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O papel dos atores no processo de formação de agenda

No documento ANA LÚCIA DE OLIVEIRA MONTEIRO (páginas 70-74)

Capítulo 2. METODOLOGIA DA PESQUISA

2.3. O papel dos atores no processo de formação de agenda

A investigação em curso se baseia em um dos conceitos fundamentais do modelo de Kingdon (1995), a agenda, designada como um conjunto de problemas, objeto de controvérsia, que demanda a intervenção do poder público. Rua (1997) acrescenta que a agenda é a lista de prioridades, inicialmente estabelecida, a qual os governos devem dar atenção, e pela qual os atores lutam arduamente para incluir seus próprios interesses. Para Rua (1997) existem três tipos de agenda: a sistêmica, ou não governamental; a governamental e a de decisão. A primeira é a lista de assuntos que preocupa diversos atores políticos e sociais, não se restringindo a um governo em particular; é a relação de temas da sociedade e do Estado. A agenda governamental reúne os assuntos que são prioridade para o governo em determinada época e depende da ideologia, dos projetos políticos e partidários, da mobilização social, das conjunturas internas e externas e das oportunidades políticas. A agenda de decisão compreende a lista de problemas contemplados no curto e no médio prazo pelo sistema político, que engloba todos os poderes constituídos no Estado e não somente a esfera governamental.

No desenvolvimento de sua análise, Kingdon (1995) apresenta o que ele denomina de atores visíveis e invisíveis no processo de formação de agenda. Os atores visíveis são os participantes que estão dentro e fora do governo. Os invisíveis são compostos pela mídia, grupos de interesse e comunidade em geral.

Kingdon (1995) ressalta que cada um desses atores pode atuar como incentivo ou como obstáculo do processo. Funcionam como incentivo quando atuam para trazer um tema para o topo das discussões ou quando pressionam para que uma alternativa seja considerada mais adequada. Estão incluídos nessa classe os dirigentes de primeiro escalão do Poder Executivo, servidores públicos de carreira e dirigentes de entidades nacionais representativas politicamente.

Outro grupo importante ressaltado por Kingdon (1995) são os parlamentares, já que o Poder Legislativo exerce impacto relevante na formação da agenda e na geração de alternativas. Os parlamentares e os assessores parlamentares, além da autoridade legal para a produção e alteração das leis, estão expostos de forma continua a informações técnicas e políticas provenientes da academia, da comunidade, dos grupos de interesse e do eleitorado em geral.

Em relação aos grupos de interesse, Kingdon (1995) coloca que podem ser formados por pessoas ou lobistas ligados ao comércio, à indústria, às associações profissionais, a grupos de interesse público, a movimentos sociais ou partidos politicos. Podem influenciar tanto a formação da agenda como a geração de alternativas e muitas vezes promovem uma mudança no curso de ação ou o bloqueio de mudanças nas políticas públicas.

A academia, os pesquisadores e os consultores técnicos em geral estão localizados no grupo de fora do governo, detém informações especializadas e podem, a qualquer momento, ser requisitados pelos atores do governo para prestart assessorial técnica que irá fundamentar a escolha ou o fortalecimento de alternativas em discussão.

Como visto, para Kingdon (1995), a agenda governamental se constitui de um conjunto de problemas para o qual os integrantes do governo estão focados em determinado momento. O autor reitera que, devido à complexidade e do volume de questões que são demandados dos formuladores de políticas, apenas algumas são consideradas em um momento determinado. A este pequeno conjunto Kingdon (1995) denomina de agenda de decisão, suconjunto da agenda governamental composto por temas prontos para a decisão. O autor confirma a necessidade dessa diferenciação, já que a agenda governamental e a agenda de decisão são resultados de processos diferentes. A primeira está relacionada à lista de temas a serem solucionados e a segunda refere-se à lista de assuntos prontos para ser implementada.

Assim, a formação da agenda, para Kingdon (1995) é o processo de reconhecimento, pelo governo, da existência de um problema sobre o qual deve agir. Nesse caso, a ação dos atores é decisiva no que diz respeito à inclusão ou não de temas e questões vinculados às demandas da sociedade em determinado período de tempo, podendo as prioridades estabelecidas variar de tempos em tempos.

Para Kingdon (1995) outros dois fatores são fundamentais para a formação da agenda e a especificação de alternativas: os participantes ativos (visíveis ou invisíveis) e os

processos pelos quais se definem as alternativas mais importantes que serão inseridas na agenda. O autor ressalta que cada um dos participantes21 e dos processos pode atuar como um incentivo ou um obstáculo na arena de negociações, podendo haver contradições no próprio comportamento dos atores em momentos diferentes.

Ao se referir aos atores que participam de um processo de articulação política, Rosenau (1995) recomenda que para os agentes públicos e privados enfrentarem uma situação que configure uma interdependência profunda, é necessária a articulação de posições conjuntas que favoreçam o surgimento de padrões globais o que tange à formulação de agendas e políticas públicas nos diversos setores, incluindo o trabalho, o que também propicia o crescimento das competências das organizações internacionais, cujo âmbito de atuação muitas vezes ultrapassa as funções estatais e cujas diretrizes norteiam o planejamento econômico e político de seus estados-membros.

