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3. NAVEGANDO NO TÔLIGADO

3.3 Interatividade e Produção do Conhecimento

A interatividade é um fator primordial para a produção do conhecimento. De acordo com Bakhtin, “a consciência só pode surgir e se afirmar como realidade mediante a encarnação material em signos (...), e os signos só emergem do processo de interação entre uma consciência individual e uma outra” (BAKHTIN Apud RAMAL, 2002, p. 227). Bakhtin criou o conceito de polifonia para definir as inúmeras vozes presentes no processo de interação, as quais possibilitariam o desenvolvimento do pensamento. Segundo Ramal, citando Bakhtin,

Para Mikhail Bakhtin, a palavra ou o discurso não têm vida própria se permanecem congelados, afastados da interação verbal. A palavra viva reúne e articula em si a presença e a força de autores e leitores (...). Subjetividade, linguagem e polifonia tornam-se três conceitos em permanente articulação: é no discurso que a consciência se constitui, e só posso constituir-me na relação dialógica (sempre dinâmica e repleta de negociações e conflitos) com outros sujeitos (RAMAL, 2002, p.121 - 122).

A rede virtual se constitui, assim, enquanto um ambiente que propicia a polifonia, se transformando numa aglutinadora de diversas vozes em interação. A tecnologia como uma extensão dos órgãos motores e sensoriais possibilita que esta troca, por meio de diferentes ferramentas e linguagens, impulsione a produção de conhecimento por meio da comunicação interativa. E como as novas tecnologias possibilitam a interação humana? O dialogismo ou conversação ou até heterodialogismo (SANTAELLA, 2004) por meio do computador é propiciado, em grande parte, pelas interfaces gráficas presentes na máquina.

“Assim, a interatividade (a conexão, a conversação) precisa de um ambiente que a propicie e por isso não podemos defini-la sem a idéia de interface. Este é o ambiente de diálogo ou como alguns autores preferem, o commom ground, o terreno comum, o espaço onde se dá a interatividade” (LEMOS, 2004, p. 110).

A união entre forma, conteúdo, técnicas e tecnologia, portanto, torna-se fundamental para propiciar uma interação entre ser humano e meios de comunicação. No caso do computador, o desenvolvimento contínuo de novas tecnologias interativas tornou possível a participação de usuários sem conhecimento de programação de sistemas, os quais podem acessar o computador por meio de interfaces gráficas. De acordo com Pierre Lévy, as interfaces são todos os aparatos materiais que permitem a interação entre o universo da informação digital e o mundo ordinário. Para ele, “a evolução das interfaces de saída deu-se no sentido de uma melhoria da definição e de uma diversificação dos modos de comunicação da informação” (LÉVY, 1999, p. 37). Ainda, segundo Santaella (2004, p. 39),

A chave para conectar a rede está no seu conjunto subjacente de regras de comunicação ou protocolos. Para o usuário, a execução dos protocolos da rede é até certo ponto fácil, na medida em que não é necessário saber o que está por baixo da interface na tela, muito menos como funcionam os programas computacionais e a máquina em que esses programas são processados. Se o usuário não tiver muitas pretensões exploratórias, basta memorizar um plano técnico de indicações sumárias para que ele possa entrar na rede. É por isso que crianças de cinco anos já são capazes de se conectar a partir da memorização de uma pequena seqüência de ícones.

E para tornar possível o uso do computador no cotidiano de pessoas leigas – que não são programadoras de sistemas ou profissionais da área – o desenvolvimento da interface gráfica e de novas formas de interação entre o ser humano e o computador foi fundamental.76 A partir de então, tornou-se possível a manipulação de informações no computador sem que a pessoa tivesse o conhecimento dos códigos matemáticos que formam o sistema digital77.

