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A importância da Organização Mundial do Comércio e do Direito

1.7 A Organização Mundial do Comércio

1.7.2 A importância da Organização Mundial do Comércio e do Direito

Além da já relatada presença dos PEDs nas negociações, esses países também passaram a participar mais da OMC em outras áreas, como no Órgão de Solução de Controvérsias e na utilização de mecanismos de salvaguardas (em especial o antidumping) para a defesa de seus mercados.

Sendo assim, a despeito de todos os protestos antiglobalizantes contra a atuação da OMC, mesmo para os PEDs, e especialmente para Brasil, a Organização tem importância fundamental, tanto pela necessidade de expansão dos mercados (sobretudo o agrícola) quanto para a defesa de seus mercados internos.

Peter Van den Bossche enumera quatro razões básicas para a existência das regras internacionais de comércio146. A primeira delas seria impedir que os Estados adotem medidas restritivas ao comércio em prejuízo da economia global e de seus próprios interesses.

De fato, o Brasil já sofreu com a imposição de medidas restritivas às suas exportações, e inconsistentes com os acordos internacionais, e encontrou na OMC o fórum mais adequado para a defesa de seus interesses, como por exemplo, a recente vitória brasileira no OSC no caso do algodão, no qual os Estados Unidos foram notificados a eliminar os subsídios à produção e exportação americana do produto.

Por outro lado, também é verdade que alguns setores industriais brasileiros são ávidos por proteção contra a concorrência externa, o que, em alguns casos, poderia beneficiar interesses específicos, mas prejudicar o país como um todo. A existência de normas que restringem a atuação governamental serviria para a

146 The law and policy of World Trade Organization. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2008, p. 36-37.

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administração pública resistir aos grupos de pressão, os chamados rent-seekings, como bem observado por Ersnst-Ulrich Petersmann:

Governments know very well [...] that by “trying their hands to the mast” (like Ulisses when he approached the island of the Sirens), reciprocal international pre-commitments help them to resist the siren-like temptations from “rent-seeking” interest groups at home147.

Uma segunda razão, segundo Van den Bossche, para a existência das regras internacionais de comércio seria a necessidade de previsibilidade e segurança para a realização de investimento148. Também nesse aspecto, as normas interessam ao Brasil, principalmente em virtude do crescente número de multinacionais brasileiras. De fato, de recente estudo da empresa KPMG, consta que, em 2006, os investimentos realizados pelo Brasil no exterior superaram os investimentos externos no país149. Por outro lado, também é verdade que o Brasil se tornou um destino seguro para os investimentos externos; essa é a conclusão da Pesquisa Mundial de Perspectivas de Investimento - 2009, publicada pela UNCTAD150. Nesse sentido, John Jackson ressalta que:

At least in the context of economic behavior [...] and particularly when that behavior is set in circumstances of decentralized decision- making, as in a market economy, rules can have important operational functions. They may provide the only predictability or stability to a potential investment or trade-development situation. Without such predictability and stability, trade or investment flows might be even more risky and therefore more inhibited than otherwise […]. To put it another way, the policies which tend to reduce some risky, lower the “risky premium” required by entrepreneurs to enter into international transactions. This should result in a general increase in the efficiency of various economic activities, contributing to greater welfare for everyone151.

147 The GATT/WTO dispute settlement system: international law, international organizations and dispute settlement. Londres: Klumer Law International, 1996, p. 36-37. Tradução nossa: Governantes sabem muito bem [...] que, por “amarrarem suas mãos ao mastro” (como Ulisses, quando ele se aproximava da ilha das Sereias), pré-compromissos internacionais de reciprocidade ajudam a resistir a tentações semelhantes dos grupos de pressão domésticos.

148 The law and policy of World Trade Organization, p. 36-37.

149 Multinacionais brasileiras: a rota de investimentos brasileiros no exterior. São Paulo, 2008.

Disponível em: <http://www.kpmg.com.br/publicacoes/tax/Multinacionais_Brasileiras_08_portugues. pdf>. Acesso em: 14 jul. 2009.

