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Almino Monteiro Álvares Affonso

Meu nome é Almino Monteiro Álvares Affonso e nasci na cidade de Humaitá, no estado do Amazonas, no dia 11 de abril de 1929, filho de Bohemundo Álvares Affonso e Dolores Monteiro Álvares Affonso. Meu pai nasceu no Ceará e estudou medicina, no Rio de Janeiro, até o quinto ano, mas viu-se obrigado a abandonar o curso para, com seu irmão, dar sustento à família, como seringalista. Foi para a Amazônia e acabou prefeito de Porto Velho. Mas sua família era do Rio Grande do Norte. Meu avô, Almino Álvares Affonso, foi líder abolicionista e deputado constituinte, em 1891, chegando ao Senado da República. Morreu cedo, relativamente, e por circunstâncias advindas de sua morte, é que a família acabou dando com os costados no Amazonas e ali se radicou. Meu avô Almino nos deixou de herança uma história marcante de lutas sociais e políticas, na região que vai de Mossoró, no Rio Grande do Norte, passando por Fortaleza, no Ceará, até o Amazonas. São os três primeiros estados a libertar seus escravos, entre 1883 e 1884, muito antes da Lei Áurea.1

Meu avô materno era um português, nacionalizado brasileiro: o comendador José Francisco Monteiro. Ele veio para o Brasil com 10 anos de idade, não se sabendo direito como ou porque razão. O fato é que se transformou num empresário, em Belém do Pará. Daí, jogou-se numa aventura fantástica, fixando-se no extremo sul do Amazonas, na região do rio Madeira, onde se tornou um grande seringalista. Fundou uma cidade, construiu uma bela cidade, Humaitá, considerada a “Princesa do Madeira”. E doou tudo isso ao estado do Amazonas. Doou. Então, foi um líder político enquanto viveu na região. Na época, chamava-se superintendente, em vez de prefeito. Ele foi superintendente várias vezes. Ele era a maior liderança em uma extensão quase infindável de terras, que iam até a fronteira de Santo Antônio, no estado de Mato Grosso.

Um território enorme! Mas o senhor tem irmãos?

Sim. Nós somos seis. Minha irmã mais velha, Matilde, foi normalista e está aposentada. Eu venho logo abaixo dela e, depois de mim, Frederico, engenheiro agrônomo; Raimundo, advogado e empresário, em São Paulo; Abigail, funcionária pública, em Rondônia; e José, o caçula, professor de desenho industrial.



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21 Otávio Mangabeira (1886-1960) foi deputado federal pelo estado da Bahia em diversas legislaturas entre 1912 e 1937. Foi eleito governador do estado da Bahia, em janeiro de 1947, e senador, pelo mesmo estado, em 1959. Ver: DHBB. 22 Francisco Waldir Pires de Souza nasceu em Acajutiba, na Bahia, em 1926. Foi deputado estadual pela Bahia em 1955-1959 pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), e deputado federal por três vezes: 1959-1963, 1991-1995 e 1999-2003. O primeiro destes mandatos foi pelo Partido Social Democrata (PSD), a seguir pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) e, por fim, pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Foi também eleito governador da Bahia (1987-1989), pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro, PMDB. Waldir Pires foi ainda consultor Geral da República entre 1963 e 1964, durante o governo João Goulart e ministro da Previdência e Assistência Social entre 1985 e 1986, durante o governo de José Sarney. É ministro da Defesa do governo de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2006). Ver:

http://www.radiobras.gov.br/governo/ministerio/lula_corregedoria.htm [acesso 6/2/2007]

23 Antônio Carlos Peixoto de Magalhães nasceu em Salvador em 1927. Em 1958, pela União Democrática Nacional (UDN), conseguiu seu primeiro mandato de deputado federal, renovado em 1962. Reeleito deputado federal em 1966, pela Arena, licenciou-se para ocupar o cargo de prefeito de Salvador, para o qual fora convidado pelo governador Luiz Viana Filho. Em 1970 foi eleito indiretamente para o seu primeiro mandato no governo da Bahia. Em 1978 conseguiu se eleger novamente governador. Antônio Carlos Magalhães foi ministro das Comunicações no governo Sarney (1985-1990). Em 1990, elegeu- se pela terceira vez para o governo da Bahia por uma coligação liderada pelo Partido da Frente Liberal, PFL. Foi ainda eleito em 1994 para o Senado pelo PFL da Bahia, e reeleito em 2002. Ver: [acesso 6/2/2007]



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Esta entrevista foi realizada por Ângela de Castro Gomes e Marcelo Timótheo da Costa, na cidade de São Paulo, em 19 de outubro

de 2006.



