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6. CARACTERIZAÇÃO DOS CASOS DA PESQUISA

6.2 A cidade de Natal

6.2.1 A gestão do transporte urbano em Natal

Assim como em outras cidades brasileiras, com a decadência do bonde elétrico, surge gradativamente em Natal a oferta de transporte coletivo por ônibus. A oferta deste serviço partiu da iniciativa privada, os primeiros operadores eram os donos dos veículos que ofereciam o serviço e também faziam fretamento. Na maioria das vezes os motoristas eram os proprietários dos ônibus, configurando-se em uma categoria de trabalhadores autônomos (SILVA, 2002).

Na década de 60 e início da década de 80, a cidade já contava com serviços de transporte coletivo oferecido por variadas empresas. Seguiam um modelo de operação em que o serviço era realizado pelas empresas privadas a partir da autorização de órgãos da Administração Pública Municipal (FREITAS, 2011).

Indícios de organização para a gestão do transporte coletivo em Natal datam de 1960, quando o Departamento de Fiscalização do Trânsito Municipal (DFTM) da Secretaria de Serviços Urbanos passou a realizar o controle das empresas privadas operadoras do transporte coletivo, atuando como um órgão regulador deste serviço público na cidade. Sua equipe era composta por guardas municipais e inspetores de transportes, sob a responsabilidade administrativa de representantes nomeados pelo prefeito. Em 1966, esse departamento passou a ser a Comissão de Serviços Concedidos (FREITAS, 2011).

Em 21 de dezembro de 1968, por meio da Lei municipal n° 1.805, na gestão do prefeito Agnelo Alves, o DFTM foi substituído pelo Departamento de Concessão de Trânsito (DCTRAN) e no ano seguinte foi instituída a obrigatoriedade da profissionalização e a regulamentação dos serviços de transporte coletivo (SILVA, 2002).

Assim como em outras capitais brasileiras, no final da década de 70 e início da década de 80, o GEIPOT e a EBTU interviram em Natal com o desenvolvimento de estudos para a implementação de melhorias nos sistemas de transporte e trânsito da cidade (TORQUATO, 2006). Em 1979, foi elaborado o Plano de Transportes Urbano de Natal a partir de um convênio entre o GEIPOT, a EBTU, o Governo do Estado do Rio Grande do Norte e a Prefeitura Municipal de Natal (MELLO, 2008).

Os estudos realizados na década de 80 pelo GEIPOT lograram resultados importantes para o transporte coletivo de Natal, como a reorganização por empresa das linhas de ônibus que antes não obedeciam a parâmetros operacionais pré-definidos, tendo como base um zoneamento de áreas de atuação; os itinerários foram racionalizados e teve início os primeiros processos de controle operacional. Na questão do trânsito, o primeiro estudo elaborado pelo GEIPOT intitulado de Recomendações para Implantação Imediata – RII de 1983, considerou propostas de intervenção no trânsito da cidade (TORQUATO, 2006).

Em 1980, o DCTRAN foi substituído pela Coordenadoria de Transportes Urbanos e Segurança (CTUS) criada por meio do Decreto municipal n° 2.403 de 26 de setembro de 1980, integrando a estrutura organizacional da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SEMURB). Dois anos depois, foi criado o Grupo Executivo em Transporte Urbano (GETU) pelo Decreto municipal n° 2.712 de 14 de setembro de 1982 (conforme informações descritas no Art. 6º da Lei municipal n° 3.165/1983).

No ano seguinte, o prefeito Marcos Formiga sancionou o Decreto municipal n° 2.812 de 1º de julho de 1983, que aprovou o regulamento para a exploração dos serviços de transporte coletivo de Natal (em vigência até 2015, quando foi elaborado um novo regulamento para a licitação). Segundo o Decreto, o GETU era o órgão responsável por administrar o sistema de transporte coletivo regido pelas disposições do Código Nacional de Trânsito e deste regulamento (Art. 1°) (NATAL, 1983a).

O regulamento classificou os serviços do sistema de transporte coletivo em regulares, especiais, experimentais e extraordinários (Art. 2°). Os serviços regulares constituíam os serviços básicos do sistema, executados de forma contínua e permanente, obedecendo a horários ou intervalos de tempo preestabelecidos (Art. 2°, § 1º). Correspondiam ao serviço de transporte convencional (por ônibus). Os serviços especiais eram integrados pelos serviços: porta-a-porta (escolar; industrial; de servidores ou empregados de órgãos ou entidades públicas ou privadas; ou outros serviços de natureza semelhante); transporte custeado por

órgãos ou entidades públicas ou privadas para servidores, empregados e seus dependentes, sem objetivo comercial e transportes para viagens eventuais a título de turismo (Art. 2°, § 2º). Os serviços experimentais eram aqueles executados em caráter provisório, para verificação de viabilidade, antes de sua implantação definitiva (Art. 2º, § 3º). Os serviços extraordinários, por sua vez, eram os executados para atender as necessidades excepcionais de transportes, causadas por fatos eventuais (Art. 2º, § 4º) (NATAL, 1983a).

