, prima chè da ogni altro, ch’io sappia, con maravigliosa invenzione ci fusse fatta udire la nostra Musica su le Scene; Piacque nondimeno a’ Signori Jacopo Corsi, ed Ottavio Rinuccini (fin l’Anno 1594) che io adoperandola in altra guisa, mettessi sotto le note la favola di Dafne, dal Signor Ottavio composta, per fare una semplice pruova di quello, che potesse il canto dell’età nostra. Onde veduto, che si trattava di poesia Dramatica, e che però si doveva imitar col canto chi parla (e senza dubbio non si parlò mai cantando) stimai, che gli antichi Greci, e Romani (i quali secondo l’openione di molti cantavano su le Scene le Tragedie intere) usassero un’armonia, che avanzando quella del parlare ordinario, scendesse tanto dalla melodia del cantare, che pigliasse forma di cosa mezzana (Peri, 1600, p. v).3

2 Camerata Fiorentina é o nome dado a um grupo de estudiosos, literatos e músicos ligados ao conde

Giovanni de’ Bardi (1534-1612), e que começou suas atividades em Florença a partir dos anos de 1570. Em suas reuniões o grupo promovia discussões sobre Literatura, Ciências e Artes, e também audições de novas obras musicais. A partir das pesquisas de Girolamo Mei (1519-1594), estudioso e editor de diversos dramas gregos, os integrantes da Camerata especulavam “em torno da hipotética unidade de poesia, música e ação na tragédia grega, tentando reestruturá-la em termos de poesia italiana” (Magnani, 1996, p. 165). Vicenzo Galilei (ca. 1520-1591), Emilio de Cavalieri (ca. 1550-1602), Ottavio Rinuccini (1562-1621), Jacopo Peri (1561-1633) e Giulio Caccini (1551-1618) foram alguns dos componentes desse grupo (Burkholder, Grout e Palisca, 2014, pp. 308-310).

3

Antes de oferecer-lhes, caros leitores, esta minha música, considerei conveniente fazer-lhes conhecer aquilo que me induziu a encontrar esta nova forma de canto, pois em todas as ações humanas a razão deve ser princípio e fonte, e aquele que não conseguir fazê-lo facilmente dá a crer que agiu por acaso. Apesar de o Senhor Emilio di Cavalieri, antes de qualquer outro, que eu saiba, com maravilhosa invenção fez ouvir a nossa Música em cena; no entanto satisfez ao Senhor Jacopo Corsi e a Ottavio Rinuccini (desde o ano de 1594) que eu, empregando-a de outra maneira, colocasse em música a fábula de Dafne, escrita pelo Senhor Ottavio, para fazer uma simples experiência do potencial do canto de nossa época. Visto que se tratava de poesia dramática, e que se deveria imitar com o canto o que se fala (e sem dúvida não se fala cantando), estimei que os antigos Gregos e Romanos (os quais segundo a opinião de muitos cantavam em cena as tragédias inteiras), usavam uma harmonia que, avançando além da fala comum, se aproxima tanto da melodia do canto que assume a forma de algo intermediário. Tradução de Dias e Jank (2016, p. 158).

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9

Ao longo dos séculos seguintes a ópera influenciou diversos outros veículos musicais, entre eles a cantata e o oratório. Originados de práticas distintas, esses meios de expressão artística acabaram por compartilhar diversos aspectos de construção, tais como a organização de sua macroestrutura em diversos números (ou movimentos) autônomos, o arcabouço das formas musicais empregadas – aberturas, recitativos, árias e conjuntos vocais – e a utilização da orquestra como forma de acompanhamento (Magnani, 1996, pp. 198-200).