Mudei-me para lá em 1950. Fui morar numa pensão de estudantes bem melhor que a de Manaus, situada na rua Domingos de Moraes, pertencente a Dona Cecília, uma senhora negra baiana, extremamente simpática e excelente cozinheira. O meu ponto de apoio foi um primo, sobrinho de minha mãe, Adalberto Ferreira do Valle, principal acionista e presidente da Prudência Capitalização. A empresa ficava na rua José Bonifácio e, terminadas as aulas, bastava atravessar o Largo do Ouvidor para chegar a meu trabalho.

O encanto era pela poesia; o direito, portanto, foi a sua segunda opção.

O ganha-pão, que justificou a mudança para um grande estado, e a perspectiva de um horizonte maior. Muito acanhada, Manaus à época, estava com o sistema elétrico em colapso. Meus pais não queriam que eu viajasse, temiam os problemas que poderiam atormentar o filho distante. Mas insisti; aquele ambiente me sufocava. O transporte aéreo era raro e custava caro, por isso embarquei num avião da Força Aérea Brasileira, FAB, e comecei vida nova com gratuidades.

Mas tendo vindo em busca da poesia, o senhor acabou encontrando a política.

Sim, eu trazia essa expectativa. E, de fato, encontrei um núcleo de poetas na minha turma de 2

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ano de direito: Renata Pallottini, que além de poetisa, também se projetou como autora teatral; Hilda Hilst, escritora e dramaturga; Fernando Whitaker, cientista político e desembargador; Décio Pignatari, concretista de renome; Augusto de Campos, tradutor, ensaísta, crítico literário e musical. No final das aulas, nos encontrávamos num lugarzinho que passamos a chamar Umuarama – o lugar do encontro, na linguagem indígena. Ali nos emplumávamos!... Foi uma grande frustração, quando não consegui me realizar como poeta. Mas logo a seguir me senti convocado pela política.

Em Manaus, já fora deflagrada a luta pelo monopólio estatal do petróleo, e por conta dela fiz os meus primeiros experimentos de orador em praça pública. Em São Paulo, me incorporei, imediatamente. Sem descuidar do direito, que lastreava o pensamento, abrindo espaços à reflexão.

O grupo de poetas integrou-se à Campanha do Petróleo?

Não, eram dois grupos rigorosamente distintos. O segundo dedicava-se à oratória, ao debate, e montava torres de petróleo simbólicas no Largo de São Francisco, nos bairros de São Paulo, em cidades do interior do estado. Nele, destacava-se a figura de Rogê Ferreira,6socialista e participante ativo das lutas sociais daquele momento.

E a faculdade? De que matérias o senhor mais gostava? Que professores chamavam sua atenção?

O direito constitucional era, por natureza, o que mais me empolgaria. A cargo de um livre docente, o professor Pinto Pereira, um senhor de idade avançada, extremamente humilde, mulato escuro, filho de escrava, me entristecia vê-lo no declínio da carreira, sabendo que fora um grande orador. Por

Entrevista Almino Monteiro Alvares Affonso



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Dr. Almino, o senhor tem recordações do que se conversava em sua casa, quando era pequeno? Afinal, sua família tinha tradição política pelo lado paterno e materno. Falava-se de seus avós, de política?

De uma forma direta ou indireta, essas duas histórias, que eram histórias políticas, permeiam a minha infância e a minha adolescência de maneira própria à idade. Meu pai, inclusive, tornou-se prefeito de Porto Velho em 1938, época do Estado Novo, em plena ditadura de Vargas.2Foi, portanto, muito mais um administrador do que uma liderança política. Mas, talvez por ser um homem muito fechado, evitava as lembranças antigas. As histórias que ouvi, diziam respeito mais à saga do avô fundador da cidade, do que aos feitos do avô pioneiro abolicionista, de quem eu herdei o nome. Só gradualmente, passei a ter uma visão mais completa a respeito da grandeza, se me permitam, de meu avô paterno. No Rio Grande do Norte, perto de Mossoró, há um município chamado Almino Affonso. Lá, ainda hoje, ele é considerado um herói. Soube disso por intermédio de Luiz da Câmara Cascudo3– e me senti iluminado!

O senhor fez os primeiros estudos em Humaitá?

