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Antigo/moderno e história: modernismo, modernização, modernidade (séculos XIX e XX)

No documento Historia e Memoria Jacques Le Goff (páginas 98-103)

ANTIGO/MODERNO

5. Antigo/moderno e história: modernismo, modernização, modernidade (séculos XIX e XX)

Com base na herança histórica da querela entre antigos e modernos, a revolução industrial vai mudar radicalmente os termos da oposição no par antigo/moderno, na segunda metade do século XIX e no século XX. Aparecem três novos pólos de evolução e de conflito: na passagem do século XIX para o XX, movimentos de ordem literária, artística e religiosa reclamam-se ou são rotulados de "modernismo" – termo que marca o endurecimento, pela passagem a doutrina, de tendências modernas até então difusas; o encontro entre países desenvolvidos e países atrasados leva para fora da Europa Ocidental e dos Estados Unidos os problemas da "modernização", que se radicalizam com a descolonização, posterior à Segunda Guerra Mundial; para concluir, no seio da aceleração da história, na área cultural ocidental, simultaneamente por arrastamento e reação, aparece um novo conceito, que se impõe no campo da criação estética, da mentalidade e dos costumes: a "modernidade".

5.1 Modernismo

Três movimentos muito diferentes alinharam-se – um, por reivindicação, outros dois pelo conteúdo – sob esta etiqueta, em 1900: a) um movimento literário, limitado à área cultural hispânica; b) um conjunto de tendências artísticas, das quais a mais importante foi o Modern Style (arte nova); c) vários esforços de investigação dogmática, no seio do cristianismo e, principalmente, do catolicismo. Modernismo literário. Este termo "evoca, desde cerca de 1890, um conjunto de escritores de língua espanhola que escolheram este nome para manifestarem a tendência comum para uma renovação dos temas e das formas" [Berveiller, 1971, p. 138]. O modernismo, que compreende sobretudo poetas, foi particularmente vivo na América Latina, tendo como expoente máximo Rubén Darío. O seu interesse, quanto ao problema do par antigo/moderno, consiste no seu caráter de reação à evolução histórica: reação ao aumento do poder do dinheiro, dos ideais materialistas e da burguesia (o modernismo é um movimento "idealista"); reação à irrupção das massas na história (é um movimento "aristocrático" e esteticista: "não sou um poeta de massas", diz Rubén Darío, no Prefácio aos Cantos de vida y esperanza). Mas também reação contra a antiguidade clássica: escolhe os modelos na literatura cosmopolita do século XIX, de preferência os poetas franceses da segunda metade do século XIX (Rubén Darío afirma: "Verlaine é para mim muito mais que Sócrates"). Finalmente, reação contra a guerra hispano-americana de 1898 e a emergência do imperialismo ianque e alimenta as tendências "reacionárias" da "geração de 98" na Espanha e do pan-americanismo latino.

Modernismo religioso. Em sentido estrito, o modernismo é um movimento interno da Igreja católica nos

primeiros anos do século XX. o termo aparece na Itália em 1904 e o seu uso culmina na encíclica Pascendi, do Papa Pio X que o condena, em 1907. Mas o modernismo está presente na longa tensão que agita o cristianismo e, em especial, a Igreja católica, desde a Revolução Francesa até os nossos dias. O aspecto católico do conflito antigo/moderno transformou-se na confrontação da Igreja conservadora com a sociedade ocidental da revolução industrial. O termo 'moderno' torna-se pejorativo no século XIX; os chefes da Igreja e os seus elementos tradicionalistas aplicam-no, quer à teologia nascida da Revolução Francesa e dos movimentos progressistas da Europa do século XIX (o liberalismo e, depois, o socialismo), quer – o que aos seus olhos é mais grave – aos católicos seduzidos por estas idéias ou que apenas as combatem com tibieza (por exemplo, Lamennais). A Igreja católica oficial do século XIX definiu-se como "anti-moderna". O Syllabus de Pio IX (1864) está nesta ordem de idéias. O último "erro", nele condenado, é a proposição: "O Pontífice Romano pode e deve reconciliar-se e contemporizar com o

progresso, o liberalismo e a civilização moderna". É certo que 'moderno' tem, acima de tudo, o sentido neutro de 'recente', mas tende para o sentido pejorativo. No fim do século XIX e princípio do XX nasce o conflito antigo/moderno no interior do catolicismo, concentra-se e radicaliza-se em torno de dois problemas: por um lado, o dogma e sobretudo a exegese bíblica e, por outro, a evolução social e política.

