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Algumas pesquisas realizadas com o Procedimento de Desenhos-Estórias

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 59-65)

Com o objetivo de sistematização do Procedimento de Desenhos-Estórias, Trinca (1976) estudou crianças entre cinco e quinze anos de ambos os sexos, que passaram por clínicas particulares, públicas e universitárias da cidade de São Paulo, com queixas relativas a problemas de personalidade. Para conseguir uma validação simultânea, ele realizou uma comparação entre a produção dos sujeitos no D-E e a produção dos mesmos sujeitos no CAT- A ou TAT. Esse trabalho demonstrou que o Procedimento de Desenhos-Estórias, além de permitir um maior conhecimento da personalidade do sujeito em questão, é válido também para obtenção de informação sobre os dinamismos da personalidade desajustada de crianças e adolescentes. O procedimento de Desenhos-Estórias, portanto, fornece informações sobre os pontos de conflitos básicos, mostrando-se útil e seguro para a exploração da dinâmica da personalidade. Dessa forma, essa sistematização do Procedimento de Desenhos-Estórias abriu porta para novas investigações, algumas das quais serão discutidas a seguir.

Foram vários os trabalhos que propiciaram a ampliação e expansão do Procedimento de Desenhos-Estórias. Entretanto, para os fins desta pesquisa irei privilegiar os trabalhos envolvendo crianças sem, contudo, deixar de citar algumas pesquisas com adultos e adolescentes.

Dentre os trabalhos realizado com adultos, Al’Osta (1984) estendeu o uso do Procedimento de Desenhos-Estórias a psicóticos maníaco-depressivos e constatou que essa técnica projetiva permite discriminar sujeitos normais daqueles que possuem diagnóstico psiquiátrico de psicose maníaco-depressiva. Fernandes (1988) estudou o psicodinamismo de mulheres primigestas. Barbosa (1989) utilizou o D-E e outras técnicas psicológicas para estudar os aspectos psíquicos das consequências da mastectomia por câncer de mama. Mazzaro (1984) estudou por meio do D-E a personalidade de adolescentes homicidas. Castro (1990) utilizou o D-E para realizar um estudo sobre a infertilidade feminina sem causa aparente. Amarilan (1992) empregou o Procedimento de Desenhos-Estórias para estudar aspectos psicodinâmicos de pessoas cegas. Esses são apenas alguns trabalhos dentre tantos realizados com o Procedimento de Desesenhos-Estórias tendo como sujeitos tanto adultos como adolescentes.

Gimenez (1983) utilizou-se do D-E para sistematizar o tipo de ansiedade predominante em quadros clínicos de fobia escolar. Foram estudadas crianças de seis a onze anos que, com queixa específica de não conseguirem permanecer na escola acometidas por um intenso temor, procuraram consultórios particulares ou universitários. O Procedimento mostrou-se de grande utilidade para classificação e apreensão da fobia escolar. A autora verificou, segundo a ansiedade dominante, a existência de quatro classes de fobia escolar: a fobia escolar por ansiedades edipianas, a fobia escolar por ansiedades depressivas e paranóides, e a fobia escolar por ansiedades primárias.

Flores (1984) buscou uma maior compreensão dos conteúdos emocionais presentes em trinta crianças terminais de três a dez anos de idade, utilizando o Procedimento de Desenhos-Estórias. Sua pesquisa concluiu que o emprego do D-E permitiu um amplo acesso ao estado emocional dessas crianças diante da situação de morte.

Migliavacca (1987) realizou uma pesquisa a fim de compreender as semelhanças existentes entre o conteúdo proveniente dos desenhos-estórias e dos conteúdos dos sonhos. Ela partiu da suposição de que o conteúdo do Procedimento de Desenhos-Estórias podia ser analisado de acordo com a interpretação freudiana dos sonhos. Para realizar esse estudo, foram analisados os desenhos-estórias de vinte sujeitos, de ambos os sexos que tivessem entre seis e treze anos de idade. A pesquisa demonstrou que os conteúdos revelados nos desenhos- estórias seja quanto ao significado, seja quanto aos mecanismos inconscientes de formação, são semelhantes ao material que se revela por meio dos sonhos.

