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AS GRANDES QUESTÕES MINEIRAS 9

No documento O carvão numa economia nacional (páginas 96-101)

1.5 O DECRETO DE 31 DE DEZEMBRO DE

AS GRANDES QUESTÕES MINEIRAS 9

Sempre que os concorrentes se apresentassem a concurso, o Estado era a entidade que determinava sobre quem deveria recair a concessão, tal como acontecia na lei

267 anterior.

Enquanto os direitos dos inventores ou descobridores se mantinham sem modificações, os direitos dos proprietários sofreram uma alteração em 52. Embora continuassem a ser reconhecidos, o Decreto de 31 de Dezembro de 52 distanciava-se da lei de 50 porque o proprietário da superfície passava a ter direito não a "uma quantia annual, a qual será arbitrada pelo Governo",™ mas a receber uma "quantia proportional ao producto liquido, que nunca excederá dois e meio por cento"?® A razão encontrada para alteração encontra-se no próprio "Relatório" ao considerar "que não é justo que a importância que o proprietário da superficie recebe seja mais de metade do imposto pago ao Estado, que é o reconhecido proprietário das minas".

A lei francesa foi a grande inspiradora de toda a nossa legislação mineira. O grande princípio básico era de que ninguém se podia arrogar no direito de propriedade sobre uma mina sem que tivesse havido uma concessão. O acto de concessão, decorrente da influência do art.7.° do decreto francês de 1810, conferia em Portugal, quer pela lei de 50, quer pelo decreto de 52, a propriedade perpétua da mina:"0 "Todas as concessões serão

feitas por tempo ûlimitado...e em quanto uma empreza cumprir...poderá usar e dispor do seu direito... como o de qualquer outra propriedade". A nossa legislação partiu do princípio

267

Arts.22.° e 14.°, respectivamente.

68 Art. 25.° da Lei de 25 de Julho de 50. 269

Art. 38.° do Decreto de 31 de Dezembro.

consignado na lei francesa de que antes da decoberta as minas não pertencem a ninguém, não constituem propriedade nem representam qualquer valor comercial. Mas, a partir desse momento, também não são reconhecidas como propriedade de ninguém sem que previamente um acto de concessão as atribuísse a alguém. A Lei, reconhecendo ao Estado a sua propriedade em nome do interesse público, providenciava, em concurso, sempre que o houvesse, sobre quem devia recair a concessão, garantindo-se os direitos dos proprietários da superfície, dos descobridores, do Estado e dos concessionários, sem esquecer, naturalmente, as obrigações destes. Tal como na legislação francesa, a finalidade era "conciliar os interesses geraes, representados pelo estado, com o interesse individual, o que se conseguiu pelas garantias dadas aos proprietários do solo, aos inventores e a todos os que de alguma

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forma concorrem para o desenvolvimento da industria mineira1'.

O Decreto de 52 cerceou o direito de propriedade da mina relativamente à faculdade da sua transmissão,2" pois só se podia fazê-lo com a permissão do governo, o que

não acontecia pela lei de 50 que era omissa sobre essa questão.

Os concorrentes às concessões foram beneficiados com este decreto, uma vez que ficaram dispensados de apresentarem o nome do engenheiro, pois era "injusto exigir que cada um dos concorrentes tenha ajustado um Engenheiro antes de saber se a mina lhe ha-de ser concedida".

Decreto com força de Lei... Op. cit. (Jun. 1859). p. 411.

Art.32.°, § único: "A propriedade de tona mina não pôde transmitir-se sem approvação do governo", Decreto de 31 de Dez. de 1852.

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As minas de carvão de S. Pedro da Cova e de Buarcos que pela lei de 50 foram isentas de impostos"5 e sujeitas "à maior renda que se obtiver por meio de arrematação em hasta

publica, e por prazos nunca maiores de vinte anos",7 não eram objecto de qualquer observação

277 nesta legislação, mas por um decreto, também com data de 31 de Dezembro de 1852, passaram a ser reguladas pelo decreto de minas de 31 de Dezembro.

Em matéria de impostos,"8 o Estado, apesar destes constituírem a única fonte de

rendimentos sobre a propriedade mineira, com destaque para o proporcional, concedia a isenção do seu pagamento durante dois anos a partir da data da concessão, o que se compreende, tendo em conta a política de desenvolvimento mineiro que se pretendia levar a cabo.

Quisemos apenas demonstrar quanto importante se tornava para o governo fontista a criação de legislação que fosse capaz de atrair, pelas vantagens oferecidas, o maior número de concorrentes à vida mineira, quer pela pesquisa, quer pelas garantias dadas no acto de concessão. Por outro lado, não são significativas as modificações introduzidas na lei de 52, pois os princípios básicos mantêm-se.

