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Berçário no carnaval do CMEI

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Desse modo, o contexto do CMEI evidenciou uma relação entre a Proposta Curricular do Município, os Ofícios circulares registrados pela Secretaria de Educação, os princípios da instituição e a organização dos docentes e das crianças (linguagens, normatização), ao apresentar o movimento do currículo: a intencionalidade da escola, a organização dos processos de seleção, organização e construção de conhecimento por meio dos conteúdos e práticas pedagógicas, percebida na sua materialização, ou seja, na sua vivência cotidiana.

O currículo no CMEI Juntos Somos Fortes é organizado sob a forma de um conjunto de atividades da gestão-coordenação com as professoras e funcionários, realizadas com as crianças, com os pais, a partir de uma rotina, que é elaborada de forma coletiva, tendo os ateliês como estrutura de funcionamento dos espaços e do conhecimento, que tem como orientação a proposta curricular da rede municipal de ensino e os ofícios circulares que guiam a prática pedagógica.

O currículo prescrito, proposto pela Rede Municipal de Recife, levanta concepções, princípios, elementos que se destacaram em nossa análise, que constituem o centro do processo de ensino–aprendizagem, vivido na rotina. Dentre

eles, estão aspectos que sobressaíram às lentes do pesquisador no campo de pesquisa, tratados no capítulo seguinte em categorias empíricas.

Em suma, entender o currículo prescrito em seus diferentes níveis (Municipal; institucional; sala de aula/professor(a)) objetivou nosso trabalho inicialmente e contribuiu para nossas análises. Agora, entender como o currículo prescrito é vivenciado, ou melhor, como é recepcionado e ressignificado pelas professoras, qual o movimento vivido em uma instituição de educação infantil a partir das categorias apresentadas é o que veremos no capítulo a seguir.

6 A PRÁTICA PEDAGÓGICA DOCENTE–DISCENTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O CURRÍCULO EM MOVIMENTO

O processo de saber, que envolve o corpo consciente todo, sentimentos, emoções, memória, afetividade, mente curiosa de forma epistemológica, voltada ao objeto, envolve igualmente outros sujeitos cognoscentes, quer dizer, capazes de conhecer e curiosos também. (FREIRE, 1994, p. 122).

O currículo na educação infantil é uma criação social e cultural que reflete escolhas sociais conscientes, que informa valores e crenças de um grupo em relação a sua organização, seleção e construção dos saberes. Ancora-se nas concepções de criança, de educação infantil, de sociedade e se apresenta como sendo tudo o que abarca a vida na escola em movimento, com intenção e deliberação. (FREIRE, 1983, 1996, 2006; MACLAREN, 1997; MOREIRA, 2001; SACRISTÁN, 2000).

Com base nessas concepções, debruçamo-nos para a análise das relações que os sujeitos docentes e discentes estabeleceram com os conteúdos, com seus pares, com os adultos, na organização das experiências vividas na prática pedagógica docente-discente nos grupos de crianças: berçário (0-1 ano), grupo 01 (1-2 anos), grupo 02 (2-3 anos) e grupo 03 (3-4 anos) do CMEI Juntos Somos

Fortes.

Nossa intenção, neste capítulo, é apresentar o movimento do currículo na educação infantil, de modo a evidenciar como acontece a vivência do currículo, quando a professora seleciona e organiza os conteúdos em relação às ações, no trabalho com as crianças, e que ressignificações procedem das orientações prescritas pelos documentos curriculares e que materializam sua prática docente- discente.

O currículo, como se sabe, foi estruturado com base nas concepções e princípios que regem as políticas nacional e local. No caso em análise, buscou a organização por ateliês/salas temáticas, que consistiam em uma organização conceitual-pedagógica, como também física/estrutural, que se referenciava em concepções por eixos temáticos e direitos de aprendizagem, diferenciando-se de uma proposta de escolarização por disciplinas. Pretendia assim que as relações fossem vividas por temáticas vinculadas a princípios, tais como, interações e brincadeiras. Buscou-se uma prática curricular em que a relação docente-discente

acontecesse como forma de aprendizagem do mundo e com o mundo, pois em sua organização visava à indissociabilidade do cuidar e educar, que se evidenciava nos momentos dos cuidados pessoais, em geral, vividos de forma tranquila, com gestos de amorosidade, não etapistas, articulados com as atividades dos ateliês. Portanto, o currículo movimentava-se e estruturava-se com três elementos: os ateliês, os espaços diversificados e os cuidados pessoais. Os ateliês são analisados por dois vieses: a brincadeira e as linguagens verbais. Tratamos essas duas temáticas também nos espaços diversificados. Focamos ainda os cuidados pessoais que transversalizaram a prática pedagógica docente-discente. Essa é a estrutura sobre a qual nos debruçamos na análise dos dados produzidos por meio das observações.

