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A I Conferência Nacional de Emprego e Trabalho Decente

No documento ANA LÚCIA DE OLIVEIRA MONTEIRO (páginas 148-153)

Capítulo 4. A CONCEPÇÃO DO TRABALHO DECENTE

4.4. A I Conferência Nacional de Emprego e Trabalho Decente

A participação social na discussão de políticas públicas é uma demanda antiga da sociedade brasileira, tendo sido consagrada na Constituição Federal de 1988 como forma de afirmação da democracia. Essa forma de inclusão da sociedade na gestão pública racionaliza recursos e proporciona ações substantivas de transformação social que vem consolidando um modelo democrático de governo nos últimos anos no Brasil (SGPR, 2011).

A realização de conferências nacionais, estaduais, regionais ou municipais, a criação de conselhos e ouvidorias, audiências públicas, plebiscitos e referendos viabilizam a intervenção de diversos segmentos na discussão, formulação, alteração e implementação de políticas públicas.

Segundo Bezerra (2004) esse modelo de democracia participativa fortalece a percepção de que as políticas são desenhadas a partir do conjunto dos cidadãos e não como decisão verticalizada, propiciando sua incorporação pela sociedade e facilitando sua implementação em nível local.

Entre os mecanismos de participação popular, Bezerra (2004) destaca a criação dos conselhos e a realização das conferências nacionais, sendo os conselhos entidades instituídas no âmbito do Estado com caráter consultivo e deliberativo, cujas atribuições são fundamentais para o acompanhamento das políticas públicas. Já as conferencias são eventos de grande amplitude cujo objetivo é realizar consultas públicas para definir

36 O Plano Brasil Sem Miséria é um programa governamental que tem por objetivo elevar a renda e o bem-

estar da população. É direcionado aos brasileiros que vivem em lares com renda per capita menor que R$70 por pessoa, visando alcançar cerca de 16,2 milhões de pessoas que ainda vivem abaixo da linha da pobreza segundo o Censo Demográfico de 2010. Ver http://www.mds.gov.br/falemds/perguntas- frequentes/superacao-da-extrema-pobreza%20/plano-brasil-sem-miseria-1/plano-brasil-sem-miseria

diretrizes na elaboração e condução de políticas públicas, assim como também monitorar a sua implementação (BEZERRA, 2004).

Segundo documento elaborado pela Secretaria Geral da Presidência da República, entre 2003 e 2010 foram criados dezenove conselhos e outros dezesseis foram reformulados, buscando incorporar as pautas e interesses de diversos setores sociais.

De acordo com a mesma fonte, entre 1941 e 2011 foram realizadas 127 conferências nacionais, sendo que 86 ocorreram no período compreendido entre 2003 e 2012, abrangendo mais de 40 áreas setoriais em nível municipal, estadual, regional e nacional. Para 2013 e 2014 estão previstas a realização de 19 conferências nacionais, propiciando os debates, tanto em nível local quanto nacional, já que em geral as conferências nacionais são precedidas de conferências preparatórias que oferecem oportunidades para que os indivíduos dêem visibilidade aos problemas locais e proponham alternativas de soluções (SGPR, 2011).

Tendo por objetivo definir e estabelecer as bases para uma Política Nacional de Emprego e Trabalho Decente, tendo por base o PNETD e sendo organizada por meio de um amplo processo tripartite de discussão nacional, a Conferência foi a instância definida para materializar o propósito de consolidar a incorporação das diretrizes do Trabalho Decente nas políticas públicas e estratégias empresariais, convertendo-as em componentes indissociáveis do modelo de desenvolvimento social econômica e ambientalmente sustentável.

Segundo CNETD (2011), para além de um acontecimento pontual, a Conferência pretendia estruturar um processo de discussão permanente, envolvendo o governo e a sociedade com o intuito de construir e implementar uma política nacional para a promoção do emprego pleno e inclusivo.

A realização da I CNETD, em agosto de 2012, em Brasília perpassou por diversas etapas no sentido de mobilizar nacionalmente os atores tripartites e preparar as discussões que seriam promovidas na Conferência.

A primeira etapa foi o pré-lançamento da Conferência pelo MTE, realizado em maio de 2010 em Brasília, com a presença de Ministros de Estado, secretários estaduais, representantes de trabalhadores, de empregadores e da sociedade civil, academia e especialistas nos temas de trabalho e emprego.

A segunda etapa foi a convocação solene da I CNETD pela Presidência da República, por meio do Decreto de 24 de novembro de 2010, que estabelece a coordenação

do processo pelo MTE, o objetivo da Conferência, a realização de conferências estaduais preparatórias, a comissão organizadora nacional tripartite e a dotação orçamentária para o evento.

A terceira etapa foi a realização, entre setembro e dezembro de 2011, de 26 conferências estaduais e a do Distrito Federal, preparatórias para a Conferência Nacional, que tiveram como objetivo, além de pactuar as prioridades regionais e harmonizar as discussões sobre os temas em cada estado, também eleger os representantes tripartites que representariam cada estado na I CNETD. Apenas o estado do Acre não conseguiu realizar a conferência estadual no prazo estabelecido.

A realização das conferências estaduais de Trabalho Decente, para além da determinação estabelecida no Decreto, foi também impulsionada pela experiência vivenciada pelo estado da Bahia, cuja Agenda Bahia de Trabalho Decente serviu de modelo e incentivo aos processos iniciados nos estados.