Mais que o ambíguo catolicismo social que aliás se opõe abertamente à Igreja oficial, dotada, pela encíclica de Leão XIII, Rerum novarum (1891), de uma doutrina "social" igualmente ambígua, mas mais aberta, o movimento teológico e exegético é o centro da crise do modernismo. A crise vem do "atraso da ciência eclesiástica, como se dizia, em relação à cultura laica e às descobertas científicas... Foi a ocasião do encontro brutal do ensino eclesiástico tradicional com as jovens ciências religiosas, que eram constituídas longe do controle da ortodoxia e, muitas vezes, contra ela, a partir de um princípio revolucionário: a aplicação dos métodos positivos a um campo e a textos até então considerados fora do seu alcance" [Poulat, 1971, pp. 135-36].

Ligado aos problemas da liberdade do ensino superior e da criação de cinco institutos católicos, este modernismo suscitou uma crise particularmente grave na França, especialmente com Alfred Loisy, excomungado em 1908.

A propósito deste modernismo, devem sublinhar-se três fenômenos que interessam ao desenvolvimento do conflito antigo/moderno.

Na Itália, o movimento modernista desemboca numa ação de massas e propaganda, colocando em questão o domínio retrógrado da Igreja sobre a vida política, intelectual e cotidiana. Três padres representam as diversas tendências deste movimento no início do século XX: Giovanni Semeria, Romolo Mum, fundador da democracia cristã, e o historiador Ernesto Buonaiuti: o primeiro foi exilado, os outros dois excomungados. Na Itália, o modernismo coloca em questão a Igreja católica, principal obstáculo à modernização da sociedade.

O modernismo amplia, por outro lado, o campo de ação do 'moderno', opondo-se mais do que a 'antigo', a 'tradicional' e num sentido mais preciso em termos religiosos, a 'integrista'; mas, acima de tudo, porque se presta a uma gama de combinações e de variantes: fala-se por exemplo de modernismo ascético e de modernismo militar, de semimodernismo e de modernização.

Para concluir, Émile Poulat pôs bem em evidência o alcance final do modernismo. No interior do catolicismo e, para além dele, em todos os meios ocidentais em que a sua influência se fazia mais ou menos sentir, restringe o domínio do "crível" e amplia o do "cognoscível". 'Moderno' torna-se assim a pedra de toque de uma remodelação fundamental no campo do saber.

Modern Style. É possível contestar no nível, aliás importante, do vocabulário, a anexação ao campo do

'moderno' de todo um conjunto de movimentos estéticos que, por volta de 1900, na Europa e nos Estados Unidos, tomaram ou receberam diversos nomes, dos quais apenas um se chamou Modern Style. A grande maioria desses nomes oferece-nos um eco de moderno – Jugendstil, Arte jovem, Nieuwe Kunst – através da juventude ou da novidade – ou evocam a ruptura que o nome implica: Sozessionstil, Style Liberty. Em suma, estes movimentos marcam decisivamente a rejeição das tradições acadêmicas, o adeus ao modelo antigo (greco-romano) em arte. Põem fim à alternância antigo/ moderno em arte: já não se lhes irá opor um regresso ao antigo.

Guerrand [1965] fez sair o Modern Style e seus aparentados de uma dupla tendência existente na segunda metade do século XIX: a luta contra o academismo e o tema da arte para todos. Está assim estritamente ligado a três aspectos ideológicos da revolução industrial: o liberalismo, o naturalismo e a democracia.

Neste ensaio, que não é uma reflexão sobre a arte e a sua história mas sobre as metamorfoses e significados da antítese antigo/moderno, só reteremos alguns episódios, figuras e princípios significativos. Pois que o inimigo é o antigo, que produziu o artificial, a obra-prima que se dirige a uma elite, o estilo moderno será naturalista e inspirar-se-á numa natureza em que as linhas sinuosas predominam sobre as linhas retas ou simples. Terá como objetivo produzir objetos, invadir a vida cotidiana e abolir a barreira entre artes maiores e menores. Em resumo, não se dirige a uma

elite; mas a todos, ao povo, torna-se social.

Nasce na Inglaterra com William Morris (1834-96), discípulo de Ruskin, que quer mudar o aspecto da casa, lança a "revolução decorativa" e cria em Londres a primeira loja de decorações: está na base da origem do design.