Outro veículo musical compartilha com esses gêneros diversas características, sendo muitas vezes com eles confundido e denominado – erroneamente – como uma cantata ou como uma ópera em miniatura: a serenata. A primeira dificuldade para defini-la e atestar sua autonomia começa por sua própria designação, que apresenta uma multiplicidade de conteúdos semânticos relacionados a práticas e conceitos musicais muito diferentes. Apesar de ter se manifestado em diversos centros europeus nos séculos XVII e XVIII, sua natureza efêmera e ocasional frequentemente deixou poucos traços para historiadores, e com isso “a dificuldade de distinguir entre os gêneros ópera e serenata conta uma importante história em si mesma” (Tcharos, 2009, p. 506).4 Domínguez apresenta um importante complicador para a abordagem deste gênero:

La escasez de ediciones (fac-símiles o críticas) de los ejemplos más significativos explica em parte que el género no haya recibido uma atención mayor hasta fechas recientes (a diferencia de lo que ocurre con el oratorio, la cantata y la opera italianos) (Domínguez, 2007, p. 622).5

Michael Talbot (1982, 1997, 2001) propõe que a palavra serenata tem sido erroneamente vinculada com a palavra sera [noite]. Para o pesquisador, a raiz etimológica do termo se prende antes a sereno, que como substantivo possui o significado de um céu claro, à

4 “the difficulty of distinguishing between opera and serenata genres tells an important story in itself.” [Nota do autor: a não ser nos casos devidamente assinalados, todas as traduções de texto em língua estrangeira foram realizadas por este autor. No caso de citações diretas curtas, a tradução foi inserida no corpo do texto, sendo a citação original apresentada em nota de rodapé. No caso de citações diretas longas, dá-se o inverso: é apresentado no corpo do texto a citação original e a tradução em nota de rodapé.]

5 [A escassez de edições (fac-símiles ou críticas) dos exemplos mais significativos explica em parte o porquê

do gênero não ter recebido uma atenção maior até datas recentes (diferentemente do que ocorre com o oratório, a cantata e a ópera italianas).]

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noite, condição atmosférica ideal para a performance dessas obras. Este vínculo

etimológico teria se estabelecido já no século XV, quando o termo serenata “adquiriu o novo significado de uma peça (ou programa) de música executada à noite ao ar livre sob um céu límpido” (Talbot, 1982, p. 1).6 [ênfase minha]

Desde seu aparecimento o termo foi vinculado a diversos significados, que, como dito anteriormente, remetem ora a uma prática musical – um programa de música, ora a aspectos construtivos – uma peça de música, tais como:

 Uma performance musical de um apaixonado debaixo da janela da pessoa amada;7

 Uma performance coletiva de música, onde grupos de pessoas cantavam alternadamente ou se apresentavam para a população em geral. Esse tipo de serenata ocorria frequentemente em Veneza no século XVIII (a geografia dessa cidade favorecia, especialmente no tempo de calor, à realização de tais festas noturnas ao sereno);8

 Uma obra dramático-musical para dois ou mais cantores e orquestra, cultivada nos séculos XVII e XVIII e estruturada de forma semelhante a uma cantata ou ópera em diversos números (abertura, recitativos, árias e conjuntos). Normalmente elogiosas a um soberano ou personalidade política, tais serenatas eram apresentadas nas cortes europeias em ocasiões festivas como aniversários, onomásticos ou casamentos; ou ainda na celebração de alianças políticas ou tratados de paz;

6 “acquired the new meaning of a piece (or programme) of music performed at night in the open air under

clear skies.”

7

No segundo ato da ópera Don Giovanni, de W. A. Mozart (1756-1791), temos uma típica serenata inserida no contexto da trama (ainda que o compositor a intitule Canzonetta). Sob o acompanhamento de cordas em pizzicato, o bandolim introduz o canto sedutor do protagonista: “Deh, vieni alla finestra, o mio tesoro...” [“Ah, venha até a janela, meu tesouro...”].