O estabelecimento da Agenda Bahia de Trabalho Decente foi uma consequência do engajamento político e do compromisso do governador que assumiu em 2006, pois este era Ministro do Trabalho e Emprego em 2003, época em que foi assinado o Memorando de Entendimento entre o governo brasileiro e a OIT, demonstrando familiaridade com o tema e compromisso com as bandeiras políticas assumidas anteriormente.

Ao assumir o governo, o novo governador mobilizou atores locais para o debate e conseguiu realizar, em abril de 2007, a I Conferência Bahia de Trabalho Decente, que reuniu 400 pessoas para discutir as questões relacionadas ao trabalho no estado.

A condução dos trabalhos e os resultados das discussões nos grupos permitiram a elaboração de um diagnóstico que subsidiou a proposta preliminar comas prioridades que deveriam constar de uma Agenda Bahia de Trabalho Decente. O engajamento e o compromisso político dos atores envolvidos fez com que esta estivesse finalizada ainda no ano de 2007, fazendo da Bahia um estado pioneiro na discussão e interiorização dos debates sobre o Trabalho Decente.

Embora a Agenda Bahia seja uma experiência local, esta sempre esteve conectada aos processos mais amplos de discussão, já que suas prioridades estavam alinhadas com a ANTD e a Agenda Hemisférica. Apesar de sua relativa autonomia em relação ao governo federal, o processo também serviu de exemplo para outros estados, motivando o desenvolvimento do processo em outras unidades da federação, por exemplo, em Mato Grosso, que lançou a própria Agenda em 2009.

As conferências realizadas no âmbito estadual em 2011 requereram que cada bancada de representação desenvolvesse formas específicas de mobilizar seus representantes em diferentes níveis, fazendo com que houvesse a interiorização dos debates e a articulação entre os diferentes grupos que compõe cada bancada em particular.

Essas discussões também foram responsáveis por fomentar iniciativas no sentido de desenvolver estratégias próprias locais ou regionais, fazendo com que vários estados assumissem o compromisso de lançar suas próprias Agendas, seguindo o exemplo de experiências já consolidadas, como no caso da Bahia e do Mato Grosso.

Enquadram-se nesse caso Minas Gerais, São Paulo, Pernambuco, Tocantins, Pará, Ceará, Espírito Santo, Distrito Federal, Rio Grande do Norte, Sergipe e Goiás, tecendo um ambiente propício para o surgimento de mecanismos importantes para a consolidação desse formato de participação social na elaboração de políticas públicas no Brasil.

Também vale mencionar que a realização de conferências estaduais promoveu a interiorização do Trabalho Decente e a apropriação do tripartismo no âmbito dos estados, com a necessária adaptação à realidade local, fortalecendo o diálogo entre grupos e entidades vinculados ao mundo do trabalho.

Embora sendo a primeira conferência nacional a ser realizada para discutir a temática laboral, a I CNETD se soma às outras conferências nacionais que se realizam em 2011 e 2012 no esforço de articulação do Governo para a eliminação da extrema pobreza, além de estar intimamente relacionado com o Plano Brasil Sem Miséria, lançado em junho de 2011.

Os temas para discussão na Conferência são divididos em quatro eixos temáticos, consensuados no âmbito da Comissão Organizadora Nacional e correspondem às três prioridades da ANTD e do PNETD:

Princípios e direitos; Proteção social; Trabalho e emprego; e

Fortalecimento dos atores tripartites e do diálogo social como instrumentos da governabilidade democrática.

Realizada em agosto de 2012, a I CNETD teve a participação de 2.110 pessoas, entre delegados, convidados e observadores, divididas em quatro bancadas constituintes do processo de discussão realizado nos estados e no Distrito Federal, representando o

segmento dos trabalhadores, dos empregadores, do governo e da sociedade civil. Conforme previa o Regimento Interno, todas as delegações foram compostas por 30% de representantes do governo, 30% de organizações de trabalhadores, 30% de organizações de empregadores e 10% de representantes pertencentes a instituições da sociedade civil. Além destes, estavam presentes convidados e observadores do processo, sendo que os convidados podiam emitir opiniões, mas não tinham direito a voto e os observadores não podiam manifestar-se nem votar.

É importante mencionar que os representantes do Acre participaram como observadores, sem direito a voz e voto, uma vez que o estado não realizou a conferência preparatória do processo nacional.

Na organização da I CNETD foram seguidos os princípios regimentais do tripartismo clássico e da paridade entre as bancadas do governo, dos trabalhadores e dos empregadores. Dessa forma, nas plenárias e nos grupos temáticos as propostas discutidas deveriam ser aprovadas por, no mínimo, 30% dos votos dos delegados presentes. Já na plenária final, seria considerada aprovada a proposta que obtivesse 50% mais um dos votos dos delegados presentes.

No próximo capítulo serão resgatados os fatores fundamentais para o estabelecimento do diálogo social, as especificidades que contemplam o diálogo na relação capital e trabalho no Brasil e como se dão as interrelações para a construção de uma agenda governamental para implementar as diretrizes do Trabalho Decente no país.

Capítulo 5. O ESTABELECIMENTO DO DIÁLOGO SOCIAL NO BRASIL

No documento ANA LÚCIA DE OLIVEIRA MONTEIRO (páginas 148-153)

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