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A Centralidade da Avaliação na Organização do Trabalho Pedagógico

Consideramos ser necessário, ainda, abordar uma questão em pauta nos discursos de renomados teóricos, Sousa (1991, 2000); Sordi (1995, 2000); Freitas (1991a, 2003); e outros, que tratam da avaliação e implantação dos ciclos e da progressão continuada como estratégia para equacionar o fluxo dos estudantes das séries do ensino fundamental. Neste sentido, na tentativa de diminuir os custos (o que vai ao encontro das exigências neoliberais com o gasto público), o banco mundial faz com que se implantem diversos programas educacionais no Brasil e no mundo para dar conta desta equação, visto que é obrigação do Estado garantir os oito anos de escolarização básica.

Com esse horizonte em foco a LDB abre a possibilidade ou, por outra ótica, impõe que se criem, sempre que possível ou que seja necessário, Ciclos de Estudo, Classes de Aceleração e a Progressão Continuada, atividades consideradas importantes fatores, que vêm ganhando relevância entre as iniciativas que visam eliminar a repetência. Analisando esta questão, Freitas (2003, p. 13) aponta que existem alguns novos vocábulos introduzidos no cotidiano da escola nos ~OWLPRV DQRV ( FLWD ³&LFORV GH IRUPDomR SURJUHVVmR FRQWLQXDGD DYDOLDomR SURPRomR automática, reforço, programas de aceleração [...] há uma intrincada rede de relações, posturas políticas, práticas e concepções que tUDQVLWDP GH IRUPD HQFREHUWD´ &DEH DSUHVHQWDU DOJXPDV alternativas político-pedagógicas adotadas pelo sistema, como medida de ajustar a correção do fluxo escolar. Para tanto, apoiamo-nos em Prado (2000, p. 52), que apresenta sua percepção sobre as seguintes modalidades:

Quadro 2.4: Regime de organização escolar

Promoção Automática Regime de Ciclos Aceleração da Aprendizagem Classes de

Talvez a mais controvertida e mais radical das políticas de correção de fluxo, esta tem sido objeto de muita

polêmica. Sintetizando e simplificando muito, poderia afirmar-

VHTXHD³SURPRomRDXWRPiWLFD´HD ³FXOWXUDGDUHSHWrQFLD´VmRGRLV enfoques extremos, que parecem distanciados do esforço pela melhoria

da qualidade do ensino.

A organização do sistema educacional em ciclos pode ser vista como medida

intermediária e não abandona as unidades de ensino ao laissez-faire.

Nesse regime, a aprovação ou a reprovação não é anual, como ocorre

quando o ensino está organizado em séries, oferecendo, portanto, maiores chances de recuperação para o aluno do que a situação atual predominante.

Trata da estratégia de correção de fluxo escolar estimulada pela atual política governamental. A Aceleração da Aprendizagem, é

um tentativa de sintetizar a proposta do MEC para o combate

³DUHSHWrQFLDcom ênfase na TXDOLGDGHGRHQVLQR´ Fonte: Baseado em Prado (2000, p. 52).

É importante colocar que os ciclos escolares correspondem à intenção de regularizar o fluxo de estudantes ao longo da escolarização, pois buscam eliminar a distorção idade/série e limitam a repetência. Os ciclos são organizados em períodos que ultrapassam o ano letivo e podem atingir dois, três, quatro ou até mesmo a totalidade de anos previstos para o ensino fundamental.

De acordo com Freitas (2003), é fundamental entender a diferHQoD HQWUH ³FLFOR´ H ³SURJUHVVmRFRQWLQXDGD´(DVVLPHVFODUHFHWUDWD-se da diferenciação entre a estratégia de:

Organizar a escola por ciclos de formação que se baseiam em experiências socialmente VLJQLILFDWLYDVSDUDDLGDGHGRDOXQRHGH³DJUXSDUVpUies com o propósito de garantir a progressão FRQWLQXDGD GR DOXQR´ >@ D SULPHLUD H[LJH XPD SURSRVWD JOREDO GH UHGHILQLomR GH WHPSRV H espaços da escola, enquanto a segunda é instrumental ± destina-se a viabilizar o fluxo de alunos e tentar melhorar a aprendizagem com medidas de apoio (reforço, recuperação etc.). [...] chamaremos de ciclos apenas experiências como a primeira, reservando para a segunda seu nome correto: progressão continuada (FREITAS, 2003, p. 9).

