• Nenhum resultado encontrado

A história hoje

No documento Historia e Memoria Jacques Le Goff (páginas 65-92)

Sobre a história contemporânea gostaria de apresentar um esboço da sua renovação enquanto prática científica e, por outro lado, de evocar o seu papel na sociedade.

O primeiro ponto será relativamente breve, remetendo para outro estudo [Le Goff, 1978], no qual se apresenta a gênese e os principais aspectos da renovação da ciência histórica no último meio século.

Esta tendência parece-me sobretudo francesa, mas manifestou-se em outros locais, nomeadamente na Grã- Bretanha e na Itália, particularmente em torno das revistas "Past and Present" (depois de 1952) e "Quaderni storici" (depois de 1966).

Uma das suas mais antigas manifestações foi o desenvolvimento da história econômica e social; devemos também mencionar aqui o papel da ciência histórica alemã em torno da revista "Vierteljahrsschrift für Sozial-und Wirtschaftsgeschichte", fundada em 1903, e o do grande historiador belga Henri Pirenne, teórico da origem econômica das cidades na Europa Medieval. Na medida em que a sociologia e a antropologia desempenharam um papel importante na mutação da história no século XX, a influência de um grande espírito como Max Weber e dos sociólogos e antropólogos anglo-saxônicos foram notórias.

O sucesso da "história oral" foi grande e precoce nos países anglo-saxônicos. A história quantitativa esteve em voga um pouco por toda a parte, exceto talvez nos países mediterrâneos.

Ruggiero Romano, que criou uma imagem, precursora pela sua inteligência e pelas posições tomadas, da

Storiografia italiana oggi [1978], indicou um grupo de países em que a participação da história e dos historiadores na

vida social e política, e não na vida cultural, é muito viva: a Itália, a França; a Espanha, os países sul-americanos, a Polônia, não se verificando este fenômeno nos países anglo-saxônicos, russos e germânicos.

O trabalho histórico e a reflexão sobre a história desenvolvem-se hoje num clima de crítica e desencanto perante a ideologia do progresso e, mais recentemente, de repúdio pelo marxismo, pelo menos do marxismo vulgarizado. Toda uma produção sem valor científico que só podia iludir pela pressão da moda e de um certo terrorismo político-intelectual perdeu completamente o crédito. Assinalemos que, em sentido contrário e nas mesmas condições, se gerou uma produção de pseudo-história antimarxista que parece ter tomado como bandeira o tema gasto do irracional.

Como o marxismo, se excetuarmos Max Weber, foi o único pensamento coerente da história no século XX, é importante ver o que se produziu à luz da desafeição pela teoria marxista e a renovação das práticas históricas no Ocidente, não contra o marxismo mas fora dele, embora se concorde com Michel Foucault que alguns problemas capitais para o historiador ainda não podem ser postos, senão a partir do marxismo. No Ocidente, alguns historiadores de qualidade esforçaram-se por mostrar que não só o marxismo podia fazer uma boa aliança com "a história nova", como também estava próximo dessa história, por sua consideração pelas estruturas, a sua concepção de uma história total, o seu interesse pelo domínio das técnicas e das atividades materiais.

Pierre Vilar [1973] e Guy Bois [1978] exprimiram o desejo de que a renovação passasse por "um certo regresso às fontes" (pp. 375-93). Obras coletivas como Aujourd'hui l'histoire [Hincker e Casanova, 1974] e Ethnologie

et histoire [Ethnologie, 1975], publicadas em Paris pelas Éditions Sociales, manifestaram um desejo de abertura. Uma

interessante série de textos publicados há alguns anos por alguns historiadores marxistas italianos [Cecchi, 1974], mostrou a vitalidade e a evolução desta procura. Uma obra como Le féodalisme, un horizon théorique de Alain Guerreau [1980] manifesta, não obstante os seus excessos, a existência de um pensamento marxista, forte e novo.

No Ocidente conhece-se mal a produção histórica dos países do Leste. À exceção da Polônia e da Hungria, o que se conhece não é encorajante. Talvez haja trabalhos e correntes interessantes na Alemanha do Leste.

