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3. NAVEGANDO NO TÔLIGADO

3.5 O método Etnográfico

3.5.2 A etnografia na escola pública

A etnografia na escola estadual paulista foi realizada em duas escolas, as que mais publicaram nas atividades de produção do conhecimento em quatro anos do projeto

TôLigado (2002-2005)93: a Escola Estadual Prof. José Felício Miziara, localizada em São José do Rio Preto, e a Escola Estadual Prof. João Portugal, localizada em Tanabi94. Estas

92 Alguns dos professores entrevistados participaram do projeto nos anos em que esta pesquisa analisa (2002-

2005)

93 O método detalhado de escolha das escolas será aprofundado no Capítulo 5 – Pisando na escola pública. 94 O método de escolha das escolas pesquisadas seguiu os seguintes procedimentos: 1) análise dos dados

quantitativos do projeto TôLigado a partir das 1.428 escolas que tiveram pelo menos uma publicação no site; 2) a partir dos dados, determinação dos critérios de escolha das escolas a serem estudadas; e 3) escolha das escolas pesquisadas a partir dos critérios levantados, como descrito adiante. Tendo em vista os diferentes graus de envolvimento das escolas no projeto TôLigado e levando-se em consideração o foco de estudo desta pesquisa – a interatividade -, optou-se por escolher as escolas com maior grau de interatividade/ publicações nas atividades de produção de conhecimento, com participação em pelo menos três anos de projeto. A partir do levantamento deste critério inicial, então, criou-se um banco de dados no programa Access, que possibilitou percorrer as seguintes etapas até a escolha final das duas escolas pesquisadas: a)Foram consideradas participantes do projeto apenas as escolas que realizaram pelo menos uma publicação entre os anos de 2002 e 2005, recorte temporal estabelecido na pesquisa pelo fato de o projeto ter sido interrompido pelo Governo do estado de São Paulo no meio do ano de 2006; b)Foram analisados os dados quantitativos de participações destas escolas, ou seja, todas as publicações de alunos e professores nas atividades oferecidas pelo site (Biotrilhas, Central de patentes, Como funciona, Comunidade viva, Quadrinhos, Repórter é você e Web zine), independentemente de seu conteúdo. Estes foram avaliados posteriormente na pesquisa qualitativa sobre as escolas selecionadas; c) A partir dos dados das publicações, foram selecionadas as instituições que publicaram pelo menos durante três anos – mais da metade da duração do projeto. Esta seleção diminuiu o universo em questão para o número de 100 escolas; d) Destas 100 escolas, foram levantadas as que mais publicaram ao longo dos anos de 2002 a 2005 – escolas que mais tiveram destaque de

escolas foram incluídas na amostragem de 10% das publicações, estando entre as 135 escolas analisadas por meio da etnografia no virtual.

A observação participante, ocorrida nos meses de outubro e novembro de 200695.,

acompanhou as experiências diárias dos agentes, para apreender sua visão de mundo, isto é, o significado que eles atribuem à realidade que os cerca e às suas próprias ações (VIÁ,

1971, p. 10).

A entrevista (de pesquisa) não é simplesmente um trabalho de coleta de informações, mas, sempre, uma situação de interação, ou mesmo de influência entre dois indivíduos, e que as ‘informações’ dadas pelo sujeito (o ‘material’ que ele fornece) podem ser profundamente afetadas pela natureza de suas relações com o pesquisador (KANDEL, apud THIOLLENT, 1987, 171).

Durante a pesquisa de campo, foram desenvolvidas as seguintes atividades: observação da rotina escolar, com ênfase para o trabalho dos PCPs, diretores e demais funcionários e participação em espaços coletivos da escola, como os HTPCs, reuniões de professores e almoços na escola; conversa informal com professores, diretores, funcionários e alunos; acompanhamento de aulas do ensino fundamental e médio nos período matutino e noturno, com a intenção de observar a dinâmica das aulas e a metodologia utilizada pelos professores nas disciplinas; acompanhamento de um conselho de classe de final de bimestre.

A pesquisa de campo privilegiou a idéia de que as operações envolvidas nessa fase visam a “reconstrução empírica da realidade” (LOPES, 1994, p. 132). Neste viés metodológico, Lopes destaca a relevância de uma conjugação responsável e de uma postura crítica diante de modelos previamente concebidos e sacralizados pelas Ciências da Comunicação. A problematização se estendeu ao conjunto teórico apresentado nesta pesquisa, para viabilizar uma “análise interpretativa”. Esta, segundo Lopes, se demarcaria pela possibilidade de explicar o fenômeno “através de operações lógicas de síntese e de amplificação levando a análise a um nível superior de abstração e de generalização” (LOPES, 1994, p. 132).

publicação no site. A partir de análise da participação destas seis escolas, chegou-se aos objetos de estudo da pesquisa etnográfica presencial: a Escola Estadual Prof. José Felício Miziara, localizada em São José do Rio Preto, e a Escola Estadual Prof. João Portugal, localizada em Tanabi, as duas escolas que mais tiveram participação entre os anos de 2002 e 2005.