A idéia de modo algum é nova, pois, segundo Fernandes (2002), o tema das políticas de não-retenção (reprovação) e os estudos em torno da promoção automática marcam longa data no Brasil. Conforme o autor, políticas referentes à implantação de tais propostas foram anunciadas, pela primeira vez, ainda na década de 1920, e cita como exemplo os estudos realizados por Mainardes (1998) e Barreto e Mitrulis (1999). Entretanto, foi na década de 1950 que propostas de aprovação automática foram encaradas com entusiasmo e otimismo por políticos e gestores de políticas educacionais.

Segundo Mainardes apud Fernandes (2002), no período de 1968 a 1972, o Estado de São Paulo introduziu na rede de ensino público a Organização em Níveis, que eliminava a reprovação entre a 1ª e 2ª séries (nível I) e entre a 3ª e 4ª séries (nível II); Santa Catarina, entre 1970-1984, promoveu o Sistema de Avanços Progressivos, que aprovavam os estudantes automaticamente no 1º grau; o Rio de Janeiro experimentou o Bloco Único, de 1979 a 1984, propondo a passagem automática da 1ª para a 2ª série, sendo mais uma vez implantado em 1993, com a extinção da seriação entre as classes de alfabetização e a 4ª série do 1º grau.

O Estado de São Paulo implantou em 1984 o CBA - Ciclos Básicos de Alfabetização7, proposta que, num primeiro momento, significou apenas a aprovação automática de estudantes da rede pública da 1ª para a 2ª série do ensino fundamental. Essa estratégia pedagógica de reorganização da escola pública 1983/1984 foi realizada de forma semelhante em Minas Gerais (1985), Paraná e Goiás (1988).

A rede municipal de São Paulo organizou, em 1992, o ensino fundamental em três ciclos: ciclo inicial (1ª, 2ª, e 3ª série), ciclo intermediário (4ª, 5ª e 6ª séries) e ciclo final (7ª e 8ª séries). E, em 1994, as redes municipais de Belo Horizonte implantaram a Escola Plural e Porto Alegre implantou a Escola Cidadã ± implantaram o ensino fundamental com nove anos organizados em três ciclos.

Com o objetivo de garantir a progressão continuada inter-ciclos, em 1997 a Secretária de Educação do Estado de São Paulo adotou o regime de progressão continuada no ensino fundamental e, a partir de 1999, o governo do Estado de Mato Grosso implantou gradativamente os Ciclos de Formação. Cabe ressaltar que as iniciativas de projetos desta natureza buscam sobremaneira eliminar ou superar o problema da evasão e da repetência escolar.

Como visto, no Estado de São Paulo percebe-se, historicamente, a ocorrência de diversas iniciativas que buscam enfrentar essa situação. Neste sentido, recentemente, se destaca a instalação do ciclo básico e a experiência da instauração dos ciclos na Prefeitura Municipal de São Paulo, visto que, com base na nova LDB, objetivando garantir a todos o direito de acesso, permanência e progressão bem sucedida no ensino fundamental, a Secretária da Educação adotou o Regime de Progressão Continuada8 organizado em dois ciclos (ciclo I ± quatro primeiras séries e ciclo II ± quatro últimas séries), garantindo a progressão continuada intra-ciclos (ABRAMOWICZ, 1999).

Em relação à experiência piloto de correção da distorção idade/série, Parente e Lück (2004, p. 21) destacam o registro de três experiências significativas no Brasil de correção da distorção idade/série, uma orientada pelo Centro de Ensino Tecnológico de Brasília (CETEB);

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A proposta do CBA consistia na eliminação da reprovação entre a 1ª e 2ª séries, prolongando o período de alfabetização.