8

Ainda hoje esse significado é comum, sendo encontrado, por exemplo, nas performances de tunas universitárias portuguesas como foi noticiado pelo jornal Correio do Minho um evento ocorrido em 05 de abril de 2018 na cidade de Braga: “FITU oferece serenata à cidade no Largo do Paço – (...) Esta noite, a Augusta Cidade recebe os estudantes com suas capas negras e os bicos vermelhos dos tunos da Tuna Universitária do Minho para um dos momentos mais solenes do ano e, pelo qual, já todos os bracarenses esperam: a Serenata à Cidade de Braga (“FITU oferece”, 2018).” [ênfase minha]

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11

 Uma obra de música para conjunto instrumental em vários movimentos, designação que passou a ser utilizada a partir da segunda metade do século XVIII, e que tem, entre muitos outros, exemplos como a Serenata notturna, KV. 239, de W. A. Mozart (1756-1791), ou as Serenade Op. 11 e Op. 16, de J. Brahms (1833-1897).

No senso comum talvez o sentido que esteja mais associado à serenata é o de uma música oferecida a alguém como demonstração de afeto, por vezes exaltando suas qualidades físicas, intelectuais ou morais, em que a performance ocorre durante a noite e, eventualmente, fazendo alguma referência a esta atmosfera. Assim, diversas canções foram produzidas sob o título genérico de Serenata (adaptado quando oportuno aos diversos idiomas), como a Ständchen D. 954/4 de Franz Schubert (1797-1828), sobre texto de Ludwig Rellstab (1799-1860), ou a Moonlight Serenade, de Glenn Miller (1904-1944), com texto de Mitchell Parish (1900-1993). Também obras de música instrumental procuram evocar este conteúdo poético como, por exemplo, a Serenata Andaluza, Op. 28, para violino e piano, de Pablo de Sarasate (1844-1908), ou La sérénade interrompue, para piano, de Claude Debussy (1862-1918).

A serenata que é o foco deste estudo – uma obra dramático-musical – extrapola esse entendimento. Se a exaltação de qualidades pessoais faz uma intersecção com a visão do senso comum, há que se lembrar que estas obras eram encomendadas e os altos custos de suas produções eram pagos pelas próprias cortes, sendo que sua performance ultrapassava a dimensão íntima de oferecimento e se configurava como um evento social de amplo alcance.

Outra questão que dificulta a apreciação da serenata enquanto um gênero musical autônomo é o fato de que os compositores frequentemente designavam essas obras como cantata ou dramma pastorale. Poetas também utilizaram diversos outros termos para se referir a este gênero, e é possível encontrarmos as seguintes denominações para o texto literário: festa teatrale, componimento da camera, poemetto drammatico, azione

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termos “referem-se especificamente à composição literária preservada separadamente no libreto, e não à obra apresentada com música” (Talbot, 1982, p. 13).9

Em meio a tanta ambiguidade, é possível ser estabelecido um critério para definir o que é uma serenata? Sobre essa questão o mesmo autor propõe que:

To be classed as a serenata a work cannot merely be seen to possess one or two distinguishing features; rather, we have to make a longer list of typical features and allow individual works to differ in one or even more respects from the ideal type without thereby disqualifying themselves (Talbot, 1982, p. 3).10

Essa longa lista de características típicas mencionada por Talbot compreende os seguintes itens:

 Quantidade de personagens – Diferindo da cantata de câmara, que utilizava apenas um ou dois cantores, as serenatas empregavam um número maior, sendo o usual três ou quatro, mas podendo chegar a seis, que podiam representar deuses e heróis da mitologia clássica, figuras arcádicas como ninfas e pastores, personificações de conceitos como Dever ou Honra, ou mesmo características geográficas, como uma cidade ou um rio;11

 Acompanhamento instrumental – Grande parte das serenatas utiliza uma orquestra relativamente grande, similar à orquestra utilizada nas óperas do período em questão e que compreendia, além dos instrumentos de corda e aqueles necessários para o continuo, vários instrumentos de sopro;

 Locais e condições de apresentação – Embora algumas serenatas fossem apresentadas em recintos privados ou casas de ópera, o mais usual era que essas obras fossem apresentadas ao ar livre, em estruturas construídas especialmente

9

“refer specifically to the literary composition preserved separately in the libretto, not to the work as performed with music.”

