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Parte I – Enquadramento teórico 9

3.2   A preferência do meio televisão pelos anunciantes e espetadores 67

No que concerne ao meio televisivo, é patente a ideia de que a sua unidirecionalidade pode tornar castradora a interação com o consumidor. Porém, há quem defenda que a comunicação televisiva pode ser entendida como sendo algo libertador da condição humana:

[L]a televisión pretende transmitir audiovisualmente las vibraciones recibidas. Es un comercio de ida y vuelta. Un magnifico instrumento - eso -sí que corona, por el momento, la carrera que el hombre emprendió hace muchos siglos para acortar la distanciaexistente entre alguien que percibe y transmite y alguien que tiene que recibir lo que por el instrumento de comunicación ha de transmitírsele.

Se trata de una distancia que desafía al progreso humano con distintas barreras. Muros, a veces, impenetrables. Y a la destrucción y derrumbamiento de esos muros es a lo que ha contribuido de manera especial la televisión de nuestro tiempo (Gil de Muro, cit in Davara et

al, 1989: 247).

Numa primeira instância, o consumidor é sempre um ser individual, com uma identidade própria, sendo precisamente essa a especificidade na qual se baseia a sua relação para com o meio televisivo.

O discurso publicitário desloca-se de um modelo de respostas e estímulos para um modelo cinematográfico, daí a designação de “hipercinema”, que assenta na premissa da “imagem excesso”76 que, por sua vez, se baseia na aplicação de recursos estilísticos utilizados no texto publicitário, bem como no ritmo acelerado das imagens exibidas pelos spots de televisão e

76Apesar da linguagem utilizada nos spots de televisão ser similar ao cinema, existem diferenças estruturais e estéticas como por exemplo a duração e o número de planos.

na sua duração, que é cada vez menor77. “A tendência é de retracção extrema da imagem no tempo e de um dilúvio de imagens lançadas na cascata da estética do clip” (Lipovetsky e Serroy, 2010: 238).

Esta tendência pode ser demonstrada pelas marcas de perfumes que apresentam as estrelas de cinema como atores das suas mensagens (partilhar as emoções mais íntimas, como a paixão e deslumbramento provocadas pela fragrância de um aroma que se mostra poderoso e único, onde tudo é excessivo e apaixonante).

Contudo, a publicidade em televisão continua a seguir a regra de ouro: comunicar de forma simples e clara. A televisão fornece esta vantagem à construção dos anúncios de televisão, permitindo que a imagem e a palavra se possam manipular (na montagem de planos) e que, se tornem sedutoras, numa ‘única’ sequência que resulta no significado de uma marca, por outras palavras:

[L]o que parece más cierto es que una palabra y mil imágenes son casi la filosofía perfecta de un diccionario para los ojos. Por una simple razón: porque con ese proceso icónico- verbal se supera lo racional, lo lógico de las expresiones, y se instala uno en la frontera misma de la fascinación. Además de comunicar algo, se intenta también seducir, apasionar, darle la vuelta al ánimo del receptor de nuestras comunicaciones. És el mayor poder de la imagen televisual (Gil de Muro in Wimmer, e Dominick, 1996: 253).

Outro dos fatores que levam os anunciantes a optarem pelo meio televisivo prende-se com a atmosfera vivida no ambiente familiar e doméstico. Este cenário é visto como uma oportunidade de vender as suas marcas, ao considerarem a televisão como um meio socializador. Este tipo de intimidade existente nos lares dos consumidores oferece condições que são favoráveis à divulgação das marcas, bem como a assimilação das mensagens através de um fator determinante, como sendo a intimidade e partilha de emoções entre o indivíduo e o grupo.

As marcas e os produtos tornam-se ainda motivo de conversa e servem de pretexto para estabelecer relações e trocar opiniões sobre as qualidades ou o uso de determinados produtos. Nesta ótica, a televisão pode ser assim caracterizada:

77Os slogans presentes nos spots de televisão valorizam o produto através das suas promessas (prazer, juventude, sabor, etc), utilizando hipérboles que enaltecem os produtos de forma exagerada num curto espaço de tempo (Gilles Lipovetsky e Jean Serroy, 2010: 237).

[T]endo ganho relevância significativa, a televisão é hoje praticamente uma companhia habitual na estrutura familiar, podendo quase que equiparar-se a mais um membro do núcleo familiar (Peixoto, 2007: 120).

Se estabelecermos uma comparação entre o cinema e a televisão, observamos que existe entre ambos uma fronteira acentuada relativa ao modo como as imagens são recebidas pelo espetador. As imagens em televisão são trazidas para o pequeno ecrã e o seu visionamento, é feito de forma privada, como refere Lipovetsky:

[P]rimeiro familiar, a audiência da TV empenhou-se cada vez mais na via da individualização, possibilitada pela multiplicação de canais, por suportes como a cassete ou DVD e hoje, pelo vídeo on-demand (2010: 204).

Enquanto no cinema o espetador faz o corte com o seu dia a dia (idem), na televisão, em lugar do silêncio podemos dialogar e comentar, desde logo, sobre o que assistimos, ou podemos administrar o que pretendemos visionar num curto espaço de tempo. Ou seja, o corte do real não é nunca absoluto, como acontece no cinema.

No cinema, o espetador assimila as imagens de forma congelada, devido à abstração do exterior. O tumulto existe como um componente da própria mensagem. Pelo contrário, a televisão produz no espetador uma atenção que é quebrada e por vezes oscilante, não só pelo ambiente familiar que permite este tipo de atitude, mas também pela possibilidade de

zapping, caracterizada pela procura e curiosidade por parte do espetador que,

impulsivamente, pesquisa outros momentos de lazer. Uma das estratégias para minimizar o efeito de zapping pode residir em fazer dos anúncios programas de entretenimento78.

Contudo, o zapping tende a tornar-se uma ‘ameaça menor’, dado o aparecimento da televisão interativa, que permite ao consumidor voltar a rever de forma imediata um anúncio que lhe suscitou curiosidade, sendo que pode pará-lo num frame em particular. Caminhamos, deste modo, para a total manipulação da imagem, onde o consumidor não se sente afetado pela fugacidade da duração presente vulgarmente nos spots de televisão. Outro fator a ter em consideração quando se opta pelo meio televisão, é o da seleção dos horários em que anúncio de televisão deve ser inserido, ou seja, a escolha dos intervalos da

78Esta técnica foi adotada pela General Foods, desenvolvendo “shortcuts”. Este processo consiste em apresentar spots como se tratassem de um programa de culinária (Sandra Moriarty, 1991: 301).

programação de cada canal é determinante para o sucesso das marcas. Este fator é tido em conta pelos anunciantes, ainda que, mesmo conscientes de que a preferência de programas pelos consumidores não é um processo linear (a predisposição e preferência por um determinado programa variam consoante as relações que as famílias estabelecem entre si, dependendo dos estilos de vida e dos padrões culturais de cada família (Peixoto, 2007: 121). Todavia, é certo que alguns programas são alvo de uma audiência excecional (telenovelas, jogos de futebol, telejornais e reality shows são alguns exemplos).