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PARTE I: A capitania de Pernambuco, as instituições do poder central e o reformismo Setecentista

Capítulo 1 – As relações políticas entre a Coroa e a capitania de Pernambuco na segunda metade do século X

1.2 A monarquia pluricontinental portuguesa e a capitania de Pernambuco

A presente análise, embora dedique uma especial atenção às mudanças ocorridas na capitania de Pernambuco desde o governo de D. José até ao início da regência de D. João, dá ênfase ao final do período pombalino, fase particularmente relevante para estudar as relações de poder entre as elites coloniais e os representantes da Coroa incumbidos de executar as ordens vindas do Reino.

No que respeita à capitania de Pernambuco, D. Maria I deu seguimento a muitas das orientações políticas anteriores ao seu reinado: manteve em Pernambuco o governador enviado pela secretaria de Estado da Marinha e Ultramar, manteve as Mesas de Inspecção do Açúcar e do Tabaco e deu continuidade às Juntas da Fazenda Real. A única excepção a estas permanências foi a extinção das Companhias de Comércio87.

As medidas visavam a manutenção da estabilidade política e económica da região, e juntamente com a mediação do governador da capitania, resolveram situações conflituosas entre facções das elites locais, que discordavam das novas regras comerciais implementadas pela Direcção da Companhia em Pernambuco, por vezes apoiadas por entidades em Lisboa - o secretário de Estado e a Junta da Companhia -, como mais adiante será analisado.

Nesse sentido, pode dizer-se que D. Maria I, ao decidir o destino da companhia de comércio, actuou em conformidade com o propósito da prática governativa do Antigo Regime, propósito no qual o rei, no seu papel de defensor da justiça, procuraria manter os

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O reinado de D. Maria I não significou uma rutura radical com o consulado pombalino. Tal não ocorreu nem em termos teóricos, nem em termos práticos. Embora se tenha verificado em seu reinado uma reação a algumas das acções pombalinas. Seu reinado pautou-se em linhas gerais pela continuidade de princípios e nomes, pela inovação e pela reparação de alguns actos do marquês, como por exemplo a revisão que mandou efetuar a processos judiciais dos presos políticos no consulado pombalino. Patrícia A. R. de Almeida ALVES, «Manuel António Leitão Bandeira…», pp. 43-44

34 direitos estabelecidos - os das instituições e os dos particulares -, arbitrando conflitos sociais, a fim de garantir os equilíbrios existentes88.

Naquilo que respeita às reformas pombalinas de natureza económica durante o reinado de D. Maria I, com excepção das companhias de comércio, tais reformas não foram substancialmente modificadas. Mesmo que durante o pombalismo algumas decisões tenham sido de curta duração e outras tenham sido desfeitas com a aclamação de D. Maria I, de uma forma geral, as medidas pombalinas proporcionaram as bases para um longo período de desenvolvimento económico. Principalmente a partir da década de 90 de Setecentos até a partida da Corte para o Brasil89.

Adiantamos aqui que o desenvolvimento económico ocorrido no reinado «mariano» prende-se com o aumento das exportações dos produtos portugueses - sobretudo têxteis (algodão, lanifícios e linho) e ferrarias (cobre e ferro) - para o mercado brasileiro; exportações que superaram em muito o vinho e outros produtos alimentares. Também é certo que a reexportação de produtos europeus representou cerca de metade das exportações portuguesas para o Brasil, contudo, a indústria portuguesa beneficiou e muito do alargamento do mercado brasileiro90.

Paralelamente a este desenvolvimento económico que integrou os mercados do Reino e da América portuguesa, a economia lusa beneficiou da conjuntura externa

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Conforme defende António Manuel Hespanha, desde a Idade Média que a função do rei seria, particularmente, a de manter as jurisdições dos restantes corpos políticos no equilíbrio estabelecido pela constituição natural da sociedade, limitando-se quase que apenas à punição penal e à defesa da paz. Durante a Época Moderna a administração activa da Coroa e do rei foram alargadas, mas manteve- se o papel de árbitro supremo do monarca no campo da Justiça, através do conhecimento das causas; podendo, por isso, estabelecer leis gerais em todo o Reino, nomear magistrados e vigiar o cumprimento das suas atribuições. Mas os seus poderes não seriam ilimitados, uma vez que o poder legislativo não poderia ser exercido contra a lei natural e a lei divina. António Manuel HESPANHA, As vésperas do

Leviathan…, p. 278.