A noção de interface gráfica (a manipulação de ícones pelo intermédio de um apontador – o mouse) foi popularizado com a Apple Macintosh. O objetivo do Macintosh era trazer ao grande público um sistema de manipulação de informações de fácil manuseio fazendo-se analogias com os objetos do nosso dia-a-dia (pastas, arquivos, lixeiras...). O Macintosh, através de sua interface

76 A emp resa responsável pela inovação da interface gráfica foi a Apple Macintosh.

77 Santaella utiliza o termo hipermídia para designar a convergência de mídias na Internet, tecnologia

possível graças à organização das informações em dígitos – bites de 0 a 1 - que enquadra todas as diferentes linguagens dentro de uma universal: a linguagem binária. Desta forma, som, imagem, textos e programas de informática podem ser processados dentro de um único meio de comunicação digital, através da linguagem binária, “uma espécie de esperanto das máquinas” (SANTAELLA, 2004, p. 31).

gráfica, instaura um diálogo entre o homem e o computador de forma quase orgânica. Hoje quando falamos de interface gráfica (ou GUI – Graphic Users Interface), pensamos no mouse, nos ícones e na barra de menus. Mas a evolução das interfaces homem-computador começou lentamente com os plugs e válvulas até chegar à imersão completa com a realidade virtual (LEMOS, 2004, p. 110).

Os ícones, links, imagens - elementos presentes na interface gráfica – são facilitadores e possibilitadores da ocorrência de interatividade entre ser humano e computador. Por meio desta mediação da interface gráfica, se faz possível uma comunicação interativa, a qual “pressupõe que haja necessariamente intercâmbio e mútua influência do emissor e receptor na produção das mensagens transmitidas” (...), produzidas numa região intersticial em que emissor e receptor trocam continuamente de papéis” (SANTAELLA, 2004: 160).

Para a Santaella, há pelo menos quatro tipos principais de comunicação interativa: a) a comunicação face-a-face; b) a comunicação epistolar; c) a comunicação telefônica; d) a comunicação mediada por computador (Ibid, p. 60), detalhadas adiante.

Na conversação face-a-face, ambos os corpos estão presentes e as possibilidades de diálogo aumentam, uma vez que corpo e voz ampliam as possibilidades de interação. Na comunicação epistolar, a base é a escrita, o que pode anular as possibilidades de interação, pela distância espaço-temporal que pode haver. Além disso, os elementos presentes da comunicação face-a-face, como expressões corporais e componentes semióticos têm que ser substituídos por outras formas de expressão/ manifestação. A comunicação telefônica possibilita a interação via voz em tempo real, reduzindo-se ao sentido da audição e à fala. Por último, a comunicação mediada por computador torna a interação possível por meio de diferentes elementos, principalmente após a convergência das mídias – em que imagem, som e escrita se misturam -, aumentando os sentidos perceptivos humanos envolvidos no processo. Para Santaella, “uma das características principais da tecnologia criada e distribuída em forma digital, potencializada pela configuração informacional em rede, é permitir que os meios de comunicação possam atingir os usuários e obter um feedback imediato” (SANTAELLA, 2004, p. 151).

Segundo Pierre Lévy (1999, p. 63), o dispositivo comunicaciona l designa a relação entre os participantes da comunicação em três categorias: 1) um-todos: um centro emissor envia suas mensagens a um grande número de receptores passivos e dispersos (TV, rádio etc.); 2); um-um: relações recíprocas entre interlocutores, de indivíduo a indivíduo, ponto a ponto (correio e telefone); 3) todos-todos: o ciberespaço torna disponível um dispositivo

comunicacional original já que ele permite que comunidades constituam de forma progressiva e de maneira cooperativa um contexto comum (teleconferência, www etc.).

Ainda segundo o autor, o grau de interatividade de uma mídia ou de um dispositivo de comunicação pode ser mediado nos seguintes eixos, bem diferentes: 1) possibilidades de apropriação e de personalização da mensagem recebida; 2) reciprocidade da comunicação (um-um ou todos-todos); 3) virtualidade; 4) implicação da imagem dos participantes nas mensagens; e 4) telepresença.

