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A Crise Mundial dos Anos 30 e a Exacerbação Capitalista

Foto 5 – Uma das Famílias Entrevistadas

2.2 A Crise Mundial dos Anos 30 e a Exacerbação Capitalista

Depois da crise internacional instalada a partir da quebra da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, o mundo capitalista percebeu a necessidade de intervir para amenizar a situação dos trabalhadores, especialmente daqueles mais vulneráveis que acumulavam, sem atendimento, demandas e necessidades diversas. Assim, inspirado em sistemas de proteção social existentes em alguns países da Europa no final do século XIX, e sob pressão dos movimentos sociais, nasceu o chamado Estado de Bem-Estar Social. Apoiado nas teorias keynesianas6, configurou-se nos países capitalistas centrais um conjunto de políticas e ações destinado a atenuar problemas socioeconômicos originados no âmbito do próprio capitalismo, como a concentração de renda e a exploração do trabalho que grassavam sob o olhar indiferente do Estado. Essa estratégia, intensificada na década de 1940, ganhou reforço no

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Conjunto das teorias e medidas propostas pelo economista britânico John Maynard Keynes (1883-1946) e seus seguidores, que defendiam, dentro dos parâmetros do mercado livre capitalista, a necessidade de uma forte intervenção econômica do Estado com o objetivo principal de garantir o pleno emprego e manter o controle da inflação. (DICIONÁRIO..., 2007).

pós-Segunda Guerra mundial, quando do surgimento do socialismo/comunismo como sistema alternativo, uma vez que se apresentava o perigo de atração pela nova proposta.

As desigualdades econômicas e as agitações surgidas durante a década de 1930 fizeram com que se repensasse o papel do Estado em todo o mundo. Não existiam mais condições de se admitir um Estado inerte aos problemas socioeconômicos que se deflagravam neste período, principalmente porque aumentava a pressão de movimentos organizados sobre os governos, cobrando-lhes uma solução para seus problemas e anseios.

Em termos políticos, o Estado de Bem-Estar Social é o resultado da emancipação das forças social-democratas surgidas a Europa [...] sendo caracterizado pela fusão das idéias de natureza social com os princípios democráticos (necessários ao capitalismo). (CARDOSO, 2007, p. 46-48).

No Estado de Bem-estar Social imprime-se forte presença estatal na economia. O Estado atua em diversos setores de produtos e serviços, o que não quer dizer que essa alternativa, que se manifestou plenamente a partir da década de 1940, tenha ocorrido de modo homogêneo e simultâneo nos países onde foi adotada. Tampouco foi experimentada pelo chamado Terceiro Mundo ou, mais tarde, países em desenvolvimento, uma vez que no período em referência não havia nesses países o nível de desenvolvimento industrial necessário à sua sustentação. Foi o caso do Brasil e da América Latina como um todo. Nesses países o Estado precisou criar as condições para que ocorresse o desenvolvimento industrial, intervenção que foi denominada de Estado Desenvolvimentista. Para tanto, o Estado foi empresário, agente de planejamento, de financiamento e regulação nas diversas etapas do processo de desenvolvimento. “Pode-se afirmar que o Estado foi o agente central do desenvolvimento dos países da América Latina.” (CARDOSO, 2007, p. 54-55).

Por força das circunstâncias e das pressões, o Estado foi deixando de ser mero espectador encarregado de manter a ordem para o livre jogo da exploração do capital sobre os trabalhadores. Passou a intervir na economia, quer regulando as relações entre capitalistas e trabalhadores, quer orientando a economia através de mecanismos de estímulo ou desestímulo, com vistas à ativação ou à desativação de setores ou ramos, quer, ainda, atuando diretamente como empresário, através de empresas estatais, particularmente em setores básicos da economia e em países de desenvolvimento tardio ou, então, necessitados de esforço extraordinário para acelerar a fase de reconstrução após o desgaste provocado pelas guerras.

Esta intervenção do Estado, incipiente na terceira e na quarta década do século XX, intensificou-se depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Caracteriza uma nova fase do capitalismo, chamada neocapitalismo, capitalismo social, ou capitalismo moderno (“Estado de Bem-Estar Social”). Através dela, procurou-se atenuar a possibilidade de ação selvagem do sistema capitalista, como havia sido praticado até então, buscando-se assegurar relativo equilíbrio nas relações sociais de trabalho, mas sem alterar a essência do sistema. (BRUM, 2005, p. 31-32).

Entre 1945 e 1980, em seu movimento contínuo de expansão dos mercados, o capitalismo tornou-se multinacional, iniciando um processo de transnacionalização do capital,

que passou a integrar as economias dos países em desenvolvimento aos países imperialistas. (BRUM, 2005).