89 A terceira parte deste estudo dedicará particular atenção ao desenvolvimento económico da capitania

no final do século XVIII. Francisco BETHENCOURT, «Enlightened Reform in Portugal and Brazil» em

Enlightened Reform in Southern Europe and It’s Atlantic Colonies (ca. 1750-1830), org. Gabriel

PAQUETTE (USA: Ashgate, 2009), p. 42.

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Valentim Alexandre indica que os tecidos de linho de fabricação local, de Entre-o-douro-e-Minho, remetidos para o mercado brasileiro, por intermédio do Porto, representavam entre 20 a 30% da exportação total de artigos manufacturados portugueses entre os anos de 1796 a 1807, sendo que em 1801 chegou aos 44%. Também indica os montantes em dinheiro das ferragens e chapéus que saíam da mesma cidade para o Brasil e refere que correspondiam a 200 contos anuais para o mesmo período. Mas era de Lisboa que saía a maior parte dos tecidos de algodão, que gozavam de uma proteção absoluta, por isso, a Coroa portuguesa pode reservar o mercado metropolitano como o colonial à indústria do têxtil de algodão, então nascente, que possuía a vantagem de utilizar a matéria-prima brasileira com boas condições de preço. Valentim ALEXANDRE, Os sentidos do Império..., pp. 44-49.

35 europeia e norte-americana. As manufacturas portuguesas foram favorecidas pelas dificuldades de outros impérios. Consequentemente, o comércio luso-brasileiro floresceu, alimentando assim uma grande reexportação de géneros coloniais para a Europa: o algodão de Pernambuco foi um deles. Assim, no reinado de D. Maria I e durante o período da regência de D. João, confirmámos que a antiga capitania «Duartina», continuava a ser a terceira região economicamente mais importante no império português. A estabilidade económica e a prosperidade que Pernambuco conheceu no período subsequente à extinção da Companhia Geral pombalina estão relacionadas com as reformas pombalinas e com a conjuntura internacional que favoreceu os produtos coloniais91.

Mas não foi apenas a produção de géneros coloniais que beneficiou da conjuntura externa. Os anos de 1796-1807 foram marcados por uma notável prosperidade comercial, baseada na reexportação de produtos coloniais. Reexportação que manteve papel dominante nas exportações portuguesas, correspondendo a quase dois terços do seu valor global. A crescente procura europeia pelo algodão brasileiro teve um peso cada vez mais relevante, a par da comercialização do cacau e do café. A marca mais peculiar dessa prosperidade comercial, porém, foi a crescente importância que a América portuguesa adquiriu, não apenas como fornecedora de matérias-primas, mas também como consumidora de géneros remetidos do centro do império92.

No que tange às reformas políticas, o reinado de D. Maria foi um período de continuação de reformas. É preciso referir que, na segunda metade do século XVIII, se assistiu a um incremento da actividade político-administrativa da Coroa, verificando-se não apenas o aumento quantitativo de competências do poder central, mas também a mudança qualitativa das suas atribuições e dos seus intuitos, factos que confirmam a ideia

91 Liga-se particularmente com a produção, em larga escala, do algodão, por conta do processo de

independência dos Estados Unidos em 1776, processo esse que, entre 1775 e 1783, prejudicou a lavra do algodão norte-americano e acabou por beneficiar a produção das capitanias do Norte do Brasil. Jorge PEDREIRA, «A indústria», em História económica de Portugal…, vol. I, p. 203

92 Sobre o papel do Brasil na economia portuguesa ver principalmente o capítulo 4 da recente História económica de Portugal, denominado «a consolidação 1703-1807». Leonor F. COSTA, Pedro LAINS e

Susana MIRANDA, História económica de Portugal (1143-2010), (Lisboa: Esfera dos Livros, 2011), pp. 209-289. A obra clássica dirigida por Joel Serrão e Oliveira Marques confirma os dados acima e infere que Rio de Janeiro, Baía, Pernambuco, Pará e Maranhão, nesta ordem, perfaziam mais de 78% de todas as exportações portuguesas para as colónias e exportavam mais de 83% para Portugal. José Jobson de Andrade ARRUDA, «A circulação, as finanças e as flutuações económicas» em Nova História da Expansão

Portuguesa - o império luso-brasileiro 1750-1822, dirs. Joel SERRÃO e Oliveira MARQUES, vol. VIII, 1ª ed.