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A partir da Deliberação CEE 09/97 se institui, no Sistema de Ensino do Estado de São Paulo, o regime de progressão continuada no ensino fundamental, complementada pela Indicação CEE 08/97 anexada à Deliberação CEE 09/97, e também pela Instrução Conjunta CENP/GOGESP, publicada no D.O.E. de 13-2-82 seção I, que trata da organização curricular e da progressão continuada.

outra pelo MEC; outra pelo Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC) com a participação da Fundação Ayrton Senna.

Segundo as autoras supracitadas, a partir de 1996, o CENPEC começou a atuar no Estado de São Paulo, na realização de programas de aceleração da aprendizagem. Até o ano 2000, desenvolveu tais programas em mais de cinco Estados, Bahia, Ceará, Mato Grosso do Sul, Paraná e Rondônia e em 21 municípios desses Estados. Freitas (2003), nas suas investigações, apresenta duas experiências com ciclos que considera importantes, a experiência realizada na Prefeitura de Belo Horizonte, na qual essa forma de trabalho foi iniciada em 1994, e a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, que implantou a progressão continuada em 1998. O autor evidencia, também, a existência de alguns mecanismos e de algumas estratégias semelhantes adotados no intuito de limitar a repetência e a evasão.

Embora essas diferentes experiências e propostas tivessem as suas peculiaridades, tinham em comum partir da premissa de que era necessário, no ensino fundamental, um sistema de avaliação que não excluísse o estudante da escola, tentando amenizar ou até resolver o problema da evasão e repetência e, desta forma, contribuir para a melhoria da qualidade do ensino público.

Em relação à legislação, Sousa (1998, p. 87) apresenta, nas suas investigações, que a possibilidade de organização não-seriada do ensino fundamental está posta desde a Lei de Diretrizes e Bases nº 4.024, de 1961, lei que, no artigo 104, prevê:

[...@DSHUPLVVmRSDUD³RUJDQL]DomRGHFXUVRVRXHVFRODVH[SHULPHQWDLVFRPFXUUtFXORVPpWRGRV H SHUtRGRV HVFRODUHV SUySULRV´ 6H QD /HL Qž  WDO SRVVLELOLGDGH p SRVWD FRPR FDUiWHU experimental, na Lei nº 5.692 de 1971 é explicitada como uma alternativa, onde se lê no artigo  SDUiJUDIR ž TXH ³YHULILFDGDV DV QHFHVViULDV FRQGLo}HV RV VLVWHPDV GH HQVLQR SRGHUmR admitir a adoção de critérios que permitam avanços progressivos dos alunos pela conjugação dos HOHPHQWRVGHLGDGHHDSURYHLWDPHQWR´

Assim, os Ciclos aparecem indicados no artigo 23 e 32, dentre um rol de possibilidades de organização da educação básica. Art. 23: a educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não- seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.

Art. 32: 1) É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o ensino fundamental em ciclos. 2) Os estabelecimentos que utilizam progressão regular por série podem adotar no ensino fundamental o regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo de ensino/aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino (Lei Federal nº 9.394/96), em vigor desde 20 de dezembro de 1996. Abre-se, deste modo, conforme a autora, a possibilidade na qual o aluno caminha de acordo com a sua capacidade, resultando na extinção da seriação.

Evidencia-se, assim, que a problemática da defasagem idade/série não é uma realidade presente apenas no Estado do Paraná, pois este problema atinge o país como um todo, segundo relatórios anuais do MEC. Tanto é que outros Estados, como aludido, também desenvolveram programas no sentido de fazer a adequação idade/série, portanto iniciaram o processo de Correção de Fluxo de 1ª à 4ª série do ensino fundamental.

Vale ressaltar que, em 1996, o Paraná apresentava uma média de 36,6% de distorção nas matrículas de 5ª a 8ª série na rede estadual dHHQVLQRFRPXP³SLFR´GHQDVVpULHVGR ensino fundamental, por isso desenvolveu, em 1997, o Projeto Correção de Fluxo de 5ª a 8ª série (SEED, 1996). Constatou-se, no entanto, no mesmo período, que os estudantes chegavam com defasagem idade/série na 5ª série, o que levou a SEED/PR, junto com a Secretaria Municipal da Educação de Toledo, a estender o programa em 1998 a 2001 para os estudantes de 1ª a 3ª série do ensino fundamental9, tal qual, pode ser observado na Tabela 2.2.

