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As pesquisas de Berta Bornstein sobre o período de latência

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 39-41)

Em 1951, no Encontro Anual da Associação de Psicanálise Americana, Berta Bornstein apresentou um artigo intitulado “Sobre a latência”. Neste artigo, propõe uma divisão do período de latência em duas fases: a primeira delimitada entre os cinco anos e meio e oito anos, e a segunda, dos oito aos dez anos. A autora discute as características de cada uma destas fases, bem como apresenta questões relacionadas à teoria e, principalmente, à técnica envolvidas na análise de crianças no período de latência.

Neste primeiro período da latência, o ego tem que erigir defesas contra os impulsos genitais e contra os impulsos pré-genitais. Bornstein afirma que, contra os impulsos genitais, o ego adota uma regressão temporária em relação à pré-genitalidade. A formação reativa, tão característica desta fase, seria uma defesa contra estes impulsos pré-genitais. Outro aspecto ressaltado pela autora é a luta constante entre o superego e as pulsões, ocasionando um aumento da ambivalência.

Berta Bornstein (1951) ressalta que, nesta primeira fase da latência, ao contrário do que a maioria dos autores acredita, a neurose infantil não diminui. Isto só vai ocorrer na segunda fase da latência. Ela faz a seguinte consideração:

Quando o ego se depara com conflitos que não consegue vencer, durante o primeiro período, surgem dificuldades de comportamento e os sintomas neuróticos se manifestam de novas formas. Alguns exemplos: fobias antigas de animais podem ser substituídas por uma nova onda de ansiedade de separação e o medo explícito de castração pode ser substituído pelo medo de morte. Durante este período o sintoma da insônia ocorre mais frequentemente do que se pensa (BORNSTEIN, 2001, p. 2).

No segundo momento da latência, para Bornstein (1951), o ego não possui tantos conflitos emergentes devido ao enfraquecimento das demandas sexuais e a uma diminuição da rigidez do superego. Dessa forma, as crianças desenvolvem um maior apego à realidade externa, pois os pais de agora não parecem ser tão onipotentes e poderosos como outrora.

Nesta etapa do desenvolvimento, a criança está menos consciente do seu sofrimento, porque, diferentemente das crianças do primeiro período, as suas defesas estão mais consolidadas. Logo, a criança está mais voltada a solucionar os problemas oriundos da realidade externa, da qual recebe mais gratificações.

Sobre os dois períodos da latência Bornstein (1951) ressalta que, em ambos os períodos, as crianças têm como principal tarefa evitar as fantasias incestuosas e as tentações masturbatórias. Elas lutam, incessantemente, contra o aparecimento de impulsos instintivos, tendo como conseqüência disso uma amnésia parcial dessa etapa de suas vidas.

Ao final do artigo Berta Bornstein faz uma importante reflexão a respeito do período de latência. Segundo ela, todas as crianças na latência, não somente as neuróticas, usam suas energias livres para o desenvolvimento do caráter. E afirma que, durante a latência, torna-se particularmente importante não interferir na formação saudável do caráter.

Dois anos depois do primeiro artigo, escreve e apresenta um outro artigo intitulado “Masturbação no período de latência”. Nesse artigo discute, mais detalhadamente, as características da masturbação ao longo do período de latência e as características referentes a primeira e a segunda fases da latência.

Na primeira fase da latência, a criança trava uma luta interna contra os impulsos genitais e contra os pré-genitais. O ego permanece consciente dos impulsos que vão surgindo, ao mesmo tempo em que é ameaçado por um superego violento e rígido. O mundo interno da criança encontra-se desordenado e com uma ambivalência aumentada. Neste momento surgem dificuldades de comportamento e uma nova formação de sintomas neuróticos. Pode-se perceber que a latência inicial, como denomina Berta Bornstein (1953), é um momento de intensos conflitos, principalmente, os relacionados à masturbação.

Por outro lado, no segundo momento da latência, Bornstein afirma que pouco se sabe sobre a gratificação completa ou incompleta da masturbação, principalmente, porque elas reprimem e negam o escape ocasional da masturbação. Seu ego está mais equipado para lidar com os impulsos instintivos e se sentem repugnadas ao contar detalhes da sua vida sexual na análise. Nas palavras da autora:

A maturação psíquica ajuda a criança durante o segundo período da latência. O ego está exposto a conflitos menos graves, por um lado, porque o superego se tornou menos rígido. Os fatos de que a criança está mais orientada para o mundo externo,

que tem mais gratificações na realidade e, por último, porém não menos importante, que, nesta hora a energia sexual pode ser defletida com sucesso dos objetivos pré- genitais e ser utilizada para sublimação, parecem explicar a redução dos conflitos em torno da masturbação (BORNSTEIN, 2001, p. 3).

Através de seu trabalho clínico com crianças na latência, Berta Bornstein constatou que quanto menos grave a neurose, menos distorcidas são as atividades masturbatórias e menos paralisantes são os sentimentos de culpa conseqüentes.

A autora enfatiza a existência de uma masturbação normal ao longo de todo o desenvolvimento infantil e ressalta a importância de uma atitude adequada dos pais frente a isso.

Na latência, um paradoxo é evidente: a criança, às vezes, se masturba, entretanto, tenta conscientemente impedir o escape, mas sem se preocupar com o empenho. Devem se manifestar alguns leves laivos de culpa que, na puberdade, são encarados como conhecimento introspectivo benigno da inexorabilidade da vida instintiva (BORNSTEIN, 2001, p. 7).

Os estudos de Berta Bornstein acerca do período de latência auxiliam nesse momento de pesquisa e reflexão sobre esta etapa do desenvolvimento infantil. A divisão da latência, proposta por ela nos dois artigos, contribuiu para um maior entendimento da dinâmica psíquica das crianças que fizeram parte de minha pesquisa. Estes artigos de Berta Bornstein são de grande valor para quem se propõe estudar o período de latência, tendo em vista o pequeno número de publicações dedicadas sobre o tema.

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 39-41)