As primeiríssimas letras, sim, em Humaitá, no grupo escolar Oswaldo Cruz, fundado pelo meu avô, com o nome do médico sanitarista que salvou a região do impaludismo, do beribéri.4Tudo que existia na cidade fora construído por ele, que apesar de não ter instrução formal, possuía visão. O prédio da Prefeitura é uma beleza, ocupa um quarteirão inteiro; a biblioteca municipal, um casarão! Meu pai deixou o seringal por conta dos filhos – para poder educá-los – quando eu tinha 5 anos de idade; mudamo-nos para Porto Velho, onde cursei o primário. Fiz o ginásio em Manaus, no Colégio Dom Bosco. Nas férias, voltava a Porto Velho, entregue aos cuidados do comandante do navio. Tinha apenas 11 anos... Sentia-me muito mais solto do que meus netos, atualmente. A experiência que tive no internato foi totalmente negativa, constituindo-se num exemplo cabal de sua mais completa inadequação em termos educacionais. Menino, ainda, jurava a mim mesmo jamais privar os meus filhos da liberdade, submetendo-os a um sentido de ordem baseado na repressão. A quantidade de castigos que sofri!... Não por ser moleque, mas falador. Um dia, escrevi a meu pai, implorando para que me tirasse de lá: “O senhor não faz idéia do que é o Inferno”. As cartas eram censuradas!

Esse tipo de experiência é muito comum. Castigos, censura de cartas etc, havia tudo isso. Os colégios internos, religiosos principalmente, eram muito repressivos. Mas, enfim, o senhor ultrapassou essa fase e foi estudar direito.

Antes, conclui meus estudos no Colégio Estadual do Amazonas, um externato, verdadeira bênção dos deuses. Felizmente, o Dom Bosco não ia além do ginasial. Morava numa república de estudantes e era acolhido, para as refeições, por um grande amigo de família, o desembargador Stanislau Affonso. Em sua casa havia uma bela biblioteca. Fiz o 1

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ano de direito, em Manaus, no ano de 1949. Sonhando ser poeta, queria morar em São Paulo!... A Faculdade das Arcadas,5no Largo de São Francisco, era a casa de Castro Alves, Álvares de Azevedo, Fagundes Varela, e o direito, uma espécie de ponte para alcançá-los.

MINISTÉRIO DO TRABALHO: UMA HISTÓRIA VIVIDA E CONTADA



E o senhor ficou famoso como orador. Quem o apelidou de “Uirapuru da eloqüência”?

Sei lá!... Alguém inventou isso. Um ano depois, fui eleito presidente da União Estadual dos Estudantes de São Paulo. A essa altura, como liderança estudantil de expressão nacional, a carreira política passou a me prender, a me encantar.

Sua formatura foi em 1953 ou 1954?

A turma é de 1953, mas a solenidade de formatura realizou-se em janeiro de 1954. Foi quando ingressei no Partido Socialista Brasileiro. Num primeiro momento, eu abraçara as lutas nacionalistas, em defesa do petróleo e dos minerais atômicos, e fora contra a cessão da ilha de Fernando de Noronha,7mas a leitura de alguns textos marxistas me despertou, gradualmente, para os aspectos sociais. Então, o ideário socialista se impôs. Entramos juntos, no PSB, Fernando Gasparian,8recentemente falecido, Rubens Paiva,9 Adriano Branco e talvez uns quinze ou vinte colegas. De pronto, me candidatei a vereador e fui derrotado magnificamente.

O PSB não passava de um grêmio, embora contasse, no plano nacional, com grandes figuras como João Mangabeira e Alípio Corrêa Netto;10em São Paulo, destacavam-se Rogê Ferreira e Germinal Feijó.11 Havia, ainda, uma “bancada” de intelectuais, formada pelos trotskistas Febus Gikovate, Fulvio Abramo, Aziz Simão e, se não me engano, Arnaldo Pedroso D’Horta. Travava-se, internamente, uma intensa luta contra eles, apenas atenuada pela atuação do Dr. Lívio Xavier, advogado, que traduzira o clássico Minha

vida, de Trotsky. Apesar de um derrame que sofrera na juventude, aquele homem possuía uma cabeça

extraordinária. Esse era o núcleo, em torno do qual gravitavam algumas lideranças operárias, ou de origem operária, em contato com Paulo Singer e sua mulher, Eveline Pape, pais de André Singer, atual porta-voz da Presidência da República.