10

[Para ser classificada como uma serenata, uma obra não pode simplesmente ser vista como possuindo uma ou duas características distintas; em vez disso, temos que fazer uma lista mais longa de características típicas e permitir que obras individuais possam diferir em um ou mais aspectos do protótipo ideal sem se desqualificarem.]

11 Exemplo desse último caso é a serenata La Sena festeggiante [O Sena festejante], de A. Vivaldi

(1678-1741), sobre libreto de Domenico Lalli (1679-(1678-1741), escrita provavelmente em 1726 para homenagear o jovem monarca Luís XV (Talbot, 1993).

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13

para este fim. Nesses lugares (jardins, pátios, canais, praças públicas, etc.), e dado que o horário de sua performance era comumente noturno, elas podiam usufruir da riqueza proporcionada pelo uso de luz artificial, gerada através de tochas e velas. A partir de relatos de performances da época, como os estudados por Talbot (1982) e Tcharos (2006), vê-se que o posicionamento do público era cuidadosamente calculado, de forma a favorecer a figura dos homenageados;  Duração – Apesar de haver uma grande diversidade de duração das serenatas, era

comum que muitas delas fossem escritas em duas partes, com uma média de doze árias ou conjuntos (além dos recitativos), o que equivale a um terço de uma opera

seria – cerca de uma hora e meia de duração;

 Encenação – Neste aspecto as serenatas se aproximam do oratório, já que, como colocado por Burney, elas eram apresentadas “como oratórios, sem mudança de cena, ou representação” (Burney apud Talbot, 1982, p. 7).12 Ainda assim, algum sentido de encenação poderia ser encontrado na dinâmica gerada pela entrada ou saída de personagens. Embora haja libretos de serenatas que especificamente fazem referência a mudança de locais de cena, sem embargo, isto não necessariamente implicaria alteração de cenário. Era possível que os cantores utilizassem algum tipo de figurino e, uma vez que permaneciam parados, era comum cantarem enquanto liam suas partituras, sem as ter memorizado;

 Convenções poéticas – A forma de organização dos libretos das serenatas era bastante similar à dos textos das óperas, cantatas e oratórios do período, que consistia em uma alternância de versi sciolti (versos soltos, de ritmo irregular), destinados aos recitativos, e versos com ritmo regular e rimas, destinados às árias e conjuntos;

 Temática – Apesar de que muitas serenatas eram escritas para enaltecer a figura de um homenageado, a alusão ao mesmo era apresentada no enredo de forma alegórica e paulatina. Uma alusão mais explícita, quando ocorria, dava-se geralmente nos números finais, sendo toda a obra construída em função deste “clímax”. As duas fórmulas mais empregadas pelos poetas para a construção do

12

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14

enredo eram a contesa ou gara (uma disputa entre elementos contraditórios que terminaria com uma reconciliação – uma unione, concordia ou pace – reconciliação esta que poderia se dar na ou pela figura do homenageado), e a

busca (na qual os personagens procuram a identidade de um “herói” através de

seus atributos virtuosos – uma fórmula mais adequada para elogios diretos). Em uma temática tão singular e personalizada, é natural que os libretos das serenatas não fossem tão reaproveitados quanto o eram os libretos de ópera.

Ao observar todas estas características pode-se facilmente chegar à conclusão que as serenatas demandavam altos custos para a sua realização, devido à quantidade de cantores, ao emprego de uma orquestra grande para a época, aos trabalhos quase sempre inéditos do poeta e do compositor e à eventual confecção de figurinos e cenários, que poderia necessitar da construção de estruturas de arquitetura efêmera para as execuções ao ar livre. Isto explica o fato de este gênero ligar-se tão intimamente à alta nobreza. Eram eles, os nobres, quem detinham as condições financeiras para arcar com todas estas despesas, e utilizavam este meio para fortalecer sua projeção social. Tcharos, em seu estudo sobre a serenata Le gare festive in applauso alla Real Casa di Francia, apresentada em Roma em 1704, ressalta a riqueza que é apresentada nas descrições desse evento. Para ela, esta produção “foi um ato público calculado para fortalecer alianças, neste caso em particular entre a proeminente nobreza romana, a delegação espanhola e a recentemente empoderada corte francesa dos Bourbon” (Tcharos, 2006, p. 528-529).13 Esta seria uma típica situação onde a serenata poderia demonstrar a sua

