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A importância das redes no processo de inovação

Parte I – Inovação, Conhecimento e Redes

PRÉ-CONDIÇÕES CONTEXTOS

3. Inovação, Contextos, Dinâmicas de Interacção e Redes

3.1. O papel das redes no processo de inovação

3.1.2. A importância das redes no processo de inovação

A importância das redes no processo de inovação tem vindo a ser sucessivamente reconhecida por uma ampla diversidade de autores. As diversas redes de relações desempenham um papel fulcral no processo de inovação, criando condições que facilitam a ligação e articulação entre as diferentes bases de conhecimento, permitindo a coordenação e a participação de actores distintos (ver e. g., Ficher, 1999; Oerlemans, Meeus e Boekema, 1998, 2000, 2001; Tödtling, Lehner e Trippl, 2004; Lambooy, 2005: 1149; Caravaca, et al. 2005: 12; Fischer, 2006), a troca e partilha de informação e de recursos especializados, a aprendizagem colectiva e inter-organizacional, o desenvolvimento conjunto de competências e conhecimentos e possibilitando novas oportunidades e experiências (Powell e Grodal, 2005: 57; Caravaca, et al. 2005: 12), permitindo ultrapassar muitos problemas decorrentes da incerteza e da escassez de recursos ligados ao processo de inovação e dos riscos associados à complexidade das actividades de inovação, quer para as PME (Tödtling e Kauffman, 2001), quer para as grandes empresas. Finalmente, segundo Antonelli (2005a: 10), “o conhecimento tácito

acumulado através de processos de aprendizagem localizada pode ser valorizado e facilitada a sua articulação, tanto internamente como externamente, por via do estabelecimento de redes”. Neste sentido, as redes permitem às empresas “inovarem mais rapidamente e desenvolverem inovações que estão para além das suas competências individuais” (Rutten e Boekema, 2004: 182).

O enquadramento global dos contextos de competitividade actuais, caracterizados por uma elevada incerteza dinâmica e a complexidade crescente das bases de conhecimento necessárias à inovação, significa que até as grandes empresas necessitam de interagir com o exterior para realizarem actividades inovadoras. Segundo Rutten e Boekema (2004: 182), as grandes empresas “precisam de conhecimento externo, isto é,

conhecimento que está para além do seu controlo hierárquico”, necessitando cada vez

mais de partilharem o seu conhecimento e de acederem a contextos externos de competências capazes de empreender cooperações na produção de tecnologia e no desenvolvimento de novos produtos. A crescente complexidade das bases de conhecimento está a “aumentar a divisão social do trabalho na produção do

conhecimento, resultando num número crescente de relações de colaboração entre empresas” (Hudson, 1999: 63). Estas cooperações são especialmente importantes nas

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decisiva para a viabilidade comercial de bens e serviços. Em campos onde o progresso tecnológico ou científico se está a desenvolver rapidamente e as fontes de conhecimento estão dispersas, as empresas não conseguem individualmente deter todo o conhecimento e competências capazes de trazer inovação significativa aos mercados. À medida que a profissionalização e a comercialização do conhecimento têm vindo a assumir maior importância no crescimento económico, também as diferentes formas de colaboração se têm vindo a tornar mais comuns e inevitáveis. São colaborações que permitem partilhar recursos, novas ideias e competências. Se este raciocínio é verdadeiro para empresas de grande dimensão e pertencentes a sectores dominados maioritariamente por conhecimento analítico, torna-se ainda mais relevante para as empresas de pequena e média dimensão que se envolvem, de forma activa e sustentada, em actividades de inovação nos diversos sectores de actividade.

Nestas dinâmicas, as redes e a heterogeneidade no portfolio de colaborações inter- organizacional permitem às empresas aprenderem com base numa ampla gama de stock de conhecimento. Designa-se esta forma de aprendizagem por aprendizagem por interacção (Lundvall, 1992). Este tipo de aprendizagem é fundamental, uma vez que a utilidade económica dos seus recursos depende da capacidade que as organizações demonstram para identificar fragmentos de conhecimento heterogéneos e complementares, integrando-os na sua base de conhecimento endógena. É preciso saber quem detém o conhecimento e qual a sua disponibilidade para o usar e partilhar. O facto de cada vez mais se formarem redes de relações entre diversas organizações coloca em evidência a crescente interdependência entre elas. Esta crescente interdependência conduz as organizações a estratégias de interacção que nada têm de casual, sendo o “resultado de escolhas estratégicas e deliberadas em situações de mútua dependência (Rutten e Boekema, 2004: 182).