Mestriner (1989) estudou os psicodinamismos de crianças asmáticas com o objetivo de diferenciá-los das crianças normais. Foram analisados dois grupos de meninos, de

5 (cinco) a 10 (dez) anos, sendo que um grupo era formado por crianças portadoras de asma e o outro por crianças não-portadoras. Constatou-se que as crianças asmáticas possuem o mundo interno carregado de violência, impulsos agressivos e destrutivos, sendo esses sentimentos dirigidos contra o próprio ego da criança e também contra o mundo externo, como de oposição, briga, oralidade e, mais raramente, roubo e malandragem. Como mecanismo de defesa, destacaram-se a projeção e o deslocamento, aparecendo também a idealização, a divisão e, às vezes, a formação reativa. As crianças demonstraram uma intensa ansiedade da separação em relação à mãe, e os desenhos e estórias indicaram alguns traços de imaturidade.

Ana Maria Trinca (1987), em sua pesquisa de mestrado, buscou conhecer alguns mecanismos psíquicos presentes em crianças que aguardavam cirurgia de porte médio. Para isso, foram estudadas 15 (quinze) crianças de ambos os sexos. Ela utilizou o Procedimento de Desenhos-Estórias e entrevista semi-dirigida com o acompanhante, além de observações clínicas do sujeito. Foi constatado que a cirurgia aparece como fator de reativação de mecanismos pregressos básicos; angústias evocadas aparecem, principalmente, pela situação cirúrgica; são utilizados vários mecanismos de defesa; há o predomínio de forças de vida; a cirurgia é vivenciada como punição e como realização de desejos de cura. Ocorrem fantasias da criança relacionadas à sua doença física e, também, ao Procedimento D-E.

Em sua pesquisa de doutorado, Ana MariaTrinca (2002) buscou estudar como o Procedimento de Desenhos-Estórias se porta como instrumento não apenas de investigação da personalidade, mas também como instrumento de intermediação terapêutica na situação específica de atendimento psicológico de crianças no período pré-cirúrgico. Foram investigadas quinze crianças, sendo nove meninos e seis meninas de cirurgia marcada com antecedência de até um mês. A autora observou que o D-E utilizado de modo terapêutico permitiu a livre expressão do estado emocional das crianças. Além disso, as crianças puderam elaborar seus conflitos e diminuir suas angústias no final do processo. Foi constatada também uma possibilidade de reforçar as defesas do ego que se encontravam fragilizadas pela situação pré-cirúrgica. O Procedimento D-E combinado a entrevistas e observações clínicas se apresenta como um instrumento clinicamente válido, no atendimento de crianças na pré- cirurgia, para a intermediação terapêutica breve.

Tardivo (1992) procurou estabelecer normas para a população paulistana relativas aos testes projetivos CAT-A e Fábulas de Duss, comparando os resultados obtidos com o Procedimento de Desenhos-Estórias, com base nas semelhanças e diferenças existentes. Foram analisados 103 crianças com idade entre cinco e oito anos. Os resultados do estudo de

Tardivo mostraram que o traço de insegurança foi o mais constante, aumentou com a idade e foi maior nas meninas. Foram observados mais conflitos em relação à figura materna do que em relação às figuras paternas e fraternas. Houve o predomínio de sentimentos construtivos e ambivalentes sobre os destrutivos. Apareceram tendências mais regredidas de desejo de atenção, cuidados e compreensão demonstrando uma certa dependência. As tendências construtivas apareceram como meio de superar tal regressão e, juntamente com as tendências regredidas, prevaleceram sobre as hostis. As meninas mostraram mais tendências destrutivas quando comparadas aos meninos (exceto aos oito anos) e experimentaram mais tendências paranóides do que depressivas. Os Mecanismos de Defesa também foram observados. Até os sete anos as diferenças entre os sexos aumentaram com a idade, sendo que o desempenho entre o sexos se aproximou aos oito anos.