dupla natureza – duas experiências para duas audiências: de um lado, a experiência

musical enriquecida por outras artes e rituais, e de outro, seu significado social, em que a performance destas obras era utilizada como meio de demonstração de poder e para consagração social. Embora algumas serenatas escritas para as festas nas cortes fossem muito sutis ao mencionarem seus destinatários, algumas delas faziam referência direta a eles, apontando e enaltecendo suas qualidades, principalmente aquelas que referendassem a posição social que estes patronos ocupavam. Em resumo, a serenata,

13 “was a public act calculated to strengthen alliances, in this particular case between prominent Roman

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15

mais que qualquer outro gênero musical dos séculos XVII e XVIII, apresentou-se como o meio ideal para a promoção pessoal, consagração social e fortalecimento político.

1.2 O aparecimento e a disseminação da serenata.

Antes de prosseguir sobre o surgimento e a disseminação da serenata é importante situar as palavras drama e dramático no universo da Música, em especial quando em associação com formas literárias.

Apesar de questões vinculadas à produção, recepção e função da obra de arte terem sido discutidas já em A República, de Platão, foi a Poética de Aristóteles que teve grande impacto sobre a produção artística ocidental, ao dignificar o status da poesia. Como frisa Franco:

(...) destacamos a importância, muitas vezes negligenciada, da Poética para o pensamento e cultura ocidentais. Tomando como exemplo as poesias épica e trágica, Aristóteles diverge radicalmente de seu mestre Platão, e dá à poesia a dignidade de um domínio próprio, que não mais depende de propostas políticas ou de uma filosofia moral. Pode-se dizer que, pela primeira vez, a mimesis poética é pensada como tendo uma potência própria e que, desde aí, não parou de contar sua história. Os cânones aí introduzidos para a composição da boa tragédia acabaram se tornando paradigmáticos para os demais gêneros literários, e, através deles, para outras formas de produção artística (Franco, 2016, pp. 422-423).

Assim, na Poética, que consiste em um conjunto de anotações e comentários que historiadores acreditam que teria função didática, Aristóteles faz diversas considerações sobre a utilização das palavras em prosa ou em verso. Ele sistematiza a arte poética em diversas espécies, partindo do princípio básico de que todas as suas manifestações se assentam sobre a mimesis – a imitação (Pereira, 2018, p. [9]). Apesar de distinguir três gêneros na arte literária (a epopeia, a poesia lírica e o drama), grande parte da Poética versa sobre a tragédia que, em conjunto com a comédia, compõem o gênero dramático. Considerada por Aristóteles o gênero superior entre os gêneros literários, o objetivo da tragédia era promover uma intensa experiência emocional, que levaria a uma purificação ou purga (katharsis) dos sentimentos por ela suscitados, como podemos ver em sua própria definição:

A tragédia é a imitação de uma acção elevada e completa, dotada de extensão, numa linguagem embelezada por formas diferentes em cada uma de suas partes,

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que se serve da acção e não da narração e que, por meio da compaixão e do temor, provoca a purificação de tais paixões. (Aristóteles, 2018, pp. 47-48).

Para escrever tragédias que possam conduzir o espectador a este estado de espírito, Aristóteles prescreve a observação de diversas condições e princípios. Quando da redescoberta e disseminação da Poética a partir de finais do século XV, estas condições e princípios, ligados às três unidades – de ação, de tempo e de lugar – e à verossimilhança e à necessidade, se tornaram cânones para a confecção de obras artísticas em diversas áreas.

