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A liberdade de se expressar e os agentes públicos

3 A LIBERDADE DE EXPRESSÃO NO SISTEMA INTERAMERICANO DE

3.3 A Jurisprudência da Corte Interamericana

3.3.2 A liberdade de se expressar e os agentes públicos

Em 2004, a Corte Interamericana de Direitos Humanos delimitou mais parâmetros para as responsabilidades ulteriores e estabeleceu a necessidade de diferenciar a valoração quando as expressões compreendidas como lesivas referem-se a funcionários públicos. O julgamento tratou

liberdad de expresión asume deberes y responsabilidades, cuyo âmbito depende de su situación y Del procedimiento técnico utilizado.

331LORETI, Damian M. Los aportes de la Corte Interamericana de Derechos Humanos em Materia de

Prevencion contra la Censura Previa. Disponível em:

<http://www.catedras.fsoc.uba.ar/loreti/documentos_de_la_catedra/prevencion_censura_previa_loreti.pdf>. Acesso em: 30 abr. 2012.

do jornalista Herrera Ulhoa333 condenado por difamação depois de publicar matérias no jornal La

Nacion sobre supostas práticas ilícitas realizadas pelo diplomata Félix Przdborski, na época,

representante do País na Agência Internacional de Energia Atômica. As matérias foram elaboradas a partir de fontes da imprensa belga.

O jornalista foi condenado pelo Primeiro Circuito Judicial de San José, em 1999, que o considerou culpado em quatro delitos contra a honra impondo não apenas multa, mas também a publicação de uma retratação oficial, a retirarada da referência entre os artigos publicados na Internet envolvendo o caso, a publicação de parte da sentença criminal, a responsabilização civil por dano moral e a inscrição do acusado no Registro Nacional de Delinquentes.

Diante da sentença, Herrera Ulhoa interpôs recurso na Corte Suprema de Justiça da Costa Rica, porém o mesmo foi negado pelo fato de não preencher requisitos da legislação interna do País. Apresentou, então, denúncia à Comissão Interamericana alegando-se uma série de violações e requerendo medidas cautelares urgentes. O caso seguiu para a CIDH que detectou a violação, dentre outros artigos, do artigo 13, sobre a liberdade de pensamento e expressão.

Nos termos postos na legislação interamericana, há margem para muita discricionariedade interpretativa, posto que se baseia em princípios e conceitos fluidos, incumbindo à Corte delinear os contornos de sua real aplicação. Deste modo, o caso Herera Ulhoa foi importante marco para estabelecer fronteiras jurisprudenciais.334

Na sentença, foram adotadas medidas para evitar danos à liberdade de expressão, determinando providências que tornassem sem efeito a inscrição de Mauricio Herrera no Registro Judicial de Delinquentes, incluindo suspensão da ordem de publicar retratação condenatória e a parte dispositiva da sentença.

O caso tornou-se emblemático por tratar da situação de um agente público, na função de cônsul. O conceito do limiar de proteção da Corte Interamericana para funcionários públicos ou pessoas que exercem funções de interesse público é diferente.

Não se trata de ponderar a qualidade dos sujeitos, que são igualmente respeitáveis, mas as características das questões a que se estendem a atividade ou a opinião daqueles, se trata de material que atentem ao interesse público, este dado incide naturalmente no denominado “limiar de proteção”. Quem se encontra nesta segunda hipótese está sujeito a um escrutínio público maior ao correspondente a outras pessoas335.

333 CORTE IDH, Caso Herrera Ulloa vs. Costa Rica. Sentença de 2 jul. 2004. Série C No. 107.

334 SOUSA, Rafael Barreto. O direito ao duplo grau de jurisdição na América Latina. 2010. 80 f. Monografia

(Graduação ou em Direito)-Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2010. p. 33.

335 RAMIREZ, Sergio Garcia; ALEJANDRA, Gonza. La liberdad de expresion en la juriprudencia de la Corte

Dada a natureza do cargo de Félix Przerdborski, os limites aceitáveis à exposição pública são mais amplos. Contudo, ao estabelecer o direito ao respeito à honra e dignidade a qualquer pessoa, a Convenção estabelece limites a liberdade de expressão, ataques ou ingerências de particulares ou do Estado. Mesmo assim, seria legítimo aos afetados em sua honra recorrerem aos mecanismos judiciais de proteção disponíveis.

Ao longo do julgamento, a Comissão compreendeu que as aplicações das leis de privacidade dentro do direito interno devem adequar-se aos modelos internacionais e ponderando um equilíbrio entre a proteção da privacidade, a honra e a preservação da liberdade de expressão. Caberia, então, ao Estado abster-se de censurar a informação sobre atos de interesse público levados aos meios de comunicação por funcionários públicos, posto que estes devem ter maior tolerância a críticas.

Para a Corte Interamericana, ocupantes de cargos públicos se expõem voluntariamente a uma análise pública mais exigente e são submetidos a maior risco de sofrer críticas ao saírem do domínio da esfera privada para inserir-se na esfera do debate público336. Considerando a liberdade de expressão fomentadora do controle do cidadão sobre questões de interesse publico, o Tribunal sustentou a necessidade de todas as informações serem debatidas amplamente. Isto justifica o motivo pelo qual expressões relativas a funcionários públicos, voluntariamente submetidos a um exame mais rigoroso de cidadania, recebem um nível menor de proteção.

Ademais, a penalização exagerada imposta a jornalistas, como, no referido caso por reproduzir informação de outro veiculo de comunicação, provocaria autocensura por parte dos jornalistas, dificultando o livre intercâmbio e a circulação de informações. Punição desproporcionada não se ajusta ao interesse social. Os limites à liberdade de expressão, assim como aos direitos humanos em geral, inclusive fundadas na ordem pública e no bem comum não podem ser convertidos em instrumentos para viciar seu conteúdo.

Existe uma coincidência nos diferentes sistemas regionais de proteção aos direitos humano quanto ao papel essencial que julga a liberdade de expressão e a consolidação e dinâmica de uma sociedade democrática. Sem uma efetiva liberdade de expressão em todos os seus termos a democracia se enfraquece, o pluralismo e a tolerância começam a se fragilizar e os mecanismos de controle e denúncia cidadã começam a se tornar inoperantes e a criar um campo fértil para que sistemas autoritários se fortaleçam na sociedade337.

336 CORTE IDH, Caso Herrera Ulloa vs. Costa Rica. Sentença de 2 jul. 2004. Série C No. 107. 337 Ibid.

Os meios de comunicação seriam veículos para o exercício da dimensão social da liberdade de expressão em uma sociedade democrática. Esta condição demanda proteção e independência aos jornalistas no desempenho de suas funções porque mantém informada a sociedade, requisito importante ao fortalecimento do debate público.