Já considerei alguns grandes historiadores do passado como antepassados da história nova, pelo seu gosto pela investigação das causas, a sua curiosidade pelas civilizações, o seu interesse pelo material, o cotidiano, a psicologia. De La Popelinière, no fim do século XVI, a Michelet, passando por Fénelon, Montesquieu, Voltaire, Chateaubriand e Guizot encontra-se uma impressionante linhagem de diversidade. Devemos acrescentar o holandês Huizinga (morto em 1945) cuja obra-prima O Outono da Idade Média [1919] fez entrar na história a sensibilidade e a psicologia coletiva.

Considera-se a fundação da revista "Annales" ("Annales d'histoire économique et sociale" em 1929, "Annales. Économies, Sociétés, Civilisations" em 1945), obra de Marc Bloch e Lucien Febvre, como o ato que fez nascer a nova história [cf. Revel e Chartier, 1978; Allegra e Torre, 1977; Cedronio e outros, 1977]. As idéias da revista inspiraram a fundação, em 1947, por Lucien Febvre (morto em 1956) (Marc Bloch, resistente, tinha sido fuzilado pelos alemães em 1944) de uma instituição de investigação e de ensino de investigação em ciências humanas e sociais, a sexta seção (das ciências econômicas e sociais) da École Pratique des Hautes Études, prevista por Victor Duruy no momento da fundação da escola, em 1868, mas que não tinha podido concretizar-se. Em 1975, transformado na École des Hautes Études en Sciences Sociales, este estabelecimento, em que a história tinha um lugar importante, ao lado da geografia, economia, sociologia, antropologia, psicologia, lingüística e semiologia, assegurou a difusão, na França e no estrangeiro, das idéias que tinham estado na origem dos "Annales".

Podemos resumir estas idéias pela crítica do fato histórico, da história événementielle, e, em especial, política; a procura de uma colaboração com as outras ciências sociais (o economista François Simiand – que tinha publicado em 1903 na "Revue de Synthèse Historique" (pioneira da nova ciência sob a orientação de Henri Berr) um artigo,

Méthode historique et science sociale, em que denunciava os "ídolos" "políticos", "individuais" e "cronológicos", que

inspirou o programa dos "Annales", cujo espírito foi inspirado pelo sociólogo Émile Durkheim e o sociólogo e antropólogo Marcel Mauss); a substituição da históriaconto pela história-problema, a atenção pela história do presente.

méditerranéen à l'époque de Philippe II [1966], onde a história era decomposta em três planos sobrepostos, o "tempo

geográfico", o "tempo social" e o "tempo individual" – o acontecimento situa-se na terceira parte –, publicou nos "Annales" o artigo sobre a "longa duração" [1958], que viria a inspirar uma parte importante da investigação histórica subseqüente.

Um pouco por toda a parte, nos anos 70, colóquios e obras, na sua maioria coletivas, fizeram o balanço das novas orientações da história. Um trabalho conjunto [Le Goff e Nora, 1974] apresentou, com o título Faire de

l'histoire, os "novos problemas", as "novas abordagens" e os "novos objetivos" da história. Entre os primeiros, o

quantitativo em história, a história conceitualizante, a história antes da escrita, a história dos povos sem história, a aculturação, a história ideológica, a história marxista, a nova história événementielle. Os segundos referem-se à economia, demografia, antropologia religiosa, os novos métodos da história da literatura, da arte, da ciência e da política. A escolha de novos objetos tinha-se fixado no clima, o inconsciente, o mito, a mentalidade, a língua, o livro, os jovens, o corpo, a cozinha, a opinião pública, o filme, a festa.

Quatro anos mais tarde, em 1978, um dicionário da La nouvelle histoire [Le Goff, Chartier e Revel, 1978], dirigindo-se a um público ainda mais vasto, dava testemunho dos progressos da vulgarização da nova história e das rápidas deslocações de interesses no interior do seu campo, destacando também alguns temas: antropologia histórica, cultura material, imaginário, história imediata, longa duração, marginais, mentalidades, estruturas.

O diálogo da história com as outras ciências prosseguia, aprofundava-se, concentrava-se e alargava-se simultaneamente.