(Lisboa: editorial Estampa, 1986), pp. 174-175. Números que não contradizem os resultados encontrados por Valentim Alexandre na sua obra clássica. Valentim ALEXANDRE, Os sentidos do

36 de que, no período final do Antigo Regime, a imagem do monarca se sobrepôs às dos demais corpos sociais93. A. M. Hespanha defende que a Época Moderna foi palco do alargamento da administração activa da Coroa e, em última instância, do rei, pois, conforme o historiador, «nos finais do Antigo Regime surge, por parte do poder, uma intenção nova de organização activa [da sociedade]»94.

O intervencionismo da Coroa e o reformismo, que se acentuaram com o «pombalismo», vinham já do reinado de D. João V. O reinado de D. Pedro II foi aquele que verdadeiramente marcou o início de uma mudança, através da qual a imagem do rei se foi gradualmente alterando. Mas foi com D. João V que ocorreu uma perda progressiva do protagonismo do Conselho de Estado, que desempenhava funções consultivas e decisórias junto do monarca e era constituído por um número limitado de conselheiros, procedentes das principais famílias aristocráticas95.

O Conselho de Estado no reinado de D. João V foi sendo substituído por Conselhos ou Juntas, de composição variável, e pela tomada de resoluções por parte do monarca, assistido pelos seus principais secretários, como é o caso de Diogo de Mendonça Corte Real, ou de colaboradores directos que desfrutavam da confiança régia, como o cardeal da Cunha e o cardeal da Mota96. Embora isto não excluísse de forma cabal a consulta aos Conselhos, procedeu-se a uma mudança dos centros de decisão política, em que os

93 José M. SUBTIL, «Os poderes do Centro», em História de Portugal - Antigo Regime, org. António M.

HESPANHA, vol. VII (Lisboa: Lexicultural, 2002), p. 202. A exacerbar as ideias de José Subtil, o artigo de Rui Ramos afirma que o governo pombalino se esforçou por construir uma ideologia unificada do ‘Estado’, assente na tese da monarquia pura, concebida segundo um modelo patrimonial e não pactual. O poder do rei seria de natureza sagrada, uno e indivisível, e os súbditos estariam obrigados a obedecer às suas determinações. Rui RAMOS, «República, republicanos» em Revista Ler História, nº 55 (Lisboa: ISCTE, 2008), p. 157.

94 A. Manuel HESPANHA, «Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime» em Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos, org. António Manuel Hespanha (Lisboa:

Fundação Calouste Gulbenkian, 1984), p. 67.

95 Nuno Gonçalo MONTEIRO, D. José…, p. 193. 96

Júlia P. KOROBTCHENKO, «A Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra…», p. 26. Exemplo disso são as consultas nas quais o Cardeal da Mota dá indicações para o seu irmão, o secretário de Estado do Reino, Pedro da Mota e Silva, de qual será o despacho régio. Na série Reino do Conselho Ultramarino não é incomum encontrarmos escritos de secretários particulares do rei com ordens ou com indicações de resoluções de D. João V acerca desta ou daquela matéria. Exemplo: 1736, Novembro, 23, Lisboa. ESCRITO do [Cardeal D. João da Mota e Silva] ao [secretário de Estado do Reino, Pedro da Mota e Silva, seu irmão] encaminhando petição de soltura de uns frades de Tomar, e consulta referente a D. Antônio Henriques, com sugestão de despacho régio AHU, Conselho Ultramarino, Reino. AHU_CU_Reino, Cx. 27, pasta 2.

37 negócios mais relevantes eram arbitrados por estas juntas informais e pelas Secretarias97. Trata-se de um processo que aponta para o predomínio dum governo de carácter ministerial, processo esse que se viria a consolidar nos reinados seguintes98.

Estas reformas verificaram-se, desde o início do século XVIII, no seio da monarquia portuguesa99. Convém lembrar que essa monarquia tinha um carácter pluricontinental, distinguindo-se daquilo a que John Elliott denominou de «monarquia compósita». Expressão que classifica entidades políticas compostas por vários Reinos, cada um deles com estatutos próprios que preexistiam à formação de tal monarquia. A personalidade dos vários Reinos era, desse modo, preservada nos termos das suas formações originais, com os seus corpos de leis, de normas e de direitos locais. Cada uma dessas unidades mantinha a sua capacidade de autogoverno no interior de um complexo monárquico mais amplo. Nesse formato, o monarca operava como a cabeça dessa monarquia composta pelos vários Reinos, que se mantinham regidos pelas suas regras coadunadas com as leis maiores promulgadas pela Coroa100.

