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O conceito de período de latência segundo a teoria do desenvolvimento de Erik

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 35-39)

É importante percorrer o caminho do desenvolvimento infantil proposto por Erikson, para melhor compreender sua contribuição e expansão teórica acerca do período de latência e realizar o objetivo aqui proposto.

Seguindo a tradição psicanalítica de Freud e influenciado por Anna Freud, Erik Erikson acrescentou à teoria da sexualidade freudiana suas contribuições teórico-clínicas. Uma delas foi atribuir grande importância à influência exercida pela cultura e pela sociedade no desenvolvimento humano.

Ele expandiu o enfoque dado para cada uma das fases sexuais freudianas, destacando o seu caráter psicossocial de tal modo que cada estágio representa uma organização que corresponde às exigências da cultura de uma determinada sociedade. E assegurou que cada fase vivenciada poderia transforma-se numa crise, definida como um momento crítico do processo de desenvolvimento.

Ao abordar o desenvolvimento, as idades vivenciadas durante o ciclo vital foram relacionadas com as fases estabelecidas por Freud, sendo as atitudes alternativas básicas denominadas por sentimento ou sentido de, já que o homem passa por oito crises (momentos críticos de cada idade) no transcurso de toda a sua vida. A forte influência da antropologia na sua formação e a grande preocupação com o conceito de mesmidade e continuidade histórica permitiram que Erikson investigasse os motivos da ocorrência de crises no processo evolutivo.

Assim, formulou sua teoria sobre o desenvolvimento humano como um processo contínuo, associado à ordenação e integração das várias experiências, caracterizando a formação da identidade, embora os instintos sempre comandassem a diretriz da vida humana.

Na etapa anterior à latência, as características apresentadas ampliam a teoria da sexualidade de Freud na medida em que ele propõe uma investigação que vai além da zona e localização da necessidade libidinal, levando em consideração a capacidade e o modo de relação da criança com o mundo e as modalidades sociais ou padrões de relacionamento interpessoal. (ERIKSON, 1976)

A primeira idade compreende o sentido de confiança x desconfiança. Nesse momento, os sentimentos são derivados das experiências do primeiro ano de vida. Para este autor, o firme estabelecimento de padrões duráveis para a solução do conflito nuclear da confiança básica versus a desconfiança é a primeira tarefa do ego e, portanto, antes de tudo, uma tarefa para o cuidado materno. Portanto, “a soma de confiança derivada das primeiras experiências infantis não parece depender de quantidades absolutas de alimento ou de demonstrações de amor, mas antes da qualidade da relação materna” (ERIKSON, 1976, p.229).

O sentimento de confiança, legado desse momento do desenvolvimento, está relacionado com a fé básica na existência; com o sentimento de identidade e com a capacidade que a criança adquire de confiança tanto em seus provedores externos como também em si mesmo. O papel dos pais, em especial o da mãe, tem uma importância decisiva na construção desse sentimento de confiança e desconfiança. Conforme Erikson,

As mães criam em seus filhos um sentimento de confiança por meio daquele tipo de tratamento que em sua qualidade combina o cuidado sensível das necessidades individuais da criança e um firme sentimento de fidedignidade pessoal dentro do arcabouçodo estilo de vida e de sua cultura (ERIKSON, 1976, p. 229).

A segunda idade, na qual predomina o sentido de autonomia x vergonha ou

dúvida, acontece quando a criança consegue alcançar um desenvolvimento muscular e verbal.

O desenvolvimento muscular alcançado tem o seu contraponto relacionado com duas modalidades sociais – agarrar e soltar. Segundo Erikson (1976), agarrar pode vir a significar uma retenção ou repressão destrutiva e cruel ou pode se tornar um padrão de cuidado, isto é, ter e conservar. Do mesmo modo, soltar poderá consistir em uma libertação hostil de forças destrutivas ou então em um moderado deixar passar ou acontecer. Para Erikson (1976, p. 283- 284) essa etapa do desenvolvimento

[...] passa a ser decisiva para a proporção de amor e ódio, cooperação e voluntariedade, liberdade de auto-expressão e sua supressão. De um sentimento de auto-controle sem perda da auto-estima, resulta um sentimento constante de boa

vontade e orgulho; de um sentimento de perda do auto-conrole e de supercontrole exterior resulta uma propensão duradoura para a dúvida e a vergonha [...]

Assim, o tipo de autonomia promovido na infância e modificado à medida que a vida se desenvolve favorece a preservação na vida econômica e política de um sentimento de justiça. Essa idade do desenvolvimento tem uma correlação com a fase anal postulada por Freud.

A terceira idade compreende o sentido de iniciativa x culpa. É neste momento do desenvolvimento que estão presentes o complexo de castração, a formação do superego, e o tabu do incesto. Erikson (1976) afirma que esses sentimentos se juntam para causar o que chama de crise especificamente humana, quando a criança deve renunciar à uma ligação excessiva, pré-genital com seus pais, para iniciar o lento processo de se tornar um genitor, um portador da tradição.

A fase edípica resulta, dessa forma, num sentimento moral que delimita o âmbito do permitido, principalmente no sentido do possível, e que vincula os sonhos infantis às diversas metas da tecnologia e da cultura.