Tabela 2.2: Correção de Fluxo - estudantes de 1ª a 3ª Série

Ano Matrícula Inicial Matrícula Final Aprovados Total Reprovados Total

1988 610 511 480 31

1999 220 197 172 25

2000 24 21 17 4

2001 22 22 16 6

Total 876 751 685 66

Fonte: Secretaria Municipal da Educação de Toledo, 2001.

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Ressalta-se que no ano de 1995 havia três escolas estaduais no município de Toledo que atendiam o ensino fundamental de pré-escolar a 1ª a 4ª séries. Conforme o Decreto Estadual n. 1.088/95, estas escolas foram municipalizadas em 1995. A partir deste ano o ensino pré-escolar a 4ª série passou a ser atendido somente na rede municipal.

Nota-se, pelos dados apresentados na Tabela 2.2, que, nos anos de 1998 a 2001, foram atendidos na Correção de Fluxo na rede municipal de Toledo 876 estudantes de 1ª a 3ª série, sendo que 685 estudantes foram aprovados e 66 foram retidos, mesmo com a implantação do projeto.

Em 1998 foram atendidos aproximadamente 610 estudantes, dos quais 480 foram aprovados, e 31 estudantes foram reprovados. Nota-se que continua expressivo o percentual entre matrícula inicial e matrícula final, diferença correspondendo a 16,23%. Outro aspecto que chama a atenção é o elevado número de estudantes que continuam sendo reprovados, mesmo no projeto, correspondendo a um percentual de 10,82%.

Evidencia-se que, em 1998, um total de 610 estudantes matriculados na rede municipal apresentavam defasagem idade/série e assim foram integrados na Correção de Fluxo. Este percentual de estudantes que apresentavam defasagem idade/série foi, contudo, gradativamente sendo ajustado, tanto que em 2001 havia apenas 22 estudantes nesta situação. Atendida esta demanda, o projeto foi encerrado em 2001.

Neste contexto, cabe colocar que o Parecer do Conselho Federal de Educação10 apud Sousa (1998) aponta que o sistema de avanços progressivos implica a adequação dos:

[...] objetivos educacionais às potencialidades de cada aluno, agrupando por idade e avaliando o aproveitamento do educando em função de suas capacidades. [...] Não existe reprovação. A escolaridade do aluno é vista num sentido de crescimento horizontal; o aproveitamento, numa linha de crescimento vertical. Pelo regime de avanços progressivos, o aproveitamento escolar independe da escolaridade, ou seja, do número de anos que a criança freqüenta a escola (SOUSA, 1998, p. 87).

E, segundo a mesma autora, a adoção do sistema de avanços progressivos, possibilitada SHOD OHJLVODomR QR TXDO R HVWXGDQWH FDPLQKD GH DFRUGR FRP D VXD ³FDSDFLGDGH´ UHVXOWD QD extinção da seriação e, em decorrência, da função classificatória da avaliação.

Neste panorama, é imprescindível compreender o princípio que orienta a organização escolar em seriação e desseriação. Para tanto, apoiamo-nos em Miranda (2005, p. 642), que infere que, na seriação:

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O que vem orientando toda a concepção e a organização escolar seriada é o conhecimento, porque o que reúne os alunos e configura a dinâmica do processo ensino/aprendizagem é a aquisição de determinados conhecimentos e processos mediados pelos professores. A organização escolar é, assim, definida pelo pertencimento a uma determinada série fixada arbitrariamente como anual, na qual são agrupados os alunos que já sabem e os que não sabem determinados conteúdos. Há uma preocupação com o desenvolvimento social do aluno, mas

esse desenvolvimento é subordinado ou decorrente do processo de ensino e aprendizagem.

(grifos nossos.)