95 Foram feitas duas pesquisas de campo, nas seguintes datas: 3 a 10 de outubro de 2006 e 18 a 21 de

A interpretação da realidade das escolas pesquisadas levou em consideração o conceito de descrição densa, de Geertz, na qual o pesquisador se debruça sobre o objeto de estudo de forma aprofundada e elabora descrições minuciosas. De acordo com o autor,

Um repertório de conceitos muitos gerais, feitos - na academia e sistemas de conceitos – ‘integração’, ‘racionalização’, ‘símbolo’, ‘ideologia’, ‘ethos’, ‘revolução’, ‘identidade’, ‘metáfora’, ‘estrutura’, ‘ritual’, ‘visão do mundo’, ‘ator’, ‘função’, ‘sagrado’ e, naturalmente, a própria ‘cultura’ – se entrelaçam no corpo da etnografia de descrição minuciosa na esperança de tornar cientificamente eloqüentes as simples ocorrências. O objetivo é tirar grandes conclusões a partir de fatos pequenos, mas densamente entrelaçados (...) (GEERTZ, 1973, p. 38).

Para problematizar o tema, foram adotados, ainda, dois instrumentos: questionários e entrevistas semidirigidas, a partir de ferramentas específicas, com o objetivo de detectar a relação dos agentes sociais da escola pública com a interface entre a comunicação e a educação ou educomunicação, em especial com as novas tecnologias e o projeto TôLigado. Foram aplicados questionários com 589 alunos do ensino médio (344 estudantes do 1º., 2º. e 3º. anos da E.E. Prof. José Felício Miziara e 255 estudantes de 7ª. e 8ª. séries DAE.E. Prof. João Portugal), além de questionários preenchidos por 34 agentes sociais de ambas as escolas, entre professores, coordenadores e uma diretora (23 da E.E. Prof. José Felício Miziara e 12 da E.E. Prof. João Portugal). Após esta atapa, foram selecionados alguns destes que responderam o questionário para entrevistas aprofundadas. Foram feitas entrevistas semidirigidas com 6 professores (4 da E.E. prof. José Felício Miziara e 2 da E.E. Prof. João Portugal), 2 Professores Coordenadores Pedagógicos (PCPs), um de cada escola, a diretora da E.E. Prof. João Portugal, além de 9 alunos da Escola Estadual Prof. José Felício Miziara e uma ex-aluna da E.E. Prof João Portugal que teve participação ativa no projeto TôLigado, totalizando aproximadamente 9,5 horas gravadas e transcritas.

Foi adotada a técnica da entrevista aberta, semidiretiva ou semidirigida – definidas por Orozco Gómez (1996) como entrevistas em profundidade -, em que o entrevistado elabora um roteiro a partir de diversos pressupostos alinhavados preliminarmente, no entanto oferece liberdade para que o entrevistado interfira nos rumos da entrevista. As entrevistas foram gravadas com roteiro ou semi-orientadas, "em que o pesquisador de tempos em tempos efetua uma intervenção para trazer aos assuntos que pretende investigar; o informante fala mais que do que o pesquisador, dispõe de certa dose de iniciativa, mas na verdade quem orienta todo o diálogo é o pesquisador." (QUEIROZ, 1991). Ainda, segundo VIÁ (1971, p. 10):

No questionário a informação obtida pelo pesquisador limita-se às respostas escritas e pré-determinadas. Na entrevista, o entrevistador e a pessoa entrevistada estão presentes no momento em que as perguntas são apresentadas e respondidas, existe pois uma maior flexibilidade para a obtenção de informação. O entrevistador tem oportunidade para observar a pessoa a situação total que responde.

Os dados quantitativos desta pesquisa - como número de publicações e acesso dos alunos e professores no site - foram utilizados de forma a levantar questionamentos e servem como complemento aos dados qualitativos, obtidos em questionários, entrevistas e observação direta. Segundo Orozco Gómez (1996, p. 76), a pesquisa qualitativa pode ser descrita como "um processo de indagação e exploração de um objeto, que é um objeto sempre construído, ao qual o investigador vai chegando mediante interpretações sucessivas”.

Para problematizar a relação dos agentes sociais das escolas com o projeto

TôLigado e com projetos de comunicação e educação, dividiu-se a próxima etapa da

pesquisa em dois capítulos: 4. TôLigado em rede: uma análise da interatividade , com as reflexões das análises das 814 publicações de 135 escolas participantes do projeto; e 5. Um

olhar sobre a escola estadual paulista na Era da Informação, com as análises das duas

escolas pesquisadas em campo: a E.E. Prof. José Felício Miziara e E.E. Prof. João Portugal, suas relações com o projeto TôLigado e contextualização da situação da escola pública estadual e sua incorporação dos meios de comunicação no dia-a-dia escolar.

Nestes capítulos, optou-se por apresentar uma multiplicidade de vozes, a partir da mescla dos diferentes agentes entrevistados – alunos, professores, coordenadores e diretores das escolas pesquisadas; a coordenadora do projeto TôLigado entre os anos de 2004 a 2006, Samantha Skutscka; a então Gerente da Gerência de Informática Pedagógica (GIP) da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE)/ Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, Silvia Galleta; em diálogo com as vozes de autores, os quais, retomando Bakhtin, fazem parte da composição desta polifonia.96

96 “A polifonia se define pela convivência e pela interação, em um mesmo espaço do romance, de uma

multiplicidade de vozes e consciências independentes e imiscíveis, vozes plenivalentes e consciências eqüipolentes, todas representantes de um determinado universo e marcadas pelas peculiaridades deste universo. Essa vozes e consciências não são objetos do discurso do autor, são sujeitos de seu próprio discurso” (BRAIT, 2007, p. 194).