Essa pesquisa preencheu uma grande lacuna no que diz respeito a como reagem as crianças “normais” quando submetidas a técnicas projetivas, além de contribuir para um maior aprofundamento das técnicas projetivas utilizadas no diagnóstico psicológico.

Em sua tese de livre docência, Tardivo (2004) utilizou o Procedimento de Desenhos-Estórias com tema, na busca de entender o grande número de suicídios, tentativas de suicídio e homicídios, que estavam acontecendo entre jovens indígenas aculturados na cidade de São Gabriel da Cachoeira, do estado Amazonas.

A professora Leila Tardivo orienta e coordena, além de possuir várias artigos e trabalhos publicados sobre o tema (TARDIVO, 1987, 1989, 1999, 2000, 2001, 2002 2003), diversas pesquisas relacionadas com o Procedimento de Desenhos-Estórias. Esta pesquisa vem se inserir nesse conjunto de trabalhos desenvolvidos por Tardivo. Dentre as pesquisas orientadadas pela referida professora, destaca-se nesta pesquisa aquelas que utilizaram o Procedimento de Desenhos-Estórias com crianças, tendo em vista sua pertinência com relação ao presente estudo.

Kill (2002) utilizou o D-E com o objetivo de estudar as características do funcionamento emocional de crianças pertencentes a famílias de baixa renda. Buscou também ampliar a utilização do D-E para o atendimento a essa população além de desenvolver uma relação entre a teoria de Winnicott e o instrumento utilizado. Ela aplicou o Pocedimento de Desenhos-Estórias em dez crianças com faixa etária entre sete e nove anos. Kill concluiu que as crianças utilizam mecanismos primitivos para lidar com a realidade. A análise das unidades de produção revelou a presença elevada de atitudes de insegurança, traços de hostilidade, sentimentos ambivalentes em relação às figuras parentais. A pesquisadora observou que a maior parte dos sujeitos expressa hostilidade ou omissão e falta de continência por parte dos

pais, prevalecendo sentimentos derivados do conflito e grande necessidade de suprir faltas básicas de proteção, de ser cuidado e grande incidência de necessidades orais. As conclusões do trabalho mostram que, por meio do Procedimentos de Desenhos-Estórias, as crianças são capazes de expressar seus conflitos básicos e dificuldades encontradas nos diferentes contextos em que vivem.

Com o objetivo de estudar e retratar vivências emocionais de crianças recém- abrigadas encaminhadas pelo Conselho Tutelar da criança e pela Justiça, Leôncio (2002) realizou entrevista semi-estruturada e aplicou individualmente o Procedimento de Desenhos- Estórias em 13 sujeitos abrigados entre 5 e 12 anos de idade, de ambos os sexos e de nível sócio-econômico baixo. A partir da análise dos dados, Leôncio observou que a privação de um bom ambiente está intimamente relacionada à situação de miséria e de multicarências em que vivem as famílias das crianças. Concluiu que o abrigamento intensificou os problemas emocionais das crianças por mobilizar sofrimento intenso relacionado às frustrações de seus desejos de estarem com a sua família, além da angústia por estarem em um lugar estranho. A separação da criança de tudo que lhe é familiar, segundo o pesqusador, intensificou os sentimentos de desproteção, de desamparo, de solidão, de abandono e de rejeição. Assim como Kill (2002), Leôncio observou que o Procedimento Desenhos-Estórias é realmente um instrumento capaz de mobilizar as angústias e os conflitos existentes no mundo interno da criança.

Nesse breve percurso por algumas pesquisas realizadas desde a idealização do Procedimento de Desenhos-Estórias até os dias de hoje, podemos perceber que atualmente ele é um instrumento amplamente utilizado tanto na clínica particular como em outras áreas de atuação do psicólogo.

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3.0 CAPÍTULO TRÊS

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 59-65)