Concentrava-se. A par da persistência das relações entre história e economia [atestada, por exemplo, por Lhomme, 1967], história e sociologia (um dos testemunhos é o do sociólogo Alain Touraine, que dizia [1977, p. 274]: "Não separo o trabalho da sociologia, da história de uma sociedade") estabeleceu-se uma relação privilegiada entre a história e a antropologia, desejada por alguns antropólogos, por Evans-Pritchard [1961], considerada com maior circunspecção por Lewis [1968], que insiste nos diferentes interesses das duas ciências (a história voltada para o passado, a antropologia para o presente; a primeira para os documentos, a segunda para a investigação direta; a primeira para a explicação dos acontecimentos, a segunda para os caracteres gerais das instituições sociais). Mas um historiador como Carr escreve [1961]: "Quanto mais a história se tomar sociológica e a sociologia, histórica, melhor será para ambas"; e um antropólogo como Marc Augé afirma: "O objeto da antropologia não é reconstituir sociedades desaparecidas, mas pôr em evidência lógicas sociais e históricas" [1979, p. 170].

Neste encontro entre história e antropologia, o historiador privilegiou alguns domínios e problemas. Por exemplo, o do homem selvagem e o do homem cotidiano [Furet, 1971b; Le Goff, 1971a] ou ainda as relações entre cultura erudita e cultura popular [cf. Ginzburg, 1976, p. XI: "No passado, podia acusar-se os historiadores de conhecerem apenas a "gesta dei rei". Hoje já não é assim..."]. Ou a história oral sobre a qual, entre abundante literatura, destacarei um número especial dos "Quademi storici" (1977) dedicado à Oral History: fra antropologia e

storia, que coloca bem os problemas entre as várias classes sociais e as diferentes civilizações; o livrinho de Jean-

Claude Bouvier e uma equipe de antropólogos, historiadores e lingüistas: Tradition orale et identité culturelle.

Problèmes et méthodes (1980), porque valoriza as relações entre oralidade e discurso sobre o passado, define os etnotextos, assim como um método para os recolher e utilizar; e finalmente a relação de Dominique Aron-Schnapper e

Danièle Hanet,Histoire orale ou archives orales? (1980), sobre a constituição de arquivos orais na história da segurança social que levanta o problema das relações entre um novo tipo de documentação e um novo tipo de história. Destas experiências, destes contatos, destas conquistas, alguns historiadores – em cujo número me incluo – desejavam que se constituísse uma nova disciplina histórica, estritamente ligada à antropologia: a antropologia histórica.

No suplemento de 1980, a Encyclopaedia Universalis dedica um longo artigo à antropologia histórica [Burguière, 1980]. Burguière mostra que esta nova etiqueta, nascida do encontro entre etnologia e história, é mais uma

redescoberta do que um fenômeno radicalmente novo. Coloca-se na tradição de uma concepção da história cujo pai é, sem dúvida, Heródoto, e que se exprime, na tradição francesa, no século XVI, em Pasquier, La Popelinière ou Bodin; no século XVII, nas mais importantes obras históricas das Luzes e domina a historiografia românica. É "mais analítica, apostada em traçar o itinerário e os progressos da civilização; interessa-se mais pelos destinos coletivos que pelos individuais, pela evolução das sociedades que pelas instituições, pelos costumes que pelos acontecimentos", face a outra concepção "mais narrativa, mais próxima dos poderes políticos", a que vai das grandes crônicas da Idade Média aos eruditos do século XVII e à história événementielle e positivista que se impôs no século XIX. Na linha dos fundadores dos "Annales" dá-se uma ampliação do domínio da história, "na intercepção dos três eixos principais que Marc Bloch e Lucien Febvre apontavam aos historiadores: a história econômica e social, a história das mentalidades, as investigações interdisciplinares". O seu modelo são Les rois thaumaturges de Marc Bloch [1924]. Uma das suas conseqüências é a obra de Fernand Braudel Civilisation matérielle et capitalisme, onde o historiador "descreve a maneira como os grandes equilí6rios econômicos, os circuitos de trocas criavam e modificavam a trama da vida biológica e social, a maneira como, por exemplo, o gosto se habituava a um novo produto alimentar" [Burguière, 1980, p. 159]. André Burguière dá como exemplo de um domínio que a antropologia histórica procura conquistar, o de uma história do corpo, sobre a qual o historiador alemão Norbert Elias, num livro [de 19391, cuja ressonância data dos anos 70, La civilisation des Noeurs (1974), levantou uma hipótese explicativa da evolução das relações com o corpo na civilização européia: "A ocultação e o distanciamento do corpo traduzem em nível individual a tendência para a remodelação do corpo social, imposta pelos estados burocráticos; integravam-se no mesmo processo a separação das classes por idades, o isolamento dos desviados, a segregação dos pobres e dos loucos e o declínio das solidariedades locais" [Burguière, 1980, p. 159]. Os quatro exemplos de Burguière que ilustram a antropologia histórica são: 1) história da alimentação, que "se ocupa em tentar encontrar, estudar e, eventualmente, quantificar tudo o que se refere a essa função biológica, essencial para a manutenção da vida: a nutrição"; 2) a história da sexualidade e da família, que fez entrar a demografia histórica numa nova era, com a utilização de fontes coletivas (os registros paroquiais) e uma problemática que tem em conta as mentalidades, como, por exemplo, a atitude perante a contracepção; 3) a história da infância, que mostrou que as atitudes para com a criança não se reduziam a um hipotético amor paterno mas dependiam de condições culturais complexas: por exemplo, na Idade Média, não existe uma especificidade da criança; 4) a história da morte que se revelou como o domínio mais fecundo da história das mentalidades.