Desde seu surgimento a ópera não escapou da influência da Poética e dos preceitos apresentados por seu autor. Inevitavelmente ligada ao gênero dramático, pode-se considerar a opera seria como uma derivação da tragédia, e a opera buffa, da comédia. No caso da serenata, pode-se atribuir-lhe esta classificação de gênero dramático ainda que a plena encenação não fosse o objetivo de sua performance. Ao imitar ações através do texto e da música, ao ter seu texto estruturado na forma de diálogos, e uma vez que o conteúdo de vários libretos versava sobre debates ou disputas, que tendiam no final a uma união, reconciliação ou acordo, a performance desse tipo de obra criava um dinamismo próprio deste gênero.

Ao escrever sobre a história da poesia secular em língua italiana, o estudioso, literato e co-fundador da Accademia dell’Arcadia Giovanni Mario Crescimbeni (1663-1728) dedica o Livro IV de seu livro L’Istoria della Volgar Poesia ao desenvolvimento do dramma

musicale, e nele apresenta a origem da cantata e da serenata:

Oltre alle feste, s’introdussero per la musica certe altre maniere di Poesia, che comunemente oggimai si chiaman Cantate, le quali sono composte di versi, e versetti rimate senza legge, com mescolamento d’arie, e talora ad una voce, talora a più; e se ne sono fatte, e fanno anche miste di drammatico, e di narrativo. Questa sorta di Poesia è invenzione del secolo XVII, perciocchè nell’antecedente per la musica servivano i madrigali, e gli altri regolati componimenti [...]. Ora sì fatte cantate, quando si mettono al pubblico, soglion farsi di notte tempo, e si dicono Serenate; e molte ne abbiamo ascoltate, che sono state fatte com somma

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magnificenza, e splendore da gli Ambasciadori, e da altri Principi, e Personaggi di questa gran Corte (Crescimbeni, 1731, p. 299-300).14 [ênfase minha]

O que podemos notar é que aqui é estabelecida entre a serenata e a cantata uma semelhança com relação à sua gênese e à sua estrutura, que compartilham as formas poéticas resultantes da mistura do gênero dramático e do gênero narrativo. O que é distinto num e noutro caso é principalmente o momento da performance, já que as serenatas são executadas ao ar livre, durante a noite (na prática, veremos que nem sempre), e apresentadas com magnificenza e splendore em casas de nobres. Segundo Talbot (1982), as primeiras obras que trouxeram esta designação foram Gli Amori d'Apollo

con Clizia de Antonio Bertali, estreada 1661, em Viena; e Io son la primavera de Antonio

(ou possivelmente Remigio) Cesti, estreada em 1662, em Florença. Após estes primeiros exemplos, no fim do século XVII e início do século XVIII, a serenata adquiriu seus traços mais característicos e foi cultivada principalmente na Itália e nas cortes católicas da Áustria e da Alemanha (Timms, 2009, p. 44). A difusão do gênero foi de tal magnitude que, somente na cidade de Veneza, entre os anos 1666 e 1755, foram produzidas cerca de cento e oitenta e seis serenatas, conforme o levantamento feito por Talbot (1982). Compositores como Antonio Caldara, Giovanni Bononcini, Alessandro e Domenico Scarlatti, Nicola Porpora, Alessandro Stradella, Giovanni Paisiello e Antonio Vivaldi dedicaram-se ao gênero, assim como os poetas Giovanni Ambrogio Milliavacca e Pietro Metastasio, entre muitos outros.

Durante o século XVIII a serenata se disseminou por toda a Europa, de Lisboa a São Petersburgo. Na Europa do Norte, por exemplo, compositores como J. S. Bach e G. F. Händel, cujos nomes são ligados principalmente à cantata religiosa e ao oratório (no caso de Bach), ou ao oratório e à ópera (no caso de Händel), escreveram obras louvando seus

14

[Para além das festas, se introduziram para a música outras formas de Poesia, que hoje em dia comumente se chamam Cantatas, as quais são compostas de versos rimados e não rimados, misturados a árias, e às vezes escritos para uma voz, às vezes para mais; e uma vez criadas, são feitas de uma mistura de dramático, e de narrativo. Este tipo de Poesia é invenção do século XVII, porque no antecedente para a música serviam os madrigais, e as outras composições parecidas [...]. Quando são assim cantadas, e

levadas as público em período noturno, se dizem Serenatas; e muitas temos escutado, as quais são feitas com grande magnificência e esplendor na casa de Embaixadores, de outros Príncipes e de Personalidades desta grande Corte.]

