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2. A EXECUÇÃO DA SENTENÇA CIVIL

2.5 PRINCÍPIOS DA EXECUÇÃO

2.6.2 A fase de execução (forçada) da sentença: as defesas do

2.6.2.1 A impugnação ao cumprimento de sentença

2.6.2.1.2 Objeto da impugnação

O artigo 475-L, caput, exige que o objeto da impugnação do executado obrigatoriamente se limite às causas arroladas no próprio dispositivo, verbis:

Artigo 475-L: A impugnação somente poderá versar sobre:

I – falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia;

II – inexigibilidade do título;

III – penhora incorreta ou avaliação errônea; IV – ilegitimidade das partes;

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As razões que justificam o cabimento de cada recurso são apresentadas por Pedro Miranda de Oliveira (2009d, p. 100, grifos do autor): “Com efeito, o cabimento de agravo de instrumento no caso de acolhimento parcial da impugnação, assim como na hipótese de rejeição, decorre da necessidade de os autos principais permanecerem tramitando no primeiro grau de jurisdição, enquanto a decisão recorrida é revista pelo tribunal. E só por isso! Poder-se-ia dizer que, misturando-se os critérios utilizados pelo CPC, o recurso cabível deveria ser uma espécie de “apelação de instrumento”: apelação (pelo critério do conteúdo) interposta no regime de instrumento (pelo critério finalístico).”.

V – excesso de execução;

VI – qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença.

O primeiro fundamento, na clara lição de Luiz Fux (2008, p. 262- 263), confere à impugnação uma função rescindente notável, porquanto, acolhida, “destrói todo o processo”, com efeito retro-operante, iniciando-se, a partir da intimação da decisão, novo prazo para defesa no processo, tal como se opera quando o réu comparece apenas para arguir a nulidade ou falta de convocação (artigo 214, §2°, do CPC). O citado autor ainda observa que o efeito desconstitutivo emerge se o processo de conhecimento correu à revelia do réu, uma vez que, se ele compareceu de alguma forma, ainda que representado por curador especial (art. 9° do CPC), tornar-se-á inaplicável o dispositivo, fundado inequivocamente nos cânones do devido processo legal e do contraditório.

Pelo disposto no inciso II do dispositivo processual colacionado, o executado pode defender-se alegando inexigibilidade da pretensão creditícia. A pretensão será inexigível se pender alguma condição ou termo que iniba a eficácia do direito reconhecido na sentença (CPC, artigo 572, aqui aplicável por força do artigo 475-R) (DIDIER JR et al., 2013, p. 386).

Embora a maior parte da doutrina assim comente o inciso II do artigo 475-L, Araken de Assis (2013a, p. 254) sugere outra interpretação. O doutrinador entende que o inciso se refere à inexequibilidade, ou seja, à falta de título ou à ausência dos atributos da respectiva obrigação (certeza e liquidez), pois a inexigibilidade do título executivo, impropriamente mencionada no citado dispositivo legal, representa excesso de execução (previsto no inciso V).

Ainda, a teor do §1º do artigo 475-L, para efeito do disposto no inciso II, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo STF, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pela Corte Suprema como incompatíveis com a Constituição Federal.

Antes do advento desse dispositivo, o meio apropriado para conter a exequibilidade de qualquer sentença tida por inconstitucional era a ação rescisória (artigo 485, V). Agora, para hipóteses especialmente selecionadas pelo legislador, conferiu-se essa eficácia aos embargos (artigo 741, parágrafo único) e à impugnação (artigo 475-L, §1º) à execução.

Para bem definir o alcance dos meios de oposição do executado em face de sentenças inconstitucionais, duas premissas devem ser consideradas: (i) a de que eles não alcançam a universalidade das sentenças inconstitucionais, mas apenas as fundadas em vício específico de inconstitucionalidade; e (ii) a de que tal vício específico tenha sido reconhecido pelo STF.

A solução oferecida pelo §1º do artigo 475-L fica, então, limitada a situações especiais e não afasta a necessidade de eventualmente trilhar outros caminhos quando houver sentença com vícios de inconstitucionalidade por ela não especificados.

Sobre o assunto, assim discorre Teori Albino Zavaski (2006b, p. 155):

Realmente, nem todos os possíveis conflitos entre os princípios da supremacia da Constituição e da coisa julgada são resolvidos pela impugnação e pelos embargos à execução. É que a sentença pode operar ofensa à Constituição em variadas situações, que vão além das que resultam do controle da constitucionalidade das normas. A sentença é inconstitucional não apenas (a) quando aplica norma inconstitucional (ou com um sentido ou uma situação tidos por inconstitucionais), mas também quando, por exemplo, (b) deixa de aplicar norma declarada constitucional, ou (c) aplica dispositivo da Constituição considerado não auto- aplicável, ou (d) deixa de aplicar dispositivo da Constituição considerado não auto-aplicável, e assim por diante. A inconstitucionalidade da sentença, na verdade, ocorre em qualquer caso de ofensa à supremacia da Constituição, e o controle dessa supremacia, pelo Supremo, é exercido em toda a amplitude da jurisdição constitucional, da qual a fiscalização da constitucionalidade das leis é parte importante, mas é apenas parte.

