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A criação de CME e SME e a autonomia na educação infantil

Foto 36 — Café da manhã com a família

4 PERCURSO TEÓRICO-METODOLÓGICO: fazendo caminhos e

4.1 A EDUCAÇÃO INFANTIL EM PERNAMBUCO: um estudo

4.1.2 A criação de CME e SME e a autonomia na educação infantil

A criação do CME e do SME indica níveis de autonomia nos municípios. Para aquilatar o grau de autonomia em relação à política para o atendimento na educação infantil, recorremos à identificação dos municípios que criaram Conselho Municipal de Educação (CME) e Sistema Municipal de Ensino (SME). Nesse processo,

48 RM: também chamada de Grande Recife (GR) possui o maior aglomerado urbano do Norte- Nordeste e o quinto maior do Brasil, com uma população de 3,9 milhões de habitantes (IBGE/2013). 49 Ocupa o 6 º lugar no ranking com os índices de IDHM 0.697; IDHM Renda 0.695; IDHM Longevidade 0.799; IDHM Educação 0.611.

utilizamo-nos de informações do IBGE (Perfil dos Municípios Brasileiros - Conselho Municipal de Educação – 2014)

O sentido de autonomia que orienta essa pesquisa é aquele voltado à participação social e política nas decisões, enfrentando os conflitos inerentes às dimensões individuais e coletivas que se expressam na distribuição do poder. Logo, do ponto de vista administrativo, a autonomia exige uma mudança nas relações sociais. Nessas relações, os indivíduos vão construindo sua autonomia, pois ela se desenvolve quando encontram um espaço antes habitado pela dependência ao outro, por conseguinte, constituem sua liberdade. (MOTTA, 2003). E contribuem para a autonomia política e administrativa em proveito da coletividade. Por esse motivo, entendemos que a participação social é uma prática de liberdade, envolve condicionantes históricos, culturais e econômicos que atuam nas relações individuais e coletivas. O aprendizado da autonomia corresponde à reinvenção do ser humano no processo de vivência coletiva. (FREIRE, 1996).

Tratando-se dos CME, que são órgãos em que a participação administrativa baseia-se na formação de comissões eleitas por tempo determinado, com essa característica, podem apresentar formas avançadas de participação e, em alguns casos, comissões de representação. (MARTINS, 2002). As decisões que são tomadas nos CME acontecem coletivamente. Nesse sentido, há necessidade de os seus membros terem uma postura política em relação às responsabilidades, fundada na ética, na liberdade, no respeito à dignidade que exige uma autonomia dos sujeitos envolvidos respaldados no órgão administrativo. (SANTIAGO, 2006a). “Nessa perspectiva, os movimentos autônomos e/ou participativos constituem o amplo cenário político e social que alimenta o antagonismo que fundamenta as relações sociais.” (MARTINS, 2002, p. 210).

Os Conselhos, em uma gestão pública, proporcionam uma maior interação entre Estado e sociedade civil e tornam-se, portanto, mediadores de qualidade e instrumentos de expressão, representação e participação da população (GOHN, 2011) ao oferecerem uma nova concepção de cidadania, na qual todos os sujeitos sociais têm o legítimo direito de deliberar sobre a gestão pública. (GUIMÃRAES, 2012; GOHN, 2011). Eles são formados por representantes do Estado, representantes da sociedade civil, com poderes consultivos e/ou deliberativos, que reúnem elementos da democracia representativa e da democracia direta. De acordo com Avritzer (2000, p. 18), são “instituições híbridas”. São órgãos que atuam na

prestação de serviços públicos (saúde, educação, transportes etc.). No caso da educação nos municípios, há quatro tipos de conselhos: Conselho da Alimentação Escolar (CAE), Conselho Escolar (CE), Conselho Municipal de Educação (CME) e, desde 1996, o Conselho de Acompanhamento e Controle Social do FUNDEF, atual FUNDEB. (GUIMARÃES, 2007).

