• Nenhum resultado encontrado

Os autores firmam que escalar a pirâmide tem que ser visto pelos regulados como algo análogo à estratégia militar de “queimar os navios”, ou seja, quando o exército invasor queima os navios, o invadido sabe que haverá uma guerra sangrenta, até a morte, sem recuos.

258 Idem p. 874.

259 SCHIRATO, Vitor Rhein. A regulação brasileira do mercado de capitais: restrição da autonomia privada para a satisfação do interesse público. Revista de direito público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 4, n. 16, out./dez. 2006. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/PDI0006.aspx?pdiCntd=38663>. Acesso em: 23 jun. 2016.

Na regulação, deve, portanto, o regulador deixar bem claro o seu nível de comprometimento com a escalada piramidal caso encontre um ator recalcitrante, não cooperativo.

Ayres e Braithwaite afirmam que a regulação é um jogo de “finesse” na manipulação das alternativas postas à sua disposição e que a estratégia de sucesso de uma boa modelagem regulatória depende não só da existência da pirâmide de estratégias e sanções regulatórias, mas também de que (a) só se deve escalar para a punição como o último recurso (last resort); (b) essa opção punitiva deve ser exercida somente até o ponto de conseguir compliance do regulado, e não mais260.

Insistem os autores que a teoria responsiva, e sua big gun (cujo significado preciso se verá logo em seguida), não pressupõem a virtude dos cidadãos, ou o espírito de cooperação de todos. Se o regulado não for virtuoso, as armas estarão prontas para serem atiradas. Mas as balas não serão projetadas contra os virtuosos, e, em princípios, as armas serão colocadas no fundo, longe da vista da maioria das pessoas, para que não ajam somente com base na ameaça de punição261.

Mesmo que o regulado seja economicamente irracional, ou seja, ainda que a ameaça de uma punição monetária não seja suficiente para desmotivá-lo de uma prática violadora das normas, o regulador deve possuir (como será explicitado ao longo deste trabalho) uma gama bastante variada de formas de persuasão (como, por exemplo, ataque à reputação, pressão social por grupos da sociedade civil organizada)262.

Se tudo isso falhar, seja dinheiro seja o senso de responsabilidade, a big gun estará disponível para mobilizar uma sanção incapacitante, seja uma suspensão temporária de atividades, seja a cassação (ou caducidade) da licença para operar determinado serviço263.

Aqui entra o que Brigham Daniels chamou de “poder nuclear” das agências reguladoras264. O arsenal de uma agência reguladora sói conter várias armas. Ocasionalmente, no entanto, a agência tem o poder de destruir completamente os seus “alvos regulatórios” ou causar ondas de choque na sociedade por meio de uma bomba atômica regulatória (regulatory nuke). Uma arma nuclear regulatória, diz ele, constitui uma ferramenta com duas características primaciais. Em primeiro lugar, ela possui energia suficiente para impactar

260 AYRES, I.; BRAITHWAITE, J. Responsive regulation: transcending the deregulation debate. Oxford, UK: Oxford University Press, 1992, p. 50.

261Idem, ibidem, p. 50. 262 Idem, ibidem, p. 50. 263 Idem, ibidem, p. 50.

264 DANIELS, Brigham. When agencies go nuclear: a game theoretic approach to the biggest sticks in an agency's arsenal. 80 Geo. Wash. L. Rev. 442, 2012, p. 1.

profundamente metas regulatórias individuais ou significativamente afetar aspectos importantes da sociedade ou da economia. Em segundo lugar, a partir da perspectiva da agência reguladora, é politicamente indisponível em quase todas as situações, tirante as mais extremas.

Essas armas regulatórias são encontradas em toda parte da Administração Pública. Daniels afirma que, mesmo quando as armas nucleares reguladoras individuais possam chamar a atenção, muitas vezes pensa-se sobre essas armas de maneira improdutiva. Assim, normalmente, as armas nucleares regulatórias são abordadas de uma forma maniqueísta. Por um lado, elas podem ser vistas como anomalias regulatórias com pouca relevância para entidades reguladas, que julgam que a agência nunca irá utilizá-las. Por outro lado, especialmente se a agência já lançou sua bomba nuclear regulatória, viu-se o seu poder destrutivo de fato, e quase que somente se fala e se age tendo como pano de fundo a história da destruição que deixou em seu rastro265.

A conclusão, entretanto, a que chegou Daniels, é que o bom regulador e o formulador de política consciente devem, além da dicotomia fracasso/nuvem de cogumelo referida acima, tratar a bomba atômica regulatória como um fator importante que influencia o cálculo da regulação. Sua análise sugere, destarte, que as agências muitas vezes podem obter benefícios regulatórios apontando, e somente apontando, para suas armas nucleares e não necessariamente usando-as; o poder dessa ferramenta é muitas vezes o da alavancagem da diplomacia regulatória  por ameaças, postura e coerção266.

A presunção piramidal de persuasão fornece, segundo a Teoria, a opção mais barata e mais respeitosa ao regulado, dando-lhe a chance para que ele cumpra voluntariamente os compromissos267. As punições severas são, assim, mantidas em reserva para os casos em que a persuasão falhe. Segundo a formulação proposta, o motivo mais comum para a persuasão falhar é um ator regulado ser um “calculador racional” dos custos prováveis da aplicação das sanções legais em comparação com os ganhos decorrentes de sua violação.

Para que a modelagem funcione, contudo, os autores afirmam que é necessário que o regulador carregue uma “big gun”, o que, no contexto, significa que o regulador tenha à sua disposição pesadas sanções, como ameaça a violações regulatórias, a serem aplicadas nos

265 Idem, ibidem, p. 1. 266 Idem, ibidem, p. 1.

267 BRAITHWAITE, John. Responsive Regulation and Developing Economies. World Development Vol. 34, No. 5, 2006, p. 887.

casos em que a ação na base da pirâmide se mostrar insuficiente268. Essas sanções, como visto, têm de chegar ao nível do que eles chamam de incapacitação, ou seja, retirada de licenças, processos criminais etc.

Na mesma linha, Short e Toffel citam um livro clássico de Stone no qual este afirma que o efeito dissuasor das sanções legais é insuficiente tanto para impedir o comportamento empresarial violador de normas quanto para promover o cumprimento das normas regulatórias. Segundo Stone, o que a lei pode mais eficazmente fazer é moldar o comportamento organizacional, gerando compromissos normativos (de conduta) por meio de controles internos sistêmicos269.

Usando dados de pesquisas por eles realizadas, eles chegam que à conclusão de que o ambiente legal, especialmente quando este é conjugado com medidas efetivas de fiscalização pelos reguladores, influencia significativamente a probabilidade de que as organizações irão implementar efetivamente os compromissos de autorregulação que simbolicamente adotam.

Em outras palavras, afirmam que as empresas são mais propensas a seguir com seus compromissos de autorregulação quando estão sujeitas à vigilância regulamentar pesada que quando adotam autorregulamentação na ausência de uma ameaça explícita de sanções. Tomados em conjunto, esses achados sugerem que a autorregulação pode ser uma ferramenta útil para alavancar as motivações normativas das organizações regulamentadas, mas que não pode substituir a aplicação tradicional à base de dissuasão.

2.6 A PIRÂMIDE VISTA COMO INSTRUMENTO DE COMBINAÇÃO DE

Documentos relacionados