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2. A EXECUÇÃO DA SENTENÇA CIVIL

2.5 PRINCÍPIOS DA EXECUÇÃO

2.6.1 A fase de cumprimento (voluntário) da sentença

2.6.1.3 A multa de 10% e o prazo para o pagamento

Ao instituir a multa legal de 10% o objetivo do legislador processualista foi, a toda evidência, forçar o cumprimento voluntário da obrigação pecuniária.

Na opinião de Fredie Didier Jr, Leonardo Carneiro da Cunha, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira (2013, p. 532-533), trata-se de medida de coerção indireta prevista em lei, que dispensa manifestação judicial porque é hipótese de sanção legal pelo inadimplemento da

obrigação. Para os autores, a multa tem, assim, dupla finalidade: servir como “contramotivo” para o inadimplemento (coerção) e punir o inadimplemento (sanção).

Sérgio Shimura (2006, p. 567) entende que referida multa, além do caráter punitivo, exerce função coercitiva no sentido de estimular e exortar o devedor a cumprir voluntariamente a obrigação. E vaticina: “[...] é certo que a finalidade dessa multa é de induzir o cumprimento voluntário da obrigação.”.

Arruda Alvim, Araken de Assis e Eduardo Arruda Alvim (2012, p. 974) manifestam opinião diversa ao asseverar que a multa possui caráter nitidamente sancionatório, ou seja, é imputada apenas àquele que não dá cumprimento à ordem de pagamento em quinze dias.

Em idêntico sentido, pondera Vítor J. de Mello Monteiro (2006, p. 493-494): “Com efeito, sendo um efeito da sentença, a multa, como já se disse, apresenta-se como medida punitiva, e não como meio de apoio para a execução da demanda, como são, v.g., as astreintes.”.

Esse entendimento permite inferir que haveria, então, maior intenção de punir o devedor que não cumpriu voluntariamente a obrigação ao invés de coagi-lo, por uma pressão psicológica, a cumprir tal obrigação, sob pena de lhe ser aplicado o instituto cominatório.

A respeito dessa questão, também se pode afirmar que a multa possui caráter duplo, ou seja, coercitivo e sancionatório, pois estimula o devedor ao cumprimento voluntário e pode apená-lo, caso não dê cumprimento à ordem de pagamento em quinze dias. Tal posição se compatibiliza com o espírito de efetividade e celeridade trazido pelas reformas123.

Conforme antes assinalado, objeto de muito debate é a questão atinente ao termo inicial do prazo para cumprimento da obrigação demandada, sob pena de multa. Foram várias as posições que se desenvolveram para identificar o início da contagem do prazo para o cumprimento da sentença e consequente imposição da multa prevista no artigo.

De acordo com Gilberto Gomes Bruschi (2009, p. 43), a discussão sobre o prazo para cumprimento da sentença pode ensejar,

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Por conta do caráter coercitivo, Marcelo Abelha Rodrigues (2006, p. 293- 294) admite a possibilidade de ocorrer situações ou circunstâncias que excluem a imposição da multa de 10%, tal como nos casos em que o réu não possua dinheiro disponível, mas tenha patrimônio de difícil alienação, ou se não teve “tempo suficiente para transformar bens do seu patrimônio em dinheiro suficiente para pagamento do seu débito”.

preponderantemente, duas opiniões: (i) inicia-se no momento em que a condenação se tornou exigível, mercê do trânsito em julgado ou da interposição do recurso não dotado de efeito suspensivo; ou (ii) a partir da intimação para que se inicie a contagem do prazo (e esta ainda se subdivide em duas, se a intimação pode ser feita na pessoa do advogado ou, necessariamente, deva ser feita ao devedor).

Da controvérsia instalada, resumem-se cinco principais correntes, a saber: (i) o início do prazo seria automático, a partir do momento em que a sentença/acórdão se tornasse exequível, quando então seria cabível execução provisória124-125; (ii) o início do prazo seria automático, a partir do trânsito em julgado da sentença/acórdão126; (iii) o início do prazo contaria a partir da data da intimação do advogado da baixa dos autos, com a intimação de “baixa dos autos à origem “ ou “cumpra-se”127; (iv) o início do prazo contaria a partir da data da intimação do advogado para pagar o valor da condenação128; e (v) o

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Athos Gusmão Carneiro (2006, p. 28, grifo do autor) defendeu a seguinte hipótese: “[...] na sentença condenatória por quantia líquida (ou na decisão de liquidação de sentença), a lei alerta para o tempus iudicati de quinze dias, concedido para que o devedor cumpra voluntariamente sua obrigação. Tal prazo passa automaticamente a fluir, independentemente de qualquer intimação, da data em que a sentença (ou o acórdão, CPC art. 512) se torne exigível [...].”. 125

Araken de Assis (2013a, p. 163), ao interpretar o caput do artigo 475-J, também entendeu que “[...] o prazo flui da data em que a condenação se tornar exigível.”.

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E, como se posicionou Humberto Theodoro Junior (2009b, p. 578): “A sanção, porém, só ocorrerá após o trânsito em julgado, devendo lembrar-se que a execução provisória é faculdade do credor, mas não é dever que cumpre ao devedor realizar voluntariamente, pelo que sua falta não o faz incidir na multa própria do descumprimento da sentença.”.

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Na interpretação de Cassio Scarpinella Bueno (2009b, p. 172): “O prazo, destarte, é da intimação judicial que comunique que o julgado reúne suficientemente condições de eficácia plena, qualquer que seja a ‘forma’ adotada por esta intimação. Sejam os usuais ‘cumpra-se o v. acórdão’, ‘ciência às partes do retorno dos autos ao juízo’ ou o que para os tempos da Lei n. 11.232/2005, é mais correto, ‘fica intimado o devedor a pagar o montante devido em quinze dias sob pena de multa de 10% sobre o total’, é desta intimação que fluirá o prazo a que se refere o caput do art. 475-J.”.

