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ACADEMIA REAL DAS SCIENCLAS DE LISBOA

No documento O carvão numa economia nacional (páginas 194-198)

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Com a criação da Academia Real das Ciências de Lisboa, em 1779, começaram a aparecer as mais variadas publicações de acordo com o carácter "da investigação e do fomento económico" a que se propunha, de que destacamos as Memórias Económicas (1789-1815) e, entre estas, algumas de relevo para a história do carvão em Portugal. Da sua leitura, concluímos que, efectivamente, há já experiências com carvão de pedra e que o seu estudo se relaciona com a necessidade de se encontrar combustível em alternativa às lenhas para as forjas e fundições do país, preocupações que, sendo assim, não são exclusivas de meados do século dezanove.

43 Ibidem. Cfr. RIBEIRO, J. Silvestre - Op. cit. p. 64.

44 A Academia Real das Ciências teve os primeiros estatutos aprovados em 24 de Dezembro de 1779 > r

diligência do segundo duque de Lapes e do abade Correia da Serra e inspiração de Domingos Vandelli e do visconde de Barbacena". Cfr. Academias. Dicionário de História de Portugal. Dir. de Joel Serrão. Vol. I. S.I.: Livraria Figueirinhas, S.d. p. 14.

Então, de facto, quase somos levados a concluir que, se as lenhas eram uma preocupação mas se o carvão que entretanto se produzia não encontrava quem o comprasse, não se pode imputar à sua falta a lentidão industrial do país. Não é bem assim. O carvão que ora se ensaiava não servia devidamente, como de resto o provavam as primeiras experiências que com ele se faziam.45 Mas, uma coisa adiantamos já como certa,

para fins do século XVIII, a de que se consumia carvão importado da Inglaterra porque de boa qualidade e, como veremos posteriormente, a melhor preço.

Desde os fins do século XVIII que, sob o "academismo'' da Academia Real das Ciências de Lisboa, começavam a aparecer os primeiros estudos científicos sobre as vantagens e características do carvão mineral, ao mesmo tempo que se se realizavam os primeiros ensaios e se procedia ao estudo geológico dos terrenos. É assim que, em 1789, Manoel Ferreira da Cunha, a pedido da Academia, vai fazer o "exame" de uma mina de carvão de pedra descoberta em 1783 por Fortunato José Barreto, "prior da freguesia da

45 A conclusão é extraída de VANDELLI, Domingos - Memoria sobre o modo de aproveitar o carvão de

pedra, e os paus betuminosos deste reino. Memorias económicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa. Tomo II. Nesta memória, Vandelli afirma-nos que "o carvaõ de Buarcos não pode servir nas forjas, porque escoria muito o ferro em razaõ do enxofre, e acido sulphurico que na combustão sai das

pirites, das quais abunda". Diz ainda que no ano de 1774 usou "do carvaõ de pedra da mina de da Figueira, ou Buarcos somente em pequenos fornos de louça" e porque "se não podia servir deste carvaõ nos mais processos chimicos do Laboratório de Coimbra por causa dos incómodos, e prejudiciais vapores", resoveu-se a "desenxofrallo, ou purificallo". Op. cit. p. 434-436. Bastante mais tarde, em meados do século XDC, Carlos Ribeiro continua com este pessimismo sobre o carvão do Cabo Mondego, alegando que "pela distillação dá um coke bastante poroso e de má qualidade, talvez devido ao mau preparo; O sulphureto de ferro abunda n'este combustível, eépor certo este pernicioso companheiro que

o tem banido das suas mais utei applicações". RIBEIRO, Carlos - Memoria sobre a mina de carvão de pedra do Cabo Mondego. Op. cit. p. 218-219.

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pnWTTTKAI, NO TEMPO DO CARVÃO

Carvoeira, légua e meia distante da Villa de Torres Vedras"'6 quando, "abrindo um poço para

haver de regar huma fazenda sua(...)encontrou debaixo de hum banco de saibro endurecido, a que precedia hum pequeno estrado de argilla, huma camada de carvão de pedra pyátoso".

O estudo, atestando-nos a sua existência e curiosidade muito antes de se colocar o seu valor como fundamento da força do vapor na sua relação com um processo de industrialização, revela-nos que, se o conhecimento dessa sua função energética era ainda ignorado, pelo menos, se poderia considerar como combustível na substituição das lenhas ou carvão vegetal, nas forjas e trabalhos de metalurgia. Embora possamos concluir que o conhecimento público dessa possibilidade era bastante restrito, o autor apresentavam como alternativa nas regiões desprovidas de lenhas, como parecia ser o caso da freguesia da Carvoeira:

Entre as matérias que servem à combustão, vem huma que parece ter sido primeiro aproveitada pelos habitantes dos paizes onde os vegetais são raros: e em verdade se lançarmos hum golpe de vista sobre os Paizes aonde se encontra, e extrahe com proveito o carvaõ de pedra, achallos-hemos despovoados de vegetaes, de que a natureza os indemnizou com aquella produção. O sitio da Carvoeira, e suas vizinhanças abonaõ o meu enunciado. Os habitantes desta Paroquia naõ tem lenhas, senaõ trazidas de mais longe; a mesma cepa, de que ordinariamente se faz o carvaõ, alii he taõ mesquinha, que mal pagaria o trabalho de a fabricar; e posto que o carvaõ de pedra se encontre quasi á superficie da terra; todavia como não lhe conhecem a utilidade, e delle tem pouca necessidade, tudo faz com que desprezem huns aquilo, que outros estimaõ em tanto.

CUNHA, Manoel Ferreira da - Observações - Feitas por ordem da Real Academia de Lisboa acerca do carvão de Pedra, que se encontra na freguezia da Carvoeira. Memorias Económicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa. Tomo II. 1790. p. 285.

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Idem. Ibidem.

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Por entre a descrição das informações e das amostras que recolheu para levar para a Academia, "Recolhi pedaços em grande quantidade neste sitio, dos quaes appresentei amostras á Academia"? refere-nos "indícios" de minas de carvão exploradas no passado, o que vem corroborar o que já expusemos sobre o seu conhecimento para épocas anteriores, e que estarão, segundo pensa, na origem toponímica da "Carvoeira".

(...) a favor de minha suspeita estão os indícios de antigas minas de carvão, que nos montes superiores, e na direcção de Leste a Oeste se encontrão. (...) Poder-se-hia dizer ainda com probabilidade, que o nome da Carvoeira tivera origem destas minas, que em outro tempo se extrhaírão."

E há mais. O autor demonstra conhecer as suas características que, pelo resultado das experiências feitas, "posto que este naõ tenha o mesmo aspecto, que o melhor que de Inglaterra nos vem, produz todavia os effeitos de huma boa substancia inflamável", se podia utilizar nas forjas e "caldeaçaõ" do ferro, uma vez que pela experiência realizada em "casa de hum Ferreiro", "naõ só a caldeaçaõ se fez mais breve, mas que o ferro se naõ escoriava mais, do que houvesse sido caldeado com o carvaõ de sepa ou sobro".

As conclusões a que chegou merecem ser apresentadas pela particularidade de evidenciarem, num tempo ainda tão recuado, não só conhecimento das vantagens do carvão mineral sobre os carvões vegetais e lenhas, quer como alternativa à sua escassez, quer mesmo como substituto do carvão inglês em circunstâncias específicas das nossas

"Experiências feitas com o carvaõ dos sitios assima referidos", Op. cit. p. 290.

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Op. cit. p. 289. Idem. Ibidem, p. 292.

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