' Sobre estas minas de carvão, as únicas em 52, veja-se o cap.2, "Do alvará de 4 de Julho de 1825 à criação da primeira companhia mineira de carvão", p. 167.

' Cfr. Discussão na Câmara dos Deputados sobre a aprovação § único do art. 27.° da Lei de 50, nomeadamente se eram ou não essas minas consideradas do Estado ou constituíam propriedade particular, e porque mereciam um tratamento diferente das outras. Sessão de 20 de Maio. Op.cit., p. 220.

6

Art. 27.°, §umco.

7 PORTUGAL. Leis, Decretos, etc. Collecção official da legislação portugueza...por José Maximo de

Castro Neto Leite e Vasconcellos: Anno de 1852. Lisboa: Imprensa Nacional, 1853. p. 918.

8 Numa e noutra lei o imposto fixo anual era estabelecido em função da superficie do terreno demarcado,

calculado na base de oitenta mil réis por cada dez mil braças quadradas. O imposto proporcional não poderia exceder 5% do produto líquido da mina, podendo o Governo, em ambas, convertê-las numa renda única anual.

A terminar, destacamos que o número de concessões verificado a partir de 52 não pode ser justificado apenas como obra da legislação, mas da própria corrente fontista que

serve de "marco" à divisão do século. As obras públicas e sobretudo os caminhos de ferro possibilitaram o aumento do seu número e a formação de muitas empresas mineiras que, de contrário, não seriam exequíveis pelas dificuldades e custos de transporte. Evidentemente que a conjuntura internacional, nomeadamente os mercados britânicos, constituiu um bom incentivo à pesquisa e exploração mineiras, tomando-se estes o alvo das nossas exportações."9 A este propósito, permitimo-nos exemplificar, com o quadro n °

2, a evolução da produção de minérios e o seu valor no período compreendido entre 1850 - 1882:

Quadro n ° 2 : Produtividade mineira - 1850-1882

Quinquénios Produção total

(quintais métricos)

Valor - Réis Produção média

anual (quint.met.) Valor - réis 1851 -1855 370. 970 279. 838$100 74 194 55. 967$620 1856 - 1860 963. 005 873. 411$100 192. 601 174. 682$280 1861 - 1865 5. 589. 940 3. 984.692$500 1.117.988 796 938$500 1866 - 1870 7. 869. 037 5. 629.615$415 1. 573.807 1.125.923$083 1871 - 1875 10. 843. 480 5. 755.438$810 2. 168. 696 1.151. 091$762 1876 - 1880 10. 312. 209 5. 429.889$102 2. 062. 412 1. 085.977$820 1881 2.119.450 1.392.093$000 31.180$692 1882 1.969.159 1.762.867$530 41.469$552

Fonte: Estatística Mineira de 1882

Quisemos apenas mostrar a evolução da produção mineira e concluir que há, de facto.uma evolução significativa na produtividade mineira correspondendo ao incremento do número de concessões verificado desde 52. Para além de factores externos, o contexto legislativo foi determinante.

279 GUIMARÃES, Paulo - Indústrias, Mineiros e Sindicatos. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais, 1989,

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Em todos os quinquénios se evidencia o aumento da produtividade, exceptuando o último em que a produção e o seu valor nos mostram uma diminuição, o que se explica "pela suspensão dos trabalhos nas minas de ferro ...como pela diminuição dos trabalhos da mina de S. Domingos e de quasi todas as que se lavram no norte do paiz, em consequência da funesta influencia que a crise económica produziu no mercado dos metaes até meado de 1879, sendo poucos os minérios que até então ali encontravam preços remuneradores". A partir de 1882, embora a produção tenha sido inferior à do ano de 81, o seu valor foi, contudo, "muito superior", o que se justifica pela evolução dos preços no mercado.

Em matéria de impostos, a situação traduz a evolução da produção referida. Reflectem a influência dos mesmos factores, sobressaindo um "salto" a partir de 1860, devido à influência do regulamento de 17 de Junho de 1858 sobre o processamento na

determinação dos impostos de minas, consoante o determinado no Art. 40.°: uOs

concessionários das minas são obrigados a pagar ao Estado um imposto fixo annual, dependente da superfície de terreno demarcado, e um imposto proporcional ao producto liquido das despezas de extracção".

O quadro n°3 é o resultado da entrada em vigor da lei do imposto, mostrando-se em total correspondência com o quadro anterior, acusando, de igual modo, uma baixa a partir de 1880.

Quadro n°3: Impostos mineiros - Proporcional e fixo -

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