Sobre o disposto no inciso III, a próxima seção tratará da questão da necessidade ou não da penhora prévia ao oferecimento da impugnação. Aqui, portanto, cumpre ressaltar que se quiser discutir a regularidade da penhora, ou o valor da avaliação, caberá ao executado fazê-lo na impugnação.

A ilegitimidade da parte (art. 475-L, inc. IV) também pode ser alegada na defesa do executado, mas somente aquela referente à fase do

requerimento executivo, pois a legitimidade relativa à fase de cognição não pode mais ser discutida em face da preclusão. A hipótese se refere à situação na qual não foi observado o disposto nos artigos 566 e 567 do CPC que regulam tanto a legitimidade ativa como a passiva, quando se dirige a execução contra quem não tem responsabilidade executiva, que vem disciplinada nos artigos 568 e 592 do mesmo diploma legal.

Nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2011, p. 306):

A ilegitimidade das partes que pode ser alegada em impugnação é a ilegitimidade para a execução forçada. Não é possível reabrir eventual discussão a respeito da ilegitimidade para agir de uma das partes na fase de conhecimento. Se a execução constitui apenas a fase final da demanda, que conduziu à sentença condenatória, o executado poderá arguir tão somente a ilegitimidade das partes a partir da relação de adequação entre o requerimento de execução e a sentença condenatória.

O excesso de execução (CPC, art. 475-L, inc. V) também pode ser questionado pela impugnação, que ocorre quando o executado pleiteia mais do que lhe é devido no título executivo. Entretanto, esse fundamento está ampliado nas hipóteses previstas no art. 743 do CPC, com a indicação de outras situações que devem ser recepcionadas como excesso de execução, a saber: I - quando o credor pleiteia quantia superior a do título; II - quando recai sobre coisa diversa daquela declarada no título; III - quando se processa de modo diferente do que foi determinado na sentença; IV - quando o credor, sem cumprir a prestação que lhe corresponde, exige o adimplemento do devedor (art. 582, CPC); V - se o credor não prova que a condição se realizou.

O excesso de execução se restringe a adequar o procedimento executivo ao que está disposto na sentença, para que o devedor não tenha de pagar ou entregar além daquilo a que foi condenado.

Carlos Henrique Bezerra Leite e Lais Duarte Leite (2010, p. 40) explicam que o fato de a liquidação não mais ser feita no final da fase de conhecimento, mas sim no momento da execução, torna completamente possível a sua discussão via impugnação. Assim, “quando o executado alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante da sentença, cumprir-lhe-á declarar de imediato o

valor que entende correto, sob pena de rejeição liminar dessa impugnação”, conforme previsão do §2°, artigo 475-L135.

Com efeito, qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença (art. 475-L, inc. VI), é matéria da impugnação.

Como se verifica, trata-se de rol meramente exemplificativo e as causas impeditivas do direito subjetivo material devem ser posteriores à sentença, como, por exemplo, novação, transação, renúncia, compensação, pagamento etc.

Embora o rol do inciso VI seja exemplificativo, é necessário fixar que, do contrário, as hipóteses do artigo 475-L são taxativas. Ressalvada a falta ou a nulidade de citação, se o processo correu à revelia (inciso I) e a chamada coisa julgada inconstitucional (prevista no §1º do artigo 475-L136), ao executado não se permite alegar questões anteriores à sentença, restringindo-se tão só a suscitar matéria que diga respeito à própria execução ou que seja superveniente à sentença. Isso porque as questões anteriores à sentença já foram alcançadas pela preclusão ou pela coisa julgada material, não devendo mais ser revistas na execução (CUNHA, 2007, p. 648).

Carlos Henrique Bezerra Leite e Lais Durval Leite (2010, p. 42- 43) também defendem que a prescrição, que pode ser alegada via impugnação, é a referente ao prazo de cumprimento do título executivo judicial: seria a prescrição intercorrente. Como o Estado não pode iniciar a execução de ofício, pois ainda depende do requerimento por parte do credor, há um limite para que este exija a satisfação do seu direito reconhecido judicialmente.137

Por fim, percebe-se que o legislador levou em conta a obrigatoriedade do respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, ao criar o método de reação do executado, a impugnação do

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“§2º Quando o executado alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante da sentença, cumprir-lhe-á declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de rejeição liminar dessa impugnação.”

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“§1° Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.”

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Súmula 150 do STF: “Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação.”

devedor. Embora as questões arguíveis estejam limitadas pelo artigo 475-L, na verdade, traduzem os fatos que possam comprometer a esfera jurídica do executado. Evitam-se rediscussões e, ao mesmo tempo, garante-se que acontecimentos, posteriores à formação do título executivo, não comportam os direitos do devedor.