Conforme Gohn (2011), os CME são órgãos que, apesar de apresentarem alguns pontos de fragilidade em relação a sua organização e funcionamento (nomeação do chefe do executivo para presidência do conselho; necessidade de superar limites técnico-burocráticos), ainda representam um dos canais de participação que se constituem espaços de decisão ocupados pela sociedade, referendando a autonomia dos municípios. Daí a importância na formulação e controle das políticas para a educação infantil.

Diante disso, buscamos saber como os CME de PE foram criados e como estão organizados50. Em uma consulta feita aos documentos do IBGE 2014,

obtivemos informações que possibilitam elaborar um quadro da situação. Podemos observar que no Estado de PE, em 97% dos municípios existe CME. Eles foram criados, em sua maioria (82%), na década de 1990 e 2000. Entretanto o mais antigo conselho implementado data de 1970, em Caruaru, seguido do conselho Recife em 1971, criados nessa década. Isso demonstra que no período recente a participação popular só veio a aumentar a partir dos anos 1990, quando o princípio da gestão democrática orientou a criação de conselhos como instâncias participativas na representação e ampliação da esfera pública, ampliando o fortalecimento da sociedade civil na participação nas ações do Estado51. Esse contexto corrobora os

dados sobre a paridade dos CME no Estado de Pernambuco, o qual atinge 96%. Como também, em relação a sua natureza52 (normativos 57% (103), consultivos

50 As informações disponíveis nesse levantamento foram dispostas em forma de quadro, disponível no apêndice 01.

51 Salienta-se que nesse período (1995-1999) o governo do estado de PE, o então governador Miguel Arraes de Alencar, instituiu uma política “do povo para o povo”, com uma proposta popular de ouvir e organizar os movimentos sociais. Na secretaria de Educação, coordenada pela professora Silke Weber, foi instituído o projeto de organização dos CME em todos os municípios de PE. Infere-se, porém, que uma política pública de incentivo a autonomia desses municípios contribuíram para que em sua maioria se efetivasse a implementação dos CME. (GUEDES, 2015).

52 Normativo – só é exercido quando existe o sistema de ensino próprio. Ele pode, assim, elaborar normas complementares às nacionais em relação às diretrizes para regimento escolar, determinar critérios para acolhimento de alunos sem escolaridade e interpretar a legislação e as normas educacionais. Consultivo – Responder a consultas sobre alvará, credenciamento e leis educacionais e suas aplicações, submetidas a ele por entidades da sociedade pública ou civil (Secretaria Municipal da Educação, escolas, universidades, sindicatos, câmara municipal, Ministério Público), cidadão ou

85% (153), fiscalizadores 74% (134) e deliberativos 86% (156)), em que ganha destaque o aspecto deliberativo, além de simultaneamente apresentarem mais de três atributos. Infere-se com isso que os conselhos objetivaram o gerenciamento democrático da educação municipal.

Há municípios que avançaram quanto a sua auto-organização, ao implementarem o Sistema Municipal de Educação (SME), o qual consolida a disposição legal dos elementos que se articulam para a efetiva concretização da autonomia do município. Os órgãos responsáveis pela articulação dos planos, programas e projetos educacionais no SME são as Secretarias Municipais de Educação em conjunto com o CME, em que promovem, viabilizam, administram e definem as políticas educacionais que norteiam os rumos da educação. (TOCANTINS, 2007). Dessa forma, a autonomia se explica na medida em que a atuação democrática conjunta do sistema se efetiva.

O SME é composto pelas instituições públicas municipais de educação básica; instituições privadas de educação infantil; Secretaria Municipal da Educação; Conselho Municipal de Educação (CME); Conselho Municipal do FUNDEF, o qual pode integrar o CME como Câmara; Conselho Municipal da Alimentação Escolar. Cada sistema de ensino atua em função das necessidades e dos objetivos específicos de sua região e são submetidos às diretrizes gerais da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) Art. 18.

