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O Decreto de 30 de Setembro de 1892 não se pode considerar, propriamente, uma inovação revolucionária Mantêm-se os aspectos essenciais da legislação anterior, no que

No documento O carvão numa economia nacional (páginas 101-113)

toca às questões da propriedade, pesquisa, concessão e indemnização.

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O Decreto teve em vista a compilação da legislação que desde 53 veio a ser publicada. Continuava-se a ter direito à exploração de uma mina desde que um acto de concessão investisse alguém como seu proprietário, obrigando-se este a pagar ao proprietário do solo uma renda pela superfície do terreno ocupado e "uma quantia proporcional ao valor do minério extrhaido e que será igual á terça parte do imposto proporcional que for liquidado para a fazenda publica". Também os direitos dos descobridores se mantinham, sendo-lhes dada a preferência à concessão se a requeressem nos seis meses imediatos, bem como, caso fizessem declaração de desistência, lhes era atribuído um prémio pela descoberta. O processo de concessão era um pouco abreviado, pois tendo em conta que pela lei anterior a existência de uma concessão provisória entre o reconhecimento do direito de descoberta e a concessão definitiva retardava os trabalhos, resolveu a legislador proceder à sua abolição. O processo de concessão era assim simplificado ao reduzir-se a três etapas: o manifesto, o direito de descoberta e a concessão.

Uma particularidade em relação às pesquisas não pode deixar de ser salientada,

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uma vez que se poderiam fazer em qualquer terreno que "nunca tenham tido cultura", exigindo para os terrenos cultivados "licença escripta do proprietário".

O próprio Estado continuava a exigir os seus direitos em conformidade com a lei anterior. Esta lei, mantendo os princípios anteriores, tornou-se diferente apenas porque os tornou mais claros e de aplicação mais objectiva pela amplitude que entretanto tomou. Ao longo de todo o regulamento deste Decreto está patente uma maior preocupação do Estado

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Art 56.°. Pela lei anterior, o imposto fixo era de "oitenta mil réis por dez mH braças quadradas''' e o imposto proporcional não poderia "exceder a cinco por cento doproducto liquido".

283 ,

JUNIOR, Manuel Rodrigues - Op. cit.. p. 118.

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Art. 16.°.

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pelo acompanhamento desta indústria, quer colaborando, quer fiscalizando os trabalhos de investigação e exploração. Continuavam a ser garantidos os direitos de descoberta pela preferência dada ao descobridor na concessão, desde que tivesse sido registado na Câmara Municipal a "nota de descobrimento". "O direito de preferência a uma concessão mineira era assegurado pela prioridade do registo devidamente feito". Efectuado o registo, dispunha o manifestante, descobridor, de doze meses para efectuar os trabalhos necessários e provar a existência do udepósito mineral" e requerer os direitos de descobridor legal, sendo-lhe concedido um prazo de seis meses para requerer a concessão. Na impossibilidade de o fazer e se o declarasse expressamente, o governo uarbitrava-lhe um prémio pela descoberta". Tornava-se morosa uma análise exaustiva para mostrar a evolução desta em relação à lei anterior. Diremos que não há divergência mas somente uma maior preocupação pelo desenvolvimento mineiro, pormenorizando-se com mais rigor as circunstâncias da pesquisa, da exploração, dos direitos e deveres dos concessionários, bem como dos proprietários dos terrenos.

Não podemos terminar sem apresentar, aqui, uma contradição resultante do

Código Civil287 que, tal como no decreto de 32 e mesmo no de 36, embora neste sempre

muito pouco claro e sujeito a toda uma polémica inconclusiva aquando da discussão do projecto de lei n ° 36 que produziu a lei de 25 de Julho de 50, deixava transparecer o princípio da acessão, como se depreende do art.465°: "Todos tem o direito de pesquisar e lavrar minas, independentemente de autorização do Governo, nos prédios rústicos que possuírem". A contradição existe pelo facto de até 1892 não se respeitar esta determinação, escudando-se os legisladores no artigo 467° do mesmo Código que reservava para

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legislação especial "A designação das substâncias, que devem ser consideradas como minerais...a designação das formalidades prévias e das condições para o seu exercício ...a especificação dos direitos dos possuidores do solo e dos descobridores de minas, no caso de concessão..". Como o Código nunca foi regulamentado nesta matéria, o Decreto de 31 de Dezembro de 52 e o seu regulamento de 9 de Dezembro de 53 constituíram a lei orgânica em tudo o que respeitasse a minas. O decreto de 92 regulou o aproveitamento das substâncias minerais,

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agrupando as que podiam ser exploradas só por um acto de concessão do governo, as que não careciam de nenhuma licença governamental e as outras que, mesmo sem licença, estariam sempre sob a sua fiscalização.

