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A atuação do BNH e os parcelamentos do solo no território municipal daí provenientes

4 ASPECTOS DA ATUAÇÃO DA EMPRESA FASA ENTRE 1958 E 1966 E A DINÂMICA DO PARCELAMENTO DO SOLO NO PERÍODO

5 O PARCELAMENTO DO SOLO EM OLINDA NA TERCEIRA FASE DA EMPRESA FASA: 1967 a

5.1 A atuação do BNH e os parcelamentos do solo no território municipal daí provenientes

Dentre as políticas públicas que denotam o “Estado em ação”, há aquelas que são destinadas às empresas (políticas econômicas) e as que são vinculadas às pessoas (políticas sociais). Estas últimas abrangem diversas áreas de atuação de governos, em níveis político-administrativos e espaciais que compreendem o Federal, o estadual e o municipal. Esses campos de abrangência são representados pelos setores da educação, da saúde, do saneamento etc., bem como aquele da habitação. A depender do momento histórico, tais governos buscarão estratégias que garantam sua legitimação, diante da população que reivindica melhores condições de vida, a fim de lhe demonstrar que seus anseios serão contemplados em suas gestões.

Portanto, no que concerne a aspectos da política habitacional, constata-se que o território municipal de Olinda incorporou formas-morfológicas, durante o período populista, iniciativa que pretendia solucionar o déficit de moradias para determinados segmentos de indivíduos, constatando-se a atuação, além de uma pequena intervenção de uma entidade privada, a LSCM, e de órgãos já citados, em nível Federal. Para Gonçalves (1985, p.176), a LSCM tinha um caráter

“humanista” e, além dessa entidade, na RMR, “atuavam na produção de habitações, garantindo o financiamento, as carteiras prediais de diversos institutos e caixas de aposentadoria”.

A extinção da FCP se dá no contexto da tomada do poder pelos militares, em 1964. Neste mesmo ano, por meio da Lei nº. 4.380, de 21/08/64, é instituído o Plano Nacional de Habitação criando, ainda, o BNH e o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (Serfhau). Com essa tomada de decisão, os militares pretendiam se mostrar sensíveis aos problemas enfrentados pela população brasileira, sobretudo aquela de baixa renda, sendo a questão habitacional a que seria tratada em primeiro lugar. Deste modo, poder-se-ia garantir uma “estabilidade social” (AZEVEDO; ANDRADE, 1982).

Ao BNH foi concedida a competência para agir na orientação, disciplina e controle do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), promovendo, portanto, a construção e a aquisição de casa própria, em vários conjuntos habitacionais. Schmidt e Farret (1986, p.35), ao analisarem a cidade do autoritarismo e, mais precisamente, a cidade para o capital, afirmam que “as principais razões para deslanchar uma política habitacional, através da criação do BNH, eram a pesada migração rural- urbana e a contínua pressão inflacionária.”

Por sua vez, Santos (2005, p.124), ao observar as contradições da cidade corporativa, denunciou que:

Os conjuntos residenciais, levantados com dinheiro público – mas por firmas privadas – para as classes médias baixas e os pobres, situam-se quase invariavelmente nas periferias urbanas, a pretexto dos preços mais acessíveis dos terrenos, levando, quando havia pressões, a extensões de serviços públicos como luz, água, às vezes esgotos, pavimentação e transportes, custeados, também, com os mesmos recursos.

De acordo com Antonio Octávio Cintra, que prefaciou a obra de Azevedo e Andrade (1982), pode-se comprovar que o ideal de criação de um Banco que conduzisse a questão da moradia popular data do segundo mandato de Getúlio Vargas, em 1953. Ele também admitiu que se no período do Presidente Jânio Quadros pretendia-se uma “correção monetária”, no tocante aos financiamentos da habitação, isto indicava que havia dificuldade de enfrentar a habitação popular como um bem que deveria ser fornecido pelo Estado, ou seja, um item do desenvolvimento social.

Com o BNH, ficou estabelecida uma divisão de trabalho entre agentes públicos e privados no que concerne à captação de recursos, financiamento, construção e comercialização de moradias. No que tange a essa captação, havia as poupanças compulsórias, representadas pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e as voluntárias (letras imobiliárias e cadernetas de poupanças). Para o financiamento, o BNH definiu agentes específicos para os segmentos do mercado. Deste modo, podia-se constatar a presença de: um “mercado popular” (1 a 3 e depois até 5 salários mínimos

mensais), cujos agentes eram as Cohabs32 que poderiam estar vinculadas aos estados ou aos municípios; o “mercado econômico” (3 a 6 salários mínimos), sendo, seus agentes, as Cooperativas Habitacionais, Hipotecas e Entidades Assistenciais; e, por fim, o “mercado médio” (renda mensal mínima de 6 salários) operando com os seguintes agentes privados: Sociedade de Crédito Imobiliário (SCIs), Associações de Poupança e Empréstimos (APEs) e as Caixas Econômicas, que compunham o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) (AZEVEDO; ANDRADE, 1982).