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patronos.15 Essas composições são muitas vezes apresentadas por editores modernos – em gravações e na divulgação de concertos – como cantatas seculares, o que de certa forma pode vir a obscurecer a função política associada a este tipo de música.

Como referido anteriormente, ao contrário das óperas, que podiam ser realizadas em várias noites e ser revividas em outras estações e em locais diferentes, serenatas eram geralmente trabalhos “ocasionais”, no mais estrito sentido do termo: eles eram realizados quase sempre uma única vez e, tendo cumprido seu propósito, eram geralmente esquecidas, a menos que o compositor resolvesse reutilizar alguns de seus materiais em outras obras. O caso da serenata Parnasso in festa, HWV 73, de G. F. Händel é uma exceção, pois, além da sua estreia em 1734, a obra foi reapresentada em diversas ocasiões, nos anos de 1737, 1740 e 1741. Um exemplo de reaproveitamento do material de serenatas em obras posteriores acontece, a título de exemplo, com Der Himmel dacht

auf Anhalts Ruhm und Glück, BWV 66a, escrita por J. S. Bach em 1718, cujo material foi

reutilizado para a composição da cantata religiosa Erfreut euch, ihr Herzen, BWV 66.2, de 1724. Neste caso, o reaproveitamento do material foi de crucial importância para a reconstrução da obra original, cujo material musical se perdeu.

As mudanças no cenário político no fim do século XVIII não deixariam de afetar o gênero serenata. Segundo Tcharos, nessa época

the serenata was becoming as much a relic of a passing generation as opera seria. Its effectiveness as elite propaganda and its applicability to noble contexts would soon be replaced by the less aristocratic but equally grand ‘theatre’ of revolutionary spectacle and emerging Romanticism (Tcharos, 2011, p. 508).16

Assim, os conflitos gerados entre a cultura aristocrática vinculada ao Antigo Regime e os sentimentos do Iluminismo, somados à mudança de gosto com relação à linguagem

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No corpus da obra bachiana três obras apresentam essa denominação: Der Himmel dacht auf Anhalts Ruhm und Glück (BWV 66a), Die Zeit, die Tag und Jahre macht (BWV 134a) e DurchlauchtsterLeopold (BWV 173a), todas escritas para a Casa Real de Anhalt-Cöthen. No caso de Händel, um exemplo de início de sua carreira é Aci, Galatea e Polifemo (HWV 72), escrita em Nápoles em 1708. Já em sua fase inglesa o compositor escreveu Parnasso in Festa (HWV 73), para o casamento da Princesa Anne com o Príncipe William IV de Orange, em 1734.

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[a serenata estava se tornando, como a opera seria, uma relíquia de uma geração ultrapassada. Sua eficácia como propaganda de elite e sua aplicabilidade a contextos da nobreza logo seria substituída pelo menos aristocrático mas igualmente grandioso "teatro" do espetáculo revolucionário e do Romantismo emergente.]

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clássica e ao imaginário arcádico, foram responsáveis pelo declínio do gênero, em fins do século XVIII (Talbot, 1997).