1 . 6 . 1 - A LEI D E 1917

A Lei de 1917 partiu, tal como sempre foi tradição em Portugal, do velho princípio de que as minas eram do Estado. E fê-lo de uma maneira objectiva: "O direito de propriedade das minas pertence ao Estado, mas este pode alienar o direito ao aproveitamento dos depósitos ou

jazigos...".2119 Sendo assim, a sua exploração só podia, também, ser efectuada por um acto

de concessão do governo. O interesse público continuava a ser defendido pois, mesmo que o proprietário do terreno não permitisse a exploração mineira, a licença respectiva seria concedida pelo governo. A Lei continuava a precisar as matérias que dispensavam a

Art.2.° "Entre os depósitos de substâncias minerais úteis há uns que pela sua natureza epela importância dos trabalhos necessários só poderão lavrados mediante concessão do governo. § único. Neste caso estão os depósitos de substancias metalliferas, de graphite, de combustíveis

concessão para serem lavradas, considerando ou a sua facilidade de exploração ou a sua abundância.

Contrariamente à lei anterior, a pesquisa carecia sempre de autorização e podia ser efectuada sem o consentimento do proprietário, em terrenos sem cultura, o que é, na verdade, uma alteração. A lei anterior referia que tal procedimento só seria permitido em terrenos que nunca tivessem tido cultura.

A lei, à semelhança das anteriores, reconhece os descobridores como motores do desenvolvimento mineiro e é por isso que não os esquece, assegurando-lhes o direito de preferência à concessão290 ou, quando não, o direito a um prémio que nunca seria inferior a

400$00 e pago pelo concessionário. A vontade e o interesse por esta indústria, a par das questões técnicas e sociais, passava pela necessidade se de criarem condições para que os particulares se interessassem por ela.

As áreas cativas mereceram, pela primeira vez, a atenção da lei que, compilando leis anteriores,29' reservava todas as áreas em que se presumisse haver substâncias minerais

ou que tivessem sido já reconhecidas. A razão prende-se, naturalmente, com a necessidade de associar os direitos de descoberta à investigação mineira. Ainda relacionado com a investigação mineira, que não os trabalhos de prospecção empírica, a lei, sempre no sentido de estimular e reconhecer quem por métodos científicos, nomeadamente pelo estudo da antiguidade dos terrenos, descobrisse ou presumisse da existência de um jazigo,

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atribuía a essa pesquisa um valor classificado como de propriedade intelectual, pelo que o

Artigos 18°e39°.

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seu autor teria direito a obter do governo licença para o pesquisar durante dois anos e, 293

quando o comprovasse, podia requerer a respectiva concessão mineira.

A lei, tal como as anteriores, apenas se preocupou com a exploração privada das minas, não obstante tê-las considerado do Estado. Sendo todavia do domínio dominial, ao governo ficava vedada a exploração da indústria mineira. A exploração era confiada aos particulares, nacionais ou estrangeiros, que só poderiam, à semelhança das legislações anteriores, iniciar os trabalhos depois de uma concessão os instituir como donos de uma mina. Tal como na legislação anterior, previa dois sistemas na designação do concessionário - o da liberdade mineira e o dos concursos. A liberdade mineira funciona quando o descobridor, reunindo as condições necessárias para a sua exploração, faz com que seja o preferido e se institua como proprietário da mina, aparecendo o concurso na impossibilidade do descobridor não cumprir ou não querer, pelo que o governo abre

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concurso, incluindo para as concessões abandonadas.

Concluímos, reconhecendo que as leis são o cerne de qualquer política mineira. Esta pretendia-o ser ainda mais A actividade privada era uma questão de interesse colectivo. Por esta razão a lavra era obrigatória sob pena de se perder a concessão. O concessionário era obrigado a respeitar as populações, os proprietários, a proteger os operários e impedido de fazer uma lavra ambiciosa, pelo que deveria ter sempre à sua frente um director com a anuência do próprio governo. Este, através dos seus organismos próprios, inspeccionava e registava todos os defeitos ou progressos nas concessões, propondo as soluções possíveis. Para permitir a utilização dos recursos mineiros, a lei

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Art. 7°. 294 ,

continuou a defender as expropriações por utilidade pública quando os concessionários não chegavam a acordo com os proprietários, sendo estes previamente indemnizados.