No caso português é mais pertinente falar numa «monarquia pluricontinental». A expressão demonstra que se trata de uma entidade política composta pelo conjunto das possessões ultramarinas e caracterizada pela comunicação permanente e pela negociação entre o Reino e as elites da periferia imperial. Além disso, na monarquia pluricontinental portuguesa registou-se uma tendência para uma crescente distinção das diversas esferas

97 Mesmo com a reforma das Secretarias de Estado em 1736, reforma que aparentemente representava

um ponto de viragem no padrão de governo, e apontava para uma administração ministerial, o resultado prático desta mudança não é visível no reinado de D. João V. O rei continuava a emitir as suas decisões, apoiado por um grupo de cortesãos da sua confiança, não conferindo às Secretarias criadas um papel central nas decisões governativas.

98 Maria Fernanda B. BICALHO, «As tramas da política: conselhos, secretários e juntas na administração

da monarquia portuguesa e de seus domínios ultramarinos» em Na Trama das Redes: política e negócios

no império português, séculos XVI-XVIII, orgs. João FRAGOSO, e Maria de Fátima Silva GOUVÊA (Rio de

Janeiro: Civilização Brasileira, 2008), p. 361.

99 Mas não apenas na monarquia portuguesa. Na monarquia hispânica, com o conjunto de reformas

bourbónicas, as possessões passaram a ser consideradas como colónias, sendo vistas não apenas como uma parte dependente de Castela, mas como comunidades semelhantes às colónias que a França e a Grã-Bretanha haviam estabelecido na América do Norte: comunidades fundadas e preservadas graças aos interesses mercantis com a metrópole. Pela primeira vez, definiu-se o "espanhol natural da América" como sendo um vassalo que vivia numa área periférica, ligada a Espanha graças ao comércio. Frederica MORELLI, «La redefinición de las relaciones imperiales: en torno a la relación reformas dieciochescas/independencia en América», Nuevo Mundo Mundos Nuevos, Debates, 2008.

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Como se sabe, J. Elliott tomou como referência o caso espanhol e Portugal fez parte desta monarquia compósita entre 1581 e 1640. John ELLIOTT, «A Europe of Composite Monarchies», em Past and

38 institucionais fossem elas militares, judiciais, tributárias ou eclesiásticas. Conforme Nuno G. Monteiro:

Elas correspondiam, de resto, a diversas lógicas sociais e a distintos padrões de circulação no espaço da Monarquia. A integração das periferias e o equilíbrio dos poderes no Império não se faziam, sobretudo, através do enraizamento local de todos os agentes referidos, o qual podia ou não ocorrer, mas, ao invés, pelo facto de as distintas instâncias, e as respetivas elites, mutuamente se tutelarem e manterem vínculos de comunicação com o centro101.

Este conceito afigurou-se muito pertinente para o nosso estudo, pois nele tencionámos reconstituir a comunicação política de Pernambuco com o centro, as negociações que os governadores precisaram de encetar com as elites locais, e como estas elites, na busca pelos seus interesses, procuraram revalidar a relação política com a Coroa. Além disso, e a partir do estudo da interação entre instituições situadas na capitania e entidades do poder central, pretendemos compreender os diferentes padrões de comunicação e os circuitos que as cartas e os ofícios provenientes de Pernambuco percorriam até chegarem ao rei, com a finalidade de perceber como eram resolvidas as demandas dos moradores da capitania de Pernambuco102.

Como se demonstrará ao longo da presente tese, através da análise das cartas do secretário de Estado, das câmaras e dos agentes da governação da capitania de Pernambuco, foi possível compreender como a comunicação política directa entre estes agentes da administração com o centro produziu muitas vezes argumentos contraditórios para a resolução de um mesmo problema ou questão103. Algo que não foi incomum ao longo de todo o Antigo Regime. O poder régio raramente teve condições para exercer uma «política, tal como hoje se entende o conceito», que desenvolvesse uma acção governativa e administrativa coesa e ordenada. Tal ocorreu mesmo durante o pombalismo.

