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O conceito de período de latência em Melanie Klein

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 33-35)

Em 1932 Melanie Klein publica um livro intitulado “A Psicanálise da Criança” no qual, através de uma série de artigos, lança as bases teóricas de suas geniais e importantes contribuições posteriores. Nesta obra Klein discute o período de latência em três importantes artigos: “A técnica de análise no período de latência”, “A técnica de análise na puberdade” e “A importância das situações de ansiedade arcaicas no desenvolvimento do ego”.

Esta pesquisa não tem como objetivo o aprofundamento da teoria kleiniana, mas faz-se necessário compreender como Melanie Klein utilizou o conceito freudiano do período de latência.

No primeiro artigo “A técnica da análise no período de latência”, Melanie Klein afirma que a criança na latência possui uma vida imaginativa mais precária devido à forte repressão. O ego ainda não se encontra plenamente desenvolvido como nos adultos, o que contribui para que a criança não possua insight sobre a sua doença nem desejo de ser curada.

Outra característica das crianças na fase de latência, segundo Melanie Klein (1932), é a atitude de reserva e desconfiança diante do mundo. Tanto para Klein como também para Freud, esse sentimento está ligado a uma luta interna travada pela criança contra a masturbação. Melanie Klein (1932) observou que as crianças, no período de latência, não brincavam como as crianças menores e nem associavam como os adultos.

Sobre o brincar das crianças na latência, Melanie Klein (1932) ressalta que

Durante o período de latência, em consonância com a repressão mais intensa de sua fantasia e com o seu ego mais desenvolvido, as brincadeiras da criança são mais adaptadas à realidade e menos fantasiosas do que as da criança pequena. Em suas brincadeiras com água, por exemplo, não encontramos representações tão diretas de desejos orais ou de urinar-se ou sujar-se como nas crianças menores; suas ocupações servem muito mais a tendências reativas e assumem formas racionalizadas como cozinhar, limpar, etc. Considero que a grande importância do elemento racional no brincar das crianças dessa idade não se deve apenas a uma repressão mais intensa da sua fantasia, mas também a uma ênfase obsessiva da realidade, o que é parte integrante das condições especiais de desenvolvimento do período de latência (KLEIN, 1997, p. 80).

No artigo “A técnica da análise na puberdade”, Klein verifica que a análise de adolescentes se aproxima mais da análise de crianças pequenas do que da análise de crianças que estejam na latência. Ela acredita que, na adolescência, a atividade pulsional é mais intensa e a vida de fantasia mais rica, pois é nesse momento do desenvolvimento que as fantasias infantis, principalmente as relacionadas ao complexo de Édipo, vão ser reativadas. Essas

fantasias infantis, quanto a intensa ansiedade que as acompanha, vão ser revividas na busca do adolescente pelo seu objeto de amor.

Entretanto, Klein observa que, em alguns adolescentes, uma forte repressão ocasionou uma grande limitação da personalidade restringindo seus interesses. Muitas vezes, nesses casos, o adolescente fica restringido a apenas um único interesse, o que ganha contornos não de sublimação, mas sim, de caráter obsessivo. Klein (1932) conclui:

Cheguei à conclusão de que, por um lado, quando encontramos uma limitação grave de interesses e de meios de expressão na puberdade, estamos diante de um período de latência prolongado e, de outro, quando há uma limitação extensa das atividades imaginativas (tais como inibições no brincar, etc.) na primeira infância, trata-se de um caso prematuro do começo do período de latência. Em qualquer um dos casos, quer a latência comece cedo demais quer termine tarde demais, perturbações graves se fazem notar não apenas pela mudança no tempo como também pelo grau excessivo dos fenômenos que normalmente acompanham o período de latência (KLEIN, 1997, p. 101-102).

Isto sugere que tanto a latência começando cedo demais como acabando tardiamente podem ocasionar graves perturbações no desenvolvimento infantil. Além do que já foi posto por Freud, Klein também acredita ser importante o estudo sobre esse período do desenvolvimento infantil.

No artigo “A importância das situações de ansiedade arcaica no desenvolvimento do ego”, Klein assinala que no período de latência a estabilidade da criança é alcançada pela união do ego com o superego na busca de um objetivo comum, levando-se em consideração as exigências da realidade. Nesse trabalho, Klein (1932) retoma algumas idéias desenvolvidas por Freud sobre o período de latência, principalmente a questão relativa à luta da criança contra a masturbação.

Descrevemos a estabilização que ocorre no período de latência como estando baseada em uma adaptação à realidade, efetuada pelo ego em concordância com o superego. A conquista de um objetivo como esse depende de uma ação combinada de todas as forças comprometidas em conter e restringir as pulsões do id. É aqui que entra a luta da criança para se libertar da masturbação – uma luta que, citando Freud, ‘exige uma parcela grande de suas energias’ durante o período de latência e cuja força plena é dirigida também contra as fantasias masturbatórias (KLEIN, 1997, p.204).

Além de aprofundar as idéias de Freud referentes à luta da criança contra a masturbação ao aparecimento de mecanismos obsessivos, Melanie Klein (1932) sugere que, nesse momento evolutivo, a criança precisa receber proibições de fora, ou seja, do mundo externo, uma vez que essas proibições vão sustentar as interdições internas. De acordo com Klein (1932)

[...] ela precisa, em outras palavras, ter representantes do superego no mundo externo. Essa dependência em relação aos objetos com a finalidade de ser capaz de controlar a ansiedade é muito mais forte no período de latência do que em qualquer

outra fase do desenvolvimento. De fato, parece-me ser um pré-requisito definido para uma transição bem-sucedida para o período de latência que o controle da ansiedade por parte da criança se apóie nas suas relações de objeto e adaptação à realidade (KLEIN, 1997, p. 207).

Melanie Klein destaca, nessa fase, a importância da influência do ambiente externo no desenvolvimento infantil. Ressalta a importância dos pais em conter a ansiedade das crianças, dando limites e fazendo valer o princípio de realidade em detrimento do princípio de prazer. Essa reflexão sobre a importância de um superego externo que auxilie a criança na sua luta pulsional interna é peça fundamental na tessitura das minhas reflexões acerca da organização psíquica da sexualidade na latência nos dias de hoje.

1.5 O conceito de período de latência segundo a teoria do desenvolvimento de Erik

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 33-35)