É todavia na Bélgica que o movimento se coloca sob o signo do moderno, com a função, em 1881, da revista "L'Art Moderne" e que esta ligação entre arte moderna e política social se impõe mais rapidamente. Um dos fundadores da associação La Libre Esthétique, que tem como objetivo promover as novas tendências, é o redator- chefe do jornal "Peuple", órgão do partido operário belga. Victor Horta, arquiteto que explora todos os recursos do ferro, decorando e mobiliando os prédios que constrói, é um dos pioneiros da arte social e o construtor da Maison du

Peuple, em Bruxelas. Foi na Bélgica que a arte moderna encontrou o arquiteto e decorador Henry van de Velde que,

na escola que dirige em Weimar, o Bauhaus, onde lhe sucederá Gropius, prepara a grande arte arquitetônica do século XX.

Nos Países Baixos, o Nieuwe Kunst utilizou materiais de toda a espécie (madeira, porcelana, prata) e fez triunfar a nova linha no livro ilustrado, no calendário e no manifesto.

Na França, onde o Modern Style tem como capital Nancy, com os vidreiros Gallé, os irmãos Dereux e o arquiteto Victor Prouvé, que pratica todas as artes, o Modern Style desce às ruas com Hector Guimard, o "Ravachol da arquitetura", que faz das estações de metrô de Paris templos de arte moderna e com o gráfico Alphonse Mudra. O moderno invade a joalheria e a ourivesaria com René Lalique que abre uma loja com Samuel Bing onde vende objetos de Modern Style.

Na Alemanha e em Mônaco, a arte moderna alia-se, sob o signo da juventude, ao pacifismo e ao anticlericalismo. Na Espanha e sobretudo na Catalunha, a arte moderna suscita o aparecimento do gênio da arquitetura naturalista: Gaudi.

Na Itália, o estilo Liberty, do nome do mercador inglês que, em 1875, tinha fundado em Londres uma casa de decoração, triunfa na primeira exposição internacional de arte decorativa moderna (Turim, 1902).

Nos Estados Unidos, a figura exemplar é a de Tiffany, em cuja "oficina de arte" de Nova Iorque se distingue em todas as artes ditas menores e faz a promoção do vidro soprado, através da decoração da mais cotidiana das invenções modernas: a iluminação elétrica.

O Modern Style, fenômeno efêmero, que dura menos de vinte anos, entre 1890 e 1910, é ultrapassado por um movimento nascido da recusa da decoração, das curvas e dos floreados, iniciado em Darnstadt, na Alemanha, e que triunfa na Áustria com Adolphe Loos que, sobre as ruínas do ornamento, se torna o profeta de um "novo século", o "das grandes paredes brancas", o reinado do cimento.

Mas o Modern Style, a partir de 1970, sai de um longo purgatório para se impor de novo na esteira da "modernidade", graças a características bem analisadas por Delevoy [1965]: o Kitsch é uma "dimensão de gratuito", um sistema de objetos, de estruturas ambientais, uma linguagem de ambigüidade. A diferença essencial é que, enquanto que o espírito "antigo" se alimentava de heróis, de chefes, de gestas, o espírito moderno vive, pelo contrário, do cotidiano, do massivo, do difuso.

5.2 Modernização

O primeiro embate total entre antigo e moderno foi, talvez, o dos índios da América com os Europeus, e as suas conseqüências foram claras: os Índios foram vencidos, conquistados, destruídos e assimilados; raramente as várias formas de imperialismo e colonialismo, do século XIX e princípio do XX, tiveram efeitos tão radicais. As nações atingidas pelo imperialismo ocidental, quando conseguiram alcançar mais ou menos a sua independência, foram confrontadas com o problema do seu atraso em certos campos. A descolonização, posterior à Segunda Guerra Mundial, permite às novas nações que, por sua vez, abordem este problema.

Quase todas as nações atrasadas se encontraram perante a equivalência entre modernização e ocidentalização e o problema do moderno foi posto paralelamente ao da identidade nacional. Um pouco por todo o lado distinguiu também a modernização econômica e técnica da modernização social e cultural.