Para superar a escassez de recursos, vivenciada no início da atuação do BNH, a fim de corrigir a rota da política habitacional, foi implementada a estratégia da gestão financeira do FGTS, pelo Banco. Também foram delineados reajustes das prestações e de amortização dos planos habitacionais, dos quais resultaram vários mecanismos, a fim de que o órgão, sem perder a racionalidade empresarial, amenizasse a situação dos mutuários, mais particularmente aqueles do mercado popular.

As Cohabs, agentes promotores do BNH para o “mercado popular”, eram constituídas na forma de sociedade de economia mista em que o estado ou o município deteria o controle acionário. Para a concretização de suas estratégias, eram necessárias as respectivas aprovações pelo BNH. Frequentemente, as municipalidades assumiam os ônus da urbanização da área onde seria edificado o conjunto: arruamentos, redes de água e esgoto etc. Às vezes, as Prefeituras doavam o terreno, implicando a não necessidade de sua obtenção pela companhia que o adquiria a preço de mercado. Os custos das obras eram repassados para aqueles que compravam as unidades residenciais.

Ao analisar a trajetória dessas companhias, Azevedo e Andrade (1982), destacaram três fases: a da implantação e expansão (1964-1969); a do esvaziamento e crise (1970-1974); e, a da restauração (1975-1980). Para eles, na primeira fase, que consistiu na montagem do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), o “mercado popular” teve prioridade da política, por representar o foco dos conflitos. No tocante à crise, admitiu-se, sobretudo, a inadimplência, devido à situação financeira dos mutuários. A última fase – a de revigoramento – foi marcada pelo atendimento às faixas mais altas do mercado popular.

Tal prioridade, enfatizada no parágrafo anterior, talvez tenha, no território municipal de Olinda, mais precisamente no bairro de Peixinhos, o exemplo mais característico quando do parcelamento do solo, aprovado e registrado em nome da Cohab-PE. Na verdade, entende-se aqui

32 Segundo Souza (1990, p.57) “em Pernambuco institue-se [sic], em janeiro de 1965, a COHAB – Recife, com

jurisdição no Grande Recife, e, em novembro do mesmo ano, a COHAB-Pernambuco, com atuação nos municípios do interior do Estado.” Ainda para a autora, mais tarde, em meados da década de 1970, essas duas companhias são incorporadas restando apenas a Cohab-Pernambuco. Novaes (1990) aponta o ano de 1975 como aquele em que foram fundidas essas duas companhias.

que o que houve foi uma espécie de “reordenamento” daqueles “lotes” produzidos pela prática espacial de segmentos pobres, ao ocuparem – ou, em alguns casos, permanecerem ocupando –, a maior porção do terreno adquirido pelo IAPC, quando a Cohab, em 1968, realizou “a transformação dos mocambos e casinhas de taipa, ali existentes, em casas de alvenaria, de dois pavimentos (duplex), para aproveitamento das reduzidas áreas que ocupavam, ficando como mutuários os moradores do local” (NOVAES, 1990, p.67). Para o mesmo autor, este fato se traduziu em uma “experiência habitacional pioneira, embora não se saiba de qual nível político-administrativo espacial ele esteja se referindo a esse pioneirismo.

Em termos de implantação de parcelamentos do solo, efetivando a política do BNH, no território municipal de Olinda, além do caso de Peixinhos, surgiram aqueles vinculados às cinco etapas do conjunto habitacional do Rio Doce, o do Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais (Inocoop), o que implantaria o conjunto habitacional conhecido como Ouro Preto Cohab e os projetos-empresa, tanto o da Novolinda, que originaria o conjunto Jardim Brasil, como o da Ciro, com a construção da Cidade Tabajara.

Para retomar os escritos de Novaes (1990, p.68), em sua obra com a qual procurou descrever a evolução urbana de Olinda e atentando-se, mais especificamente, à questão de obras de infraestrutura, ele comentou que:

Houve nos primeiros anos de funcionamento do BNH, um açodamento de empresários, em construir grandes conjuntos, sem que as obras de infra-estrutura estivessem prontas ou então em lugares onde fosse inexistente essa infra-estrutura. Tal foi o caso de enormes conjuntos como a Cidade Tabajara, parte em Olinda e parte em Paulista, que a COHAB assumiu com a falência da empresa Tabajara, para realizar as obras complementares necessárias. Em virtude desses abusos o BNH houve por bem determinar, em 1972, que as Cohabs, Inocoops e também empresas particulares, atacassem primeiro as obras de infra estrutura [sic] dos conjuntos habitacionais, antes de erguer as casas, passando a fazer o financiamento dessas obras diretamente, o que antes era feito por diversos órgãos, resultando numa falta de coordenação.

Possivelmente, as análises dessas implicações, no contexto do BNH, tenham motivado Pessôa (1982, p.89) a declarar, atentando-se a questões jurídicas, que “a ideologia que se implanta a partir da segunda metade da década de 1960, embora assemelhada em alguns pontos com a do início dos anos 1930, tem total dessemelhança com ela em relação ao uso social da propriedade urbana.”