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Nuno Gonçalo MONTEIRO. «Governadores e capitães-mores do Império Atlântico português no século XVIII» em Modos de Governar - Ideias e práticas políticas no Império português séculos XVI a XIX, orgs. Maria Fernanda BICALHO, e Vera Lúcia Amaral FERLINI, (São Paulo: Alameda, 2005), p. 93 e ss.

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A triagem feita pelo Conselho Ultramarino ou pela Secretaria de Estado, quando recebiam os pedidos e as queixas das periferias do império, tornou-se importante porque nos permitiu conhecer o que foi considerado relevante a ponto de ser apreciado. A decisão sobre o que foi consultado e resolvido auxiliou na compreensão de como os poderes se equilibravam nesta sociedade. É possível confirmar o conceito de monarquia pluricontinental quando estudamos a correspondência trocada entre os vassalos em Pernambuco e as instituições centrais da monarquia portuguesa, pois compreendemos como eram mantidos os vínculos de comunicação com o centro.

103 Um exemplo disso é a extinção da companhia pombalina e o debate ocorrido entre o secretário de

39 No que concerne ao Brasil, da parte da realeza não pareceu existir uma estratégia de longa duração, apenas uma disposição conjuntural para o alargamento da sua esfera de decisão e para a centralização da capacidade decisória, ao menos até a partida da Corte para o Brasil104. Ideia compartilhada por Francisco Bettencourt quando afirma que o verdadeiro processo de centralização iniciou-se em 1808 com a trasladação de relevantes agências da Coroa, a abertura dos portos, a liberdade de desenvolvimento industrial, o desenvolvimento de uma burocracia e a propagação do modelo social da sociedade de corte105.

Em texto bastante conhecido Russell-Wood já defendia que necessitavam de revisam a noção de um governo metropolitano centralizado, a formulação de políticas impermeáveis à realidade colonial, implementadas rigorosamente e sem questionamentos por parte dos agentes da governança e a existência de uma Coroa indiferente e com «directrizes» inflexíveis relativas ao Brasil106. Um dos traços mais comuns da actividade governativa do Antigo Regime foi o «improviso e a falta de planeamento político, bem como a ausência das visões de conjunto e de programas de intervenção social de longa duração»107. Mesmo que durante o chamado período pombalino tenha havido um esforço para centrar as decisões da Coroa na pessoa do rei, a ausência de uma política unificada ou centralizadora por parte da Coroa, seja para o «centro» ou para as «periferias» do império, foi algo que imperou durante os séculos XVI ao XVIII108.

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Para concluir este capítulo, algumas explicações sobre as fontes que utilizámos na elaboração deste estudo. A base de análise foi composta pelos diplomas emitidos pelos

104 Anthony J. R. RUSSELL-WOOD, «Centros e periferias no mundo luso-brasileiro, 1500 - 1808», Revista Brasileira de História, vol. XVIII, nº 36 (1998):pp. 200-206. [Consultado em 3 de novembro de 2011].

Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01881998000200010

105 Francisco BETHENCOURT, «Configurações políticas e poderes locais» em A expansão marítima portuguesa, 1400-1800, dirs., Francisco BETHENCOURT e Diogo Ramada CURTO (Liboa: Edições 70,

2010), p. 252.

106 Anthony J. R. RUSSELL-WOOD, «Centros e periferias no mundo luso-brasileiro…», p. 202. 107

Pedro CARDIM, «Centralização política e Estado na recente historiografia sobre o Portugal do antigo regime», Separata da Revista Nação e Defesa, Lisboa: Instituto da Defesa Nacional (1998), p. 141.

108 Miguel Jasmins RODRIGUES, «A pequena nobreza na construção do império: territorialização, serviço

régio e política de casamentos no grupo de famílias oriundo de João Gonçalves Zarco» em Pequena

nobreza de aquém e de além-mar: poderes, patrimónios e redes. (Lisboa: Instituto de Investigação

40 agentes da governação e, também, pela sua correspondência com as instituições do poder central. Entre a documentação utlizada destaca-se a correspondência trocada entre os governadores, os moradores da capitania de Pernambuco e o secretário de Estado109; as consultas do Conselho Ultramarino; as queixas das câmaras através da comunicação directa com os órgãos da administração central; as denúncias dos moradores contra alguns agentes da governação; e, finalmente, os processos de devassa aos governadores. A

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