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A Cibercultura e o Ciberespaço: Compondo uma Rede Virtual

2. COMUNICAÇÃO E EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE: UM DESAFIO PARA A ESCOLA PÚBLICA

2.4 A Cibercultura e o Ciberespaço: Compondo uma Rede Virtual

Em co-existência com o mundo das relações presenciais dos excluídos digitais – estes que não participam in loco da cibersociedade, mas que são influenciados diretamente por suas implicações - surgem as relações virtuais, compondo redes de comunicação em um novo território - o ciberespaço - e construindo novas teias de relações sociais que vão caracterizar a cibercultura. De acordo com Lévy (1999, p. 17):

O ciberespaço (que também chamarei de ‘rede’) é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial de computadores. O termo especifica não apenas a infra-estrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo. Quanto ao neologismo ‘cibercultura’, especifica aqui o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço.

No ciberespaço as possibilidades de comunicação independem do espaço geográfico e do tempo: a comunicação pode se efetivar entre diferentes países, em tempo síncrono (ao mesmo tempo) ou assíncrono, por meio de diferentes linguagens (escrita, imagens e sons), com a possibilidade de armazenar as informações virtualmente para consultá-las quando necessário, de qualquer lugar que possua computador conectado à Internet. Isto só é possível, pois “a informática reúne técnicas que permitem digitalizar a informação (entrada), armazená-la (memória), tratá-la automaticamente, transportá-la e colocá-la à disposição de um usuário final, humano ou mecânico (saída)” (LÉVY, 1999, p. 37), que pode consultar a informação no momento em que esta é produzida ou quando

desejar, num espaço desmaterializado (LEMOS, 2003: 14)38. Segundo Castells (1999, p.

398).

O novo sistema de comunicação transforma radicalmente o espaço e o tempo, as dimensões fundamentais da vida humana. Localidades ficam despojadas de seu sentido cultural, histórico e geográfico e reintegram-se em redes funcionais ou em colagens de imagens, ocasionando um espaço de fluxos que substitui o espaço de lugares. O tempo é apagado no novo sistema de comunicação já que passado, presente e futuro podem ser programados para interagir entre si na mesma mensagem. O espaço de fluxos e o tempo intemporal são as bases principais de uma nova cultura, que transcende e inclui a diversidade dos sistemas de representação historicamente transmitidos: a cultura da virtualidade real, onde o faz-de-conta vai se tornando realidade.

As formas de comunicação propiciadas pelas novas tecnologias estão alterando profundamente os diversos âmbitos das relações sociais, da vida pessoal à profissional. No âmbito pessoal, muitas pessoas não saem mais de casa para fazer compras, a comunicação que antes era presencial passa a ser virtual, englobando desde o diálogo via e-mail, chats e fóruns até o sexo virtual. Na esfera profissional, muitas organizações não possuem mais funcionários que trabalham no espaço físico da empresa, ficam em casa e mantêm contato virtualmente, fazem reuniões via teleconferência ou skype39, “o que nos conduz diretamente à virtualização das organizações que, com a ajuda das ferramentas da cibercultura, tornam-se cada vez menos dependentes de lugares determinados, de horários de trabalhos fixos e de planejamento a longo prazo” (LÉVY, 1999, p. 49).

No ciberespaço, a tecnologia se transforma na mediadora das interações e há uma reorganização do social, da cultura e dos valores contemporâneos em função da construção de uma nova rede de trocas simbólicas. As informações transitam praticamente de forma instantânea pelo mundo, re-configurando os sentidos sociais e a esfera da luta política. O imediatismo torna-se cada vez mais presente, a sensação eterna de que “é para ontem” passa a ser uma constante, assim como a produção e o consumo permanente de materiais e símbolos. A diversidade, quantidade e velocidade de informações diárias, características da modernidade, são herdadas pela pós-modernidade, “em que as coisas fragmentam-se sob efeito do transitório, do excessivo e da instabilidade que marcam o psiquismo humano com

38 André Lemos utiliza o conceito de desmaterialização do espaço de lugar. Segundo o autor, “vivemos uma nova conjuntura espaço-temporal marcada pelas tecnologias digitais -telemáticas onde o tempo real parece aniquilar, no sentido inverso à modernidade, o espaço de lugar, criando espaços de fluxos, redes planetárias pulsando no tempo real, em caminho para a desmaterialização do espaço de lugar. Assim, na Cibercultura podemos estar aqui e agir à distância. A forma técnica da Cibercultura permite a ampliação das formas de ação e comunicação sobre o mundo” (LEMOS, 2003, p. 14).

