• Nenhum resultado encontrado

5 QUESTÕES DE PERFORMANCE

5.5 Dinâmica

As marcações de dinâmica são muito presentes em LPVB onde, além do extensivo uso do

piano e do forte, Perez utiliza ocasionalmente o pianissimo, o fortissimo e o fp. Em

nenhum trecho da obra são encontradas dinâmicas de transição, tais como crescendo ou

decrescendo. Porém, em alguns lugares, como no c. 4 da ária Io paventar? (número 2),

Perez adverte que não deve haver nenhum crescendo em todo o trecho, através das indicações piano sempre ou sempre piano. Já na Sinfonia, nos c. 117-118 e c. 120-121, para evitar um possível decrescendo ele utiliza o recurso de escrever reiteradamente a

160

dinâmica forte. Todas estas marcações são encontradas somente na parte da orquestra, nunca nas partes vocais.

Apesar do zelo do compositor com relação ao planejamento da dinâmica, em minha abordagem interpretativa julguei conveniente intervir sobre o texto musical em alguns trechos. As mais importantes dessas intervenções e suas motivações são apresentadas a seguir:

Definição de indicações de dinâmica no início de movimentos – Alguns dos movimentos de LPVB não apresentam marcação de dinâmica em seu ataque inicial. Nos movimentos onde isto acontece (na Sinfonia e nos números 5, 12, 14, 15, 19a, 22a, 23, 25 e 27) defini a intensidade a partir da textura orquestral e do conteúdo dramático do movimento, ou através de alguma indicação posterior fornecida pelo compositor. Na maioria dos casos a dinâmica inicial foi definida como forte (Sinfonia e números 12, 15, 19a, 22a, 23, 25 e 27). Já a Ária 5 (Apolo) foi iniciada em piano em função tanto da indicação de forte colocada no c. 7, que surge em claro contraste em relação aos compassos anteriores, quanto da indicação piano colocada nos c. 12 e 92, quando é repetido o material dos compassos iniciais. No número 14, a escolha de piano para o compasso inicial, seguida por ataques em mezzo forte no c. 5 e forte no c. 9 foi uma tentativa de realçar o caráter de expectativa encontrado neste trecho, caráter este que é reforçado pelo fato de o compositor apresentar o mesmo material musical em três tonalidades progressivas: Si bemol Maior, Dó Maior e Ré Maior.

Definição de dinâmicas em seções B das arie da capo – Como já foi apresentado anteriormente, em diversas árias Perez modifica consideravelmente a textura musical na seção B da aria da capo (seja qual for sua configuração), criando um grande contraste com a seção A. Porém, em alguns desses lugares ele não insere uma indicação dinâmica que corrobore este contraste, como no caso dos números 15, 20 e 25. Nesses casos, solicitei à orquestra a performance desses trechos em piano.

Utilização de dinâmicas distintas para variar repetições – Em alguns números de LPVB, Perez escreve compassos ou grupos de compassos que apresentam exatamente o mesmo material musical. Nesses casos, é provável que alguma alteração de dinâmica ou

161

articulação fosse pretendida na performance, de modo a criar alguma variedade. Em algumas dessas situações utilizei a dinâmica com este propósito, como nos c. 218 a 230 da Sinfonia. Nesses compassos, onde acontece a Coda do movimento, Perez faz três apresentações do mesmo material. Assim, para a performance ocorrida com a OFB, do compasso 218 até a primeira nota do c. 222 solicitei que fosse mantida a dinâmica forte dos compassos anteriores. Em seguida, a segunda nota do c. 222 foi atacada subitamente em piano, dinâmica que se estendeu até o primeiro tempo do compasso 226, quando se deu o início de um crescendo que culminou em forte no penúltimo compasso (Exemplo 10):

162

Exemplo 10: Compassos 214 a 230 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez, com modificações de dinâmicas inseridas por este autor.

Modificações dessa natureza foram também realizadas nos seguintes trechos:  Aria Apollo [Se sivise sì belle splendete] (número 5): c. 138 a 141;  Aria Amore [Non è ver] (número 7): c. 103 a 107;

 Aria Pallade [La meritata palma] (número 13): c. 138 a 141;

 Aria Amore [Cieco ciascun mi crede] (número 23): c. 5 a 8 e C. 58 a 60;  Coro [Tutto il Cielo discenda raccolto] (número 27): c. 21 a 33.