Segundo Brum (2005, p. 29), o Estado de Bem-Estar Social é caracterizado:

Por relativa intervenção do Estado como indutor da economia e impulsionador do desenvolvimento: busca de pleno emprego; expansão dos serviços públicos; implantação da infra-estrutura e atuação em setores básicos; controle da luta de classes; mediação das relações entre capital e trabalho; minimização das crises; distribuição da riqueza [...]

A crise de 1929 atingiu fortemente o Brasil, principalmente por sua fragilidade na divisão internacional do trabalho, cuja economia dependia praticamente da exportação de um único produto, o café. O país teve de voltar-se para o combate à crise, mas também para a geração de alternativas econômicas. (CORSI, 1997).

No Brasil, a intervenção estatal foi intensificada a partir de 1930, mas, em fins do século anterior e início do século XIX, foi praticada por ocasião da política de estímulo à imigração de colonos estrangeiros para desenvolver a cafeicultura, bem como dos esforços envidados para a compra do excesso da produção do café, com vistas a manter o preço do produto no mercado internacional. Porém a utilização de instrumentos de planejamento com vistas a promover o desenvolvimento industrial foi inaugurada no país “com o lançamento do ‘Plano de Metas’ do governo Juscelino Kubitschek, na segunda metade da década de 1950, marcando o início da fase desenvolvimentista”. No fim da década anterior, no alinhamento com o governo norte-americano do pós-guerra, tentou-se traçar um diagnóstico dos principais problemas econômicos brasileiros, com a formação da ‘Comissão Mista Brasil – Estados Unidos’. Paralelamente, o governo Dutra (45-51) elaborou o plano Saúde, Alimentação, Transporte e Energia (SALTE), com o objetivo de “gerenciar os gastos públicos e o investimento nos setores essenciais ao país”. Nenhum dos dois vingou, principalmente por questões orçamentárias. (CARDOSO, 2007, p. 79-81).

O permanente desafio nacional, desde os séculos de colonização, residia na falta de mercado interno. Nesse ponto crucial a crise mundial, desencadeada a partir de 1929, representou fator dinamizador para o mercado interno brasileiro. A produção industrial, que sofrera um baque nos primeiros anos da crise, tendo seu ápice para o Brasil em 1932, recupera, em 1933, os níveis alcançados em 1929. Do mesmo modo, a produção agrícola vai superando os efeitos da crise. O aquecimento do mercado interno foi estimulado pelo corte de

itens de importação, bem como pelos recursos liberados pelo setor de exportação, que encolhia seus lucros em função da crise internacional. Nesse cenário, o mercado interno, particularmente o campo da indústria, beneficiou-se do parque já instalado, a exemplo da indústria têxtil. “Esse aproveitamento mais intensivo da capacidade instalada possibilitava uma maior rentabilidade para o capital aplicado, criando os fundos necessários, dentro da própria indústria, para sua expansão subseqüente”. (FURTADO, 1980, p. 198). Outra oportunidade aproveitada à época foi a possibilidade que se apresentou aos empresários nacionais de adquirir equipamentos de fábricas que haviam falido na grande depressão. Essa ambiência favoreceu ainda:

O crescimento da procura de bens de capital, reflexo da expansão da produção para o mercado interno, e a forte elevação dos preços de importação desses bens, acarretada pela depreciação cambial, criaram condições propícias à instalação no país de uma indústria de bens de capital. (FURTADO, 1980, p. 199).

A partir de 1933, em meio a profunda crise na agricultura, a indústria sinalizava com visíveis perspectivas de crescimento. Neste cenário e, possivelmente, sob a influência dos setores e classes dominantes, no primeiro governo Vargas (1930-1945) começaram a ser construídas políticas públicas de apoio à industrialização. A carta de São Lourenço dava as diretrizes do governo nesse sentido. Para tanto, foram definidos diversos organismos e planos, como o Conselho Nacional de Petróleo (1938), o Conselho Nacional de Águas e Energia e o Plano de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional (1939). Os esforços governamentais concentraram-se particularmente com vistas a implantar a grande siderurgia nacional, o que só veio se concretizar posteriormente, em outro contexto político. (CORSI, 1997).

De acordo com Corsi (1997, p. 6):

A política de desenvolvimento acelerado, além de galvanizar o apoio de setores fundamentais, parecia ser a resposta mais eficaz ao problema da fragmentação do País em economias regionais pouco integradas. Embora o programa de Vargas não contivesse medidas efetivas visando um desenvolvimento mais equilibrado entre as regiões do País e a redistribuição da renda, o discurso e as medidas implementadas no sentido de criar um verdadeiro mercado nacional sugerem que o projeto de desenvolvimento era muito mais do que um programa de crescimento acelerado; consistia em um verdadeiro projeto de consolidação da nação a partir da hegemonia do capitalismo industrial.