39 Skype é um software que permite comunicação grátis pela internet através de conexões sobre VoIP (Voz

a tensão nervosa, a velocidade, o superficialismo, a efemeridade, a hiperestesia, tudo isso convergindo para a experiência imediata e solitária do homem moderno” (SANTAELLA, 2004, p.29).

Na sociedade da informação, muitas das atividades são concretizadas através de um único clique capaz de enviar informações a várias partes do mundo. Essa característica torna a Internet um instrumento de intervenção política, possibilitando que múltiplos atores sociais participem de um meio que ainda não possui a produção e distribuição de suas informações totalmente controladas como ocorre nos outros meios de comunicação de massa: televisão, rádio e jornal impresso. Como enfatiza Graham,

Para apreciar esto, comparemo s Internet com la radio y la televisión. Incluso en estos días de infinitos canales de radio y de televisión y de costes enormemente reducidos de retransmisión básica, lãs posibilidades que tienen los indivíduos y los grupos pequeños de hacerce com los recursos y la pericia necesarios para ponerse a si mismos o poner sus opiniones em antena son todavia muy limitadas, tanto que, de echo, es uma imposibilidaded práctica para la mayoría. Por el contrario, los indivíduos y los grupos com tiempo, recursos e habilidades limitadas pueden aprovecharse de la tecnologia de Internet, literalmente, presentarse a si mismos ante el mundo y lanzar sus mensajes (GRAHAM, 1999, p. 78).

Apesar de os grandes meios transmissores de informação serem denominados meios de comunicação de massa (MCM), são poucos os que propiciam um ato comunicativo real ou uma interação. Em geral, o que estes meios disponibilizam aos receptores é informação, transmitida de forma unidirecional e não dialógica. Assim, como enfatiza Kaplun (1987), ao invés de meios de comunicação, estes deveriam ser chamados de meios de informação, pois transmitem massivamente informações aos leitores, ouvintes ou espectadores que, na maioria das vezes, não têm condições técnicas, políticas e econômicas de responder a estas mensagens. Segundo Mario Kaplun, a teoria da comunicação foi construída a partir do estudo dos meios massivos de informação, que acabaram sendo definidos como meios de comunicação de massa.

La forma de operar de estor médios se convertió em modelo referencial, em paradigma de comunicación. Para estudiarlos, se construyó toda toda una ‘teoria de la comunicación’ que se centraba exclusivamente em la transmissión de señales y menjajes. Lo que ellos hacían – transmitir - -: eso era la comunicación. Así, em lugar de partir de lãs relaciones humanas, fueron la técnica, la ingeniería, la electrócnica – y lãs poderosas empresas propietarias de los médios – los que impusieron la forma de concebir la comunicación (KAPLUN, 1987, p. 65).

De acordo com Kaplun (1987), um dos fundamentos da comunicação é a participação, a interação, o diálogo entre sujeitos que trocam informações e sensações.

Para que a rede funcione, é necessário que os internautas e/ou cibernautas façam da conexão uma interação entre os diferentes nós de computadores, se transformando no que Pierre Lévy chama de espectadores-interagentes ou o que Jean Cloutier (apud Kaplun, 1987, p. 69) define de EMIREC40: emissor-receptor.

La verdadera comunicación – dicen – no está dada por um emisor que habla y um recpetor que escucha, sino por dos o más seres o comunidades humanas que intercambian y comparten experiências, conocimientos, sentimientos (aunque sea a distancia a través de médios artificiales). Es a través de esse proceso de intercambio como los seres humanos establecen relaciones entre si y pasan de la existência individual aislada a la existência social comunitária (KAPLUN, 1987, p. 68).

A maior liberdade de publicação - nos ambientes virtuais que possibilitam essa participação - propicia o aume nto de fontes de contra-informação na sociedade e amplia a interação e mistura de papéis entre produtores e receptores – categorias mistas na rede: quem produz informações também recebe e vice-versa. O internauta participativo, assim, se constitui enquanto um EMIREC.