Antes de iniciarmos as análises das informações colhidas em sessões de observação da prática, tecemos algumas considerações sobre os sujeitos do currículo: as crianças de 0 a 3 anos em situação escolar e explicitamos o contexto do centro de educação infantil, lócus da pesquisa. Apresentamos algumas caraterísticas do chão, do espaço físico onde o currículo acontece. Abordamos, a seguir, a forma de organização geral, apresentando os principais estruturantes do currículo materializado na rotina diária, com destaque para a roda de conversas, tema que se sobressaiu quando da análise dos dados empíricos, para, na sequência, mencionar as categorias construídas a partir das relações vividas na prática docente-discente, iniciando por um conteúdo singular da educação infantil: o período da adaptação.

6.1 A criança 0 a 3 anos no contexto de uma instituição de educação infantil Inicialmente, faz-se necessário tratarmos das especificidades das crianças78

de 0 a 3 anos, os sujeitos do currículo e o contexto que as situa nessa realidade, o espaço físico do CMEI; em seguida, a rotina do berçário. Concomitantemente, vamos adentrando algumas especificidades da prática pedagógica docente-discente vivida nesta turma.

As crianças de 0 a 3 anos não são seres passivos, elas interagem, têm capacidades e competências. “São pessoas potentes no campo das relações sociais e da cognição [...], são dotadas de um corpo, no qual, afeto, intelecto e motricidade estão profundamente conectados.” (BARBOSA, 2010, p. 2). Sua individualidade vai

se definindo ao articular esses elementos, por meio da interação com adultos e crianças, ao longo de sua história, portanto, seres inconclusos, de relação, históricos, datados e situados num contexto. (FREIRE, 1983). A criança é competente, única, singular, curiosa e rica em iniciativas pelo espaço que a cerca. A ampliação do seu universo cultural e pessoal acontece principalmente nas instituições de educação coletiva, quando entram em contato como esse ambiente e conhecem outros mundos diferentes dos seus. (BARBOSA, 2010; 2008).

As instituições de educação infantil têm, dessa forma, grande responsabilidade nessa formação e apresentam um currículo que considere os bebês-crianças como seres de convivência, que não só conhecem ou se apropriam da cultura existente, mas também a criam e a produzem. (OLIVEIRA, 2010, p.5). As crianças aprendem observando, tocando, brincando, experimentando, construindo ações e sentidos sobre a natureza e a sociedade, “buscando compreender o mundo e a si mesma, testando de alguma forma as significações que constrói, modificando- as continuamente em cada interação, seja com outro ser humano, seja com objetos”. (OLIVEIRA, 2010, p. 5). Conhecer a condição do ser criança como produtor de conhecimentos nessa relação com objetos da realidade cultural é assumir que o conhecimento deve estar a serviço da compreensão dessa mesma realidade cognitiva, emocional, cultural e social. (FREIRE, 1983).

Essa compreensão requer uma instituição que amplie os contatos das crianças com o mundo, cujo currículo volte-se para a formação humana, que os professores medeiem os conhecimentos, organizando, selecionando a vida no CMEI, com práticas de convívio com pessoas ou com objetos que evidenciem o patrimônio cultural, artístico e científico, por meio do exercício da docência. (BARBOSA, 2008; 2009; 2010).

Essa instituição - creche e pré-escola -, segundo as DCNEI (2009), configura um espaço educativo, que tem o papel de educar e cuidar das crianças junto às famílias e cumprir sua função sociopolítica e pedagógica, que indica a responsabilidade do Estado diante da educação coletiva das crianças na concepção desses ambientes educacionais que, consequentemente, precisam ser:

espaços privilegiados de convivência, de construção de identidades coletivas e de ampliação de saberes e conhecimentos de diferentes naturezas, por meio de práticas que atuam como recursos de promoção da equidade de oportunidades educacionais entre as crianças de diferentes classes sociais no que se refere ao acesso a bens culturais e às possibilidades de vivência da infância. (BRASIL, 2009, p. 5).

As funções que as instituições de educação infantil desenvolvem reafirmam a condição das crianças de seres de direitos. Direito a uma instituição, a um ambiente social de afirmação, de aceitação, de confiança e de respeito, um espaço privilegiado de convivência, uma oportunidade de viver com um grupo em uma cultura, priorizando as aprendizagens, com conteúdos compatíveis com a faixa etária, com seus interesses e necessidades a partir de meios participativos, dialógicos e dinâmicos. (BARBOSA, 2008, 2010; OLIVEIRA, 2002, 2010; CAMPOS, 2010; KRAMER, 1986, 1993).