A concessão, embora perpétua sempre que se respeitasse as cláusulas estabelecidas na concessão, não podia ser transmitida sem autorização do governo, como de resto se verificava na lei anterior. A perpetuidade tinha sido, desde 50, o meio indispensável para se assegurar a lavra uma vez que se tratava de uma actividade muito dispendiosa e que requeria, logo desde o início, avultados capitais. Se não se dessem garantias ao concessionário para recuperar os investimentos feitos, com certeza não haveria investimentos de monta.

Mesmo para terminar, queríamos apenas frisar que os concessionários podiam perder o direito às concessões se não cumprissem com os deveres e encargos estabelecidos no acto de concessão. Isto é, a criação da propriedade mineira não constituía um propriedade igual às outras, mas uma propriedade especial, porque revestida de um carácter dominial, a quem o Estado devia não só incentivar mas também proteger de situações de abandono. A propriedade da mina, instituída por uma concessão feita por tempo ilimitado e, por conseguinte, perpétua, poderia extinguir-se sempre que se verificasse incumprimento das clausulas inerentes à concessão.

As minas, propriedades imobiliárias, são bens dominiais que ao Estado continuam pertencendo depois da concessão. Por esta o Estado apenas transfere, por tempo ilimitado embora, a faculdade de as

295 explorar segundo regras fixadas pela lei...

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Apresentamos uma amostra de como a propriedade mineira foi evoluindo e, mesmo que lentamente, decorreu sem grandes oscilações. Assistiu-se ao aumento do número das concessões, da produtividade e do números de trabalhadores nela empregada. Deste modo, atentemos no quadro n°4:

Quadro n ° 4 - concessões existentes

Anos N ° de Concessões 1852 35 1867 78 1883 348 1890 509 1900 461 1910 506 1911 528 1913 599 1914 611 1915 644 1918 737

Fonte: JÚNIOR, Manuel Rodrigues - Op. cit.. p. 27.

Todavia, não podemos inferir de uma lavra absoluta. Muitas concessões não iniciavam a lavra e muitas outras eram abandonadas. O progresso, mesmo que vagaroso, é evidente no quadro n°5.

Idem. Ibidem, p. 27.

Quadro n° 5 - Evolução da produção e valor dos minérios ( 1871-1915)

Anos Toneladas Valor no mercado

1871 180.054 1.241.000$ 1881 211.945 1.392.093$ 1890 166.357 1.159.689$ 1900 455.880 1.536.094$ 1904 414.515 1.874.820$ 1907 384.011 2.165.741$ 1908 844.500 1.355.816$ 1909 304.379 1.925.759$ 1910 331.021 2.048.883$ 1911 325.447 2.229.396$ 1912 401.942 2.762.580$ 1913 473.709 3.388.169$ 1914 337.516 2.490.000$ 1915 247.969 3.6377.944$ Fonte: JUNIOR, Manuel Rodrigues - Op. cit. p. 44

Que poderemos concluir? Que há, marcadamente, uma evolução no sector mineiro, embora nem sempre regular. As razões prendem-se com a influência da corrida às minas por toda a Europa, fruto da industrialização, com o desenvolvimento das vias de comunicação, com a abundância de capitais disponíveis nos mercados europeus e, naturalmente, não podemos esquecer a legislação que cada vez mais estimulava e envolvia os particulares na mineração, já que o Estado, afastando-se desta actividade, quer das pesquisas quer das minas, não se demitia das funções de fiscalização, investigação e protecção.

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1.7 - N A D É C A D A D E T R I N T A

Aproximamonos lentamente da segunda metade do século XX. Apenas um ligeiro olhar pela propriedade, pesquisa, concessão e preocupações que a indústria mineira continuava a merecer.

O Decreto n° 18713 de 1 de Agosto de 1930 revogou a Lei de 1917 mas manteve inalteráveis os princípios da propriedade, da concessão e dos direitos da indemnização.

As minas continuavam a ser do Estado e só podiam ser trabalhadas mediante a sua concessão a qualquer indivíduo que, para a obter, teria de manifestar previamente a sua descoberta na Câmara Municipal, assegurando deste modo, tal como nas legislações anteriores, o direito de preferência. Porém, se não tivesse capacidade para o fazer, era a concessão posta a concurso, sendo o concessionário obrigado a pagar-lhe um prémio.