Vai se formando, assim, uma grande rede de comunicação global, em que computadores de várias partes do mundo se tornam telas vivas por meio da interação de internautas em conexão. As repercussões das redes informacionais e digitais já podem ser sentidas em movimentos sociais de contraposição às informações hegemônicas dos meios de comunicação, na publicação massiva de textos e audiovisuais de amadores e profissionais sem destaque na grande mídia, na criação de comunidades internacionais que se encontram para discutir temas de interesse comum, enfim, no compartilhamento de informações como nunca antes se tinha visto.

As inúmeras conexões virtuais e as diferentes relações construídas no ambiente do ciberespaço passam a ser encaixadas dentro do conceito de rede, a qual é formada pelos computadores do mundo inteiro que se interligam – como nós – por meio de conexões pessoais, profissionais e institucionais. Segundo Lucia Santaella (2004, p. 39), “a rede se compõe de um número de dezenas de milhares de sub-redes, elas mesmas conectadas a redes chamadas de ‘espinhas dorsais’ ou ‘redes federativas’. Dentre as sub-redes, a mais empregada é a WWW (World Wide Web)”.

Na rede, o saber irradia-se para todas as direções, sem uma linearidade heterogêneo e pulverizado, o domínio do saber se descentraliza, se formata de outro modo: um conceito

40 Termo criado por Jean Cloutier e citado por Mario Kaplun em El comunicador Popular como “la

que privilegiaria esta forma de configuração do saber e seu domínio na rede é a construída por Gilles Deleuze e Felix Guatari (1995, p. 22): o rizoma, “qualquer ponto de rizoma pode ser conectado a qualquer outro e deve sê-lo”. De acordo com os autores, o rizoma possui as seguintes características:

- Princípios de conexão e de heterogeneidade: “qualquer ponto de um rizoma pode ser conectado a qualquer outro e deve sê-lo. (...) Num rizoma (...) cada traço não remete necessariamente a um traço lingüístico: cadeias semióticas de toda natureza são aí conectadas a modos de codificação muito diversos, cadeias biológicas, políticas, econômicas, etc., colocando em jogo não somente regimes de signos diferentes, mas também estatutos de estados das coisas” (DELEUZE & GUATTARI, 1995, p. 15). Assim, a multiplicidade de signos torna o rizoma um aglutinador de cadeias das mais diversas, não havendo uma única linguagem universal, mas várias descentralizadas.

- Princípio da multiplicidade: “é somente quando o múltiplo é efetivamente tratado como substantivo, multiplicidade, que ele não tem mais nenhuma relação com o uno como sujeito ou como objeto, como realidade natural ou espiritual, como imagem e mundo. (...) Uma multiplicidade não tem nem sujeito nem objeto, mas somente determinações, grandezas, dimensões que não podem crescer sem que mude de natureza (as leis de combinação crescem então com a multiplicidade)” (Ibid, p. 16). Desta forma, a rede cresce de acordo com a diversidade de conexões que vão sendo feitas, sem uma regra definida, sem um roteiro programado. “As multiplicidades se definem pelo fora: pela linha abstrata, linha de fuga ou desterritorialização segundo a qual elas mudam de natureza ao se conectarem às outras” (Ibid, 17). Assim, o aumento das conexões amplia as dimensões e o conjunto de correlações entre os elementos da rede.

- Princípio de ruptura a-significante: “um rizoma pode ser rompido, quebrado em um lugar qualquer, e também retoma segundo uma ou outra de suas linhas e segundo outras linhas. (...) Todo rizoma compreende linhas de segmentaridade segundo as quais ele é estratificado, territorializado, organizado, significado, atribuído, etc.; mas compreende também linhas de desterritorialização pelas quais ele foge sem parar. Há ruptura no rizoma cada vez que linhas segmentares explodem numa linha de fuga, mas a linha de fuga faz parte do rizoma.” (Ibid, 18). Da mesma forma que a linha de fuga quebra o rizoma, faz parte dele, o que resulta na ampliação da rede e não simplesmente na quebra: as rupturas atuam como novas conexões.