Já o principio que orienta a organização desseriada contrapõe-se frontalmente ao seriado supra-apresentado, pois:

Defende que os alunos sejam agrupados em ciclos e que o critério de inclusão se deva operar por faixa etária ou por uma etapa de desenvolvimento humano. [...] o cerne é uma mudança radical no conceito de reprovação. A sustentação dessa reforma advém da necessidade de se fazer com que os alunos não mais sejam excluídos da educação formal, o que se daria mediante a retirada dos mecanismos de aprovação/promoção ou reprovação/retenção/exclusão (MIRANDA, 2005, p. 642).

A organização da escola em ciclos implica mudar o conceito de escola:

[...] a noção de socialização mediada pela escola, que deixa de ser orientada por um critério, digamos iluminista, de que a emancipação dos indivíduos deva ocorrer mediante a aquisição de conhecimentos, saberes, técnicas e valores que lhe permitam viver em uma sociedade mediada por estes conhecimentos, [...] passando a orientarem-se por uma noção de socialidade que

prescinde da mediação do conhecimento como sua dimensão fundamental, sendo a socialidade per si o seu critério. O importante é que as crianças permaneçam na escola, dispondo de tempo e

de espaço para que possam desfrutar o que ela possa lhes oferecer, inclusive a oportunidade de adquirir conhecimentos, mas não apenas isso ou não fundamentalmente isso: que eles possam viver ali e agora uma experiência de cidadania, de conviver, de formação de valores sociais (MIRANDA, 2005, p. 642-643). (grifos nossos).

Nota-se que, na organização seriada, os estudantes são agrupados de acordo com o conhecimento adquirido; na organização desseriada, os estudantes são agrupados por faixa etária, independente da aquisição de conhecimentos; neste caso, o estudante alfabetizado pode ser agrupado com o não alfabetizado para desenvolver as mesmas ou diferentes atividades. Parte-se do principio de que nem todos conseguem resolver todas as atividades e de que o importante é que todos permaneçam na escola por oito anos, que não sejam retidos garantindo eficiência no fluxo, que sejam sociáveis e participem no desenvolvimento das atividades; para tanto, minimizam-VH DV H[LJrQFLDV SDUD TXH WRGRV ³FKHJXHP SUy[LPRV´ DR REMHWLYR SODQHMDGR 6H

couber a ironia, não é necessário saber ler fluentemente, pois esta cobrança poderia diminuir a sua auto-estima caso se dêem conta de que não são capazes; assim, basta que consigam identificar algumas letrinhas, e cabe ao professor enaltecê-los para elevar a sua auto-estima, e, por conseguinte, evitar o fracasso/evasão escolar.

Já na organização seriada, é imprescindível conhecer e ter domínio dos conteúdos, independente do tempo (anos) que levar para consegui-lo, pois o vestibular e o mercado de trabalho vão exigir estes conhecimentos. Em síntese, pode-se inferir que, na organização seriada (destinada às classes mais favorecidas), em primeiro lugar vem a aprendizagem, depois a socialização. Na organização desseriada (destinada às classes menos favorecidas), primeiro vem a socialização, depois, ou de forma independente, a aprendizagem. Pergunta-se, diante disso tudo: Será que este processo foi suficiente para responder ao contexto apresentado?

Desta forma, a introdução de projetos desta natureza, como a desseriação no ensino fundamental, é contraditória: de um lado, é considerada uma tentativa de mascarar o problema da repetência no país e, de outro, um avanço para garantir a permanência e o aprendizado dos estudantes na escola. Hoje, 8,2 milhões (23%) dos 36 milhões de estudantes do ensino fundamental no país estão matriculados em escolas, onde o sistema de ciclos substitui as séries tradicionais e o aluno só pode ser reprovado ao fim de duas, três ou quatro séries (WEBER, 2000).

Neste cenário, um ponto nevrálgico, e negativo, de projetos desta natureza é que, em alguns casos, os estudantes avançam sem terem alcançado de fato o conhecimento necessário para tanto. Neste sentido, Barretto e Mitrulis (2002) proferem que, o aluno deve aprender sem repetir a série é diferente de camuflar a aprendizagem para que ele possa avançar mesmo sem aprender.