Assim, o diálogo entre história e ciências sociais tem tendência para privilegiar as relações entre história e antropologia, embora também se pense que a história abrange a sociologia. Entretanto, a história começa a sair do seu território de maneira ainda mais audaciosa, invadindo as ciências da natureza [cf. Le Roy Ladurie, 1967] e as da vida, em especial a biologia.

Antes de mais nada é, contudo, necessário que os cientistas tenham desejo de fazer história, mas não uma história qualquer. Vejamos o que escreve um grande biólogo, o prêmio Nobel François Jacob [1970]: "Para um biólogo, há duas maneiras de considerar a história da ciência. Em primeiro lugar, podemos ver nela a sucessão das idéias e a sua genealogia. Procura-se então o fio que conduziu o pensamento até as teorias atuais. Esta história faz-se por assim dizer ao inverso, por extrapolação do presente no passado. Passo a passo, examina-se a hipótese hoje dominante, depois, a que a precedeu, etc. Por este processo, as idéias adquirem independência... Assiste-se agora a uma espécie de evolução das idéias, sujeita talvez a uma espécie de seleção natural, baseada num critério de interpretação teórica (e de reutilização prática) e à única teologia da razão...

Há uma outra maneira de encarar a história da biologia: procurar como os objetos desta ciência se tornaram acessíveis à análise, e como se abriram assim novos domínios de investigação. Trata-se então de precisar a natureza destes objetos, as atitudes dos que os estudam, a sua maneira de observar, os obstáculos levantados pela tradição oral ao investigador... Deixa de existir então uma filiação mais ou menos linear de idéias, engendradas uma na outra. Há

um domínio que o seu pensamento procura explorar e no qual procura introduzir uma ordem; constituir um conjunto de relações abstratas de acordo, não só com as observações e as técnicas, mas também com as práticas, os valores e as interpretações dominantes".

Vemos claramente o que está aqui em questão. É a refutação de uma história idealista, onde as idéias se geram por uma espécie de partogênese, de uma história guiada pela concepção de um progresso linear, de uma história que interpreta o passado com os valores do presente. Pelo contrário, François Jacob propõe a história de urna ciência que dá conta das condições (materiais, sociais, mentais) da sua produção e que individualiza, em toda a sua complexidade, as etapas do saber.

Mas é preciso ir mais longe. Ruggiero Romano, baseando-se nos trabalhos sugestivos, indiscutivelmente bem fundamentados, de Jacques Ruffié [1976] e nos de Wilson [1975], estes mais discutíveis, afirma: "Lá onde a história tinha procurado impor-se à biologia servindo-se (mal e baixamente) dela para a história demográfica, hoje a biologia quer e pode ensinar qualquer coisa à história" [1978, p. 8].

Nitschke chamou a atenção para o interesse de uma colaboração entre historiadores e especialistas de etologia: "Múltiplos incitamentos à investigação histórica surgem de um confronto entre a etologia dos biólogos. Desejamos que este encontro entre as duas disciplinas, na perspectiva de uma etologia histórica, se torne frutuoso para ambas" [ 1974, p. 97].

