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3 PARCELAMENTO DO SOLO ENTRE 191 E 1957: DIRETRIZES E FATOS ANTERIORES À INSERÇÃO DA EMPRESA FASA NO PLANO DE METAS

3.2 A elaboração de planejamentos para o Recife metropolitano (1951 e 1954)

Neste item, destacam-se dois planos da primeira metade da década de 1950, como o elaborado pelo professor e engenheiro, Antonio Bezerra Baltar, em 1951, e o Padre Louis Joseph Lebret, em 1954. Como visto anteriormente, já se cogitava, na década de 1940, a expansão do Recife sobre o território municipal de Olinda.

3.2.1 O plano pioneiro de Antonio Bezerra Baltar (1951)

Antonio Bezerra Baltar nasceu e faleceu no Recife (1915-2003). Foi engenheiro, professor, urbanista e político. Em 1938, ele se formou pela Escola de Engenharia da Universidade do Recife (ANTONIO, 2010). Em 1940, constata-se sua participação em reuniões promovidas pela LSCM, conforme matérias publicadas no Diário Oficial do Estado, período em que Agamenon Magalhães era Interventor Federal, em Pernambuco.

Possivelmente, sua formação e contatos com a situação vivenciada no espaço urbano do Recife tenham motivado a elaboração, em 1951, de sua tese de concurso intitulada “diretrizes de um plano regional para o Recife”, com a qual concorreu para o provimento da cadeira de Urbanismo e Arquitetura Paisagística, na Escola de Belas Artes, da mesma universidade pela qual se formara, havia treze anos.

Em sua “explicação pessoal”, no início da referida tese, Baltar (1951) enfatiza que sua preocupação com os problemas urbanos já provinha de outros momentos. Muito provavelmente, a diferença consistia, agora, em conceber um plano em outra escala, a metropolitana, indo além dos limites do território municipal recifense. No teor de sua obra, ele explica que os planos de Nestor de Figueiredo, Atílio Corrêa Lima e Ulhôa Cintra – ocorrido, o primeiro, em 1931 –, deram ênfase a um problema restrito e específico, em detrimento de uma perspectiva mais ampla da cidade.

Para ele,

Encarando o futuro de uma cidade real e concreta – o Recife tal como ela existe hoje com os seus encantos e as suas tremendas deficiências – procurei adotar, na análise e na concepção do plano de remodelação e expansão desse complexo urbano, o ponto de vista e a maneira de ver mais ampla do urbanismo moderno como o estão praticando à larga os ingleses a partir sobretudo da legislação britânica de 1947 sobre planejamento rural e urbano. (BALTAR, 1951, p.11). O professor Antonio Baltar considerava que o crescimento do Recife estava atrelado a determinados fatores e tentava, com seu trabalho, caracterizá-los, para que pudesse traçar algumas normas gerais adequadas ao tratamento do problema, tentando contribuir, assim, na apresentação de uma fórmula que atendesse à solução para esse desafio. Ele presumia um “novo surto de urbanização”, relacionando-o com a oferta de “energia hidro-elétrica”, proveniente de Paulo Afonso, e acreditava que seu tema era pertinente, devido a esse fato ser iminente.

Em virtude da impossibilidade em apresentar um plano completo, no que se referia à expansão da cidade, ele procurou seguir diretrizes mais consistentes para abordar tal tema. Para tanto, destacou a necessidade de trabalhos preliminares os quais, para ele, eram imprescindíveis, bem como um plano diretor da expansão urbana e remodelação da cidade do Recife.

Deste modo, no primeiro capítulo foi abordada a questão que partia “do plano da cidade ao plano da região”, pelo qual objetivava trazer dados históricos sobre a evolução do urbanismo, colocando em evidência pensamento de autores como Ebenezer Howard, Raymond Unwin, Lewis Mumford e dezenas de outros.

Pelo que se percebe, o professor Baltar, por meio de suas diretrizes, pretendia estabelecer a concepção de Cidade-Jardim. De acordo com Castello (2008, p. 46):

O Modelo Teórico de Cidade-Jardim, como ficou mundialmente conhecido, engloba na verdade uma visão muito mais abrangente e complexa de sistema urbano. A Cidade-Jardim é apenas uma parte dessa engrenagem, que prevê uma constelação de cidades interconectadas e interdependentes gravitando no entorno de uma área urbana central concentradora daqueles serviços e equipamentos de maior porte, que seriam facilmente acessados por todos os moradores através de um sistema de circulação eficiente.

Já próximo a concluir suas discussões, vinculadas à proposta do primeiro capítulo, o professor Baltar expôs, no tocante ao caso da Grã-Bretanha, que a renovação da legislação inglesa contribuiu para uma revolução urbanística com a qual se priorizou preocupações voltadas para comunidades urbanas e rurais. Assim, defende que esse seria o caminho certo, e dentre outras coisas, ainda sustentou que a realidade urbana deveria ser perpassada por um conhecimento objetivo, bem como o Poder Público deveria estar aparelhado de normas jurídicas e equipamento técnico para buscar, junto com a iniciativa privada, a respectiva solução.