Nota-se que estes programas buscam fazer a correção da idade/série do estudante, colocando-o na série em que, segundo o sistema, seria a idade cronológica ideal, fato que estigmatiza ainda mais o aluno, visto que o senso comum das pessoas entende que o que deve ser ³FRUULJLGR´ p DOJR TXH QHFHVVDULDPHQWH QXP PRPHQWR DQWHULRU HVWDYD HUUDGR DVVLP RV estudantes que participam do processo correção idade/série acabam interiorizando e carregam a alcunha de estudantes errados, deficientes, problemáticos, que não atingiram os objetivos/conhecimentos planejados no currículo escolar.

Em relação à retenção dos estudantes nos ciclos no Estado de São Paulo, Sousa e Alavarse (2002) constatam que, em algumas redes, a reprovação foi deslocada da primeira para a segunda série do ensino fundamental, momento em que era possibilitada a retenção do aluno.

É chocante. Na práxis do sistema, na busca de gerar eficiência no fluxo escolar, substitui-VH ³WRGD FULDQoD WHP GLUHLWR j HVFROD´ SRU ³WRGD FULDQoD WrP XPD SDVVDJHP SHOD HVFROD´RTXHSURYDYHOPHQWHLQFRUUHUiHPH[FOXVmRYLVWRTXHRVHVWXGDQWHVYmRGHWHUGLSORPDV sem conhecimento suficiente agregado. Neste sentido, pode-se recorrer à contribuição de Bourdieu (1998, p. 221), que pondera³>@2VDOXQRVRXHVWXGDQWHVSURYHQLHQWHVGHFODVVHVPDLV desprovidas culturalmente têm todas as chances de obter, ao fim da escolaridade [...] um diploma desvalorizado; [...] e a exclusão é mais estigmatizante na medida em que, aparentemente, tiveram µVXDFKDQFH¶´

Nota-se que, aprovando o aluno sem que efetivamente tenha aprendido, é uma forma perversa de exclusão da condição de dar continuidade aos seus estudos, e da sua real inserção no sistema social, político e econômico. Neste sentido, Freitas (2002a) adverte que há uma des- responsabilização da escola, pois se supõe que todas as condições estão dadas. Assim, a responsabilidade da aprendizagem recai efetivamente sobre o aluno e a sua família. Se o estudante não tiver uma aprendizagem adequada, inúmeras vezes o mundo do trabalho no sistema capitalista o rejeitará, justamente pela sua formação deficitária, que obviamente não será condizente com as mínimas qualificações exigidas.

Na problemática da retenção/aprovação incide a discussão de um elemento essencial que vem à tona, o fator-chave denominado avaliação; pois a implantação da organização escolar desseriada teoricamente impõe uma ressignificação ao processo da aferição da aprendizagem dos estudantes, em que o objetivo é romper com o padrão sistemático de avaliação tradicional do sistema seriado, marcado pelo cunho classificatório e seletivo, que tem por efeito hierarquizar e estigmatizar os estudantes.

Importa aqui informar que o intuito dos projetos desta natureza visa substituir a avaliação formal, via prova escrita, pela avaliação diagnóstica e contínua. Sob esta ótica, parte-se do pressuposto de que a função classificatória poderá submergir, e os docentes e estudantes poderão buscar outros sentidos mais significativos na avaliação, sentidos capazes de promover o processo de ensino e aprendizagem.

Pesquisas sobre a avaliação nestes programas têm, contudo, revelado grande descrédito e imenso desconforto aos estudantes, aos pais e até mesmo aos próprios professores, pois, ao mesmo tempo em que possibilitam retirar do processo avaliativo a prova, substituindo-a pela avaliação contínua, diagnóstica e processual, não são proporcionados os meios necessários e suficientes para realizá-la.

Constata-se, assim, que há grande dificuldade quando se busca mudar a cultura da avaliação, visto que a sociedade está historicamente condicionada e acredita neste instrumento