150 UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT (UNCTAD). World

Investment Prospects Survey - 2009. Genebra/Nova Iorque: Organização das Nações Unidas,

2009. Disponível em: <http://www.unctad.org/en/docs/diaeia20098_en.pdf>. Acesso em: 10 set. 2009.

151 World Trade and the Law of GATT, p. 320. Tradução nossa: Pelo menos no contexto do comportamento econômico [...] e, em particular quando esse comportamento é definido em circunstâncias de tomada de decisão descentralizada, como em uma economia de mercado, as regras podem ter importantes funções operacionais. Elas podem fornecer a previsibilidade e a estabilidade para um potencial investimento comercial ou para uma situação de desenvolvimento.

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A terceira razão apresentada por Van den Bossche para a existência das regras internacionais de comércio seria a incapacidade de os governos lidarem sozinhos com os desafios de uma economia globalizada. O autor se refere, especificamente, à proteção de importantes valores sociais, como a saúde pública, o meio ambiente, a identidade cultural e os padrões trabalhistas mínimos152.

Também aqui é interessante ao Brasil assegurar a defesa de seus interesses nos assuntos relacionados, mas, sobretudo, garantir que não serão utilizadas essas justificativas para bloquear as suas exportações. Um exemplo disso foi a recente declaração da primeira-ministra alemã Ângela Merkel, segundo a qual a continuidade das exportações do etanol brasileiro para a Alemanha depende da “sustentabilidade”153. Nesse sentido, a Alemanha poderia utilizar permissões contidas no GATT (em especial o artigo XX, que trata das exceções às regras sobre a liberalização comercial com o intuito de proteger o meio ambiente) para impedir a entrada do produto brasileiro.

A quarta e última razão apontada por Van den Bossche para a existência das regras multilaterais seria a necessidade de se alcançar medidas equitativas nas relações econômicas internacionais, que possam integrar os países mais pobres à globalização e reconhecer as necessidades especiais dos países em desenvolvimento, para que os mesmos também possam auferir os ganhos com o comércio internacional154. Nesse ponto, o Brasil também tem desempenhado papel de destaque nas negociações internacionais, sobretudo na atual Rodada de negociações.

As regras negociadas no âmbito da OMC funcionaram para assentar os diversos acordos internacionais que regiam o comércio internacional antes das discussões multilaterais. Tais normas compõem o Direito Internacional Econômico, o qual Van den Bossche conceituou da seguinte forma:

Sem previsibilidade e estabilidade, comércio ou os fluxos de investimento poderiam ser ainda mais arriscados e, portanto, mais inibidos do que o contrário [...]. Para dizer de outra maneira, as políticas que tendem a reduzir o risco diminuem o prêmio “de risco” exigido pelos empresários para entrar em transações internacionais. Isso deve resultar em um aumento geral na eficiência das diversas atividades econômicas, contribuindo para o maior bem-estar de todos.

152 The law and policy of World Trade Organization, p. 36-37.

153 MERKEL apóia o Brasil, mas pede medidas a Lula. Valor Online, São Paulo, 15 maio 2008. Disponível em: <http://www.valoronline.com.br/?online/brasil/5/4930627/merkel-apoia-o-brasil,-mas- pede-medidas-a-lula>. Acesso em: 22 jul. 2009.

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International Economic Law can be defined, broadly, as covering all those international rules pertaining to economic transactions and relations, as well as, those pertaining to governmental regulation of economic matters. As such, International Economic Law includes international rules on trade in goods and services, economic development, intellectual property rights, foreign directs investment, international finance and monetary matters, commodities, food, health, transport, communications, natural resources, private commercial transactions, nuclear energy, etc. International trade in goods and services, i.e. international trade law, constitutes the “hard core” of international economic law155.

Dessa forma, o Direito Internacional Econômico seria constituído, por um lado, pelos numerosos acordos bilaterais ou regionais de comércio, e, por outro, pelos acordos multilaterais de comércio. O Marrakesh Agreement Establishing the World Trade Organization, concluído em 15 de abril de 1994, foi um verdadeiro marco regulatório para o Direito Internacional Econômico, que, em diversos aspectos, interessa sobremaneira para o Brasil, e, segundo Peter Sutherland, John Swell e David Weiner, “is the most important tool of global management and development we possess”156.

Sendo esse Direito Internacional Econômico extremamente importante para os interesses brasileiros, importa entender as suas regras, pois a utilização de determinados instrumentos legais previstos nos Acordos da OMC pode representar verdadeiras alavancas para determinados setores da economia brasileira.