Neste contexto de complexas interdependências, a capacidade de absorver recursos externos – “absorptive capacity”40 – é, por isso, uma capacidade essencial às empresas, independentemente do seu tamanho e do sector a que pertençam (Fagerberg, 2005: 11). As empresas “devem ser capazes de seleccionar os parceiros correctos e de manter

relações com eles. Devem ser capazes de combinar diferentes elementos que não são desenvolvidos internamente” (Lorentzen, 2008: 542). As organizações com redes mais

40 Ver Cohen, W. e Levinthal, D. (1990) – “Absorptive Capacity: A New Perspective on Learning and Innovation”, Administrative Science Quarterly 35: pp. 123-33.

amplas estão sujeitas a mais experiências, ao confronto com diferentes competências e à exploração e aproveitamento de novas oportunidades potenciais. Neste caso, as redes são espaços de inovação, uma vez que “a criação e transmissão de conhecimento é um

elemento essencial no aumento das posições competitivas das empresas” (Powell e

Grodal, 2005: 58). Deve, contudo, salientar-se que os recursos que a empresa pode obter das relações que estabelece com outras organizações não são homogéneos e a sua qualidade e utilidade dependerão de múltiplos factores, para além da sua capacidade de absorção.

As questões que se relacionam com a dependência de uma trajectória de desenvolvimento – “path dependency” – são elementos que condicionam, simultaneamente, de forma importante, a problemática do processo de inovação empresarial. Se uma empresa se encontra numa determinada trajectória de inovação poderá recolher desde muito cedo benefícios significativos decorrentes dessa escolha, mas também pode ficar condicionada, ou fechada (lock in), por um conjunto de mecanismos que se auto-reforçam, de natureza cumulativa e que não permitam (via custos elevados ou tempo necessário para o fazer) à empresa corrigir o caminho escolhido (Fagerberg, 2005: 10). As redes podem ser, em muitos casos, instrumentos que, pela sua diversidade de actores e bases de conhecimento subjacentes, contribuem para reduzir consideravelmente os riscos da empresa ficar condicionada pela trajectória de inovação que escolheu e que se demonstra pouco produtiva. Segundo Fagerberg (2005: 12), “as redes que se estabelecem são de extrema importância de forma a gerir e

a manter uma certa abertura face ao possível lock in das empresas”. As empresas

inovadoras muitas vezes cultivam os “nós fracos”, como forma de manterem alguma capacidade de mudarem a sua orientação. É neste sentido que Lorentzen afirma, provavelmente com algum exagero, que os “nós fracos com parceiros distantes são

mais importantes para a inovação do que a proximidade e os nós fortes uma vez que os últimos tendem para conhecimento redundante e lock-in” (Lorentzen, 2008: 543).

Importa, por isso, que a empresa seja capaz de combinar ambos os tipos de ligações, como forma de manter dinâmica e valorizável economicamente a sua base de conhecimentos.

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Podemos olhar para este problema de um outro ângulo de análise. Embora a localização empresarial seja apenas uma componente das múltiplas vantagens que o território pode fornecer às empresas, não é um factor pouco relevante enquanto recurso condicionador do seu desempenho económico. Contudo, a localização é em si própria um factor com elevados custos de reversibilidade e, face às constantes alterações das dinâmicas de competição mundiais, muitas empresas gostariam provavelmente de conferir maior flexibilidade a esse grau de irreversibilidade. Ora, alguns tipos de redes podem, na nossa opinião, permitir às empresas uma situação de multi-presença territorial que compense esses custos de localização41. Os custos de oportunidade de construir ou destruir uma relação reticular são certamente inferiores aos das deslocalizações constantes das empresas. A localização óptima empresarial é um conceito puramente teórico, adequado a um mundo estático, e a participação em redes pode ser visto como uma constante procura de sintonização competitiva, partindo de uma localização satisfatória, condicionado por restrições de diversa natureza (humanas, legais, financeiras, tecnológicas, etc.).

Do ponto de vista empírico, é possível identificar alguns casos em que as diversas redes têm desempenhado um papel relevante nas dinâmicas empresariais. Segundo Powell e Grodal (2005), as redes de colaboração (em I&D, distribuição, desenvolvimento do produto) têm sido reconhecidas como elementos fundamentais em algumas indústrias, como por exemplo nas indústrias artesanais (Eccles, 1981), nos distritos industriais (Brusco, 1982; Piore e Sabel, 1984), na indústria aeronáutica, onde a montagem depende largamente de um conjunto diverso de fornecedores de inputs e, nomeadamente nas indústrias de intensivas em conhecimento. Diversos trabalhos empíricos apontam para a correlação positiva entre esforço de I&D e sofisticação tecnológica e o número e a intensidade de alianças estratégicas (Freeman 1991; Hagedoorn, 1995). Powell e Grodal (2005: 60) mostram que “na área da biotecnologia, as organizações que

demonstram insuficiências nas relações com outras organizações falham mais facilmente e têm maior dificuldade em acompanhar o ritmo da indústria”.

41 Este é um argumento não deixará de ser ponderado pelos resultados empíricos obtidos na Parte II desta dissertação. Claro que a localização só poderá ser entendida como um constrangimento quando o território em que se insere for estéril, do ponto de vista das dinâmicas de interacção que permita mobilizar e desenvolver.

A nossa opinião é a de que as redes não são apenas importantes neste nível de intensidade tecnológica. A nossa convicção42 é a de que, a partir do momento em que se “retira a inovação dos laboratórios de I&D”, as redes, nas suas múltiplas tipologias, ganham uma relevância fundamental no processo de inovação empresarial.