1.3 A introdução da música dramática e a presença da serenata em Portugal.

Em 1668 um Portugal vitorioso assina com a Espanha o Tratado de Lisboa, que pôs fim à Guerra da Restauração, na qual os dois países se envolveram desde 1640. Esse fato está inserido em um processo de transformação no funcionamento das instituições, nos poderes e equilíbrios sociais portugueses, que se afastaram da “prática de uma forma de governo centrada nas consultas aos vários conselhos do centro da monarquia” (Monteiro, 2009, p. 300). Nos anos em que se seguiram, “a disputa política e as facções de corte, embora sempre presentes, deixaram de se revestir da dimensão fortemente polarizada que assumiram na fase anterior”; e a dinastia foi consolidada através “da paz externa e do restabelecimento do domínio sobre possessões coloniais”, e “por via das várias disposições que asseguraram a definição dos mecanismos de sucessão à coroa” (Monteiro, 2009, p. 336). Na década seguinte o país passou por uma profunda crise econômica, decorrente da concorrência ultramarina (que dificultava o acesso das produções brasileiras aos mercados europeus) e da insuficiência na produção de trigo e outros cereais, que exigiam a compra de grandes quantidades de víveres e de bens manufaturados no mercado externo (Meneses, 2001, p. 9).

Dada nessa época a dependência da economia portuguesa da entrada e valorização dos bens extraídos nas colônias, este quadro econômico só viria a se alterar significativamente no fim do século, com a revalorização do açúcar e do tabaco brasileiros, seguida pelo surto da mineração ali ocorrido. As principais jazidas auríferas no Brasil foram descobertas na década de 1690, na região que veio a ser conhecida por Minas Gerais, e jazidas menores foram encontradas até aos anos de 1740, na Bahia, em Mato Grosso e em Goiás. Jazidas de diamantes foram encontradas também na região de Minas Gerais, na década de 1720, e na Bahia, no início da década de 1730 (Meneses, 2001, pp. 267-271).

Data provavelmente de 1697 a chegada do primeiro carregamento expressivo do ouro do Brasil a Lisboa, ao que se seguiram muitos outros até 1807 (Meneses, 2001, p. 268),

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sendo que o apogeu dessas remessas ocorreu entre os anos de 1735 e 1754. Estes carregamentos eram resultantes do imposto cobrado sobre a extração do metal, à taxa de um quinto. Estima-se que entre 750 a 1000 toneladas de ouro entraram no país durante o século XVIII, um valor difícil de definir com precisão, devido à “elementaridade da burocracia, à difusão do contrabando e à imperfeição da fiscalidade, que negligenciam a obrigatoriedade do registro” (Meneses, 2001, p. 269).

É neste panorama de prosperidade econômica que em 1º de janeiro de 1707 foi aclamado rei de Portugal D. João V (1689-1750). Seu longo reinado leva adiante a implantação de um sistema político já surgido no reinado de seu pai, D. Pedro II (1648-1706): a Monarquia Absolutista. Neste sentido, de acordo com Cymbron & Brito (1992, p. 105), no período em que esteve à frente do país, D. João V procurou fazer uma “afirmação interna do Poder Absoluto e da recuperação externa da posição do país no concerto das nações europeias, assim como, de um modo bastante mais limitado e contraditório, da renovação das estruturas econômicas e culturais.” No caso da Música, suas políticas se refletiram em diversas ações, tais como:

 A contratação de numerosos músicos estrangeiros, principalmente italianos, para vir trabalhar no país, dos quais o mais importante foi certamente o compositor Domenico Scarlatti (1685-1757);

 A criação, em 1713, de uma escola de música ligada à Real Capela Patriarcal, o

Real Seminário de Música da Patriarcal, que de acordo com Fernandes, “até a

fundação do conservatório [de Lisboa], em 1835, (...) foi o principal suporte da formação profissional dos compositores, cantores e organistas para as Capelas da monarquia e para outras instituições do país” (Fernandes, 2010, p. xxi).

 O envio dos discípulos mais dotados do Seminário da Patriarcal para se especializar em Roma, como foi o caso de João Rodrigues Esteves (c.1701-1752), António Teixeira (1707-1774), Francisco António de Almeida (1703-1754) e Joaquim do Vale Mixelim (Fernandes, 2010, p. 13).

Imagem

Figura 2: Vênus de Milo, escultura atribuída a  Alexandre de Antioquia – Museu do Louvre,
Figura 3: D. João V (1689-1750).
Figura 4: D. Maria Ana de Áustria (1683-1754).
Figura 5: Pietro Metastasio, em retrato de cerca de 1707   atribuído a Pompeo Batoni (1708-1787)
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Referências

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