A interação pode ocorrer de duas formas: entre ser humano e computador e entre ser humano e ser humano por meio do computador. De acordo com LEMOS (2004, p. 112), a interatividade propiciada por máquinas pode ser do tipo técnico analógico- mecânico, que seria a relação com a máquina para fins mecânicos (como dirigir um carro); social (ou simplesmente interação), quando a máquina de alguma forma estimula o relacionamento entre as pessoas (telefone, por exemplo), e a interatividade técnico eletrônico-digital, em que há uma união das duas interações, já que o mundo virtual possibilita a interação social por meio da interação técnica analógica-mecânica. Segundo o autor,

(...) além da interatividade de tipo analógico mecânica e da interação social, podemos dizer que os novos media digitais vão proporcionar uma nova qualidade de interação, ou o que chamamos hoje de interatividade digital: uma interação técnica de tipo eletrônico-digital correspondendo à superação do paradigma analógico-mecânico. (...) A interatividade digital é um tipo de relação tecno-social (...). A tecnologia digital possibilita ao usuário interagir não mais apenas com o objeto (a máquina ou a ferramenta), mas com a informação, isto é, com o conteúdo. Isso vale tanto para uma emissão da televisão digital, como para os ícones das interfaces gráficas dos microcomputadores. (LEMOS, 2004, p. 114).

A partir destes conceitos, dividirei a interação propiciada pela máquina em interação ser humano-computador e interação ser humano-ser humano por meio do computador.

3.3.1 Interação ser humano -computador

Neste caso, a pessoa estabelece uma relação com a máquina, numa interatividade técnico analógico-mecânica e técnico eletrônico-digital e, a partir de sua interface gráfica, interage com as atividades oferecidas pela máquina: a interação ocorre entre o corpo, o sistema cognitivo humano e o computador. Os jogos eletrônicos são exemplos deste tipo de

interação, já que existe em estímulo por parte da pessoa e uma resposta por parte do computador e vice-versa. A interface inteligível desenvolvida é fundamental para propiciar a interação.

3.3.2 A interação ser humano-ser humano por meio do computador (Internet)

A interatividade propiciada é técnico analógico-mecânica e técnico eletrônico- digital e social: uma interatividade digital, em que a comunicação é bidirecional e até multidirecional e a comunicação pode ocorrer em tempo real ou não e por meio de diferentes linguagens da hipermídia.

Existem três formas de interatividade: a unidirecional (um-todos ou um-um), bidirecional (um-um com troca) e a multidirecional (todos-todos) (ALAVA apud PASSARELLI, 2006, p. 34-35), sendo que no ciberespaço, os graus de interferência do receptor-produtor de informações se intensificam, por meio das diferentes mídias presentes na Internet. O internauta possui diversas possibilidades de dialogar, já que a diversidade de instrumentos aumenta. De acordo com Lévy (1999, p. 101), o ciberespaço possibilita os seguintes modos de comunicação e de interação: acesso à distância e transferência de arquivos; correio eletrônico (troca de mensagens); conferências eletrônicas (a partir de centros de interesse); e groupware: os programas e sistemas a serviço do trabalho cooperativo (ex.: intranet). Para Santaella (2004, p. 164),

os sistemas usados na internet são muitos, exibindo diferentes capacidades tecnológicas e de interação, tanto sincrônica (como é o caso dos chats), quanto assincrônica (correio eletrônico e fóruns). Além disso, a proliferação exuberante de sites e portais que estão disponibilizados para consulta na rede deu origem à interatividade informática que produz o hipertexto hipermidiático no qual camadas de dados relacionadas entre si permitem gerar uma informação a partir de escolhas aleatórias. Nesse caso, (...) é a interatividade do cibernauta que cria o hipertexto, nos nexos, nós e redes multilineares que vão sendo geradas por suas escolhas de leituras.

E como o foi a interatividade no projeto TôLigado? Que ferramentas foram mais utilizadas que propiciaram a interatividade entre alunos, professores e gestores e as novas tecnologias, de forma a promover encontros virtuais e presenciais? A seguir, descrevo que métodos foram utilizados para elaborar a análise da interatividade que será desenvolvida no Capítulo 4 desta dissertação.