Perdida a eleição para a Câmara dos Vereadores, em São Paulo, o senhor voltou a se candidatar a deputado federal, mas pelo Amazonas, em 1958.

É verdade, lancei-me pelo Amazonas. Mas antes, tentara ser candidato a deputado estadual pelo Partido Socialista Brasileiro em São Paulo, e vi, com clareza, mais uma vez, que não tinha chance alguma. Enquanto isso, um companheiro da minha geração, como Gilberto Mestrinho, se candidatava ao governo do estado do Amazonas. Então vários colegas me chamaram: “Venha para cá”. E eu fui; uma loucura completa... Fui e me lancei pela legenda do Partido Social Trabalhista (PST), pois o PSB não existia, no estado. O único partido que tinha semelhança ideológica com a visão do PSB era o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que na época era liderado pelo Plínio Ramos Coelho, um homem de compromisso popular, nacionalista. O PTB crescera muito no estado, mas o número de candidatos possíveis era restrito. Aí ele fez uma aliança com o PST e fui lançado com o compromisso de que, se eleito, automaticamente estaria no PTB.

Recém casado, viajei a Manaus e fiz uma campanha de três meses. Por incrível que pareça, ganhei. Havia sete cadeiras em jogo, e disputei com vereadores, deputados estaduais, secretários de estado, todos de terno



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coincidência, não chegou à cátedra. E eu me pergunto se a cor de alguma maneira não influenciou. Além dele, havia o professor Cesarino Júnior, negro também, que ensinava direito do trabalho, ou direito social, como ele dizia. O metódico professor Basileu Garcia lecionava direito penal, e ao ouvi-lo, me apaixonei pela matéria. O professor de direito comercial era Waldemar Ferreira, homem extremamente culto, mas rococó, na sua maneira de falar e escrever. Polemista, opôs-se à criação da Justiça do Trabalho e debateu com Oliveira Vianna. Outro muito humilde foi o professor Alvino Lima, que nos ministrava aulas de direito civil; expositor ruim, eu demorei a valorizá-lo. Lembro-me de ter comparado a sua tese sobre direitos pessoais, com Rui, que os defendia, numa monografia que “cometi”. De Miguel Reale, pelas suas idéias fascistas, sempre mantive distância.

E o curso lhe pareceu bom?

Excelente. Os professores, embora não me encantassem, eram brilhantes, e eu fui bom aluno. Excetuando direito processual civil, matéria em que prestei exame oral, passava por média sempre. Só não era o primeiro... Aliás, primeiríssimo da turma, Boris Fausto ganhou todos os prêmios e se tornou um grande historiador.

Como se deu o seu ingresso na política estudantil?

Comecei a ganhar certa notoriedade no aniversário de Pinto Pereira, quando um colega maldoso levantou- se, em plena sala de aula, e me indicou para discursar em nome da turma, saudando o professor. Eu trouxera do norte uma noção de elegância que incluía terno branco e sapato bicolor, itens que não tinham nada a ver com a indumentária dos paulistas. Além disso, usava uma senhora cabeleira! Desconcertado, ante a evidência do trote, busquei inspiração no entusiasmo que sentia, não pelo professor, mas pelo ser humano, e fiz um discurso comparando seu vigor ao pau-mulato, árvore amazônica cujo lenho muda de cor três vezes ao ano, passando do negro ao verde limoso e, depois, ao vermelho sangue. Segundo a crença popular, quem se banha em água tingida pela sua casca, renova-se sempre – assim como o mestre... Emocionado, ele chorou, e choraram todas as moças... Foi um sucesso! À saída, alguém comentou: “O amazonense arrasou!” A partir daí, a política estava a um passo.

Existiam, na Faculdade de Direito, dois partidos – o Libertador e o Renovador. Por insistência de um amigo, me deixei cooptar pelo Partido Libertador, e fui apresentado a um colega do 4

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ano, Sérgio Farina.

Conversamos, e ele aceitou que eu escrevesse uma plataforma com base na qual nos lançamos – ele, a presidente e eu, a orador do Centro Acadêmico 11 de Agosto. Até então, o nome do orador – a pessoa que discursava em todas as ocasiões mais importantes na Faculdade –, surgia de uma eleição meio combinada. Segundo a tal plataforma, passaria a ser escolhido mediante concurso. Foi o que se deu. Mais tarde, ganhei um concurso nacional de oratória e me tornei, também, o orador de minha turma.