Para desenvolver os conceitos de desterritorialização e reterritorialização, os autores trabalham com a metáfora da polinização. De acordo com eles, quando uma vespa pousa numa orquídea, ela se desterritorializa – já que compõe uma outra imagem que não a sua original e forma um outro ambiente, e ao pegar o pólen da flor e distribuí-lo pelo espaço – polinizando - ela reterritorialiaza a orquídea, já que espalha elementos da flor pelo ambiente. Assim, “a vespa e a orquídea fazem rizoma em sua heterogeneidade” (Ibid, 18). Portanto, a semeadura virtual é uma forma de aumentar a dimensão do jardim do ciberespaço, criando novas linhas de fuga, de escape e o rizoma se transforma num cruzamento de caminhos inesperados de diferentes idéias e informações.

- Princípio de cartografia e de decalcomania: “um rizoma não pode ser justificado por nenhum modelo estrutural ou gerativo. Ele é estranho a qualquer idéia de eixo genético ou de estrutura profunda. Um eixo genético é como uma unidade pivotante objetiva sobre a qual se organizam estados sucessivos; uma estrutura profunda é, antes, como que uma seqüência de base decomponível em constituintes imediatos, enqua nto a unidade do produto se apresenta numa outra dimensão, transformacional e subjetiva. (...) Do eixo genético ou da estrutura profunda, dizemos que eles são antes de tudo princípios de decalque, reprodutíveis ao infinito” (Ibid, p. 21). O rizoma não é previsível, de reprodução óbvia. É, antes de tudo, um mapa imprevisível. “O mapa é aberto, é conectável em todas as suas dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber modificações constantemente” (Ibid, p. 22). Como num quebra-cabeça de peças quadradas que formam uma imagem abstrata: são muitas as possibilidades de montagem, vai de acordo com a imaginação do jogador. Para os autores, “uma das características mais importantes do rizoma talvez seja a de ter sempre múltiplas entradas” (Ibid, p. 22).

Mas, como se dão as relações de poder dentro deste rizoma virtual? A favor de uma democracia política e comunicacional ou de um fortalecimento das estruturas de poder já instituídas? Segundo Musso (2003, p. 35), as duas imagens originais das redes da Internet são redescobertas, “a que agita seus bajuladores, da livre circulação generalizada das informações, significando democracia e transparência da ‘sociedade da informação’, e a evocada por seus detratores, do controle e da vigilância generalizada”. Os poderes, desta forma, aumentam de maneira paradoxal: maior liberdade de expressão41 e troca de informações por parte do internautas, ao mesmo tempo em que crescem as possibilidades

41 Esta liberdade ainda restringe-se ao número de contatos da pessoa e à disseminação destas informações

pela Internet. Não se compara, no entanto, com as informações massivas transmitidas pelos grandes meios de comunicação.

de controle da vida das pessoas por parte de “transeuntes virtuais” e de instituições, numa mistura de “alto-falante virtual” com o panóptico42 de Foucault.

Nesta rede, pessoas e entidades do mundo inteiro utilizam o instrumento do auto- falante virtual para se fazerem ouvidas e representadas, ao mesmo tempo em que têm a possibilidade de controlar a vida alheia, através do acesso a bancos de dados pessoais, por meio de comunidades virtuais como o Orkut43 - criado para ser uma rede social e

aglutinando mais de 60 milhões de usuários cadastrados até 20 de agosto de 200744, o qual disponibiliza, de acordo com o interesse da pessoa cadastrada, as conversas dos usuários acessíveis a quem quiser consultar. A super exposição dos indivíduos vem tornando possível que empresas utilizem a Internet para pesquisar sobre a vida de futuros funcionários, além de “facilitar a vida” dos praticantes de voyeurismo - ato de “espionar” a intimidade das pessoas – os quais não precisam mais fazer “malabarismos”: basta se conectar à Internet e as possibilidades são infinitas. Desta forma, a rede virtual, propiciada pela fusão entre tecnologia e sociedade, cria um espaço de conexões onde se misturam os espaços públicos e privados.