Atentando para os serviços regulares, por estes servirem as demandas de deslocamentos da população, o regulamento estabelecia que os serviços de transporte coletivos por ônibus seriam explorados diretamente pela Administração Municipal por delegação a entidades a esta vinculadas ou às empresas particulares (Art. 5º). Nesse último caso, a seleção das empresas seria feita por meio de licitação (caput Art. 9º) e a delegação seria dada por regime de permissão, formalizada mediante "Termo de Permissão" (Art. 10) (NATAL, 1983a).

Estavam previstos no regulamento casos em que a licitação não se aplicava ou seria dispensada. O parágrafo único do Art. 9º determina que a licitação não se aplica para as linhas que merecem tratamento diferenciado da Administração, mas não cita quais sejam estas linhas. Previa a dispensa de licitação, quando houvesse a criação de novas linhas em zona já servida por empresa de transporte regular em que esta seria favorecida (Art. 9º, § 1º) (NATAL, 1983a). A licitação se dava por linha e era obrigatória somente nos casos em que não havia nenhuma empresa operando a zona da respectiva linha ou a mesma não tivesse interesse. A cidade já havia sido dividida em cinco zonas e todas estas com empresas operando, assim o mercado para novas empresas era praticamente inexistente (ORRICO FILHO, 1996; BRASILEIRO; FORTES, 1996).

O regulamento também previa os prazos de permissão para 7 e 10 anos, de acordo com o tipo de veículo (veículos de motores a combustão interna e veículos de tração elétrica, respectivamente) (Art. 7º, inciso I). Além disso, havia a possibilidade de prorrogação e renovação dos contratos de permissão, condicionadas a boa qualidade do serviço (Art. 11, § 5°) (NATAL, 1983a). Essa qualidade seria aferida pelo órgão gestor de transportes, supondo uma avaliação sistemática das empresas operadoras.

Apesar de explícita no regulamento, nunca houve qualquer licitação do transporte público na cidade de Natal. Até o momento presente deste trabalho, o que tem ocorrido é uma

negociação entre o órgão gestor de transportes e as empresas operadoras, seja para novas linhas, seja para a expansão dos serviços existentes. As disposições do regulamento citadas acima, entre outras, praticamente, excluem a possibilidade de licitação (COPPETEC, 2008a).

No mesmo ano de aprovação do regulamento do sistema de transportes coletivos, foi criada pela Lei municipal n° 3.165 de 9 de dezembro de 1983 a Superintendência de Transportes Urbanos (STU), passando a atuar em 1984 após regulamentação por decreto do Executivo, e pela mesma lei foram extintos a CTUS e o GETU. A STU foi instituída como autarquia municipal com personalidade jurídica, autonomia financeira e administrativa e patrimônio próprio, composta inicialmente pelo quadro de pessoal do GETU (Art. 1º) (NATAL, 1983b).

A STU tinha por competência realizar a gestão do sistema de transporte público de passageiros por ônibus e táxi no Município de Natal. Entre outras atividades, competia à STU: disciplinar, conceder e fiscalizar a exploração dos serviços de transporte público de passageiros por ônibus e por táxi; desenvolver o planejamento e a programação do sistema de transporte público por ônibus e estabelecer esquemas de operação para o serviço de táxi; elaborar estudos, executar e fiscalizar a política e os valores tarifários para o ônibus e para o táxi; elaborar estudos e projeto de engenharia de tráfego, regulamentar o uso e a sinalização das vias sob jurisdição e fiscalizar a circulação de veículos mediante convênio com a Polícia Militar (Art. 3º) (NATAL, 1983b).

Ainda por meio da Lei municipal 3.165/1983, foi criado o Conselho Municipal de Transporte Urbano, presidido pelo Superintendente da STU e composto por 10 membros dos seguintes órgãos: Câmara Municipal, Secretaria Municipal de Planejamento, SUMOV, DETRAN, SUTERN, REFESA (siglas não especificadas no texto da lei), Sindicato das Empresas de Transportes, Sindicato dos Condutores Autônomos de Veículos, Federação dos Conselhos Comunitários (Art. 8º) (NATAL, 1983b).

Por volta de 1996, o serviço alternativo operado por veículos de pequeno porte surge no mercado de transporte público de Natal. As primeiras manifestações significativas deste serviço concentravam-se na ligação entre os municípios de Parnamirim e Natal. Nesta época este trecho era permitido à empresa que operava por monopólio o transporte intramunicipal de Parnamirim, e então surgia o transporte operado por veículos de pequeno porte, clandestino e irregular em oposição a um operador monopolista protegido por regulamentação pública

(COPPETEC, 2008b). De certo modo, o contexto político dessa época foi favorável aos operadores alternativos:

“O contexto político em que se dava o surgimento da operação alternativa era o da campanha para as eleições municipais de 1996. A defesa dos operadores alternativos foi bancada pelo candidato de oposição à Prefeitura de Parnamirim, do mesmo partido político do governador do estado. O organismo regulador estadual, a quem caberia formalmente a fiscalização e a repressão aos serviços piratas, fez vistas grossas e criou comissões para estudar a questão; a imprensa local ecoou rapidamente o debate e o posicionamento em prol ou em contra dos alternativos se transformou em mote de campanha (defesa estrita da legalidade vs. defesa da livre competição face ao cartel dos operadores de ônibus).” (COPPETEC, 2008b).