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Continuava a prevalecer o princípio da liberdade mineira, embora o Estado, que continuava a abster-se da lavra directa, mantivesse, através da legislação, uma atitude de tutela sempre no interesse de conciliar os interesses privados com os colectivos, não perdendo de vista a sua função de garantir e encorajar a exploração mineira.

As pesquisas, que pela legislação anterior requeriam licença para se efectuarem, deixaram de se submeter a esta autorização, o que tornava mais rápidos os trabalhos

299 /• necessários para se comprovar os depósitos designados no registo de descoberta feito e,

O princípio da liberdade mineira consiste em atribuir a exploração mineira à actividade privada, normalmente aos descobridores, constituindo a descoberta o meio legal da preferência.

8 Art. 18.°

9

O registo de descoberta ou manifesto mineiro constituía o meio pelo qual o descobridor adquiria o direito de descoberta e consequentemente a prioridade à concessão ou o direito a um prémio. (Vide Art. 26, §2.°)

deste modo, poder-se iniciar, sem delongas, o pedido de concessão e consequentemente da lavra num mais curto espaço de tempo. As concessões eram dadas por tempo ilimitado, tal como nas leis anteriores, sendo discriminados com o maior pormenor os direitos e deveres dos proprietários e concessionários, não descurando a lei os deveres destes para com o Estado, nomeadamente na questão dos impostos. Para além dos pormenores que tornaram a lei mais abrangente, cumpre-nos salientar que esta legislação, revogando toda a legislação em contrário, exceptuava a que se referia a carvões nacionais.

Mas, reconhecida a importância do sector mineiro no desenvolvimento económico nacional e porque se verificava que a reforma mineira introduzida pelo decreto de 30 não o revolucionava, surgiu o Decreto n.° 29.725 de 28 de Junho de 39, com o objectivo claro de "'obter um maior desenvolvimento da indústria mineira em Portugal", sendo "por isso necessário um novo estudo e reconhecimento das possibilidades do País, sobretudo em relação aos minérios

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fundamentais, alargando-se assim a política que já vem sendo seguida quanto a carvões". Reconhecia-se que havia algum progresso mas temia-se a regressão atribuindo-se essa possibilidade "aos males'' que caracterizavam a indústria mineira:

...insuficiente reconhecimento das possibilidades mineiras do País, de onde resulta a falta de orientação por parte dos exploradores, a irregularidade da lavra, as intermitências na exploração, a insuficiência dos aproveitamentos, as constantes transmissões de concessão.

Mais grave era a própria legislação ao permitir que se fizessem os registos de descoberta, de maneira fácil e sem estudos consistentes, o que provocava explorações

Relatório do Decreto n.° 29.725 de 28 de Junho de 1939.

Ibidem. Ibidem

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debilitadas e mantidas artificialmente à espera do momento mais oportuno para se vender. A especulação era um negócio inerente às minas. O quadro n ° 6 é esclarecedor do que se acaba de dizer.

Quadro n.°6 - Das concessões à lavra activa

Anos Número total

de concessões Total de coutos mineiros Núm. de cone. em lavra activa Núm. de coutos min. em lavra Núm.de cone. abandonadas min. abandonados Núm.de coutos

1928 1.211 20 47 13 22 - 1929 1.246 21 65 15 22 - 1930 1.288 24 68 14 3 - 1331 1.296 24 50 11 51 - 1932 1.200 26 48 10 78 - 1933 1. 139 25 49 11 74 - 1934 1. 101 26 70 14 37 - 1935 1.004 25 95 14 79 - 1936 1.010 26 121 18 85 - 1937 1.041 27 202 21 31 -

FONTE : Preâmbulo do Decreto -Lei n° 29 725 de 28 de Junho de 1939

Evidenciamos assim a desproporcionalidade existente entre as concessões efectuadas e as que entravam em exploração, o que justifica a necessidade de se rever a legislação.

Para além da razão apontada, muitas concessões não permitiam a viabilização das suas empresas pelo facto de serem demasiado pequenas e não conseguirem os meios materiais e técnicos para uma exploração eficaz. A preocupação com a diminuição dos encargos do transporte pela isenção do imposto ferroviário e o reconhecimento de que a falta de capitais se poderia resolver através do crédito, levou os legisladores a estenderem a hipoteca às minas no sentido de se dar garantias ao credor pelo capital emprestado, podendo registar a mina em seu nome. Para concluir, o legislador assacou ao Estado a responsabilidade principal no estudo e prospecção mineira, colmatando as lacunas que a actividade privada, por falta de capitais, não conseguia, por si só, realizar com eficiência.

No documento O carvão numa economia nacional (páginas 101-113)