Dentro desta rede de intersecções, Marc Guillaume (apud LEMOS, 2004, p. 106) propõe o conceito de espectralidade para definir os novos mecanismos utilizados pelas tecnologias microeletrônicas. De acordo com Guillaume, “a relação entre a tecnologia e a sociedade se dá em três níveis: estratégico (empresas, governos), retórico (discursos publicitários, media, poderes públicos) e tático (usos do quotidiano). Os dois primeiros níveis estruturam-se no que Guillaume chama de ‘mitologia programada’. Mas é no último nível que residem as possibilidades de desvios, de apropriações” (LEMOS, 2004: 106). Para aprofundar estas definições, LEMOS esmiúça o pensamento de Guillaume:

Segundo Guillaume, as interseções entre a tecnologia e a sociedade acontecem em um nível estratégico, onde a tecnologia é impulsionada pelo Estado, pelas grandes empresas, pelos Centros e Pesquisa e Desenvolvimento (R&D) e pelos grupos sociais organizados; em um nível retórico, onde são incluídas estruturas de representação de objetos através da publicidade, dos medias e dos poderes públicos; e em um nível tático, ou seja, o nível dos usos quotidianos, das práticas

42 Conceito desenvolvido por Foucault (1977), em Vigiar e Punir, para designar o controle das pessoas por

meio de um instrumento localizado em local estratégico, o qual possibilita a visão do todo e de todos. Este conceito por desenvolvido a partir de uma idéia arquitetônica projetada para presídios, em que existiria uma central de controle exatamente no meio da estrutura presidiária, que possibilitaria controlar todos os presidiários.

43 “O Orkut é uma rede social filiada ao Google, criada em 19 de Janeiro de 2004 com o objetivo de ajudar

seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos. Seu nome é originado no projetista chefe, Orkut Büyükkokten, engenheiro turco do Google. Tais sistemas, como esse adotado pelo projetista, também são chamados de rede social.” O país com o maior número de membros é o Brasil. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Orkut. Acesso em: 02 de agosto de 2007.

minuciosas e anônimas que rejeitam e transformam a lógica funcional imposta pelos dois outros níveis. Os primeiros níveis são onde nascem as mitologias programadas (LEMOS, 2004, p. 106).

Com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação, há uma re- configuração dos espaços públicos45 e privados, mesclando as esferas sociais, políticas, culturais e tecnológicas numa grande rede virtual. Muitos espaços antes considerados privados se tornam públicos: a vida íntima das pessoas passa a ser compartilhada das mais diversas formas: por meio da criação de páginas eletrônicas pessoais, blogs, fotologs,

videologs, em que diários, fotos, vídeos e depoimentos são publicados e disponibilizados

para quem quiser ver e vasculhar, como acontece com o Orkut e com o YouTube46 - o qual

se divulga com o slogan “broacast yourself ” (transmita em rede você mesmo) - disponibiliza vídeos em curta-metragem de produções amadoras e profissionais, de independentes e instituições empresariais, que não possuem, em sua maioria, outros canais de divulgação de seus trabalhos. O site possui um acesso de mais de 5 milhões de internautas, se transformando em um dos espaços virtuais de referência para a exibição e troca de materiais audiovisuais.

Ao mesmo tempo em que a Internet possibilita a super-exposição de pessoas, ela também é um meio que possibilita o total anonimato e o falseamento de identidades. A possibilidade de se comunicar com alguém sem que ela saiba nada sobre você é tão possível quanto a possibilidade de mostrar tudo sobre você (por meio de webcams, exposição de diários pessoais etc.). A busca pelo anonimato dentro de um mundo onde tudo é visível e explicitado é definido por Guillaume (apud LEMOS, 2004, p. 107), por meio do conceito já citado anteriormente, de espectralidade. Para Lemos (2004, p. 107), as tecnologias da informação e da comunicação:

constituem os pilares da cibercultura, respondendo a um desejo de escapar parcialmente e momentaneamente aos constrangimentos simbólicos da modernidade e seus funcionalismos totalitários. O próprio sujeito individualista, filho da modernidade, torna-se um espectro, porque desaparece para vagar em uma ordem simbólica que se tornou transparente. A espectralidade torna-se um fenômeno de massa já no começo do século XX, com a difusão dos filmes em salas de cinema, com o rádio e, posteriormente, a televisão, hoje entrando em sua fase mais virótica com a aparição da microinformática e das redes telemáticas (LEMOS, 2004: 107).

O anonimato pode ser alcançado por meio de diferentes ferramentas disponíveis na