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3 A LIBERDADE DE EXPRESSÃO NO SISTEMA INTERAMERICANO DE

3.3 A Jurisprudência da Corte Interamericana

3.3.5 Sobre o direito à informação

Em setembro de 2006, a Corte realizou o julgamento histórico de Claude Reyes vs. Chile345. Organizações não-governamentais como Article 19346 consideraram esta jurisprudência como um avanço importante no movimento pelo direito de acesso a informações públicas no Chile.

O caso começou com a solicitação de acesso a informação publica sobre o projeto de exploração florestal impulsionado por uma empresa estrangeira no Chile. Na época, a preocupação dos solicitantes, futuros peticionários, era o impacto negativo para o meio ambiente do projeto, conhecido como “Trillium”, situado na zona sul do País conhecida pela sua rica biodiversidade.

O pedido foi encaminhado por Marcelo Claude Reys e outros ao Comitê de Inversiones

Estrangeiras, órgão autorizado pelo Estado do Chile a aceitar ingresso de capitais estrangeiros no

Pais. Das sete perguntas, quatro foram respondidas alegando-se, inclusive, serem as informações de natureza comercial. Para obter todos os dados, os interessados interpuseram recursos em tribunais superiores de justiça chilenos, mas não obtiveram êxito.

Ao apreciar o caso, a Comissão alegou: a “divulgação de informação em poder do estado deve julgar um rol muito importante em uma sociedade democrática, pois habilita a sociedade civil para controlar as ações de governo a quem confiou a proteção de seus interesses”347.

O acesso à informação está previsto no artigo 13 o qual prevê obrigação positiva por parte do Estado em possibilitar o acesso à informação em seu poder. Isso evita abusos de funcionários governamentais, promove a transparência, permite um debate sólido e informa para assegurar a garantia de contar com recursos efetivos.

A Corte afirmou que a informação nas mãos do Estado deve ser presumidamente pública e acessível e sustentou ser o direito à informação regido pelo princípio da “máxima divulgação”. Por isto, tal como o direito à liberdade de expressão, só pode ser restringido quando comprovado o seu objetivo legítimo, demonstrando-se os prováveis riscos, os prejuízos e as ameaças causadas pela publicidade. E isso só pode ocorrer quando dos danos forem maiores do que o interesse

345 CORTE IDH. Caso Claude Reyes vs. Chile. Sentença de 19 set. 2006. p. 58.

346 As estratégias de atuação da ARTIGO 19 incluem advocacia e campanha pela implementação de padrões

internacionalmente reconhecidos nas áreas de liberdade de expressão e informação; monitoramento e pesquisa; desenvolvimento jurídico; litígio e formação.

público em dispor de tal informação. Dessa forma, o Estado, deve dar uma resposta fundamentada quando, por algum motivo, limite o acesso a qualquer informação num caso concreto.

A informação deve ser entregue sem necessidade de provar um interesse direto, salvo para casos de restrição. O direito à informação também tem suas dimensões individual e social348. As restrições são admitidas desde que cumpram requisitos e estejam previamente fixadas em lei como proteção contra o arbítrio do poder público. As leis devem ser ditadas por razões de interesse geral, com propósito para o qual haviam sido estabelecidas e a restrição deve ocorrer em menor escala possível.

A Comissão reconhece a existência de legislação sobre acesso à informação na maioria dos Estados americanos. Além da Convenção Americana, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos estabelecem um direito positivo de buscar e receber informações. “Existe um consenso regional dos Estados que compõem a OEA sobre a importância do acesso à informação pública e a necessidade de sua proteção. Existem inclusive resoluções específicas.349

Na sentença, a Corte destacou a Declaração de Nuevo Leon, na qual os Chefes de Estado se comprometeram a estabelecer marcos jurídicos e normativos para garantir o direito de acesso à informação, com devido respeito às normas constitucionais e legais, incluindo a privacidade e a confidencialidade350.

Sobressaltou também a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção e a Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento e a Assembleia Geral da OEA, ambas consideraram o acesso à informação como requisito indispensável à democracia, para uma maior transparência e para uma boa gestão pública, afinal o sistema democrático, representativo e participativo; a cidadania exercem-se por meio de uma ampla liberdade de expressão e livre acesso à informação.

Assim, o Estado deve ser regido pelos princípios da publicidade e da transparência da gestão pública, tornando possível às pessoas exercerem o controle democrático das gestões

348 CORTE IDH, 2006, p. 62.

349 Resolução AG/RES.1932 “Acesso à informação pública: Fortalecimento da democracia”, de 10 de junho de

2003. Ela relaciona-se também com o artigo 4 da Carta Democrática Interamericana que destaca a importância da transparência de atividades governamentais, a responsabilidade dos governos em gestão pública, o respeito aos direitos sociais e a liberdade de expressão e imprensa como componentes fundamentais ao exercício da democracia.

350 Declaração de Nuevo Leon, aprovada em 13 de janeiro de 2004 na Cúpula Extraordinária das Américas, criadas

estatais, de forma a poder questionar e considerar se há um adequado cumprimento das funções públicas. É a participação da gestão pública a partir do controle social.

Dessa forma, não bastaria apenas modificações de normas, sendo necessárias também mudanças na prática estatal para regularem os procedimentos administrativos adequados para “tramitação e resolução das solicitações de informações, estabeleça prazos para resolver e entregar as informações encontradas sob responsabilidade de funcionários públicos devidamente capacitados” 351.

A Corte reconheceu o direito de acesso a informações em poder de órgãos públicos como parte integrante do direito à liberdade de expressão e obrigou o Chile a divulgar informações sobre um projeto de extração de madeira solicitado por um grupo de ambientalistas e negadas pelo governo.

Ao estudar o caso, Wilson352 destaca: desde a denúncia dos peticionários até a decisão da Corte transcorreram oito anos. O autor questiona a demora e destaca que o Chile tem dívidas em matéria de liberdade de expressão em suas distintas dimensões e critica a sentença: “No que se refere a reparações, a sentença deveria ter forcado uma adequação ao ordenamento jurídico aos estandartes internacionais sobre acesso a informação”.

Em agosto de 2008, o Chile editou uma lei de acesso a informação, chamada de “Lei de Transparência da Função Publica e de Acesso à Informação da Administração do Estado”, a qual define que toda pessoa terá o direito de solicitar e receber informações de qualquer órgão da administração do Estado, inclusive as empresas públicas. As instituições públicas terão um prazo de 20 dias para responder os pedidos de informação, não sendo necessária qualquer explicação de motivos para fazer um pedido de informações353.

351 CORTE IDH, 2006, p. 62.

352 WILSON, Alex Munoz. Chile y el Acceso a Información Pública: Comentarios sobre un Nuevo Fallo Adverso

de la Corte Interamericana. Disponível em: <www.anuariocdh.uchile.cl>. Acesso em: 05 nov. 2012.

353

Para Agnès Callamard, diretora executiva da ARTIGO 19: “A lei representa um passo muito importante em direção à transparência e ao acesso universal a informações no Chile, e ao ser implementada aumentará a boa governança, a eficiência do poder público e a participação cidadã. Esperamos que a iniciativa sirva de exemplo para outros países latino-americanos que ainda não aprovaram leis de acesso a informação”. Disponível em: <http://www.article19.org/data/files/pdfs/press/chile-artigo-19-sauda-assinatura-de-lei-de-acesso-a-informacao- publica.pdf>.