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Trata-se de entendimento esboçado pela maioria da doutrina: “A intimação acerca da incidência da multa de 10% pode ser feita na pessoa do advogado, sem a necessidade de intimação pessoal da parte [...].” (LUCON, 2007, p. 990). “Como forma de minimizar as possibilidades de injustiças, e tendo em vista a falta de norma expressa, é que defendemos a necessidade de intimação do

início do prazo contaria a partir da data da intimação pessoal do devedor para pagar o valor da condenação129.

Em decisão monocrática nos autos do Agravo de Instrumento 1.056.473/RS, o Ministro João Otávio de Noronha, emblematicamente, manifestou-se pelo afastamento da multa de 10% do artigo 475-J, ante o argumento de que o termo inicial para o cumprimento voluntário da sentença deve iniciar a partir da intimação do devedor, na pessoa de seu advogado (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AI 1.056.473/RS, j. 22.05.2009).

Posteriormente, o STJ, por meio do acórdão proferido no REsp 940.274/MS, acabou consolidando o entendimento de que o prazo de quinze dias se inicia mediante intimação do advogado da parte da determinação de que seja cumprida a sentença, após o retorno dos autos ao juízo de origem competente para processar o cumprimento. Fixou-se, também, o entendimento de que a multa de 10% prevista no caput do artigo 475-J do CPC não é cabível no cumprimento provisório de sentença (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Corte Especial. REsp 940.274/MS, j. 07.04.2010).

A atual jurisprudência da Corte Superior de Justiça brasileira segue a mesma linha de entendimento, agora mais sofisticada, diferenciando os prazos para cumprimento de sentença e o prazo para oferecer impugnação à execução de sentença130.

devedor, mas apenas por meio de publicação na imprensa oficial, sendo dispensável a intimação pessoal, por se tratar de ato que, apesar de ser praticado pela parte, necessita acompanhamento de seu procurador constituído nos autos para elaboração do cálculo e comprovação perante o juízo em que está atrelado o processo de onde se originou a decisão interlocutória.” (BRUSCHI, 2009b, p. 51, grifos do autor).

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Nesse sentido, opina Alexandre de Freitas Câmara (2009, p. 119): “Tenho para mim que nenhuma dessas duas posições é a melhor. Penso que o termo a quo desse prazo quinzenal é a intimação pessoal do devedor para cumprir a sentença.”.

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“DIREITO PROCESSUAL CIVIL - ART. 535 DO CPC - AUSÊNCIA DE VÍCIO - EXECUÇÃO - ART. 475-J DO CPC - PRAZO PARA PAGAMENTO E PARA IMPUGNAÇÃO - DISTINÇÃO - NÃO INCIDÊNCIA DE JUROS REMUNERATÓRIOS - NÃO OCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. [...] 2. Não há identidade entre os prazos previstos no caput do art. 475-J do CPC e aquele positivado no seu §1º. O primeiro se refere ao prazo para o pagamento espontâneo do valor devido, tendo início na intimação do advogado do devedor. O segundo se refere ao interregno previsto para formulação de impugnação pelo executado e tem termo inicial no depósito da

Observou-se, na prática, que após o julgamento do REsp 940.274/MS a jurisprudência considera a intimação do condenado sobre o prévio requerimento do credor, após o retorno dos autos à instância de origem, como o termo inicial da contagem de prazo para cumprimento voluntário.

A aplicação da multa, segundo essa linha de entendimento, dependerá do trânsito em julgado do provimento condenatório ao pagamento de quantia líquida; baixa dos autos; intimação das partes sobre o retorno dos autos à origem; requerimento do credor apresentando o valor do débito e exigindo o pagamento; despacho do juiz dando impulso ao cumprimento da sentença e intimando o devedor a pagá-la; inocorrência de cumprimento voluntário (SILVA, 2011, p. 234).

Ricardo Alexandre da Silva (2011, p. 250) não concorda com os rumos que se firmaram após o julgamento do REsp 940.274/MS, mencionado linhas atrás. O autor entende que a intimação do condenado deve ocorrer, para o início da execução forçada, quando encerrado o prazo para cumprimento voluntário, de modo que a multa prevista no artigo 475-J já teria incidido.

Contudo, a posição do STJ foi bem aceita pela doutrina. A melhor interpretação parece ser a que exige a intimação do devedor, dirigida ao seu advogado, para, no prazo de quinze dias, oportunizar o adimplemento voluntário da obrigação. O devedor que não cumprir voluntariamente a obrigação neste prazo será considerado inadimplente e, então, o credor, agora exequente, poderá requerer o início do cumprimento forçado da sentença (execução da sentença), como deixa claro o comando, na sua parte final, do caput do artigo 475-J do CPC (DIDIER JR et al, 2013, p. 534).

A conclusão, nessa linha de raciocínio, é que a multa do artigo 475-J só pode incidir se, antes, o executado – por meio do advogado – tiver sido intimado para cumprir espontaneamente a obrigação.

Ultrapassada a fase de cumprimento voluntário da sentença, a fase executiva (execução forçada) iniciar-se-á a partir do requerimento do credor e, então, poder-se-á fazer a penhora e a avaliação de bens que respondam pela dívida e oportunizar impugnação ao devedor.

A seguir, o estudo se detém na segunda fase do cumprimento da sentença, a partir das defesas do executado.

dívida incontroversa. Precedentes. [...] 4. Recurso especial não provido.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma. REsp 1327781/BA, j. 02/05/2013).

2.6.2 A fase de execução (forçada) da sentença: as defesas do