Ao nos referirmos ao espaço de uma instituição de educação infantil, mencionarmos um ambiente que é formado pelo modo de ser, de estar e das relações que se travam nele, por isso é importante investigar sobre o espaço físico que compõe essas instituições. “A organização do espaço físico das instituições de EI deve levar em consideração todas as dimensões humanas potencializadas nas crianças: o imaginário, o lúdico, o artístico, o afetivo, o cognitivo etc.” (FARIA, 2001, pp. 70-71). Portanto, falar de espaço físico é tratar de elementos funcionais do processo educacional, que refletem a concepção de educação assumida pela instituição.

O espaço físico torna-se mais do que paredes, salas e pátio, são espaços de convivência e de ampliação dos conhecimentos culturais, sociais e cognitivos, de modo que também se trata de currículo. Nesse sentido, o espaço é visto como ambiente, pois de acordo com Horn e Gobbato (2015), o “ambiente diz respeito ao conjunto desse espaço físico e às relações que se estabelecem no mesmo, as quais envolvem os afetos e as relações interpessoais dos envolvidos no processo, adultos e crianças” (p. 71). Deste ponto de vista, um ambiente faz parte de um currículo com uma concepção de criança como sujeito de direito: um ambiente bonito, alegre, organizado na sua inteireza para um atendimento de qualidade, que significa um ambiente que proporciona interação, em que o adulto seja estimulador e parceiro nas iniciativas infantis, conduzindo o ambiente/espaço para algo construído na relação, como referendam Horn e Gobbato (2015):

um espaço organizado pode proporcionar interações entre as crianças e delas com os adultos. À medida que o adulto, nesse caso o parceiro mais experiente, alia-se a um espaço que promova a descentralização de sua figura e que incentive as iniciativas infantis, abrem-se grandes possibilidades de aprendizagens sem sua intermediação direta. O espaço não é, portanto, algo dado, natural,

mas sim, construído. Pode-se dizer que o espaço é uma construção social que tem estreita relação com as atividades desempenhadas por pessoas nas instituições. (HORN E GOBBATO, 2015, p. 80). A seguir, descreveremos como é a estrutura física do CMEI e como ela se transforma em um ambiente em sua vivencia cotidiana, ou seja, na construção do ambiente/espaço que é formado com e nas interações entre as pessoas, os objetos e o meio físico.

6.2 CMEI: o espaço educativo para a educação infantil

O CMEI Juntos Somos Fortes possui uma estrutura física limpa, bem cuidada, alegre, de qualidade, de inegável boniteza, nos termos de Freire (2006). Afinal uma “escola não é só um espaço físico [...] é um modo de ser.” (GADOTTI, 2007, p. 12). Contudo um modo de ser merece um corpo equilibrado, um espaço apropriado e será sobre o espaço físico que vamos explicitar a seguir.

O CMEI é um prédio com um piso térreo e um 1º andar. No térreo, encontra- se a parte administrativa, onde funcionam serviços diversos, um amplo espaço coberto e uma pequena área externa, pouco utilizada pelas crianças. No primeiro andar, estão localizadas cinco salas de aula, distribuídas por grupo etário: berçário (0-1 ano) e grupos de 01 ao 04/05 (crianças de 1 aos 5 anos), uma sala destinada ao projeto Mesas Interativas, a biblioteca e dois banheiros para crianças.

Nas salas de aula, funcionam os ateliês, e é o espaço onde ocorre a maior parte das atividades, cuja utilização se faz em forma de rodízio. São espaços usados coletivamente, assim como o refeitório e o pátio coberto. Dada a sua especificidade, o uso coletivo não se verifica com o berçário.

O berçário situa-se no primeiro andar do CMEI em uma sala ampla, dividida em cinco ambientes: o solário, espaço aberto, com acesso por uma porta de vidro temperado, que é de uso exclusivo desse grupo; do lado esquerdo, um lactário situado em um pequeno corredor, onde é produzida a alimentação das crianças; do lado direito; o banheiro, espaço de trocas e do banho, com um chuveiro, com banheira e dois trocadores.

O salão principal é um espaço amplo, climatizado, onde as crianças passam a maior parte do dia e desenvolvem as atividades, como pode ser visto nas fotos ilustrativas. Nele, estão dispostos quatro armários, um menor, onde são colocados

livros ao alcance das crianças; um maior, onde ficam os brinquedos, também de fácil acesso das crianças e dois armários fechados, destinados a guardar o material dos adultos e da professora. Existem ainda quatro berços para o repouso das crianças.