Analisemos alguns exemplos que ilustram a transformação do par antigo/moderno. Sem minimizar o caráter relativamente arbitrário desta enumeração, distinguir-se-ão três tipos de modernização: a) a modernização equilibrada, em que o êxito da penetração do ."moderno" não destruiu o valores do "antigo"; b) a modernização conflitual que, atingindo apenas uma parte da sociedade, ao tender para o "moderno", criou conflitos graves com as tradições antigas; c) a modernização por tentativas que, sob diversas formas, procura conciliar "moderno" e "antigo", não através de um novo equilíbrio geral, mas por tentativas parciais.

O modelo de modernização equilibrada é o Japão. Decidida, de cima, numa sociedade hierarquizada, no momento em que a revolução industrial e as descobertas do século XIX se difundiam – o que permitirá ao Japão juntar-se rapidamente ao conjunto das nações modernas –, a modernização Meiji (a partir de 1867) caracterizou-se pela recepção das técnicas ocidentais e a conservação dos valores próprios. Mas o regime autocrático-militarista que dela saiu sujeitou-se à prova da derrota em 1945 que foi, de certo modo, uma crise maior no processo de modernização do Japão. Ainda neste final de século, a sociedade japonesa, apesar dos progressos em direção à democracia política, vive, de maneira perigosa, tensões inerentes a um equilíbrio instável, entre o "antigo" e o "moderno".

Pode vir a acontecer que, de modo diferente, e a partir de elementos muito mais complexos, Israel venha também a representar um modelo atual de modernização equilibrada. Mas aqui as tensões situam-se no interior de componentes geográficas e culturais do novo povo israelita e, globalmente, entre as tradições hebraicas (e seu fundamento religioso) e a necessidade que o novo Estado tem de uma modernização, uma das garantias essenciais da sua existência. Pelas mesmas razões de sobrevivência, Israel deve salvaguardar a todo custo o seu patrimônio "antigo" e desenvolver o caráter "moderno".

Podemos citar, como exemplo de modernização conflitual, a maioria dos países do mundo muçulmano. Aí a modernização não teve origem, na maior parte dos casos, numa escolha, mas numa invasão (militar ou não) e, em todos os casos, num choque com o exterior. Em quase toda a parte, a modernização adquiriu a forma de ocidentalização, o que tornou evidente ou criou um problema fundamental: Ocidente ou Oriente? Sem analisar em detalhe este conflito, podemos dizer que, historicamente, revestiu três aspectos: no século XIX, como contragolpe do Imperialismo europeu, colonialista ou não; depois da Segunda Guerra Mundial, no quadro da descolonização e da emergência do Terceiro Mundo; nos anos 70 (século XX) com o boom do petróleo.

Apesar da grande variedade de casos muçulmanos, em seu conjunto a modernização só tocou alguns setores da economia e da vida superficial dos estados e das nações, só seduziu equipes dirigentes e meios sociais limitados a certas categorias "burguesas". Exasperou os nacionalismos, cavou o fosso entre as classes, introduziu um profundo mal-estar na cultura.

Jacques Berque [1974] e Gustav von Grünebaum [1962], entre outros, analisaram bem este mal-estar. Para o segundo, a modernização põe aos povos e às nações do Islã o problema essencial da sua identidade cultural. Jacques Berque reencontrou nas "linguagens árabes do presente" a ruptura que os economistas deploram no seu domínio: "setor moderno/setor tradicional". Estudando as formas literárias e artísticas modernas no mundo árabe que, há cem anos, "ignorava a pintura, a escultura e mesmo a literatura, no sentido que os tempos modernos dão a estas palavras" [1974, p. 290], Jacques Berque mostra as contradições que, no ensaio, no romance, na música, no teatro e, paradoxalmente, no cinema, arte sem passado, agitam e, de certo modo, paralisam a cultura. Neste mundo em que a "normalidade invoca a referência aos antigos" e no qual "a exceção procede direta ou indiretamente do estrangeiro", a modernidade não opera como criação mas "como aculturação ou transição, entre o arcaico e o importado".

das heranças e das orientações, dois elementos básicos dominam o problema antigo/moderno: a) a independência é muito recente, os elementos de modernismo trazidos pelos colonialistas são fracos, descontínuos, inadequados às necessidades reais dos povos e das nações, em resumo, o "moderno" é muito jovem; b) em contrapartida, o atraso histórico é grande, e o "antigo' é muito pesado.