Inserção de dinâmicas de transição – embora Perez não tenha empregado este tipo de dinâmica claramente em LPVB, Neumann defende que alguma intervenção do intérprete é possível neste tipo de repertório:

For the masters of the galant style who did not make use of the symbols for extended gradations, we should feel free to insert some gradations where the music seems to favor them and where homophonic texture seems to invite and need this kind of coloristic support (Neumann, 1993, p. 184).91

Um exemplo deste tipo de intervenção que realizei em LPVB ocorreu nos c. 15 a 27 da

Sinfonia, intervenção esta que teve como objetivo realçar o processo de modulação

ocorrido na Ponte, o qual necessita de alguma explicação.

91

[Para os mestres do estilo galante que não usaram símbolos para gradações prolongadas, devemos nos sentir livres para inserir algumas gradações onde a música parece favorecê-las e onde a textura homofônica parece convidar e precisar desse tipo de suporte de colorido].

163

Na exposição deste movimento, o início da Ponte (c. 16) ocorre sobre o acorde de dominante da tonalidade principal, Mi Maior. Nos compassos seguintes, o baixo faz uma progressão ascendente que, através do cromatismo Mi–Mi sustenido–Fá sustenido (c. 19 a 21), atingirá a dominante de Si Maior. Sobre esta progressão do baixo há uma sequência de pequenos fragmentos melódicos em violinos e oboés que, ao ser atingido o acorde de Fá sustenido Maior, começam a se concentrar sobre as mesmas notas (c. 21 a 26, especialmente os três últimos). Após uma longa detenção sobre a função de dominante – seis compassos92 – a esperada resolução sobre o I grau ocorre no compasso 27 (justamente onde Perez apresenta sua primeira indicação dinâmica, um forte), ao que se seguem cadências de confirmação da nova tonalidade.

Para realçar esta estrutura, propus que a Ponte (c. 16) fosse iniciada em piano, que foi alcançado após um decrescendo no c. 15. A partir deste piano, se seguiu um crescendo gradual até o compasso 21, onde um forte enfatizou o momento no qual a dominante de Si Maior é atingida. Pouco à frente, no c. 23, um decrescendo acompanhou as repetições dos pequenos fragmentos melódicos até o compasso 25, onde foi alcançada a dinâmica

piano. A insistência sobre os fragmentos melódicos a partir daí pode ser enfatizada por

um novo crescendo, que culminou no forte escrito por Perez. No Exemplo 11 estas propostas ficam mais claras:

92 Apesar da presença de outros acordes nestes compassos, o caráter estático da harmonia é sublinhado

166

Exemplo 11: Compassos 13 a 29 da Sinfonia da serenata LPVB, de David Perez.

Substituição de dinâmicas escritas – Esta questão já foi antecipada no item “Tamanho da orquestra e suas proporções” onde expliquei que, devido ao desequilíbrio entre o volume da orquestra e parte vocal, em alguns momentos pedi a alteração de dinâmicas escritas por Perez, de forte ou fortissimo para piano ou mesmo pianíssimo, em situações como as apresentadas no exemplo seguinte:

167

Exemplo 12: Compassos 47 a 53 da ária Sublime si vegga, da serenata LPVB, de David Perez.

O sentido do texto literário me leva a crer que neste trecho a personagem Vênus canta em franca oposição ao grupo orquestral, grupo este formado por dois oboés, um fagote, dois trompetes, duas trompas, cordas e cravo, para os quais Perez indica a dinâmica forte. Com se não bastasse, a música executada por este grupo ganha ainda mais peso se levarmos em conta que parte dela consiste em escalas em semicolcheias que são direcionadas à região aguda, escalas estas que ocorrem simultaneamente em quatro oitavas diferentes. Apesar de Perez desejar expressar aqui a força dos ventos e das ondas, tanto o texto de Metastasio (Né il vento, né l’onda... – nem o vento, nem a onda...) quanto o bom senso musical não permitem que a voz seja subjugada por essas “forças da Natureza”. Assim, solicitei que toda a seção fosse executada em piano.

168

No processo de performance de LPVB, apesar de ter previsto várias dessas intervenções com antecedência, cometi uma falha ao não inseri-las nas partes orquestrais previamente, e isto causou demasiadas interrupções durante os ensaios. Assim, aquelas indicações que me parecem mais óbvias (como as indicações em inícios de andamento e nas partes B das arie da capo) foram posteriormente inseridas na edição da obra (devidamente assinaladas como adições editoriais), de modo a poupar tempo de ensaio em futuras performances.