Nesse primeiro mandato, o senhor se envolveu na montagem da Frente Parlamentar Nacionalista.13

Mas antes, tive que superar alguns sérios problemas pessoais. Para princípio de conversa, chegara à Câmara com fama de orador, e lá encontrei verdadeiros mestres da palavra, e um grande tribuno, alguém que jamais tolerei, politicamente: Carlos Lacerda,14deputado da UDN. Quando ele subia à tribuna, a Câmara silenciava – os que o odiavam e os que o amavam. Capaz de provocar reação semelhante, somente Vieira de Melo, líder do Partido Social Democrático.15Entrei em crise, a ponto de ficar com as mãos arroxeadas! Fiquei nesse estado até que morreu o pai do Lacerda, o batalhador Maurício Lacerda,16 prócer da esquerda, socialista histórico – o oposto do filho. Pois não é que Fernando Ferrari - líder do PTB - me indica para falar em nome do partido, homenageando Maurício de Lacerda? Fui à biblioteca e, em dois dias, me preparei da melhor maneira possível. Fiz um bom discurso. Tanto que Carlos Lacerda o elogiou: “Foi um belo discurso”. Imagine!... Um jovem deputado, de um partido adversário, receber louvores do parlamentar mais eloqüente da Câmara. A crise, todavia, só foi subjugada quando fiz psicanálise. Naquela ocasião, a terapia representou um divisor de águas. Deixei para trás quaisquer vestígios de insegurança ou timidez, e aprendi a distinguir minhas fraquezas da audácia alheia. Soltei-me! E como 1

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secretário da Frente Parlamentar Nacionalista, alcei vôo.

Como a Frente foi montada?

Seu maior articulador foi o paraense Abguar Bastos,17intelectual e escritor, além de grande quadro político. À minha chegada, a Frente era presidida por Bento Gonçalves, do Partido Republicano de Minas Gerais (PRM), e liderada por Rogê, pelo PTB, e Dagoberto Sales, pelo PSD. Ingressamos nela vários deputados trabalhistas e também da própria UDN. Mas o que aumentou sua visibilidade foi a mensagem nacionalista que trazíamos. O chamado Grupo Compacto do PTB, que também integrava a Frente Parlamentar Nacionalista, tinha nítidos compromissos sociais e uma clara marca de esquerda.18

Foram vocês, do Grupo Compacto, que deram alma à Frente Parlamentar Nacionalista.

Não há dúvida. Sem desmerecer a participação de outros deputados, nós constituímos um núcleo muito importante da Frente Parlamentar Nacionalista, que era integrada por figuras de várias outras legendas. Da UDN, o maranhense José Sarney, Ferro Costa, do Pará, e Seixas Dória, de Sergipe. Do PSD, José Joffily, da Paraíba. Do PSP, Neiva Moreira, de São Paulo. Do PSB, Aurélio Viana, das Alagoas. Em suma, todos os partidos tinham o seu ninho dentro da Frente, e no PTB, majoritário, o Grupo Compacto imprimia uma dinâmica nova. Essa, talvez, seja a síntese mais correta.

O senhor tinha proximidade maior com alguém?

O grupo atuava unido e tomava decisões políticas por consenso, mas havia espaço para relações pessoais. Tive maior aproximação com três companheiros do próprio partido: Clidenor Freitas, médico do

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branco, engravatados, com uma postura distante do eleitorado. Sob um calor infernal, de quase 40

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, minha primeira atitude foi tirar o paletó. Fiz reuniões em casa de simpatizantes e pequenos comícios na porta das fábricas e dos colégios públicos. Carregava um tamborete e discursava nas esquinas mais movimentadas, usando um megafone. Sabe quem eram os organizadores da campanha?... O atual senador Jefferson Peres e o ex-ministro Bernardo Cabral. Minha mulher, funcionária pública por concurso, tomou emprestados 50 mil cruzeiros, na Caixa Econômica, para me ajudar. De minha parte, eu só usava a garganta.

Também, internamente, tive dificuldades. Aliados contra a União Democrática Nacional (UDN), o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido Social Trabalhista (PST) dividiam o eleitorado do estado. Jango,12de passagem por Manaus, chamou atenção para o risco que isso representava, e sugeriu a retirada das candidaturas do PST. A tese foi aceita pelo governador, Plínio Nunes Coelho, que ofereceu aos prejudicados vários cargos em secretarias e empresas estatais. A mim, ele propôs que desistisse da candidatura a deputado