A seguir ele buscou resumir a evolução urbana do Recife fazendo uma retrospecção desse processo. Aí ele aponta a década de 1920 como aquela na qual se acelerou o processo de urbanização do Recife pelo qual determinadas áreas desocupadas passaram a participar do desenvolvimento territorial da cidade. Até a referida década, aproximadamente, a morfologia urbana da cidade foi aquela consolidada pelas facilidades das comunicações entre o centro e outros núcleos urbanos, atendidos pelas maxambombas, depois pelos bondes.

No terceiro capítulo, ele observa o Recife de seu tempo levantando hipóteses acerca de questões demográficas, econômicas e culturais. Aí ele reserva uma parte para discussão de aspectos físicos e denuncia o que chama de “loteamentos irracionais”, que foram delineados, a partir de retalhamento de propriedades fundiárias, devastando a cobertura vegetal, apontando a escassez da arborização, quer seja em espaços urbanos, suburbanos ou rurais. Ele ainda traz dados sobre a atividade industrial, sistemas de transportes e educação.

O último capítulo foi reservado para as “diretrizes de um plano para a região do Recife [...]”, expondo, aí, suas ideias defendidas sobre o plano de expansão da cidade. Neste, ele destaca a necessidade de uma harmonia entre conjuntos residenciais, trabalho e transportes.

No tocante à questão residencial, são apontadas cidades-satélites que deveriam ocupar uma área de, no máximo, oitocentos hectares com cerca de quinze unidades residenciais por hectare. As indústrias da cidade regional deveriam ser localizadas de modo planejado, na periferia das cidades- satélites. As atividades agrícolas também foram contempladas nas propostas de Baltar.

O autor ainda ressalta a imprescindibilidade, no planejamento da cidade futura, de ser levada em consideração a área metropolitana, incluindo, neste caso, os territórios municipais de Olinda, Paulista, São Lourenço e Jaboatão. No caso da cidade de Olinda ele enfatiza seu relevante patrimônio histórico e artístico.

Em suas conclusões, por “blocos” enumerados, reforça, no oitavo, “estender o planejamento ao território dos municípios vizinhos – Olinda, Paulista, S. Lourenço e Jaboatão – que "anexados" ao do Recife, proporcionariam uma área metropolitana de cerca de 1.000km².” (BALTAR, 1951, p.134). Também sugere a retirada progressiva das atividades industriais conduzindo-as à periferia metropolitana. Estipula em cinquenta mil habitantes o planejamento de unidades residenciais que deveriam ser delineadas nas colinas que se encontravam no entorno do Recife, entre outras.

3.2.2 As considerações do Padre Louis Joseph Lebret (1954)

O Padre Lebret nasceu na Bretanha (França), em 1897 e faleceu em Paris, em 1966. Além de religioso, era economista. Em 1942, fundou o centro de pesquisas e ação econômica “Economia e Humanismo” e muitas associações para o desenvolvimento social, em vários países (LOUIS, 2010).

Ao abordar o “urbanismo e metropolização do Grande Recife”, Souza (2010, p.217), frisou: O Brasil foi um dois países nos quais o Padre Lebret atuou, fundando escritórios da Sociedade de Análises Gráficas e Mecanográficas para Análise de Complexos Sociais, a SAGMACS, em São paulo, e Rio de Janeiro, que ao longo dos anos 50 e 60 elaborou planos e estudos para cidades no Paraná, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso e outros estados, além de desenvolver uma metodologia para pesquisa e ação em desenvolvimentos urbanos que está na base de diversas vertentes do pensamento urbanístico nacional.

Dentre os “outros estados” nos quais o Padre Lebret atuou, se encontra o de Pernambuco. Ele aí chegou, em 03/08/1954, a convite da Comissão de Desenvolvimento de Pernambuco (Codepe) que buscava dirimir o problema de como inserir o Nordeste no surto de desenvolvimento que ocorria no país, resultando em um estudo (LEBRET, 2001).

Tal estudo refletia o desenvolvimento e implantação de indústrias, contando com a participação do Secretário Geral da Codepe e do professor Antonio Bezerra Baltar. Este, segundo Souza (2010), estava vinculado, de modo particular, às ideias do Movimento Economia e Humanismo, do padre dominicano.

Dentre as conclusões, o Padre Lebret considerou a urgência de um plano urbanístico para o Recife, devido à constatação de seu crescimento rápido, e sugeriu o estabelecimento de um perímetro de aglomeração, ressaltando que era necessário impedir o crescimento da cidade, além dele. “É preciso, no interior do perímetro atual, construir ou prever para construção os loteamentos já feitos [...]. É necessário, pois, conseguir alojar esse milhão previsível de habitantes dentro do perímetro atual dos quadros urbanos e suburbanos.” (LEBRET, 2001, p.84). Também fez referência à reserva de terrenos periféricos para as indústrias e denunciou que a especulação imobiliária, em torno dos loteamentos, aniquilava as possibilidades delas se instalarem fora do perímetro urbano da capital, muito provavelmente, Olinda estava inserida nesta situação, conforme foi visto até aqui.

O Padre Lebret aludiu às cidades-satélites das quais tratara o professor Baltar e teceu crítica, ao declarar que se tratava “de um esquema teórico e acadêmico, muito belo mas ainda desenhado no ar, porque se destinava a uma discussão universitária.” Ele ainda advertia que “nem tudo está perdido e é tempo de agir, fixando um perímetro de aglomeração e um zoneamento definitivo o mais cedo possível.” (LEBRET, 2001, p.87).