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A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

2. Tutela Jurídica Internacional

2.3. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

No âmbito da Comunidade Europeia foi criada a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, aprovada por ocasião do Conselho da União Europeia em Nice, a 7 de Dezembro de 2000 que visa proteger os direitos e princípios fundamentais dos cidadãos da Comunidade Europeia169.

Logo no texto do Preâmbulo a Carta, entre outros diplomas e instituições, reconhece o respeito pelas atribuições da Convenção Europeia dos Direitos Humanos e

167 BARRETO, Irineu Cabral, CAMPOS, Abel, Portugal e o Tribunal Europeu dos Direitos do

Homem, ob. cit., pág. 146, PINTO, Ana Luísa, ob. cit., pág. 38.

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FONSECA, Isabel Celeste M., O direito a um processo à prova de tempo, ob. cit., pág. 223 e segs.

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da jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

A Carta da União no que concerne ao direito de acesso à justiça, no seu art. 47.º, n.º 2 determinou expressamente que «Toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja

julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei»170.

No que respeita ao tema em estudo a Carta não trouxe nada de inovador, sendo que o preceituado no n.º 2 do art. 47.º é basicamente o art. 6.º, n.º 1 da CEDH. Aliás esta posição é defendida por ANA LUÍSA PINTO171. Não obstante, o reconhecimento do direito à uma decisão em prazo razoável pela Carta significou um reconhecimento universal daquele direito, e dos princípios e valores fundamentais da condição da dignidade da pessoa humana.

O Tratado de Lisboa, inicialmente conhecido como o Tratado Reformador, assinado pelos Estados-Membros da União Europeia (UE) em 13 de Dezembro de 2007 e entrado em vigor a 1 de Dezembro de 2009, teve um papel fugaz no reforço do funcionamento pleno da União172. Esse Tratado fez com que a Carta da União em matéria de direitos humanos, se tornasse juridicamente vinculativa, significando a concretização da adesão da União Europeia à CEDH. Como estabelece o art. 6.º, n.º 2 daquele tratado «A União adere à Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais. Essa adesão não altera as competências da União, tal como definidas nos Tratados». O n.º 3 refere que «Do direito da União fazem parte, enquanto princípios gerais, os direitos fundamentais tal como os garante a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados- Membros».

Além do mais, essas alterações deram corpo a nova redação do art. 6.º (ex-artigo 6.º TUE), tendo reconhecido que «A União reconhece os direitos, as liberdades e os

princípios enunciados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, de 7 de Dezembro de 2000, com as adaptações que lhe foram introduzidas em 12 de Dezembro de 2007, em Estrasburgo, e que tem o mesmo valor jurídico que os Tratados».

170 Informações disponível em <http://www.fd.uc.pt/CI/CEE/pm/Tratados/Lisboa/tratados-TUE-

TFUE-V-Lisboa.html>. Acesso em: 22 de Jan. 2017

171 GOMES, Conceição, ob. cit., págs. 48-49.

172 MORAIS, Carlos Banco de, «A sindicabilidade do direito da União Europeia pelo Tribunal

Constitucional português», in Estudo em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, Vol. I, Edição da Faculdade de Lisboa da Universidade de Lisboa, Coimbra, Editora, 2010, pág. 221.

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É importante referir que, o art. 7.º do Tratado da União Europeia declara consequências por violação dos direitos fundamentais e o modo de funcionamento da análise da contestação, tendo consagrado que «pode verificar a existência de um risco

manifesto de violação grave dos valores referidos no artigo 2.º por parte de um Estado- Membro. Antes de proceder a essa constatação, o Conselho deve ouvir o Estado- Membro em questão e pode dirigir-lhe recomendações, deliberando segundo o mesmo processo».

Importa acrescentar ainda que, o Tratado Constitucional europeu, na parte dedicada a justiça – Título II – Direitos Fundamentais e Cidadania da União – no artigo I-9.º, n.º 1, consagrou que «A União reconhece os direitos, as liberdades e os

princípios enunciados na Carta dos Direitos Fundamentais», constituindo esta a Parte

II do Tratado e passando a ter força jurídica vinculativa. Contrariamente, o Tratado de Lisboa não incorpora a Carta dos Direitos Fundamentais, todavia, o art. 8.º, n.º 1, na parte em que dá nova redação ao art. 6.º, n.º 1 do Tratado da União Europeia, atribui-lhe valor jurídico idêntico aos dos Tratados173.

Portugal ratificou o Tratado de Lisboa a 23 de Abril de 2008 no parlamento, tendo a Constituição Portuguesa no seu art. 8.º, n.º 4, determinado expressamente que «as disposições dos Tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das

suas instituições, no exercício das suas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo Direito da União Europeia, com o respeito pelos princípios fundamentais do Estado de Direito Democrático»174.

A natureza vinculativa da Carta da União Europeia na ordem jurídica comunitária tem sido confirmada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.

Da assunção de que os Tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, pode-se concluir que o Tribunal de Justiça é uma instância vinculativa para o Estado Português.

O Tribunal de Justiça reconheceu igualmente o princípio da responsabilidade dos Estados-Membros pela violação do direito da União, que constitui, por um lado, um elemento que reforça decisivamente a proteção dos direitos conferidos aos particulares pelas disposições da União, e por outro lado, é um fator suscetível de contribuir para uma execução mais diligente de tais disposições dos Estados-Membros, resultando

173 Sobre isso, Vide, PINTO, Ana Luísa, ob. cit., pág. 50. 174

Para maiores desenvolvimentos sobre o assunto, MORAIS, Carlos Banco de, ob. cit., pág. 224 e segs.

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responsabilidade civil de obrigações de ressarcimento175. Assim sendo, perante o incumprimento do direito à decisão em prazo razoável previsto no art. 47.º, n.º 2 da Carta, os particulares podem recorrer ao Tribunal de Justiça para reparação do seu direito violado176.

O Tribunal de Justiça no seu acórdão n.º C-185/95 P, de 17 de Dezembro de 1998, reconheceu sobre o recurso intentada pela sociedade alemã Baustahlgewebe

GmbH contra a Comissão Europeia, por violação do direito à decisão em prazo

razoável, num processo de coima em virtude de violação de regras de concorrência, deu razão ao recorrente e confirmou a existência de um princípio geral do direito comunitário, vinculativo, inspirado no art. 6.º da CEDH, no sentido de que qualquer pessoa tem direito a um julgamento equitativo e num prazo razoável177.