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2 NO AMANHECER DO SÉCULO

No documento O carvão numa economia nacional (páginas 142-146)

Infelizmente que, se na alvorada do século XX continuavam as preocupações pelas minas, por vezes mesmo encaradas com certo ou mesmo demasiado optimismo, a realidade era outra, aproveitando o país muito menos do que poderia, mesmo sem os recursos que tantas vezes se fazia crer. A maior parte das explorações manter-se-ía confiada aos estrangeiros, tal como Léon Poinsard escrevia em 1912:

Portugal possue, pois, todos os elementos d'uma industria metallurgica muito importante que, com industrias annexas, poderia ter feito d'esté paiz um dos centros mais activos do mundo. Os portuguezes não souberam tirar partido d'estas riquezas; os seus minérios quasi não foram para elles mais que montões de pedras sem valor até o dia em que os estrangeiros vieram extrahi-los e os levaram para alimentarem as suas fabricas.

Desde o início do século XX que o interesse dos estrangeiros pelos nossos recursos minerais se tornara mais frequente, conforme os pedidos de concessão e exploração que se fizeram. Apesar de não termos as riquezas que sempre alimentaram o nosso imaginário, o que tínhamos, aliado sobretudo a uma abundante variedade, sempre fizera com que os estrangeiros, sem as dificuldades da concorrência dos capitais nacionais, se aproveitassem no decurso deste século das nossas melhores minas. E, a justificá-lo, cá temos, mais uma vez, Manuel Rodrigues Júnior, quando, em 1921, afirma:

Op. cit. p. 253-254.

E, contudo, se das investigações mineiras até hoje feitas e da constituição geológica conhecida resulta que Portugal não é um país rico de minas, também é evidente que em face do número, da área das concessões existentes, da variedade dos minérios e do valor dos jazigos, a exploração actual está muito

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àquem das suas possibilidades.

A falta de um inventário rigoroso dos nossos recursos e o mito de que "Portugal era

um dos países mais ricos em jazigos metallij'eros"91constituía, obviamente, um estímulo ao

investimento estrangeiro. Aliás, esta tinha sido uma razão que atraíra os capitais

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estrangeiros desde a década de 50 do século anterior.

M. Rodrigues Júnior traçou-nos, em 1921,93 uma verdadeira análise explicativa da

situação mineira relativa ao primeiro quartel do nosso século. Nada faltou. A debilidade dos capitais nacionais, ou então, a pouca receptividade por este tipo de investimento feito pelos estrangeiros apenas nas minas mais ricas, donde retiravam os minérios que depois transformavam e nos vendiam, guardando mesmo para reserva, muitas vezes, essas minas, era uma das causas apresentadas para o nosso atraso.

Então não havia mesmo capitais portugueses para o investimento? Haver, havia, mas a lógica do investimento está sempre relacionada com a menor capacidade de investimento para um lucro rápido, fácil e seguro, coisa que as minas não asseguravam.

O capital português, quando atraído pelo sector industrial, esquecia-se do mineiro. Compreende-se! As minas ficavam a enormes distâncias dos centros de consumo, os instrumentos e os trabalhos de pesquisa tornavam-se sempre onerosos, a falta de

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Op. cit. p. 195.

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POINSARD, Léon - Op. cit. p. 249. PERDIGÃO, Azeredo - Op. cit. p. 13. SERRÃO, J. Veríssimo - Op. cit. Vol. IX, p. 282-285.

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metalurgias na proximidade das minas e os meios de comunicação sempre difíceis e caros eram sérios obstáculos ao investimento neste tipo de actividade. Aliás, eram já as dificuldades de transporte que, no Inquérito de 1890, R. Lima continuava a reconhecer como um dos factores impeditivos do progresso mineiro.

Uma das causas allegadas pelos concessionários como contraria ao desenvolvimento da actividade mineira é a das difficuldades de transporte. (...)A questão dos transportes é a que mais assoberba os nossos industriaes mineiros, é o argumento com que primeiro reclamam os auxilios do estado, aquelle pelo qual promovem mais prompta explicação para justificarem a atrazo ou a ruina da industria.

Então, como se explica o interesse estrangeiro? O interesse estrangeiro não era, de modo algum, consequente e permanente, pois o seu capital só ocorria quando a remuneração era certa e elevada,95 para além de que, como dissemos já, "não raro sucede que

as minas portuguesas são apenas minas de reserva, paralisadas sob vários pretextos até ao dia em que se esgotarem os jazigos que em outras regiões tais empresas possuem .

Tendo em consideração o que temos vindo a afirmar, compreendemos assim por que é que os maiores "picos" na produção mineira correspondem aos períodos das duas guerras mundiais, tornando-se alguns minérios muitos mais representativos do que outros, como se constatou com o forte sobreempolamento dos minérios metálicos, nomeadamente

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o volfrâmio e o estanho, que viram a sua cotação atingir níveis elevadíssimos. Claro está que a indústria mineira, tal como as outras, também produz mercadorias que se destinam a

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INQUÉRITO INDUSTRIAL DE 1890. p. 126.

95 JÚNIOR, M. R. - Op. cit. p. 205.

Idem. Ibidem.

CARNEIRO, F. Soares - Potencialidades minerais da metrópole - Base firme desenvolvimento industrial dopais. Lisboa: Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos. n°2. 1971, p. 19-22.

um mercado e, por consequência, tem necessariamente um valor. Ora, é aqui que queremos clarificar uma diferença substancial entre estas e as outras. Em comum, os preços estabelecidos em função do mercado. Porém, há uma diferença na sua natureza, pois o valor dos minérios, vulgarmente designado por cotações, é sempre baixo, digamos sempre subavaliado e subvalorizado, com excepção para os períodos de guerra. E porquê? Antes de mais, não são bens que se consumam de imediato e, por outro lado, os minérios dos países que não têm metalurgias, "têm a sua sorte talhada, lá nas alturas, pelos poderosos e impiedosos

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dominadores desta civilização industrial".

Neste nosso estudo foram sempre excluídas as pedreiras (granitos, lousas, mármores, saibro e areia) que só a partir de 1966 entram nos totais das estatísticas.(C?p. cit. p. 20)

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