A fase ‘edípica’ resultará, pois, finalmente não só num sentimento moral que limita os horizontes do permissível, mas também no estabelecimento de diretrizes no sentido do possível e do tangível, as quais vinculam os sonhos infantis às diversas metas da tecnologia e da cultura (ERIKSON, 1972, p. 121).

A contribuição da fase de iniciativa para o desenvolvimento da identidade infantil consiste na libertação dessa iniciativa, no sentido de realizar tarefas semelhantes ao adulto. Essa situação promete na infância uma ampliação das capacidades e da plena realização.

A quarta idade do ciclo vital está relacionada com o sentimento de indústria x

inferioridade e coincide com o período de latência, foco principal deste estudo. Nessa fase, a

escola começa a desempenhar um importante papel no desenvolvimento infantil. Erikson acredita ser nessa fase do desenvolvimento que, em todas as culturas, a criança começa a receber alguma instrução sistemática.

Nesse momento do desenvolvimento a criança descobre em si um sentimento de que pode realizar coisas, que pode fazê-las bem. Foi baseado nessas percepções que Erikson definiu o sentimento de indústria como uma das atitudes básicas dessa etapa evolutiva. A criança utiliza-se de novas capacidades para realizar suas tarefas, não recorrendo, no entanto, a exacerbações dos novos impulsos humanos. Erikson (1976) afirma que essa etapa difere das anteriores porque não é uma oscilação de uma convulsão interior para um novo domínio.

Com a chegada da latência, ocorre a sublimação dos desejos sexuais. A criança volta seus interesses para iniciativas concretas com finalidade de ser socialmente aceita, como se verifica a seguir:

[...] antes que a criança, que já é psicologicamente um genitor rudimentar, possa se transformar em um genitor biológico, deve começar por ser um trabalhador e provedor potencial. Ao se aproximar o período de latência, a criança normalmente desenvolvida esquece, ou melhor, sublima a necessidade de ‘fazer’ gente por ataque direto ou de se tornar às pressas papai e mamãe; aprende agora a conquistar consideração produzindo coisas (ERIKSON, 1976, p. 238).

Segundo Erikson (1976), essa é uma das fases do desenvolvimento socialmente mais decisivas, pois a necessidade de produzir envolve “fazer coisas ao lado dos outros”, favorecendo o primeiro sentido da divisão do trabalho e das oportunidades diferenciadas. Assim,

É na idade escolar elementar, quando à criança são ensinados os requisitos preliminares da participação na tecnologia particular da sua cultura e se lhe proporciona a oportunidade e a tarefa vital de desenvolver um sentido de execução e participação no trabalho (ERIKSON, 1976, p. 35).

O perigo dessa fase reside no desenvolvimento do sentimento de inferioridade (ERIKSON, 1972). Esse sentimento pode ser causado por uma solução insuficiente do conflito anterior. Dessa forma, a criança ainda pode querer mais a sua “mamãe” do que conhecimentos, poderá preferir ser bebê em casa a ser menino crescido na escola.

Ainda sobre a quarta idade do ciclo vital (o período de latência), Erikson explicita que nesse momento do desenvolvimento a criança começa a desenvolver as aptidões necessárias para o uso de instrumentos, símbolos e conceitos referentes à sua cultura.

O período de latência sob à ótica da teoria do desenvolvimento de Erikson ocupa um lugar relevante, ou seja, é um momento de transição da infância para o mundo adulto, quando a criança começa a desempenhar papéis preparatórios para a realidade da tecnologia e da economia.

Após a quarta idade que está relacionada com o sentimento de indústria e

inferioridade, segue a quinta idade referente ao sentimento de identidade x confusão de papel,

compreendendo o período da adolescência. Na sexta idade, os sentimentos predominantes são

a intimidade versus o isolamento. A sétima idade proposta privilegia o sentimento de generatividade x estagnação. E, por fim, a oitava idade compreende os sentimentos de integridade do ego x desesperança.

É importante destacar a relevância que Erikson (1972, p. 53) delega à influência das formas sociais, ou seja, da cultura na constituição da identidade de cada indivíduo.

Uma criança tem muitas oportunidades de identificar-se mais ou menos experimentalmente, com pessoas reais ou fictícias de um ou outro sexo, e com

hábitos, características ocupações e idéias. Certas crises obrigam-na a fazer seleções radicais. Contudo, a era histórica em que ela vive oferece apenas um número limitado de modelos socialmente significativos para combinações viáveis de fragmentos de identificação. A utilidade desses modelos depende do modo como satisfaçam, simultaneamente, aos requisitos da fase de amadurecimento do organismo, ao estilo de síntese do ego e às exigências da cultura.

A teoria do desenvolvimento de Erik Erikson amplia o olhar sobre as fases psicossexuais postuladas por Freud (1905) à proporção que destaca o seu aspecto psicossocial. Além disso, esse enfoque dado por Erikson acerca da influência de uma determinada cultura sobre a construção da identidade infantil será de grande importância no momento da análise e discussão dos dados desta pesquisa.

No documento GIANNA FILGUEIRAS MOHANA PINHEIRO (páginas 35-39)