Para identificarmos a existência dos Sistemas Municipais de Ensino do Estado de PE, foi realizado um levantamento a partir de três fontes: aquelas geradas pela UNCME – PE, as buscadas pessoalmente e as originadas dos sites das Secretarias de Educação, que compuseram o quadro divulgado no apêndice 01. Dentre 185 municípios de Pernambuco, 141 são subordinados ao Sistema Estadual de Educação e 46 organizaram seus SME. A tabela nº 03, a seguir, mostra a distribuição desses últimos de acordo com a divisão geopolítica do Estado.

grupo de cidadãos. Fiscalizador – promover sindicâncias, solicitar esclarecimento dos responsáveis ao constatar irregularidades e denunciá-las aos órgãos competentes. Deliberativo – essa atribuição deverá ser definida na lei que cria o conselho, que pode, por exemplo, aprovar regimentos e estatutos; autorizar cursos, séries ou ciclos; e deliberar sobre os currículos propostos pela secretaria (Secretaria Municipal de Educação, Ministério Público, Tribunal de Contas, Câmara dos Vereadores).

TABELA 03: MUNICÍPIOS QUE APRESENTAM SME DE ACORDO COM A DIVISÃO GEOPOLÍTICA DO ESTADO DE PE

REGIÕES DE DESENVOLVIMENTO

NÚMERO DE MUNICÍPIOS NÚMERO DE MUNICÍPIOS COM SME Região metropolitana 15 09 Agreste central 26 05 Agreste meridional 26 01 Mata Norte 19 02 Mata sul 24 07 Sertão central 08 03 Sertão Itaparica 07 02 Sertão do Araripe 10 05 Sertão do Moxotó 07 00 Sertão do Pajeú 17 08

Sertão do são Francisco 07 01

Total 185 46

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da UNCME, 2013

A Região Metropolitana do Estado (RM) oferece um atendimento significativo à etapa da educação infantil, também é a que concentra um maior número de SME. Dos quinze munícipios dessa região, nove têm SME organizado e funcionando. Quanto às outras regiões, encontramos uma sem SME em nenhum dos seus municípios, a exemplo do Sertão do Moxotó.

Portanto, a maioria dos municípios de PE mostrou-se sem autonomia na proposição de suas ações políticas educacionais, quando não organiza seu sistema de ensino próprio. Certamente isso pode acarretar a não adequação das políticas sociais às peculiaridades locais.

A legislação faculta ao município a criação do sistema de ensino próprio ou a integração ao sistema de ensino estadual. Essa integração há de ser realizada mediante entendimento entre os dois sistemas, em que fiquem claras as responsabilidades de cada um (LDB, Art. 11 § único53). A opção pela vinculação ao

53 Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de: I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados; II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas; III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino; IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino; V - oferecer a educação infantil em creches e pré- escolas, e, com prioridade, o Ensino Fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino. Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica.

sistema estadual de educação acarreta o caráter não normativo, nem deliberativo do CME, ou seja, abre mão de sua autonomia. (TOCANTINS, 2007).

Em síntese, a criação do SME é importante para o município, uma vez que guarda autonomia, toma suas decisões e faz opções para a implementação de políticas educacionais, em razão de se tratar de uma estrutura institucional, constituída por um conjunto de elementos autônomos (órgãos e instituições, com seus respectivos profissionais, normas, planejamento, recursos financeiros e culturais), que interagem intencionalmente na política da educação. (TOCANTINS, 2007). Por esse motivo, essa ação efetiva do município é um dos aspectos que mostram a educação infantil como segmento educacional consolidado. Portanto, a existência de SME criado, implementado e em pleno funcionamento, é relevante para o nosso estudo.

O estudo explicitou ainda que, no Estado de Pernambuco, a Região Metropolitana (RM) foi o destaque quanto ao atendimento e à autonomia pública. Nela, verificamos uma maior oferta de vagas para a educação infantil e uma concentração de municípios com SME organizados (dos 15 municípios, nove possuem o SME organizado).

Nesse caso, a RM e seus municípios com SME (Araçoiaba, Cabo de Santo Agostinho, Igarassu, Itapissuma, Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista e Recife) requereram aprofundamento, constituindo-se em objeto da segunda etapa do estudo exploratório, que contribuiu para refinar os dados e delinear o campo empírico e os sujeitos colaboradores desta pesquisa.