Esse papel de destaque das organizações internacionais para minimizar os conflitos e intermediar as negociações com o objetivo de estabelecer a cooperação internacional vem em continuidade aos esforços de institucionalização da agenda política internacional dos períodos pós-guerras, com a criação de organismos como a ONU e suas agências especializadas. Isso propiciou a criação de redes que passaram a balizar o desenvolvimento e a estruturar instâncias de negociação que influenciam profundamente a política e a economia internacionais (CASTRO, 2001).

Outros autores reiteram que as organizações internacionais são parte central da política internacional e da vida social desde que foram criadas nas diversas partes do globo. Cada organização internacional possui um código próprio, acordado por seus estados-membros, que gera um conjunto de ideias, interesses e valores próprios, às vezes conflitantes entre si, já que as normas e procedimentos adotados por um determinado país são debatidos e muitas vezes gerados no seio das organizações internacionais.

Dessa forma, não se pode dissociar as questões políticas, econômicas, sociais e culturais da esfera nacional dos interesses, ideias e influências exercidas por esses organismos.

Note-se que aqui estão descritos o padrão de ações das organizações formadas por Estados-Nação, que fomentam mecanismos de cooperação entre países e outros agentes

21 Kingdon (1995) ressalta a existência de comunidades de políticas, definidas como o conjunto de

especialistas, governamentais e não-governamentais, em determinada área, que partilha de crenças semelhantes no que se refere aos nexos causais entre a origem do problema e a solução a ser encaminhada, propondo alternativas de solução durante o processo de formulação de políticas públicas.

para promover o desenvolvimento mundial. Além de estabelecer os fóruns onde as ideias circulam e se legitimam, formando o consenso em torno de determinados interesses e gerando mecanismos de implementação de políticas, essas instituições são consideradas agentes porque tem autonomia em relação aos estados-membros, possuem agendas e políticas próprias, além de ter personalidade jurídica, conforme o direito internacional público (HERZ; HOFFMANN, 2004).

Além de ter legitimidade perante um número considerável de atores, e exercer o poder no cenário internacional, as organizações internacionais também influenciam os atores nacionais para que atendam a certas ideias e interesses determinados em normas, resoluções e políticas, seja por meio de pressão política ou, em casos mais extremos, por imposição de sanções.

Esse movimento é recíproco, pois, da mesma forma, os países que participam das organizações internacionais, seja como estados-membros, seja como colaborador ou doador, integrando seus comitês ou conselhos deliberativos também influenciam as agendas e políticas dessas organizações. Como exemplo, podem ser citados os cortes nas doações efetuadas pelos Estados Unidos a alguns órgãos das Nações Unidas por discordar de suas políticas ou a atuação do Brasil como membro do Conselho de Administração da OIT, que tem influenciado a formação de agendas no campo da promoção do Trabalho Decente em outros países.

Da mesma forma, os atores do cenário nacional, quando necessitam de apoio para difundir suas ideias e interesses no âmbito nacional, recorrem aos mecanismos próprios estabelecidos pelas organizações internacionais para criar ou fortalecer coalizões internas. É comum também a aliança com movimentos de pressão externos que podem ajudar a inserir um tema na agenda governamental, cujos valores já sejam internacionais e que componham uma base de ideias já difundidas mundialmente. Esse processo é o que Kingdon (1995) denomina de “janelas de oportunidade política”.

É a convergência dos três fluxos – problemas, alternativas de soluções e processos políticos que permite a oportunidade de mudança na agenda. Os processos são dinâmicos e não lineares, possuem lógica própria e possibilitam a emergência do que Kingdon (1995) denomina de empreendedores de políticas – atores dispostos a investir seus recursos numa idéia ou projeto visando sua concretização. Os empreendedores fazem parte tanto da esfera governamental quanto da sociedade civil e desempenham papel essencial na articulação

entre problemas e soluções, problemas e forças políticas, forças políticas e propostas existentes.

É a essa complexidade que o modelo de Kingdon (1995) acrescido de Hall (2002) procura atender, ao contrário dos modelos baseados em fases ou etapas que não conseguem abranger em profundidade o estudo proposto, por não tratar das interrelações e contradições que os modelos de Kingdon e Hall conseguem alcançar.

O Gráfico 1 abaixo demonstra a dinamicidade do processo preconizado por Kingdon (1995) onde os fluxos não obedecem a uma hierarquização pré-definida e se movimentam de acordo com o momento social, econômico e político.

GRÁFICO 1

ATUAÇÃO DOS ATORES NO PROCESSO DE DEFINIÇÃO DA AGENDA E FORMULAÇÃO DE

No documento ANA LÚCIA DE OLIVEIRA MONTEIRO (páginas 70-74)

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