Este processo também contou com a reação organizada das empresas de ônibus convencionais, sem a ocorrência de conflitos violentos, por meio do sindicato patronal, que investiram em campanhas publicitárias, em ações judiciais e em pressões de toda ordem contra os clandestinos. Entretanto, ao longo do tempo a oferta dos serviços alternativos em Natal cresceu, tanto nos serviços de caráter intermunicipal quanto intramunicipal. A população utilizava o serviço e as autoridades eram tolerantes. Desse modo, o processo se encaminhou para a negociação e regularização do serviço. Para os intermunicipais, a Administração Estadual providenciou licenças provisórias e, em Natal, a Prefeitura encaminhou a Câmara Municipal uma proposta de lei criando o Serviço de Transporte Opcional e regulamentando a entrada de operadores (COPPETEC, 2008b).

Após amplas negociações, que envolveram empresários de ônibus e transportadores alternativos, a Câmara aprovou com modificações a proposta do Executivo municipal e em 29 de setembro de 1997 aprovou a Lei n° 4.882, que cria e regula o serviço opcional, posteriormente regulamentada pelo Decreto nº 6.085 de 17 de outubro de 1997. Este serviço foi criado como regular e suplementar ao transporte coletivo, devendo assim ser prestado de modo contínuo e não concorrente ou coincidente com o serviço convencional (Art. 1º). É cedido por licitação em regime de permissão e segundo esta lei, só pode ser operado por pessoas físicas/firmas individuais (Art. 2º). Diferente dos convencionais, a licitação dos opcionais foi realizada e homologada em 1998, sendo implantada a operação sem maiores problemas (COPPETEC, 2008b).

Com a aprovação do Novo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997, que determina como atribuição dos municípios a gestão do trânsito, ainda no ano de 1998, através da Lei municipal n° 5.027 de 15 de julho, a Superintendência de Transportes Urbanos (STU) altera sua denominação para Superintendência de Trânsito e Transportes Urbanos (STTU), redefine suas competências, sua estrutura organizacional e a distribuição dos cargos para atender às disposições do CTB. Entre as novas atribuições do

órgão relativas ao trânsito estavam: planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas; coletar dados estatísticos e elaborar estudos sobre acidentes de trânsito e suas causas; executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar medidas cabíveis por infrações de circulações; entre outras atribuições (Art. 2º, Lei municipal 5.027/1998). No ano seguinte, através da Lei complementar 20, de 2 de maio de 1999, a autarquia foi alterada para secretaria, passando a ser um órgão público da Prefeitura Municipal de Natal, diretamente vinculado ao Gabinete do Prefeito.

Também no ano de 1997 é conferida à STTU mais uma atribuição, a elaboração e aprovação do Relatório de Impacto sobre o Tráfego Urbano (RITUR) conforme a Lei municipal n° 4.885 de 7 de outubro de 1997 e o Decreto municipal n° 8.227 de 06 de agosto de 2007.

Em 2009, na gestão da prefeita Micarla de Souza, a STTU alterou sua denominação para Secretaria de Mobilidade Urbana (SEMOB), através da Lei complementar n° 108 de 24 de junho de 2009, que dispõe sobre a organização administrativa da estrutura de órgãos da Prefeitura Municipal de Natal, mas sem alterações nas suas competências. Neste mesmo ano foi finalizada a proposta do Plano de Mobilidade de Natal. O atual Plano Diretor de Natal, aprovado em 2007, determina que em um prazo de dois anos a política de mobilidade seja instituída pelo Poder Público Municipal (Art. 57). Seguindo esta determinação, em 2008 a Prefeitura Municipal de Natal contratou a Fundação Coordenação de Projetos, Pesquisas e Estudos Tecnológicos (COPPETEC) e o Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (COPPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) para a elaboração do Plano de Mobilidade de Natal. O relatório da proposta foi concluído em 2009, no entanto não foi transformada em lei pela Câmara Municipal, não tendo efeito legal.

Recentemente, em 2014, na atual gestão municipal do prefeito Carlos Eduardo Alves, a Secretaria de Mobilidade Urbana retomou a sigla STTU e em 2015 foi aprovado o novo regimento do órgão através do Decreto municipal n° 10.801 de 25 de agosto. Também foi contratada, por licitação, uma empresa de consultoria para a reelaboração do Plano municipal de Mobilidade.

7. METODOLOGIA PARA AVALIAÇÃO DA ESTRUTURA ORGANIZACIONAL