Todas as mudanças profundas da metodologia histórica são acompanhadas de uma transformação importante da documentação. Neste campo, a nossa época conhece uma verdadeira revolução documental: é a irrupção do quantitativo e o recurso à informática. Chamado pelo interesse da nova história pelos grandes números, postulado pela utilização de documentos que permitem atingir as massas, como os registros paroquiais na França, base da nova demografia [cf. por exemplo Goubert, 1960], tornado necessário pelo desenvolvimento da nova história serial, o computador entrou na aparelhagem do historiador. O quantitativo que tinha aparecido na história com a história econômica, em especial com a história dos preços de que Ernest Labrousse [1933] foi um dos pioneiros, influenciado por François Simiand, invadiu a história demográfica, a história cultural. Depois de um período de entusiasmo ingênuo, foram identificados os serviços indispensáveis, prestados pelo computador em certos tipos de investigação histórica e os seus limites [cf. Furet, 1971a; Shorter, 1971; Arnold, 1974]. Também em história econômica, um dos principais responsáveis pela história quantitativa, Marczewski, escreveu: "A história quantitativa não é mais que um dos métodos de investigação no domínio da história econômica. Não exclui o recurso à história qualitativa. Esta traz- lhe um complemento indispensável" [1965, p. 48]. Um modelo inovador de investigação histórica, baseado na utilização inteligente do computador, é a obra de Herlihy e Klapisch-Zuber, Les Toscans et leurs familles, [1978].

O olhar do historiador sobre a história da sua disciplina desenvolveu recentemente um novo setor especialmente rico da historiografia: a história da história.

O filósofo e historiador polaco Krzysztof Pomian lançou um olhar penetrante sobre a história da história. Lembrou as condições históricas em que esta história tinha nascido no século XIX, sob a crítica do reinado da História: "Filósofos, sociólogos e mesmo historiadores demonstraram que a objetividade, os fatos dados de uma vez por todas, as leis de desenvolvimento, o progresso, todas as noções que até aí eram consideradas evidentes e que serviam de base às pretensões científicas da história não passavam de um logro... Os historiadores foram apresentados, na melhor das hipóteses, como ingênuos, cegos pelas ilusões que eles próprios tinham criado, ou então como charlatães" [1975, p. 936].

A história da historiografia toma como divisa a palavra de Croce: toda a história é história contemporânea e o historiador, de sábio que julgava ser, tomou-se um forjador de mitos, um político inconsciente. Mas, acrescenta Pomian, este pôr em questão não diz apenas respeito à história, mas "a toda a ciência e em especial ao seu núcleo, a física" [ibid.]. A história das ciências desenvolveu-se com o mesmo espírito crítico que a história da historiografia. Para Pomian, este tipo de história está hoje ultrapassado porque ignora o aspecto cognitivo da história e da ciência e

deveria tomar-se uma ciência do conjunto de práticas do historiador e mais ainda uma história do conhecimento: "A história da historiografia teve o seu tempo. Aquilo de que hoje precisamos é de uma história da história que deveria colocar, no centro das suas investigações, as interações entre o conhecimento, as ideologias, as exigências da escrita, em resumo, os aspectos diversos e, por vezes, discordantes do trabalho do historiador. E, fazendo isto, permitiria lançar uma ponte entre a história das ciências e a da filosofia, da literatura e talvez da arte. Ou melhor, entre uma história do conhecimento e a dos diferentes usos que dele se faz" [ibid., p. 952].

Do alargamento do domínio da história dá testemunho a criação de novas revistas num quadro temático – enquanto que o grande movimento de nascimento de revistas históricas, no século XIX, se tinha sobretudo realizado num quadro nacional.

Gostaria de recordar entre as novas revistas: 1) as que se interessam pela história quantitativa, por exemplo, "Computers and the Humanities", publicada em 1966 no Queen's College da City University de Nova Iorque; 2) as que tratam da história oral e da etno-história, entre as quais "Oral History. The Journal of the British Oral History

No documento Historia e Memoria Jacques Le Goff (páginas 65-92)

Documentos relacionados