Em conseqüência, através das diversas fórmulas políticas e ideológicas há, em geral, dois desejos: a) encontrar o que, no "moderno", convém à África, praticar uma modernização seletiva, parcial, lacunar, empírica; b) procurar um equilíbrio especificamente africano, entre tradição e modernização.

Apesar dos inegáveis êxitos e dos consideráveis esforços temos, por vezes, a impressão de que a modernização na África negra está ainda no comovente estado de encantamento e que procede com um misto de empirismo e de retórica (mas talvez tenha razão em proceder assim e este seja um processo específico e eficaz de modernização). Por exemplo, Amadou Hampaté Ba, diretor do Institut de Sciences Humaines do Mali, declarou durante um encontro internacional em Bouaké em 1965: "Quem diz "tradição' diz herança acumulada durante milhares de anos por um povo e quem diz "modernismo' diz gosto ou até mania do que é atual. Não penso que tudo o que é moderno seja sempre um progresso absoluto em relação aos costumes transmitidos de geração para geração, até hoje. O modernismo pode ser um progresso ou uma regressão sob esse mesmo aspecto"; e ainda: "A tradição não se opõe ao progresso; procura-o, pede-o, pede-o a Deus e até ao próprio Diabo'.

Resta-nos analisar um caso talvez aberrante em relação ao problema da modernização. Se acreditarmos em Louis Dumont, na índia o sentido do tempo e da história escapou até hoje à noção de progresso. Também lá se "discutiam os respectivos méritos de antigos e modernos", mas de certo modo à parte, comparando-os uns com os outros sem a intervenção de nenhuma idéia de progresso (ou regressão). "A história era apenas um repertório de altos feitos e de modelos de conduta, de exemplos" [1964, p. 36], dos quais uns ficavam mais longe e outros mais perto, tal como se poderiam situar à direita ou à esquerda, a norte ou a sul, num mundo não-orientado por valores topológicos.

Para além disso, as condições de independência, longe de simplificarem o problema da modernização, complicaram-no, segundo Louis Dumont: "A adaptação ao mundo moderno exige aos Indianos um esforço considerável. A independência criou um mal-entendido pois, ao obtê-la, foram reconhecidos como seus iguais, pelo conjunto das nações, o que os fez imaginar que a adaptação estava, no fundamental, acabada. Estava consolidada a vitória do seu esforço, então só era preciso mantê-la. Ora, o contrário é que era verdadeiro... Pois a índia conseguiu desembaraçar-se do domínio estrangeiro realizando o mínimo de modernização. Sucesso notável, é certo, devido em grande parte ao gênio de Gandhi, cuja política penso resumir-se nesta fórmula" [ibid., pp. 72-73].

Se acreditarmos em Louis Dumont, será que uma parte importante da humanidade escapou até hoje à dialética dinâmica do par antigo/moderno?

5.3 Modernidade

O termo 'modernidade' foi lançado por Baudelaire no artigo Le peintre de Ia vie moderne, escrito na sua maior parte em 1860 e publicado em 1863. O termo teve um sucesso inicial limitado aos ambientes literários e artísticos da segunda metade do século XIX; teve depois um reaparecimento e uma ampla difusão após a Segunda Guerra Mundial.

Baudelaire – e isto é novo – não procura justificar o valor do presente – logo do moderno – para além do fato de ser presente. "O prazer que retiramos da representação do presente não só provém da beleza de que se pode revestir, mas também da qualidade essencial de ser presente" [ 1863]. O belo tem uma parte eterna, mas os "acadêmicos" (os sectários do antigo) não vêem que tem também necessariamente uma parte "ligada à época, à moda, à moral, à paixão" [ibid.]. O belo deve ser, pelo menos em parte, moderno. O que é a modernidade? É o que há de "poético" no "histórico", de "eterno" no "transitório". A modernidade tem ligações com a "moda". Assim, nos

exemplos que dá, Baudelaire fala também de moda feminina, do "estudo do militar, do dandy e do próprio animal, cão ou cavalo". Dá ao significado de moderno uma tonalidade que o liga aos comportamentos, costumes e decoração. "Cada época", diz, "tem o seu porte, o seu olhar, o seu gesto". Devemos interessar-nos pelo antigo, tal como pela arte pura, a lógica, o método em geral! Quanto ao resto, devemos manter a "memória do presente" e estudar cuidadosamente "tudo o que constitui a vida exterior de um século".

A modernidade está pois ligada à moda, ao dandismo, ao esnobismo: "A moda deve ser considerada",

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